• Nenhum resultado encontrado

A análise histológica foi feita pela pesquisadora principal e por um patologista em microscópio de dupla observação no departamento de Patologia.

Para quantificação do colágeno utilizou-se o programa ImageTool 3.00, tendo sido capturadas imagens de cada amostra corada por picrosírius, utilizando microscópio Olympus BX51, sob o aumento de 40x e com lentes polarizadoras. A partir da calibração do programa para o referido microscópio, foi possível a aferição da área total de captura da imagem. Posteriormente, pela análise individual de cada amostra, foi aferida a área do tecido na imagem composta por colágeno (evidenciado pela polarização). A partir da relação entre os valores obtidos de área total da imagem capturada e área composta por colágeno na referida imagem pode-se obter a porcentagem de colágeno nas diferentes amostras (Tabelas 3 e 4).

3.7 Análise estatística

Para comparação entre os grupos A, B e C foi utilizado o teste ANOVA. Quando houve diferença estatisticamente significativa o teste de Tukey de

comparações múltiplas foi aplicado. Para comparação entre os grupos C e D, foi empregado o teste-t para amostras não pareadas.

4.1 Resultados clínicos

Onze pacientes com idade média de 23,2 ± 2,8, variando de 18 a 26 anos, foram submetidas à reconstrução vaginal utilizando a membrana de celulose oxidada. O cariótipo de todas as pacientes foi 46 XX, excluindo outros diagnósticos diferenciais como a feminilização testicular.

Das onze mulheres que foram incluídas neste estudo, oito tiveram diagnóstico de síndrome de MRKH e três apresentavam agenesia cérvico- vaginal (a ressonância magnética pélvica revelou que os corpos uterinos e cavidades endometriais eram normais). Todas as pacientes tinham ovários normais. Oito pacientes tinham relacionamento estável (Pacientes 1 a 8, Tabela 3), sendo que as outras eram meninas sem experiência sexual. Anomalias do trato urinário foram encontradas em três casos, incluindo dois casos de agenesia renal unilateral e um caso de rim único pélvico. Múltiplas malformações ósseas foram observadas em uma paciente.

Em todas as mulheres foi realizada neovaginoplastia a McIndoe modificada com uso de celulose oxidada no revestimento do conformador vaginal. Os procedimentos transcorreram sem complicações intra-operatórias e houve apenas mínima perda de sangue em todos os casos. O tempo operatório médio foi de 110 minutos (variando de 45 a 190 minutos), considerando-se que três pacientes tinham útero funcional (CVA) sendo a laparotomia necessária para criar um canal entre o útero e a vagina. O tempo médio de internação foi de quatro dias (intervalo 3 a 7) após a operação. O tempo médio de acompanhamento de todo o grupo foi de 14 meses (variando de 6 a 24 meses).

Tabela 3 - Perfil das pacientes submetidas à neovaginoplastia Pacientes Diagnóstico Idade na cirurgia (anos) Vaginometria 6 m após cirurgia (cm) FSFI 6 m após a cirurgia 1 MRKH 26 10 34 2 MRKH 24 9 31 3 MRKH 24 11 30 4 MRKH 25 12 32 5 MRKH 26 10 36 6 MRKH 26 9 30 7 MRKH 24 7 32 8 MRKH 22 9 NA 9 CVA 20 2 NA 10 CVA 20 2 NA 11 CVA 18 NA NA

MRKH=Síndrome de Mayer-Rokitansky- Kuster-Hauser CVA= Agenesia Cervico-Vaginal

NA= não avaliado.

4.1.1 Síndrome de Mayer-Rokitansky-Kuster-Hauser

No pós-operatório não houve necessidade do emprego de opióides em nenhum caso, apesar do desconforto pelo repouso absoluto em decúbito horizontal. A secreção pós-operatória manteve-se em pequena quantidade, de aspecto sero-sanguíneo na maioria dos casos. Em duas pacientes houve saída de secreção hemática moderada pela vagina, que foi controlada clinicamente. Não houve casos de infecção.

