• Nenhum resultado encontrado

Análise da comunidade microfitoplanctônica – Índices de diversidade

6. Discussão

6.3. Análise da comunidade microfitoplanctônica – Índices de diversidade

Um índice de diversidade específica é um indicador biológico que integra informações dos tipos e do número de organismos presentes em uma comunidade, em um simples dado (REVELANTE; GILMARTIN, 1980), sendo a diversidade a expressão do número de relações biológicas que se estabelece entre os elementos de uma comunidade, podendo ser tratado provisoriamente como um parâmetro ambiental (REYSSAC, 1970).

Nesse contexto, riqueza e equabilidade combinam-se para determinar a diversidade de uma comunidade (BEGON et al., 2007), que é influenciada basicamente por fatores físicos, químicos, hidrológicos (movimento de massas de água, no caso do fitoplâncton), que determinam o status sucessional dessa comunidade. Segundo Pielou (1966), a diversidade indica o grau de incerteza ligado a qualquer indivíduo selecionado aleatoriamente na comunidade, ou seja, quanto maior o número de espécies e mais proximamente iguais suas proporções, maior será a incerteza de se coletar dois indivíduos da mesma espécie e, portanto maior será a diversidade. A equabilidade (equitabilidade), nesse caso, será a razão entre a diversidade observada e a diversidade máxima teórica (LEGENDRE, 1973).

Sendo assim, uma diversidade fraca caracteriza uma população jovem com alto poder de multiplicação, ocorrendo dominância de uma ou poucas espécies (geralmente diatomáceas, no fitoplâncton). Por outro lado, uma diversidade elevada caracteriza populações maduras ou senis apresentando, do ponto de vista de sua composição específica, uma grande complexidade (REYSSAC, 1970). A maior complexidade traduz um estado de equilíbrio e fraco poder de multiplicação, caracterizando uma comunidade madura, com maioria de organismos pertencentes a níveis tróficos superiores (MARGALEF, 1963).

Para Margalef (1969a), a diversidade constitui caráter sintético ou macroscópico das comunidades (populações mistas). No entanto, para o fitoplâncton, ela é praticamente inacessível, pela dificuldade de obter e identificar todos os organismos

presentes no volume de água que se pretende estudar. Principalmente, quando grande parte do fitoplâncton é dominado pelos organismos nanoplanctônicos, impossíveis de serem identificados a nível específico durante as análises e contagens ao microscópio ótico invertido. Entretanto, um fato acessível e ressaltado pelo autor, consiste na utilização da coleta de fitoplâncton com redes finas, como sendo uma forma apropriada para ter uma idéia da diversidade específica do plâncton, por permitir separar espécies de grande tamanho e escassa densidade, que podem ter interesse taxonômico, ecológico ou biogeográfico.

O problema do estudo da diversidade do fitoplâncton é complexo. Para os estudos quantitativos do fitoplâncton, as amostragens são geralmente coletadas com garrafas, uma vez que propicia uma amostragem de todos os organismos presentes na massa de água, incluindo os menores organismos que normalmente são excluídos nas amostragens com redes. Entretanto, o pequeno volume das amostras acaba excluindo as células maiores e mais raras destes inventários e, coletas de grandes volumes de água, geralmente, causam problemas de espaço para armazenagem a bordo e no laboratório. Por outro lado, a utilização dos inventários das contagens ao microscópio invertido para estimativa da diversidade é bastante problemático, porque, por um lado, os organismos pequenos e delicados são de identificação difícil ou impossível, de maneira que são agrupados em categorias ou por faixas de tamanho durante as contagens, portanto, não é possível basear a estimativa do cálculo de diversidade nestes dados (MARGALEF, 1972). Os valores de diversidade seriam inferiores aos verdadeiros, pois cada grupo reúne indivíduos de mais de uma espécie (MARGALEF, 1970). Por outro lado, devido ao pequeno volume das amostragens utilizadas, a maior parte das espécies do microfitoplâncton é subestimada, tornando estas estimativas de diversidade ainda menos reais.

Tem sido freqüente a utilização de amostras coletadas com rede para um inventário de espécies e para a estimativa da diversidade do fitoplâncton (MARGALEF 1969a, 1969b, 1970, 1972). Os índices de diversidade baseados nas amostras de rede têm sido bastante utilizados em regiões costeiras ou eutrofizadas, entretanto sua utilização em áreas oligotróficas é escassa. Apesar da região do Banco de Abrolhos ser dominada pelo nanoplâncton, ou seja, o microfitoplâncton representar uma pequena parte da comunidade fitoplanctônica, optou-se por calcular do índice de diversidade do microfitoplâncton e testar o significado de sua utilização para regiões oligotróficas.

