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O Americanismo e fordismo de Gramsci no declínio do fordismo

2 EDUCAÇÃO PROFISSIONAL, INDUSTRIALIZAÇÃO E AMERICANISMO

4.2 O Americanismo e fordismo de Gramsci

4.2.1 O Americanismo e fordismo de Gramsci no declínio do fordismo

Gramsci, ao colocar suas observações sobre o Americanismo e fordismo nos cadernos, partia de um contexto sócio-histórico que lhe permitia enxergar a dimensão do projeto de Henry Ford de produção em massa como a expressão de um novo modelo de vida, consumo, produção e trabalho, que para existir necessitaria de um aparato cultural que, a partir de mecanismos ideológicos persuasivos-coercitivos e de ampla divulgação, consolidariam a lógica de que depende a produção em massa. Mas era dentro do próprio sistema fordista que Gramsci enxergava também as possibilidades de resistências por parte do operariado e mesmo por parte de algumas classes burguesas.

A esse respeito o cenário que se estabelecera do início do século XX até os seus meados trazem aspectos importantes para compreensão do declínio do modelo fordista.

A economia de capitalismo da Era dos Impérios48 penetrou e transformou

praticamente todas as partes do globo, mesmo tendo, após a Revolução de Outubro, parado nas fronteiras da URSS. Esse era o motivo pelo qual a Grande Depressão de 1929-33 iria ser um marco milenar na história do anti-imperialismo e dos movimentos de libertação do Terceiro Mundo. Fossem quais fossem a economia, a riqueza, as culturas e sistemas políticos dos países antes de chegar ao alcance do povo do Atlântico Norte, foram todos sugados para dentro do mercado mundial, quando não descartados por homens de negócios e governos estrangeiros como economicamente desinteressantes [...]. Seu valor para o mercado mundial era essencialmente, como fornecedores de produtos primários – matérias-primas para a indústria, energia e produtos agrícolas – e como uma saída para o investimento do capital nortista, sobretudo em empréstimos a governos e para a infraestrutura de transportes, comunicações e cidades, sem o que os países dos recursos dependentes não podiam ser eficazmente explorados (HOBSBAWN, 1995, p. 203).

Diante desta conjuntura, o fordismo se disseminava de formas desiguais ao redor do globo, a depender do modo com que cada nação gerenciava o modo de organização do trabalho, as políticas econômicas e de bem-estar social (HARVEY, 2005, p. 132) e daí por diante. Essas singularidades que levavam a diferentes formas de conceber o fordismo, a sua negação também encontrava espaço, mesmo no apogeu da era das linhas de montagem:

Produziram sérias tensões e fortes movimentos sociais por parte do excluídos – movimentos que giravam em torno da maneira pela qual a raça, o gênero e a origem ética costumavam determinar quem tinha ou não acesso ao emprego privilegiado. [...] Sem acesso ao trabalho privilegiado da produção em massa, amplos segmentos da força de trabalho também não tinham acesso às tão louvadas alegrias do consumo em massa. Tratava-se de uma fórmula segura para produzir insatisfação. O movimento dos direitos civis nos Estados Unidos se tornou uma raiva revolucionária que abalou as grandes cidades. O surgimento de mulheres como assalariadas mal-remuneradas

48 O autor se refere à outra obra de sua autoria: A era dos impérios. HOBSBAWN, Eric J. A Era dos Impérios

foi acompanhado por um movimento feminista igualmente vigoroso. E o choque da descoberta de uma terrível pobreza em meio a crescente afluência [...] gerou fortes contramovimentos de descontentamento com os supostos benefícios do fordismo (HARVEY, 2005, p. 132).

Era a crise que enfrentava o advento da sociedade projetada a partir um regime fordista de produção e acumulação. O Estado também precisaria ter papel forte para não entrar em colapso em face das pressões nas mais diversas esferas, pois a ele caberia disponibilizar a população os benefícios do fordismo (HARVEY, 2005, p. 133).

A partir da década de 1970, com o cenário geopolítico globalizado, o capitalismo de modelo fordista deixava de ser hegemônico em vista das novas configurações. Embora não caiba aqui se deter nessas diferenças, o fato é que já não havia mais lugar para criar a sociedade que Ford sonhara, pelo menos não enquanto modelo único, enquanto força inelutável do desenvolvimento histórico:

No espaço social criado por todas essas oscilações e incertezas, uma série de novas experiências nos domínios da organização industrial e da vida social e política começou a tomar forma. Essas experiências podem representar os primeiros ímpetos da passagem para um regime de acumulação inteiramente novo, associado com um sistema de regulamentação política e social bem distinta (HARVEY, 2005, p. 137).

Por conseguinte, entende-se que o processo analisado por Gramsci teve resultados inegáveis em termos de estruturação da sociedade e na tentativa de forjar um novo tipo de individuo, dos quais se destacam alguns aspectos:

[...] a racionalização do trabalho e a organização de uma economia monopolista, a montagem de uma vasta rede de aparelhos hegemônicos privados, semipúblicos e públicos; a difusão e a inculcação de ideologias puritanas; e a constituição de uma nova classe média integrada pelos quadros técnicos e gestionários da produção racional (BRAGA, 2008, p. 24).

Mas ao tomar tal processo como uma Revolução Passiva, que a partir do Americanismo estaria atrelado à força do grande capital monopolista, as resistências surgem dentro de seu próprio enredo na tentativa de criar o modelo racionalizado de economia e de sociedade.

O ritmo de difusão da crise não é separável da desigualdade do desenvolvimento dos processos produtivos. Partindo do reordenamento das relações entre Estado e “sociedade civil” no período pós-1929, Gramsci indica que, tal como a hegemonia, também a revolução passiva nasce da fábrica, isto é, no “coração” do sistema de formas de organização do trabalho, assim como do conjunto de relações ético- político-econômicas – formas da política nas suas relações com as forças produtivas – próprias ao universo cultural (BRAGA, 2008, p. 23).

fordista, ao passo que se confirmou uma inflexão no modo de organizar a produção e o trabalho nos EUA e nos demais países que passavam a se relacionar com o grande capital, ainda assim permanece no universo industrial um aspecto que está na própria essência do fordismo: a existência de indústrias de produção em massa (linhas de montagem) voltadas para o consumo também em massa.

4.3 O CORPUS DOCUMENTAL ESCOLHIDO PARA A PESQUISA E OS