Exame vaginal foi realizado mensalmente durante os primeiros seis meses. No primeiro mês após a cirurgia as paredes vaginais apresentavam-se, ao exame macroscópico, cobertas por um revestimento liso e friável intercalado por áreas de tecido de granulação. Em nenhuma das pacientes observou-se reação inflamatória grave ou necrose. O desenvolvimento progressivo de um tecido vaginal normal e saudável foi detectado a partir de dois meses. Aos seis

meses de pós-operatório, toda a cavidade vaginal estava coberta por um epitélio muito semelhante ao da vagina normal, entretanto o tecido não possuía as pregas características de uma vagina normal (Figura 7). Observou-se tecido de granulação persistente no ápice da neovagina em três pacientes com MRKHS, o qual foi atribuído ao trauma da porção distal do molde e desapareceu espontaneamente após redução do uso da prótese.

Os resultados anatômicos e funcionais foram avaliados seis meses após a cirurgia. O sucesso foi alcançado em 100% das pacientes (n = 8). O comprimento médio das neovaginas foi de 9,6 ± 2,1 cm, permitindo a fácil introdução de dois dedos em todos os casos. No seguimento pós-operatório, uma paciente apresentou estenose distal sete meses após a cirurgia, que foi tratada efetivamente com dilatação perineal progressiva. Duas pacientes apresentaram vaginite sintomática e foram tratadas com antibiótico tópico. Não houve outros problemas relatados em termos de uso do molde vaginal e nenhuma delas queixou-se de sensação de secura vaginal. O questionário FSFI, validado na língua portuguesa, foi utilizado para a avaliação da função sexual. Das oito pacientes com MRKHS, sete iniciaram atividade sexual vaginal logo após a liberação médica e na avaliação de seis meses de pós-operatório foi aplicado o FSFI. A pontuação total FSFI mostrou resultados muito bons em todas elas, a média da pontuação total FSFI foi 32,3 ± 2,1. Todas referiam libido e orgasmo presentes, sensação de penetração completa e lubrificação vaginal espontânea durante o coito. Valores detalhados da vaginometria e as pontuações do FSFI das pacientes com MRKHS estão apresentadas na tabela 3 (Pacientes 1 a 8).

Figura 7 (a) e (b) – Aspecto da neovagina com celulose oxidada 6 meses após a cirurgia.

4.1.2 Agenesia Cervico-vaginal

A evolução após a cirurgia dos dois primeiros casos de CVA (Pacientes 9 e 10) foi semelhante. As pacientes permaneceram internadas por sete dias e foram acompanhadas com hemograma seriado e controle clínico de temperatura e freqüência cardíaca. A secreção vaginal foi sero-sanguinolenta e sem particularidades. No primeiro exame físico, uma neocervice sem fórnix vaginal era visível. No entanto, a comunicação uterovaginal logo fechou e, depois de um mês, a amenorréia e dismenorréia cíclica reapareceram. Além disso, as pacientes não usaram rotineiramente o dilatador e a vagina se tornou estenótica dois meses após a cirurgia. Uma das pacientes não tinha desejo de gravidez e decidiu não se submeter à outra cirurgia. Para bloquear a função ovariana foi introduzido contraceptivo oral contínuo. No outro caso, apesar de bem orientada quanto às possibilidades de tratamento a paciente ficou decepcionada com o método e não apresentou desejo de persistir com o tratamento.

A última paciente do estudo (Paciente 11) morreu oito dias após o procedimento cirúrgico. O pós-operatório transcorreu sem anormalidades até o

sétimo dia, quando ela fez uma parada cardíaca súbita na enfermaria. Foi reanimada e transferida para a Unidade de Terapia Intensiva da Cardiologia do Hospital São Paulo. Após sete paradas cardíacas sucessivas ela faleceu. Os exames realizados como hemograma, cultura da secreção vaginal, hemocultura, urocultura e ecografia abdominal não mostraram sinais de infecção e a hipótese diagnóstica principal foi tromboembolia pulmonar. No entanto, a hipótese de sepse fulminante por germe atípico não pode ser descartada.