De maneira geral, os valores dos índices de diversidade calculados para a área estudada mostraram: (i) elevada diversidade (de 4,5 a maior do que 5,0 bits.ind-1) ao sul

do Banco de Abrolhos e nas estações ao largo, valores típicos de águas tropicais oceânicas, e; (ii) valores mais baixos (1,29 até 4,5 bits.ind-1), característicos de áreas costeiras, na região sobre e ao norte do Banco de Abrolhos.

Ao sul do banco, parece que a topografia do fundo mais suave (maior espaçamento entre as isóbatas de 1000 e 3000 metros) fez com que houvesse uma menor turbulência nesta área, assim como observado nas estações oceânicas mais ao largo, nas quais a estratificação da coluna de água, permitiu à comunidade fitoplanctônica se desenvolver e amadurecer, refletindo os altos valores de diversidade encontrados nestas regiões. Como exemplo de estação oceânica profunda, podemos citar a estação 42, com diversidade elevada (≥ 5,0 bits.ind.-1). Essa estação apresentou uma maior proporção de dinoflagelados no microfitoplâncton, evidenciando uma comunidade mais estável, de crescimento mais lento (HULBURT, 1988/89), indicando uma etapa posterior na sucessão da comunidade fitoplanctônica (MARGALEF, 1969a, 1969b), somente possível em águas mais estáveis. Convém ressaltar que, a estabilização da ACAS em profundidade ao sul do Banco de Abrolhos, com uma suave elevação da termoclina próximo à queda do talude (estação 11) não modificou a estrutura da comunidade, e sim enriqueceu a coluna de água em profundidade, fazendo com que a diversidade da comunidade permanecesse elevada, típica de regiões tropicais oceânicas.

A região sobre o banco e as estações ao norte, próximas à quebra do talude e sobre bancos submersos, apresentam grande turbulência devido à irregularidade da topografia do fundo e à pequena profundidade da coluna de água, apresentando os menores valores de diversidade observados na região. A instabilidade da coluna de água não permite que a comunidade fitoplanctônica se estabeleça e percorra as fases da sucessão, sendo perturbada constantemente por oscilações ambientais, obrigando-a a reiniciar o processo. Dessa forma, não atinge a maturidade e, consequentemente, não alcança altos níveis de diversidade, mantendo valores intermediários e baixos típicos de áreas costeiras (MARGALEF, 1986). Nas estações mais rasas sobre o banco, a ressuspensão do sedimento presente nos bancos recifais, pode favorecer a proliferação de poucas espécies típicas de fundo, principalmente diatomáceas, imprimindo à região uma baixa diversidade (REYSSAC, 1970).

Segundo Hulburt (1988/89), o fitoplâncton pode ser dividido em dois tipos, sendo o primeiro caracterizado por espécies com alta capacidade de crescimento, r-

selecionadas e sempre abundantes, tipicamente diatomáceas; e o segundo formado por espécies de crescimento lento, previsíveis, quase K-selecionadas e normalmente não abundantes, tendo como representantes, normalmente, os dinoflagelados. O primeiro tipo, portanto, é típico de comunidades jovens, recém perturbadas, o que ocorreu com as estações, principalmente, sobre o banco; o segundo tipo, configura as estações ao sul e ao largo, onde a maior estabilidade ambiental propiciou maior complexidade e maior equabilidade na distribuição das espécies, apesar do enriquecimento promovido pela maior influência da ACAS, proveniente da região do Cabo de São Tomé, e que atinge a porção sul do Banco (NONAKA et al., 2000).

Sendo a diversidade composta por riqueza e equabilidade (PIELOU, 1966; BEGON et al., 2007), esta última, assim como a dominância, influenciou, como esperado, os valores de diversidade observados, uma vez que as estações com maiores valores de diversidade (H – Tabela 5), não foram necessariamente aquelas com o maior número de espécies ou táxons.

