• Nenhum resultado encontrado

Alterações Psicológicas: O Medo de Falhar como Mãe

CAPÍTULO I – O CICLO GRAVÍDICO-PUERPERAL: DE MULHER A MÃE

1.2. Alterações decorrentes da Gravidez, Parto e Puerpério

1.2.2. Alterações Psicológicas: O Medo de Falhar como Mãe

Nenhuma mulher está preparada para ser mãe. Santo, (2009, p.26), refere que quando a mulher engravida, tudo de imediato se modifica, afirmando que “o primeiro sítio onde se engravida é no cérebro”.

A maioria das vezes pensa-se na gravidez, no nascimento e na maternidade como acontecimentos isolados de vida. No entanto, (com durações temporais diferentes), a gravidez transcende o momento da concepção, assim como a maternidade transcende o

momento do parto, sendo considerados processos, (do ponto de vista psicológico), dinâmicos de construção e desenvolvimento (Canavarro, 2001).

Para Correia, (citada em Nogueiro, Lopes e Galvão, 2004, p. 37), “ser mãe pode ser considerado uma experiência dolorosa, perigosa, interessante ou satisfatória”. Os medos relacionados com a perda do recém-nascido e da sua própria autonomia contrastam e equilibram-se de certa forma com a alegria, o orgulho e o desejo de ser mãe.

Como todas as mudanças, a gravidez, o parto e a maternidade são frequentemente encarados como períodos de crise, implicando stress. No entanto, ao serem encarados como períodos de crise, constituem momentos especiais de mudança psicológica, não só para a mulher mas também para o companheiro, (nomeadamente ao nível da segurança emocional). As vulnerabilidades e descompensações físicas e psicológicas permitem criar novas respostas adaptativas, com um importante impacto ao nível do desempenho psicológico dos pais (Silva e Figueiredo, 2005).

Para algumas mulheres, o nascimento de um filho pode ser percepcionado como uma oportunidade para reforçar a relação afectiva do casal, ou pelo contrário constituir um obstáculo ao relacionamento afectivo e sexual do mesmo. Para Tedesco, (citado em Nogueiro, Lopes e Galvão, 2004, p.37), “quando a gravidez não é desejada nem planeada, as perturbações emocionais que daí decorrem podem prejudicar a sexualidade do casal, assim como a intimidade afectiva do mesmo.”

Mendes, (2007), ainda a propósito da representação da maternidade no contexto do relacionamento conjugal/marital, refere-nos que a maternidade tanto pode assumir o significado de materialização e projecção de um encontro, de uma relação íntima, fortalecendo os elos afectivos entre o casal, ou pelo contrário, ser percebida como uma perda de espaço, de organização conjugal ou mesmo da sua exclusividade, devido ao elevado investimento emocional e de tempo que implica.

Ainda que a mulher se sinta feliz com a sua gravidez, predominando uma sensação geral de bem-estar, é com bastante frequência que apresenta labilidade emocional, definida por Colman e Colman, (1994, p. 32), como “uma condição psicológica caracterizada por uma vasta série de estados de espírito que variam rapidamente em resposta a situações que geralmente não despoletariam tais reacções.” As variações de humor podem ser confusas e angustiantes para a grávida e familiares, constituindo importantes factores na determinação do binómio sexualidade-gravidez (Nogueiro, Lopes e Galvão, 2004).

No geral, para a mulher, a gravidez é o momento de consolidação de um sentimento de controlo do próprio corpo, bem como, da sua fertilidade. No entanto, nem sempre o processo de integração de uma nova imagem corporal de si própria é pacífico, segundo Tobin, (citado em Silva e Figueiredo, 2005), pode mesmo representar para a mulher deixar de ter controlo sobre o seu próprio corpo. Durante o período pós-parto a mulher vive uma situação de hipersensibilidade, essencialmente devida à readaptação hormonal que tem início imediatamente após o parto. Paralelamente, verifica-se um ajustamento psicológico na auto-imagem e nas novas relações familiares. Mudanças exteriores e interiores profundas ocorrem, precisamente quando tem de se desenvolver toda uma nova série de comportamentos práticos (Apóstolo, 1999).

A adaptação ao papel de mãe é tanto mais difícil quanto mais complicados são os problemas familiares e de ordem económica (Portelinha, 1999). No entanto, não são apenas estes factores que despoletam as dificuldades na adaptação psicológica ao papel de mãe. Do ponto de vista sintomático é muito usual as mulheres apresentarem algum grau de depressão quando estão presentes, dor uterina, (que não cede à analgesia), fadiga, (por falta de sono), descarga emocional, (característica do vencer os medos típicos da gravidez e do parto), ansiedade, (relacionada com as capacidades para cuidar do recém-nascido), e medo, (da perda de atractividade). Também Santo, (2009), alerta para a frequente ocorrência da depressão no período pós-parto, referindo que é necessário dar-lhe a devida atenção.

Ainda hoje a maternidade continua a ser frequentemente caracterizada como natural e instintiva. Canavarro, (2001, p. 22), defende que “muitas mulheres sentiram, sentem e sentirão que ser mãe é fundamental para a sua realização pessoal”, podendo o desejo de ter de cuidar de uma criança ser tão forte e natural, que transmite a sensação de ser qualquer coisa inata. Para a autora, a noção da maternidade como algo natural e instintivo, não permite às mulheres a conceptualização da maternidade como um processo de decisão, associado a um importante desenvolvimento pessoal e auto- conhecimento. Afirma ainda, (citando Tobin, 1999), que “as mulheres que escolhem não utilizar a sua capacidade biológica para ser mães, não são menos normais, menos femininas, menos naturais, menos maturas e mais egoístas do que aquelas mulheres, que sentem como muito forte a vontade de ter e cuidar de uma criança.”

O nascimento de um filho, cultural e socialmente, foi sempre considerado algo muito importante mas revestido de grandes dificuldades. Na nossa cultura, parece não haver limites para o que uma boa mãe pode fazer. Para a mulher, encontrar o ponto de

equilíbrio entre as suas necessidades e as necessidades da criança, é muitas vezes difícil, frustrante, angustiante e motivo de uma enorme ansiedade. A mulher pode dar tudo de si, envolvendo-se em todos os aspectos do desenvolvimento do seu filho, tentando que seja o melhor, o mais inteligente, o mais feliz e o melhor adaptado (Canavarro, 2001). O único limite para ser uma boa mãe, segundo Tobin, (citado em Canavarro, 2001, p. 27), parece ser, “a sua capacidade pessoal de sacrificar as suas próprias necessidades – de privacidade, espaço, tempo e coisas materiais – em favor das do seu filho.”

A qualidade da atenção que a mulher recebeu quando ela própria foi criança, constitui o factor mais importante para determinar a capacidade de uma mãe para ser sensível às necessidades de uma criança e para responder de forma altruísta e amorosa. Inconscientemente, uma mãe repete a sua primeira relação, e tendo experimentado a negligência ou o amor, vai querer dar sempre mais do que aquilo que recebeu ao seu filho (Colman e Colman, 1994).