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2 MARCO TEÓRICO METODOLÓGICO

3 FONTES ETNO-HISTÓRICAS, AMBIENTAÇÃO E PESQUISA DE CAMPO

3.2 AMBIENTAÇÃO E IMPLANTAÇÃO DO SÍTIO

A paisagem da Serra da Mantiqueira Meridional apresenta afloramentos rocho- sos entremeados por florestas alti- montanas, de Araucárias e campos de altitude.

Conforme a classificação es- tabelecida por ROSS (1985) o sítio localiza-se no domínio morfoestru- tural de cinturões móveis neoprote- rozóicos que compreendem extensas áreas representadas por planaltos, alinhamentos serranos e depressões interplanálticas elaborados em terre- nos dobrados e falhados, incluindo principalmente metamorfitos e granitóides associ- ados. Está situado na região geomorfológica da Serra da Mantiqueira em divisa entre unidades geomorfológicas de serra e mar de morros.

O modelado tectônico regional apresenta grande quantidade de falhamentos (MISSURA; CORRÊA, 2007). Uma destas falhas, a Falha de Camanducaia onde se localiza o sítio, corre no sentido NW – SE. Esta falha se constitui em uma passagem na Serra de Camanducaia/ Mantiqueira onde é atravessada pelo Rio Camanducaia. As caraterísticas geomorfológicas da colina do sítio se inserem na descrição geral da região a seguir (MISSURA; CORRÊA, 2007. p. 272):

Figura 7: Mapa de localização do sítio

Figura 8: A colina do sítio vista Sul para o Norte (foto: Delforge, 2013)

Os aluviões se distribuem ao longo da drenagem, em planícies aluviais e terraços. Os depósitos pré-atuais localizam-se em terraços, alçados de pou- cos metros sobre o talvegue dos rios, formados também por sedimentos in- consolidados, cuja composição é predominantemente arenosa, síltica e argilosa, comuns em depósitos orgânicos. Existem ainda outros tipos de co- berturas que se encontram associadas aos depósitos de vertentes, como os colúvios e os tálus. Os colúvios apresentam composição argilo-arenosa à argilosa, com expressão areal e espessura variáveis, com linhas de pedra no contato com o substrato rochoso. Já os depósitos de tálus caracterizam- se pela ocorrência superficial de matacões, blocos e seixos polimíticos, imersos em matriz argilo-arenosa ou areno-argilosa. Tais depósitos foram utilizados como marcadores morfoestratigráficos da área, sendo que nos de- pósitos coluviais da área encontram-se ainda perfis organo-minerais interca- lados.

O topo da colina do sítio situa-se a 1.000 m de altitude em relação ao nível do mar e apresenta uma inclinação suave em suas vertentes. O topo é relativamente plano em uma área de aproximadamente 150 x 50 m na margem esquerda do rio. O solo apresenta uma camada superficial argilo-arenosa orgânica e escura no topo e sob este um horizonte estéril argilo-arenoso vermelho exposto nas vertentes indican- do a erosão da camada superior. A colina do sítio vista a partir do rio forma uma ele- vação suave, seguindo em direção à Serra de Itapeva com afloramentos rochosos e matas de altitude, ligando-se à Serra da Mantiqueira. A colina separa dois vales e si- tua-se em um interflúvio, por um lado corre o Rio Camanducaia e por outro corre um córrego brejoso, sem nome na cartografia, que desce da vertente da Serra de Itape- va, braço da Serra da Mantiqueira.

A drenagem e o relevo da re- gião são influenciados pelas estru- turas rochosas formando um padrão dendrítico onde os rios cor- rem em direção oeste, rumo ao es- tado de São Paulo. O Rio Camanducaia pertence à bacia do Tietê / Piracicaba/ Paraná, região hidrográfica do Rio Paraná, atra- vessa a Serra da Mantiqueira em direção ao Estado de São Paulo atravessando o passo do caminho velho do sertão por onde os antigos indígenas e os bandeirantes subiram rumo ao Planalto Central.

