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Alterando o desenho da estrutura escolar

4 EM BUSCA DA CONSTITUIÇÃO DE PRÁTICAS DEMOCRÁTICAS

4.2 CRIAÇÃO DO COLEGIADO CONSULTIVO: LIMITES E POSSIBILIDADES

4.2.1 Alterando o desenho da estrutura escolar

A rigidez dos tempos e espaços da escola, ao mesmo tempo em que, pode

comprometer o desempenho de alguns instrumentos de participação, como é possível perceber nos depoimentos da professora Maria, ao falar do Colegiado Consultivo, pode, também, servir para impulsionar algumas mudanças na estrutura escolar, como também contribuir no

processo de discussão e reestruturação dos seus tempos e espaços, o que, por sua vez, pode dilatar as possibilidades de envolver mais professoras/es no processo de elaboração de políticas educacionais.

São organizados, no ano de 1997, pela SEMED, alguns seminários para discutir, com toda a rede pública municipal de educação, os rumos da política educacional de

Blumenau. Estes seminários tinham por objetivo trazer à tona as experiências, consideradas, significativas, inovadoras e transgressoras, presentes na prática de várias/os professoras/es, práticas estas que se encontravam emudecidas no cotidiano escolar. A socialização de tais experiências, que tinha por finalidade criar situações coletivas para que as/os professoras/es pudessem dialogar sobre os saberes docentes, sobre os significados de tais experiências instigou, entre as/os professoras/es, o interesse em debater, também, a possibilidade de repensar, de alterar o desenho da estrutura escolar.

“...Aos poucos, quando começou a se discutir também a Escola Sem Fronteiras, também o processo de implantação da Escola Sem Fronteiras, também, aliás, o processo de implantação dos ciclos e a proposta Escola Sem Fronteiras, então isso aguçou muito mais as discussões de uma forma geral nas escolas, não sobre o Colegiado Consultivo, sobre quem era representante, mas provocou a discussão entre os professores sobre concepções de educação, sobre a forma de como a escola estava organizada, sobre o que a gente pensava que tinha que ser mudado...”(Professora Maria).

Os encontros, seminários ocorridos no primeiro ano (1997) do Governo Popular, objetivaram promover, entre as/os professoras/es da rede, discussões acerca da realidade da política educacional do Brasil, a importância de estudar, de entender os processos, as

concepções de aprendizagem, de redimensionar as discussões pedagógicas incluindo na pauta questões relacionadas às temporalidades humanas, ao processo de formação humana.

“Discutia-se muito como se dava a aprendizagem da criança e isso começou a me chamar à atenção. Porque até então eu não tinha muito claro como é que a criança aprendia, como é que o professor poderia estar mediando de uma forma mais eficiente digamos, não com essa palavra, mas de alguma forma que essa criança conseguisse melhorar mesmo com essa mediação. Eu lembro que ficava muito mais claro as questões das relações, do aprender com o outro, desde 97, nos grupos de estudos” (Ana – no início trabalhou com o Ciclo da Infância, atualmente é Profª da Pré-adolescência).

Neste ano (1997), o professor e assessor Miguel Arroyo discutiu com as/os

possibilidades de repensar os tempos e os espaços educacionais com a organização dos Ciclos de Formação Humana.

As discussões conduzidas, no ano de 1997, pautavam-se no que significava elaborar uma política pública de educação, envolvendo ações para a educação infantil, o ensino fundamental e a educação de jovens e adultos, tendo com base os princípios, os eixos apresentados anteriormente, da Escola Sem Fronteiras, mas para as/os professoras/es, do ensino fundamental, o foco principal, o que mais chamou a atenção foram às questões acerca da organização escolar em Ciclos de Formação Humana. Esta organização prevê, entre outros aspectos, alterações na estrutura escolar, isto é, mudanças nos tempos e nos espaços escolares, com a inclusão de momentos destinados ao estudo, à formação docente. A política de

formação permanente, presente na organização escolar em ciclos de formação humana, implantada a partir de 1998, possibilita que as/os professoras/es, de Blumenau, passem a se encontrar periodicamente, na própria escola, ou em outros locais, para debater questões relacionadas ao trabalho docente.