4.2 Análise histológica

Análise histológica foi realizada em todas as pacientes com síndrome MRKH, uma vez que os casos de Agenesia Cervico-vaginal evoluíram com estenose precoce não sendo possível realizar biópsias seriadas.

As biópsias provenientes de sítio cirúrgico (Grupo A), prévias ao procedimento, eram compostas por tecido conjuntivo fibromuscular maduro, sem peculiaridades. Em algumas amostras, foi representado tecido adiposo característico em permeio (Figura 8).

Figura 8 - Cortes histológicos das biópsias obtidas do sítio cirúrgico, prévias ao

procedimento, exibindo tecido fibroconjuntivo maduro (a), por vezes permeado por

Os achados histológicos das amostras precoces (1 a 5 meses), que constituem o Grupo B, evidenciaram a proliferação de tecido fibroconjuntivo ricamente vascularizado e com numerosas células inflamatórias em permeio, caracterizando tecido de granulação (Figura 9). Ainda, em grande parte dos casos (87%), a presença de células gigantes multinucleadas de tipo corpo estranho (provável resquício da celulose oxidada) pode ser observada até quatro meses de pós-operatório (Figura 10).

Figura 9 - Corte histológico exibindo tecido conjuntivo frouxo, ricamente

vascularizado, com numerosas células inflamatórias em permeio (H&E, 100x)

Figura 10 - Corte histológico exibindo em detalhe a exuberante reação giganto-celular

Nas amostras mais tardias (> 6 meses), que formam o grupo C, o tecido biopsiado exibiu epitelização, caracterizada pela presença de epitélio malpighiano maduro recobrindo um tecido estromal característico (Figura 11). Em grande parte das amostras, o epitélio exibiu camada granular superficialmente, caracterizando metaplasia epidermóide (Figura 12), com diferentes graus de queratinização e com deposição de lamelas de queratina em sua superfície (Figura 13). A espessura do epitélio foi medida com uma régua micrométrica (régua de Breslow), tendo sido considerada para a aferição a região de maior espessura do epitélio. A espessura mínima do epitélio após seis meses de cirurgia foi de 0,20mm e a máxima de 0,40mm (média de 0,30mm). A espessura média do epitélio vaginal do grupo controle também foi medida, tendo em média 0,35mm (Grupo D).

Figura 11 - Corte histológico de biópsia tardia, com epitélio malpighiano maduro e

Figura 12 - Corte histológico de biópsia tardia, com epitélio malpighiano maduro

exibindo no interior do citoplasma das células superficiais grânulos de queratina (H&E, 400x)

Figura 13 - Corte histológico de biópsia tardia, com epitélio malpighiano maduro

queratinizado, com lamelas de queratina em sua superfície (H&E, 100x)

Figura 14 - Lâmina corada pelo picrosirius sob luz polarizada mostrando as fibras de

Figura 15 - Foto ilustrativa de imagem capturada e trabalhada pelo programa Image

Tool 3.0, com as fibras colágenas selecionadas para quantificação.

Uma quantidade significativamente maior de colágeno total foi encontrada no grupo C comparado ao grupo B e no grupo C comparado ao grupo A (Tabela 4). Não houve diferenças na quantidade de colágeno entre os grupos A e B.

Também não houve diferença significativa na quantidade de colágeno entre as biópsias tardias da neovagina (Grupo C) e das vaginas normais (Grupo D). Os números são apresentados na tabela 5.

Tabela 4 - Porcentagem total de colágeno na neovagina das pacientes

dos grupos A, B e C.

Paciente Grupo A Grupo B Grupo C

1 23,54 48,25 77,57 2 16,56 33,42 39,99 3 28,12 37,13 58,6 4 6,01 37,01 52,52 5 36,21 24,6 64,52 6 34,58 26,4 40,31 7 33,46 16,14 41,23 8 27,88 20,3 32,26 9 - - - 10 - - - 11 - - - Média 25,80 30,41 50,88 DP 10,25 10,5 15,26 Teste ANOVA P = 0,001*

Teste de comparações múltiplas Pares P Grupo A, Grupo B > 0,05 Grupo A, Grupo C < 0,01 Grupo B, Grupo C < 0,01 * = significante

Gráfico 1 - Porcentagem total de colágeno na neovagina das pacientes dos grupos A,

B e C. A B C 0 25 50 75 100 A B C % co ll ag en C O L À G E N O %

Tabela 5 - Porcentagem total de colágeno na neovagina das pacientes do

grupo C e nas vaginas do grupo controle D.