Figura 9: A colina do sítio vista Norte Sul (foto: Delforge, 2013)

O Rio Camanducaia é afluen- te do Rio Jaguari que, conforme o registro arqueológico, banha territó- rios habitados principalmente por populações praticantes da tradição cerâmica Aratu-Sapucaí. Historica- mente é relatada a presença de tri- bos ligadas ao tronco linguístico Macro Jê em especial aqueles co- nhecidos como Puris e Coroado.

O Sr. Gilson Pereira, o idoso proprietário da terra, cultiva a área desde jovem. Esta roça se situa em um pequeno terreno, situado na parte plana posterior do topo chegando até próximo às erosões da vertente esquerda da colina. A colina oferece uma visão dominante do vale com alcance de quilômetros sobre os meandros do Rio Camanducaia que se formam no depósito aluvional plano do fundo do vale.

O local proporciona acesso fácil a ambientes diversificados como, mata de ga- leria, brejos, lagoas, campos de altitude e montanhas, além de áreas planas ou com pouca declividade para o cultivo. A água é abundante no entorno do sítio, os rios próximos não são navegáveis devido a seu tamanho, à profusão de matacões e que- das d'água.

O relevo montanhoso onde se localiza o sítio possui um regime eólico próprio peculiar de circulação da brisa vale – montanha, que pode se estender por mais de Figura 10: Trecho do Rio Jaguari (foto: Delforge, 2013)

100 km da serra. Este se constitui na alternância de ventos do vale para a montanha durante o dia e da montanha para o vale durante a noite, com pausas ao amanhecer e ao entardecer. “Na região esta circulação determina ventos do quadrante sul du- rante o dia e do quadrante norte durante a noite” (REBOITA, 2014, p. 65). As calma- rias são muito raras.

O mapa hipsométrico do local mostra a localização do sítio em um ponto de passagem pela Serra da Mantiqueira ou Serra de Itapeva. A colina onde se implanta domina visualmente Vale do Rio Camanducaia ao pé da Serra de Itapeva e da subi- da para o planalto de Campos do Jordão.

Este vale sempre foi utilizado como passagem, seu uso pode ser dividido em quatro momentos históricos: previamente à colonização, no contato, na colônia e na modernização. Durante a ocupação do território como via de penetração pelos ban- deirantes, na colônia como estrada real e atualmente se constitui no trajeto da BR 381.

A diversidade de compartimentos ambientais no entorno do sítio é grande, em- bora hajam restrições de deslocamento e até possíveis barreiras representadas pe- las montanhas e afloramentos rochosos, os vales são planos e largos.

A Araucaria angustifolia é endêmica na região. A araucária ocorre aqui na maior concentração do Sudeste na Serra da Mantiqueira, sua presença pode ter represen- tado importante papel na alimentação e também como fonte de combustível dos po-

Figura 12: Montagem de fotos, horizonte ao Sul visto do sítio (foto: A. Delforge, 2017)

vos que ali viveram, assim como é atualmente, a araucária está presente na região desde o quaternário.

O pinhão, semente da Arau- cária é um recurso alimentar de co- leta nos meses de outono e pode ser armazenado por algum tempo. O pinhão é rico em carboidratos (33,24% cozido) e sais minerais (K, P, Mg e Ca) e contém 3,62% de proteína (EMBRAPA, 2017). A se- mente fornece cerca de 160 calori- as por 100 g. Segundo a EMBRAPA, com altos teores de proteínas, fibras alimentares e amido. O pinhão, protegido da desidratação e mantido em local frio, pôde ser conservado até 210 dias ou 7 meses, debulhado ou nas pinhas (FRECCIA

et alli, 2013). Este recurso se revela estratégico uma vez que no verão se colhem as

frutas, o outono e o inverno são meses de baixa ou nenhuma produtividade de ali- mentos vegetais cultivados ou coletados. Os cultivares vão produzir na primavera. Trata se de um recurso importante em uma região onde o inverno atinge temperatu- ras muito baixas (MACHADO – FILHO et alli. 1983. apud MEIRELES; KINOSHITA; SHEPHERD, 2014, p.833)15.

