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2. A AUTORA VIRGINIA WOOLF E SUA OBRA

2.2 A autora Virginia Woolf e a estética de sua obra

2.2.1 A autora Virginia Woolf

A história de vida de Virginia Woolf é rica em fatos trágicos e questões psicológicas marcantes, o que torna tentador, para qualquer pesquisador, adentrar este universo psicológico, tanto para biografar quanto para analisar sua obra. Pretende-se neste momento, mostrar um pouco do universo de Woolf para apresentar sua história e como ela veio a se tornar escritora.

Adeline Virginia Stephen nasceu em 25 de janeiro de 1882, fruto do segundo casamento de Leslie Stephen e Julia Princep Stephen, ambos viúvos. Leslie Stephen era um editor da revista Cornhill Magazine e esteve envolvido no trabalho de compilar o Dictionary of national biography. Julia Stephen era “uma mulher bonita e dotada de sensibilidade artística” (STRATHERN, Paul, 2005, p. 14). A instabilidade neurótica do pai, devida ao excesso de trabalho, criava na casa um clima de tensão emocional.

Virginia Woolf tinha sete irmãos: Laura, filha do primeiro casamento de seu pai com Harriet Marian Thackeray, que passou grande parte da vida em instituições por apresentar sinais de debilidade mental; George, Stella e Gerald, que eram filhos

de Julia Stephen com o primeiro marido, Herbert Duckworth; e Vanessa, Thoby e Adrian, que, assim como Virginia, eram filhos de Leslie e Julia Stephen. A residência dos Woolf em Hyde Park Gate, estava sempre repleta de crianças e recebia contínuas visitas de tias, tios e primos (LEHMANN, 1989, p. 8).

Desde muito jovem, Virginia tinha interesse em ser escritora. Em 1891, Virginia e Thoby criam o Hyde Park Gate News, um jornal que eles publicaram semanalmente até 1895. Desde essa época, Virginia demonstrava sua preocupação com a crítica, pois esperava ansiosamente a reação de seus pais aos textos que escrevia para o jornal.

Virginia Woolf não frequentou a escola; em grande parte, sua instrução ficara sob responsabilidade de Leslie Stephen, seu pai. Havia uma ampla biblioteca em sua casa, e seu pai, a princípio a orientava sobre o que ela deveria ler. A partir da adolescência, ele permitiu o acesso livre de Virginia à biblioteca, por confiar no seu intelecto apurado – o que era de uma grande liberdade para uma adolescente da época vitoriana, e que beneficiou muito a sua formação como escritora. Sobre as aulas dadas por seu pai, Strathern (2005, p. 15) afirma:

As “aulas" que tinha com o pai consistiam em ser argutamente inquirida sobre os livros que lera, e estimulada a expressar a verdade sobre o que haviam significado para ela. Apesar disso, ela diria mais tarde que o pai causara uma “reviravolta em sua cabeça”, acrescentando: “Eu não seria tão inteligente, mas teria sido mais estável sem isso”. E ela era inteligente. Sozinha em seu quarto, ela logo foi além de Shakespeare e da tradução de grego antigo, fazendo vastas leituras de história, literatura e filosofia. Aos 15 anos, estava lendo Carlyle e tentando aprender alemão.

A relação delicada que tinha com o pai complicou-se muito com a morte da mãe, Júlia Stephen, em 1895. A família sofreu, sobretudo, porque Sir Leslie Stephen acabou por sobrecarregar as filhas, com muita desolação e comiseração. Virginia sofreu seu primeiro colapso nervoso por conta da morte da mãe e pela tensa situação do lar. Pouco mais de dois anos depois, a irmã Stella Duckworth, filha do primeiro casamento de Julia, que substituíra a mãe na organização da vida familiar após sua morte, faleceu alguns meses depois de ter voltado enferma de sua lua-de- mel, ocasionando mais sofrimento à família. Sir Leslie Stephen veio a falecer em 1904, e este fato desencadeou em Virginia um colapso ainda maior, conforme descreve Lehmann (1989, p. 14):

Como sempre aconteceria mais tarde, tudo começou lentamente, com dores de cabeça e ataques de desconcertante irritação; depois, vinham os pesadelos mais profundos, durante os quais ela passava por torturas maníacas de autoacusação e de sentimento de culpa quanto a seu pai. Três enfermeiras cuidaram dela e passaram a encarnar o mal em sua fantasia. Resistia freneticamente a todas as tentativas de alimentar-se; e, quando a levaram para o campo, tentou o suicídio, atirando-se de uma janela.