Paciente Grupo C Controle Grupo D

1 77,57 A 43,51 2 39,99 B 42,03 3 58,6 C 30,6 4 52,52 D 42,32 5 64,52 E 67,72 6 40,31 F 42,09 7 41,23 G 43,76 8 32,26 H 43,42 9 - I 47,33 10 - J 42,13 11 - Média 50,88 44,49 DP 15,2 9,2 Teste-t P = 0,287

Gráfico 2 - Porcentagem total de colágeno na neovagina das pacientes do grupo C e

nas vaginas do grupo controle D.

C D 0 25 50 75 100 C D % co ll ag en C O L À G E N O %

As diversas modalidades de tratamento da agenesia vaginal apontam para o fato de que nenhuma delas satisfaz todas as metas de segurança, simplicidade, eficácia e aceitação (Roberts et al, 2001).

Devido à baixa incidência de agenesia vaginal na população, ensaios clínicos randomizados comparando as diversas terapêuticas não estão disponíveis. Os resultados das diversas técnicas de neovaginoplastia estão descritos na literatura por meio de taxas de sucesso anatômico e funcional avaliadas por variáveis não padronizadas. As maiores diferenças entre as técnicas cirúrgicas são o acesso (laparotomia, laparoscopia ou via vaginal) e o tipo de tecido utilizado para revestimento da cavidade da neovagina (membrana amniótica, peritônio, retalho de pele, intestino, tecidos sintéticos e outros) (Noguchi et al, 2004).

Entre os métodos mais populares de tratamento cita-se a dilatação passiva, e os procedimentos de McIndoe e a vaginoplastia com segmentos intestinais (Thomas et al, 2007).

O método de dilatação progressiva de Frank deveria ser sempre considerado como primeira opção já que está associado à baixa morbidade, no entanto esta técnica não funciona bem quando a vagina é representada inicialmente apenas por uma depressão muito superficial ou não há comprometimento da paciente com o tratamento (Hensle et al, 1998). Se a opção terapêutica é a cirúrgica, a tendência geral da literatura é cada vez mais favorecer os procedimentos menos invasivos.

A vaginoplastia pela técnica de Abbe-McIndoe é a alternativa cirúrgica mais comum neste sentido, pois não exige laparotomia, ao contrário da vaginoplastia com segmento intestinal, procedimento cirúrgico de maior porte e

associado a maiores complicações (Kim et al, 2003). Vários materiais podem ser utilizados para revestir a cavidade vaginal recém-criada. O método convencional de revestimento com enxerto de pele necessita de uma equipe de cirurgiões plásticos para a preparação do enxerto de pele, bem como tempo cirúrgico e de internação maiores (Alessandrescu et al, 1996). O resultado estético é um dos problemas mais importantes. Uma discromia visível sempre pode ser observada na margem introital da neovagina e o local doador do enxerto freqüentemente mostra uma cicatriz grande e visível nestas pacientes jovens (Cali et al, 1968)

O uso de Surgicel para revestimento da neovagina foi descrito inicialmente por Sharma como um procedimento vantajoso evitando morbidade de enxertos de pele e também o risco de transmissão da infecção viral do âmnio (Sharma et al, 2007). O nosso estudo também avaliou os resultados da vaginoplastia com Surgicel entretanto, diferentemente de Sharma na nossa série de casos algumas pacientes tinham útero funcionante e precisaram de uma cirurgia não apenas para estabelecer a função sexual, mas também para comunicar o corpo do útero à vagina.