O clima, no sistema de Köeppen, é do tipo Cwb (subtropical de altitude), com verões amenos e chuvosos e invernos frios e mais secos com ocorrên- cia de geadas (MARTINS, 2000)16. A precipitação média anual, entre os

anos de 1971 e 2001, foi de 1.740 mm e variou entre 1.380 mm a 2.360 mm. A temperatura máxima média, entre julho de 2001 e julho de 2002, vari- ou nos meses quentes e úmidos (outubro a março) entre 26,3 e 29,7ºC e, enquanto a temperatura mínima média variou nos meses frios e secos (abril a setembro) de 3 a 9,9º C. Durante esse período foram observados oito dias com ocorrência de geadas.

15 MACHADO-FILHO, L.; RIBEIRO, M. W.; GONZALES, S. R.; SCHENINI, C. A.; SANTOS-NETO, A.; PALMEIRA, R.C.B.; PIRES, J.L.; TEIXEIRA, W. e CASTRO, H.E.F. 1983. In: Projeto RADAMBRASIL. Geologia. Folhas SF:23/24 Rio de Janeiro/Vitória. Vol. 32. Rio de Janeiro-RJ. p. 56-66.

16 MARTINS, C.S. 2000. Caracterização física e fitogeográfica de Minas Gerais. In: Mendonça, M.P. & Lins, LV. (orgs.). Lista vermelha das espécies ameaçadas de extinção da flora de Minas Gerais. Fundação Biodiversitas, Belo Horizonte. Pp. 35-43.

A grande variação de altitudes do relevo na região favorece o desenvolvimen- to isolado de espécies vegetais endêmicas, exclusivas a uma ou poucas formações geográficas na região (MEIRELES; KINOSHITA; SHEPHERD, 2014, p. 833).

Foram reconhecidas dentre as formações florestais a Floresta Ombrófila Densa alto-montana e a Floresta Ombrófila Mista alto-montana; e dentre as formações campestres os Afloramentos Rochosos e Campos de Altitude [...] Os Afloramentos Rochosos corresponderam a áreas de rochas granitoides expostas, onde as plantas se estabelecem em ilhas de vegetação ou nas frestas das rochas. Essas ilhas apresentam uma matriz formada por briófi- tas, líquens e monocotiledôneas, sobre as quais se estabelecem outras er- vas e pequenos arbustos.

A ictiofauna da região apresenta espécies endêmicas, são conhecidas na área da Serra da Mantiqueira 37 espécies de peixes, sendo as mais frequentes o Chara-

cidium lauroi; Characidium alipioi; Trichomycterus itatiayae; Neoplecostomus micro- pis e Pareiorhina rudolphi, (BRAGA; ANDRADE 2005) conhecidos popularmente

como lambaris, cascudos e bagres. Os peixes evoluíram se adaptando às condições dos rios de encosta da região, estreitos e pouco profundos, e são de pequeno porte além de existirem poucas espécies, logo, não poderiam ter constituído parte impor- tante da alimentação dos povos antigos que ali viveram.

A avifauna por outro lado é rica em espécies, foram registradas 206 espéci- es de aves, das quais 57 (27,7%) são endêmicas da Mata Atlântica. A varie- dade e quantidade de famílias e espécies de aves presentes na área pode ser vista em alguns exemplos:

Cariama cristata (Siriema); Aramides saracura (Saracura do mato); Amazonet- ta brasiliensis (Marreco pé vermelho); Crypturellus obsoletus (Inhambuguaçu), Pene- lope obscura (Jacuguaçu), Odontophorus capueira (Uru), Bubulcus ibis (Garça

vaqueira, espécie invasora); Cathartes aura (Urubu de cabeça vermelha) Accipiter

striatus (gavião pequeno + 6 espécies) Caracara plancus (Carcará + 5 falconídeos); Columbina talpacoti (Rolinha roxa) e outros columbídeos; Pionopsitta pileata (Cuiú-