Retomando a discussão, iniciada anteriormente, sobre a criação, em 1997, do Colegiado Consultivo, que tinha por objetivo garantir a participação docente nas discussões relacionadas à política educacional do município, entende-se que os movimentos ocorridos, em 1997 e 1998, possibilitaram que um maior número de professoras/es participassem

diretamente destas discussões. Com o repensar da estrutura escolar, as discussões que estavam restritas a um grupo de professoras/es ampliaram-se, o que estimulou que mais professoras/es passassem a problematizar as questões pertencentes a uma proposta educacional. Este aspecto explica, em parte, a extinção, em 1998, do colegiado consultivo. Ao ser questionada sobre o motivo que levou a não mais existência do colegiado consultivo, a professora Maria que participou, em 1997, do processo (colegiado consultivo) e atualmente (2003) trabalha com o primeiro e segundo ciclo de formação relata que:

“Eu tenho a impressão que ele foi definhando por causa dessas questões que eu apontei, a falta de representatividade, as limitações e principalmente a questão da disponibilidade de tempo das pessoas... As pessoas não viam muito sentido desse colegiado consultivo, até porque, neste ano, muitas pessoas, principalmente as que trabalhavam com os primeiros ciclos de formação, começaram a participar mensalmente dos encontros na escola de formação e discutir as coisas que estavam acontecendo na escola, lá, nesses encontros dos ciclos de formação. Porque elas não precisavam de um intermediário pra isso, elas iam para o encontro, junto com as outras professoras, das outras escolas, da mesma escola, mas elas iam pra lá discutir isso e falavam das coisas que elas estavam sentindo, das dúvidas que elas tinham, das discordâncias, sem um representante. Elas iam (nos encontros) e discutiam isso...Dentro da própria escola tinha o encontro mensal e pessoas, da Secretaria de Educação, estavam constantemente na escola”.

Observa-se que a participação docente passa a ter maior sentido e visibilidade quando são alargadas as possibilidades de envolver mais professoras/es neste processo.

“...Não tinha mais sentido ter um colegiado, porque todos já estavam discutindo... todos que eu falo são todos os que estavam fazendo parte do primeiro ciclo. (Os encontros) tinham um sentindo, um sentido que o colegiado consultivo não tinha mais, porque um representante que não é representante indo lá discutir, ele não estava representando as questões de todo aquele grupo de professores, agora, aquele grupo de pessoas, do primeiro ciclo de formação, indo para a escola de formação, discutindo as suas dúvidas, falando dos seus posicionamentos, fazendo os seus questionamentos, aí sim era representativo. Eles todos estavam lá discutindo,

tinham a possibilidade de ir, mesmo que nem todos percebessem a importância disso, mas a maioria estava indo para lá e fazendo a sua discussão, ou na própria escola eles estavam discutindo suas propostas e tinha representantes da secretaria de educação, junto com eles, discutindo, ouvindo o que eles estavam falando, se posicionando” (Maria – participou do colegiado consultivo e atualmente é professora do primeiro e do segundo ciclo de formação).

Entende-se, então, que a criação do Colegiado Consultivo foi a forma inicial

encontrada (a mais apropriada para o momento) para promover a participação docente, isto é, foi o melhor jeito de garantir alguma forma de participação, das/os professoras/es, no

processo de discussão de uma política educacional, o que, por sua vez, evidencia a conquista por espaços (da sociedade civil) no interior do aparelho estatal. A constituição de novos instrumentos de participação, presente na política de formação docente, alarga as

possibilidades de inserir mais professoras/es neste processo e, desta maneira, considera-se que, diferente de ter sido extinto por representar um mecanismo frágil e limitador, o Colegiado Consultivo, deixou de existir porque, com a alteração da estrutura escolar, (implantação dos ciclos de formação humana) multiplicaram-se os espaços de participação docente nas discussões que abarcaram o fazer pedagógico.

A possibilidade de mudança estrutural da escola organizada em séries para a organização dos/as educandos/as em Ciclos de Formação Humana tornou-se, então, o cerne dos debates, das preocupações entre as/os professoras/es. Quando questionadas/os a falar sobre sua participação no processo de discussão e implementação da Escola Sem Fronteiras, as/os professoras/es, entrevistadas/os, fizeram referências ao processo de implantação dos Ciclos de Formação Humana, chegando até mesmo a falar dos ciclos como sinônimo da Escola Sem Fronteiras42 e não como uma possibilidade de organização dos tempos e espaços escolares previstos nesta política educacional. Por este motivo, na seqüência deste trabalho, será apresentada, concomitante a discussão sobre as questões que envolvem a participação docente no processo de discussão da Escola Sem Fronteiras (objeto deste estudo), alguns aspectos considerados relevantes sobre os Ciclos de Formação Humana.