O tratamento cirúrgico da agenesia cervical congênita continua sendo um desafio, principalmente quando associada com a agenesia vaginal. As primeiras tentativas do processo de canalização apresentaram pequenas taxas de sucesso (Maciulla et al, 1978). A histerectomia foi defendida nesses casos por causa das complicações freqüentes pós-operatórias da canalização uterovaginal, incluindo peritonite fatal, obstrução recorrente da comunicação utero-vaginal e persistência da infertilidade (Rotter CW, 1958; Buttram VC, 1983; Fujimoto et al, 1997). Nos últimos anos, a cirurgia conservadora passou

a ser recomendada mais freqüentemente para esses casos. Algumas séries mostrando melhora dos resultados da comunicação uterovaginal e do desempenho reprodutivo têm sido relatadas (Chakravarty et al, 2000; Deffarges et al, 2001). Novas técnicas laparoscópicas de comunicação foram inicialmente descritas com sucesso, no entanto o resultado em longo prazo e os desempenhos reprodutivos ainda não foram avaliados (Fedele et al, 2008).

A neovaginoplastia com Surgicel e o processo de canalização foram realizados simultaneamente em três pacientes com agenesia cervico-vaginal. Os dois primeiros casos evoluíram com estenose vaginal precoce. Houve uma complicação clínica sete dias após a cirurgia e a terceira paciente faleceu. A partir de nossa experiência e revisão da literatura algumas observações podem ser feitas com respeito ao tratamento de agenesia cervical congênita. Quando um processo combinado de vaginoplastia e canalização é necessário, um intervalo de tempo decorrido entre as duas cirurgias parece ser mais seguro e associado a melhores taxas de sucesso (Buymann et al, 2002; Acién et al, 2007). Apesar dos nossos resultados, acreditamos que a canalização deva ser tentada para fornecer uma oportunidade de fertilidade a essas pacientes. No entanto, a probabilidade de gravidez como resultado de canalização permanece baixa, com poucos casos descritos e, na maioria dos casos, múltiplos procedimentos de recanalização deverão ser necessários.

Por outro lado, se considerarmos apenas as pacientes com MRKHS submetidas à vaginoplastia com a celulose oxidada nosso estudo demonstrou 100% de sucesso anatômico e funcional. Comparado com os resultados de estudos recentes do procedimento clássico de McIndoe (enxerto de pele), técnica laparoscópica de Vecchietti, vaginoplastia com âmnio, peritônio pélvico

e segmento intestinal, nosso procedimento conduziu a resultados semelhantes, mas sem cicatrizes, qualquer instrumentação cirúrgica peculiar, problemas de logística (procedimentos de preparação), laparoscopia ou laparotomia, respectivamente (Klingele et al, 2003; Fedele et al, 2008; Fotopolou et al, 2010; Fedele et al, 2010; Karateke et al, 2010). Além de poder ser realizado por uma equipe estritamente ginecológica e o tempo cirúrgico ser reduzido.

Observamos também a transformação do tecido conjuntivo frouxo do canal dissecado entre a bexiga e o reto em um epitélio malpighiano maduro seis meses após a reconstrução vaginal. A espessura do epitélio foi avaliada e quando comparada ao tecido vaginal normal foi considerada semelhante. Em muitos casos houve diferentes graus de queratinização do epitélio provavelmente pelo uso contínuo do molde nos primeiros meses após a cirurgia, uma vez que essa metaplasia epidermóide é freqüentemente observada em mucosas expostas à agressão física constante. Adicionalmente, percebemos que a celulose oxidada e a reação de corpo estranho não foi mais vista no tecido quatro meses após a cirurgia.

Conforme sugerido por Jackson et al (1994) acreditamos que a celulose oxidada atua unicamente como uma camada protetora sobre a superfície da neovagina permitindo que o tecido de granulação sofra epitelização. Até o momento não se explica como ocorre esse processo de metaplasia para formação de um tecido vaginal típico. A principal hipótese é de que as células no espaço dissecado entre o reto e a bexiga tem um potencial pluripotente de diferenciação tecidual. Estudos realizados com o método de neovaginoplastia à McIndoe sem enxerto corroboram para essa conclusão (Wharton LR, 1938; Marzieh et al, 2011). O túnel vaginal é dissecado e recoberto por um

conformador revestido apenas com um condom. Apesar de esta técnica ser associada a sangramento vaginal proveniente de tecido de granulação persistente, em boa parte dos casos tecido vaginal típico foi evidenciado nove meses após o procedimento.