A influência que o pai exercera na mente de Virginia Woolf, e a complexidade da relação entre eles, a acompanharam a vida toda. Mas houve uma espécie de redenção ao extravasar as angústias familiares por meio da escrita da obra To the

lighthouse (1927), como se pode notar nesta declaração que Woolf (1989, p. 165 e

166) escreveu em seu diário, em 28 de novembro de 1928:

Aniversário de papai. Estaria fazendo 96, sim, hoje; & poderia ter chegado aos 96, como outros que conheço; mas graças que não. A vida dele teria acabado completamente com a minha. O que teria acontecido? Nada de escrever, nada de livros; – inconcebível. Eu costumava pensar nele & na mamãe todos os dias; mas escrever The Lighthouse foi pô-los no fundo da memória. E agora ele me vem à lembrança às vezes, mas de outro modo.

Depois da perda dos pais e da irmã que era tão próxima, Virginia e os irmãos Vanessa, Thoby e Adrian vão morar em uma casa em Bloomsbury. Thoby, que havia acabado de deixar Cambridge e começava sua carreira na advocacia, decidiu que a casa, todas as quintas-feiras à noite, receberia seus amigos de Cambridge para reuniões, das quais suas irmãs Vanessa e Virginia também participariam. Sobre a formação dos integrantes do grupo de Bloomsbury, Nathan (1989, p. 7) comenta o que segue:

Adrian e Thoby Stephen, recém-saídos de Cambridge, atraíram os amigos da Midnight Society, confraria universitária cujos membros portavam orgulhosamente o nome de Apóstolos. Gerações vizinhas se aproximavam e eram encontrados escritores, E. M. Forster, J. Lowes Dickinson, T. S. Eliot; pintores, Roger Fry, Duncan Grant; historiadores e economistas Lytton Strachey, J. Maynard Keynes, Leonard Woolf; críticos, Clive Bell, Desmond Mc Carthy.

A convivência com os amigos do grupo de Bloomsbury foi de grande influência no desenvolvimento de Virginia Woolf escritora. As críticas de Clive Bell, as opiniões de Lytton Strachey, eram sempre ouvidas com atenção e relevância por Woolf. Outro amigo, o pintor Roger Fry, foi um dos pioneiros na introdução da

pintura francesa pós-impressionista na Inglaterra, apresentando os problemas de estética que suscitava a arte moderna. Segundo Nathan (1989, p. 18 e 19), para Fry, o artista “não tinha de se preocupar com a criação de um objeto agradável, mas captar por trás das aparências uma realidade espiritual alimentada pela experiência, que ele chamou de visão”. Ainda conforme Nathan (1989, p. 19), as conversas de Fry com Virginia Woolf “sobre o papel do artista, a unidade das artes, a natureza da emoção estética”, a despertaram para as artes plásticas, que ela sentia ser próxima da literatura.

A liberdade experimentada pelos irmãos Stephen após sua mudança para outro endereço, fez nascer neles o desejo de viajar ao exterior. Partiram para a Grécia, em 1906, porém, Thoby contraiu febre tifoide e faleceu em novembro do mesmo ano. Vanessa decidiu casar-se com Clive Bell, e Virginia e o irmão Adrian foram viver em Fitzroy Square. Um ano depois, mudaram-se novamente, desta vez para uma casa de quatro andares em Brunswick Square. Dividiam a casa com Maynard Keynes, Duncan Grant e Leonard Woolf. Virginia casou-se com Leonard em 10 de agosto de 1912.

Depois de casada, ela e o marido Leonard Woolf, montaram uma editora, a Hogarth Press, e Virginia Woolf, enfim, sentiu-se livre para escrever sobre o que quisesse. A partir de então, inicia a sua fase mais madura e experimentalista que vai culminar em obras como Mrs. Dalloway, Ao farol, Orlando e As ondas.

Virginia Woolf suicidou-se em 28 de março de 1941. Sobre o triste episódio, Lehmann (1989, p. 131), que era um amigo próximo, afirma:

Dessa vez estava convencida de que não seria possível manter à distância as vozes aterradoras; e os elogios e o entusiasmo de Leonard, e os meus, de nada serviram. Levou avante o plano que há muito acalentava para uma tal crise: escreveu cartas de despedida para Leonard e Vanessa, encheu seus bolsos com pedras, saiu e afogou-se no rio Ouse. Seu corpo não foi encontrado senão três semanas depois.