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1. TRADUÇÃO – ASPECTOS TEÓRICOS

1.7 Alusões

Um dos aspectos a serem descritos nessas quatro traduções, diz respeito às alusões presentes na obra Mrs. Dalloway. Na análise microestrutural do texto traduzido, pode-se verificar quais foram as escolhas dos tradutores quanto à gramática, o léxico, os nomes próprios, nomes de lugares, pronomes de tratamento, repetições, rimas, aliterações e a pontuação. Uma das possiblidades de análise microestrutural se refere às alusões, de vários tipos, que são recorrentes em Mrs.

Dalloway, de Virginia Woolf.

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As deformações descritas por Berman são: racionalização, clarificação, alongamento, enobrecimento e vulgarização, empobrecimento qualitativo, empobrecimento quantitativo, homogeneização, destruição dos ritmos, destruição das redes significantes subjacentes, destruição dos sistematismos textuais, destruição (ou exotização) das redes de linguagens vernaculares, destruição das locuções e idiotismos, apagamento das superposições de línguas (BERMAN, 2013, p. 68)

Para Leppihalme (1997, p. 6), há uma definição padrão do termo "alusão" nos estudos literários como uma “referência a alguma coisa”31

. Existem diversos adjetivos para se referir a alusões que se pode observar nos estudos de Perry (apud LEPPIHALME, 1997, p. 7). Alguns desses adjetivos incluem os seguintes:

artístico, balzaquiana, bíblico, biográfica, cristão, clássico, banda desenhada, notável, contemporânea, cultural, de Homero, irónico, literário, local, medieval, metafórico, moderno, moral, musical, mítico, mitológico, obscuro, evidente, paródico, platônica, política, proverbial, satírico, científico, escritural, de Shakespeare, significativo, estilística, tonal, velado, Virgílio, visual32

Leppihalme (1997, p.7) aponta alguns dos propósitos que pesquisadores notaram quanto ao uso de alusões por diferentes autores literários:

um desejo de chamar atenção para a própria aprendizagem ou sua vasta leitura (Preminger, 1965: 18); para enriquecer o trabalho trazendo novos significados e associações, ‘uma riqueza de experiência e conhecimento além dos limites da compreensão da afirmação’ (Shaw, 1976: 14); uma tentativa de caracterizar as pessoas, ou sugerir pensamentos ou impressões inconscientes e atitudes em personagens (Hall, 1971: 534-5); ou aumentar a significância de seu próprio trabalho generalizando ou sugerindo universalidade (Weisgerber, 1970:39).33

A partir da apresentação dos tipos de alusão e das motivações que levam os escritores a utilizar-se de alusões em seus textos literários, é importante compreender os tipos de soluções que os tradutores encontram, ou podem encontrar, frente a essas referências, que podem representar dificuldades ao ato tradutório.

31 “reference to something” (LEPPIHALME, 1997, p. 6)

32 “artistic, Balzacian, biblical, biographical, Christian, classical, comic, conspicuous, contemporary,

cultural, Homeric, ironic, literary, local, medieval, metaphoric, modern, moral, musical, mythic, mythological, obscure, overt, parodic, Platonic, political, proverbial, satiric, scientific, scriptural, Shakespearean, significant, stylistic, tonal, veiled, Virgilian, visual” (PERRY apud LEPPIHALME, 1997, p. 7)

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a desire to call attention to one's learning or wide reading (Preminger, 1965: 18); to enrich the work by bringing in new meanings and associations, 'a wealth of experience and knowledge beyond the limits of plain statement' (Shaw, 1976:14); an attempt to characterise people, or suggest thoughts or unconscious impressions and attitudes in characters (Hall, 1971: 534-5); or to increase the significance of one's work by generalising or suggesting universality (Weisgerber, 1970:39).

Lefevere (1992, p. 22) se refere às alusões como o uso que escritores fazem de textos bem conhecidos em sua própria literatura para dar destaque à algum ponto em sua escrita. Os tradutores precisam reconhecer estas alusões e decidir se vão reproduzi-las em suas traduções. Ao decidir reproduzir as alusões na tradução, o tradutor não terá muitas dificuldades se a cultura de partida é semelhante à cultura de chegada. Mas, se a língua de partida e a língua de chegada pertencem a culturas distintas, Lefevere (1992, p. 22) propõe algumas ações que podem ser tomadas pelos tradutores: introduzir a alusão na a cultura de chegada (com a possibilidade de explicá-la em nota de tradução); omiti-la; ou, substituí-la por uma outra alusão já conhecida na cultura de chegada, desde que seja análoga na língua de chegada.

Lefevere (1992) classifica as alusões como: bíblicas, clássicas, culturais e literárias. Segundo Lefevere (1992, p. 23), para traduzir alusões bíblicas, o tradutor deve conhecer o texto bíblico a que o escritor do texto de partida se refere. Se acaso o texto bíblico não ocupa um papel central na cultura de chegada, o tradutor pode optar por procurar outras maneiras de representar a alusão. Quanto às alusões clássicas, Lefevere (1992, p. 24) sugere ao tradutor que reflita se a alusão ainda é atual e familiar ao leitor da cultura de chegada, no momento da tradução; se não for, uma das opções é pensar em uma analogia que substitua a alusão.

As alusões culturais requerem um grande conhecimento da cultura de partida, de acordo com Lefevere (1992, p.25), “uma familiaridade mais do que superficial com a cultura cuja língua fonte é tanto o repositório quanto a expressão”34

pois podem simplesmente passar despercebidas. Quando o tradutor não tem essa familiaridade, ela pode ser suprida com enciclopédias (pode-se acrescentar à sugestão de Lefevere o uso criterioso das ferramentas de pesquisa da internet), ou ainda, pode-se recorrer a “falantes nativos instruídos da língua”35

. Lefevere (1992) salienta que os tradutores compilam, aos poucos, a sua “enciclopédia privada de alusões culturais”36

, baseados em sua experiência com a leitura e imersão na cultura de partida. Se a alusão não for muito conhecida na cultura de chegada, ou se for

34 “more than superficial familiarity with the culture of which the source language is both the repository

and the expression” (LEFEVERE, 1992, p. 25)

35 “educated native speakers of the language” (LEFEVERE, 1992, p. 25) 36 “private encyclopedia of cultural allusions” (LEFEVERE, 1992, p. 25)

muito “obscura”, o tradutor pode lançar mão do uso de notas de rodapé ou procurar por alusões alternativas.

Quanto às alusões literárias, Lefevere (1992, p. 27) assinala que os escritores as utilizam para apresentar aos leitores as semelhanças e diferenças entre o que estão lendo e ao que é aludido. “O conflito entre a palavra na página e a alusão evocada é concebido para acentuar o efeito da obra”37

. Segundo Lefevere (1992, p. 29), a maioria dos tradutores não se referem diretamente ao autor ou texto a que se faz a alusão, nem sequer substituem por um mais conhecido dos leitores.