Por ser o estrogênio o hormônio responsável pela proliferação e diferenciação do epitélio vaginal, em estudo recente em nosso serviço, fez-se avaliação seriada dos receptores de estrogênio no tecido vaginal em desenvolvimento na neovaginoplastia com celulose oxidada regenerada (Interceed). Entretanto a ação estrogênica parece não estar diretamente relacionada ao processo de metaplasia tecidual já que no inicio do processo de epitelização vaginal o receptor de estrogênio não foi detectado. A expressão do receptor de estrogênio estava presente apenas seis meses após a cirurgia, quando a neovagina já havia adquirido as características de um tecido vaginal adulto normal (Kajikawa et al, 2011).

Com o objetivo de aumentar a informação estrutural do epitélio recém- formado, utilizamos a combinação do picrosirius com a luz polarizada linear para detecção e quantificação do colágeno no tecido das neovaginas. As fibras colágenas são o principal constituinte do tecido conjuntivo, desempenham um papel vital na manutenção da integridade estrutural e funcional do tecido (Rich et al, 2005). As fibras de colágeno afetam significativamente a resistência à tração do tecido conjuntivo e, conseqüentemente, fornecem o suporte para os órgãos. Amostras de tecido foram obtidas a partir da área cruenta durante o procedimento cirúrgico, a partir da neovagina no pós operatório precoce (1 a 5 meses após a cirurgia) e tardio (> 6 meses após a cirurgia). Estas foram comparadas com amostras de tecido vaginal normal. A porcentagem total de colágeno não

aumentou progressivamente após a vaginoplastia, sendo apenas a partir de seis meses (quando já havia epitelização vaginal) comparável a uma vagina normal.

A necessidade do uso prolongado de conformadores vaginais é observada no seguimento da maioria dos métodos cirúrgicos de vaginoplastia. Dilatadores vaginais são associados a um impacto emocional negativo, são desconfortáveis e considerados constrangedores pelas pacientes.

Em casos de neovaginoplastia com enxerto de pele o principal problema é a forte tendência do enxerto a se contrair e fechar a cavidade. Klingele et al (2003) relataram que em 73% dos pacientes que se submetem ao procedimento de McIndoe com enxerto de pele foi necessária o uso de conformador vaginal por um período maior que 6 meses. O conceito anterior de que a vaginoplastia com segmento intestinal não requer dilatação no pós-operatório não é mais aceito na literatura (Gargollo et al, 2009). Kim et al (2003) relataram que 8,3% de suas pacientes necessitaram de uso de prótese vaginal intermitente por pelo menos 1 ano e 6% utilizaram durante mais de um ano. Segundo estudo de Hensle et al (1998) 10% das pacientes que realizaram neovaginoplastia com segmento intestinal necessitaram de dilatação crônica após o procedimento.

Ao contrário dos enxertos de pele e segmentos do intestino que mantém grande parte das suas características originais, a neovagina criada com a celulose oxidada logo é revestida por epitélio malpighiano maduro. Por isso, é intrigante perceber que mesmo neste procedimento o uso do conformador também é necessário para preservar o comprimento vaginal nas pacientes que não mantém relações sexuais freqüentes.

De acordo com a teoria de DeLancey, o epitélio vaginal, as camadas mais profundas de colágeno e a musculatura lisa proporcionam o suporte ao longo

de todo comprimento da vagina normal (DeLancey et al, 1990; DeLancey, 1992).

Acreditamos que, apesar da neovagina ser composta por um tecido muito semelhante ao tecido vaginal normal, incluindo a mesma quantidade de colágeno, faltam o arcabouço, o assoalho pélvico e as estruturas ligamentares próprias de uma vaginal normal.

Uma nova técnica para a produção de tecido autólogo para enxerto, pelo plantio e expansão de células nativas em bases reabsorvíveis de acido poliglicólico (PGA), foi descrita previamente para a produção de vários tipos de

Documentos relacionados