Cuíú) Pionus maximiliani (Maritaca Verde) e outros psitacideos; Athene cunicularia (Coruja Buraqueira); Nyctidromus albicollis (Curiango); Eupetomena macroura (Beija flôr tesoura); Megaceryle torquata (Martim pescador); Ramphastos toco (Tucano- açú); Colaptes melanochloros (Pica-pau-verde). Entre os pássaros pequenos encon- tram-se: Dysithamnus xanthopterus (Choquinha asa de ferrugem), Chamaeza rufi-

cauda (Tocava-de-rabo-vermelho ou capoeira-cachorra), Leptasthenura setaria

(Grimpeiro ou Rabo-de-espinho-da-araucária), Heliobletus contaminatus (Trepadorzi- nho), Hemitriccus obsoletus (Catraca), Phylloscartes difficilis (Estalinho), Piprites pi-

leata (Caneleirinho de chapéu preto), Poospiza thoracica (Peito pinhão), Cacicus chrysopterus (Tecelão ou Japim); Scytalopus notoriusm e S. speluncae (Tapaculo), Lepidocolaptes squamatus (Arapaçu escamado); L. falcinellus (Arapaçu escamado

do sul), Basileuterus culicivorus (Pula-pula);. B. hypoleucus (Pula-pula de barriga branca). (VASCONCELOS; D’ANGELO NETO, 2009) o Pitangus sulfuratus (bem-te- vi), Furnarius rufus (joão-de-barro), Muscivora tyrannusa (tesoura), As aves da regi- ão apresentam um potencial maior para alimentação com a presença de jacús e gali- nhas do mato.

Entre as serpentes encontram-se atualmente na região principalmente: Bo-

throps neuwiedi. (Jararaca cruzeiro); Crotalus durissus (Cascavel-de-quatro-ventas); Bothrops. Jararaca (Jararaca-da-mata); Oxyrhopus rhombifer (Falsa coral) (CARDO-

SO, 2011).

Na região da Mantiqueira há uma grande variedade de mamíferos de pequeno a grande porte que poderiam ter servido como fonte de proteínas através da caça:

Didelphis aurita (Gambá-de-orelha-preta); Marmosa sp. (Cuíca); Micoureus pa- raguayanus (Catita); Philander frenatus (Guaraxaim), Akodon sp (Rato-do-chão); Cerradomys subflavus (Rato-do-mato); Oligoryzomys sp. (Rato-da-árvore); Thap- tomys nigrita (Rato-do-chão) (DELGADO; NOBRE, 2015). Cuniculus paca (Paca), Leopardus pardalis (Jaguatirica) Leopardus wiedii (Gato-maracajá); Puma concolor

(Onça-parda); Eira barbara (Irara), Conepatus semistriatus (Jaratataca); Nasua na-

sua (Quati); Procyon cancrivorus (Mão pelada), Pecari tajacu (Cateto) (NUNES et alli. 2012. p. 209). Hydrochoeris hydrochaeris (Capivara) Callicebus nigrifons (Sauá);

cervídeos do gênero Mazama (Veado catingueiro, Pardo, Bororó, Mateiro e Roxo),

Sylvilagus brasiliensis (Tapiti). (MARQUES NETO, 2015). Callithrix penicillata (Mico-

estrela ou Sagui): Sapajus nigritus (Macaco-Prego): Callithrix aurita (Sagui-da-serra- escuro): Alouatta guariba clamitans (Bugio-Ruivo), Brachyteles arachnoides (Muriqui ou Mono-Carvoeiro) e B. Hypoxanthus (Muriqui-do-Norte) (CARVALHO; XAVIER; ESBÉRARD, 2015).