As maiores diversidades foram observadas nas estações mais profundas e afastadas da costa, ao sul (17) e ao norte (75) do banco, as quais apresentaram maior contribuição dos dinoflagelados com relação aos demais grupos, sugerindo estados mais avançados na sucessão fitoplanctônica. Nessas estações, os valores de dominância foram baixos e, em contrapartida, apresentaram altos valores de equabilidade, o que elevou a sua diversidade. Outra estação que apresentou alto valor de diversidade foi a 8, ao sul do banco. Nessa estação, as contribuições das diatomáceas e dos dinoflagelados foram semelhantes e, assim como nas estações anteriores, apresentou alto valor de equabilidade e baixo valor de dominância.

Portanto, parece que a equabilidade, ou a baixa dominância, é fundamental na determinação de uma maior ou menor diversidade, muito mais do que a participação dos diferentes grupos fitoplanctônicos, e o que se observa é uma modificação da comunidade ao longo da sucessão, através da substituição das espécies r- selecionadas (representadas principalmente pelas diatomáceas) por espécies K-selecionadas (representadas pelos dinoflagelados e a maior parte dos cocolitoforídeos). Entretanto, elevadas diversidades podem ser mantidas, mesmo quando as contribuições destes grupos são semelhantes e não há espécies dominantes, o que sugere um estágio intermediário de sucessão.

De maneira geral, valores de diversidade baixos (em torno de 1) são característicos de estágios iniciais de sucessão. Entretanto, para análise da evolução dos

diferentes estágios fitoplanctônicos, a composição específica das comunidades deve ser considerada. As menores diversidades (1,29 e 1,81 bits.ind-1) foram observadas nas

estações 58 e 50, respectivamente, ao norte e sobre o banco. A estação 58 apresentou a maior contribuição percentual de dinoflagelados e elevada dominância (86%), com grande contribuição de espécies dos gêneros Ceratium e Podolampas; já a estação 50, apresentou um pequeno número de espécies, principalmente diatomáceas formadoras de cadeia (espécies dos gêneros Chaetoceros, Bacteriastrum, a espécie Paralia sulcata) e penadas alongadas (Pseudo-nitzschia), além de diatomáceas do gênero Rhizosolenia, com elevada dominância (76%) das primeiras. Parece claro que a dominância de poucas espécies contribui para a queda da diversidade, independente da maior contribuição percentual destes dois grupos, entretanto a interpretação da sucessão é distinta nestes dois casos. Diatomáceas e dinoflagelados representam extremos em termos de estratégias adaptativas e são, conseqüentemente, espacialmente segregados. Em geral, os dinoflagelados parecem exibir maior vulnerabilidade biofísica à turbulência. Para os dinoflagelados, o principal problema de sobrevivência e manutenção em determinada massa de água, parece ser o de sobreviver à turbulência das massas de água, sem danos biofísicos, e acessar zonas com concentrações de nutrientes ideais para seu crescimento, por pelo menos um período de tempo adequado ao seu ciclo de vida. Smayda e Reynolds (2001) sugeriram uma figura esquemática, na qual nove tipos de diferentes habitats marinhos pelágicos, alinhados ao longo do gradiente costa-oceano, com decrescente disponibilidade de nutrientes, redução da mistura e aumento da zona eufótica, nos quais os dinoflagelados podem florescer (formar blooms). Associados a cada um destes habitats, foram alinhados os diferentes tipos (formas de vida) de dinoflagelados.

A dominância, na estação 58, de dinoflagelados dos gêneros Ceratium e Podolampas, evidencia a presença da Água Tropical, massa de água quente, estruturando a comunidade, uma vez que esses gêneros são característicos de regiões com temperatura elevada; a estação 50, com predomínio de diatomáceas formadoras de cadeia e penadas alongadas, sugere uma maior influência do fundo sobre a coluna de água nessa estação, já que essas espécies são comuns em áreas turbulentas, com influência de organismos e sedimentos do fundo (TENENBAUM et al., 2007). A presença de diatomáceas do gênero Rhizosolenia confirma a oligotrofia da estação: esse gênero está relacionado a associações com a cianobactéria Richelia intracelularis, uma

estratégia adaptativa ao ambiente com escassez de nutrientes, por meio da fixação de nitrogênio realizada pela cianobactéria (MASUDA, 2009).

A oligotrofia do ambiente, ocasionada pela predominância da Água Tropical em toda a região, é refletida na dominância de espécies pequenas que, com maior relação superfície/volume, detêm maior atividade metabólica, ocasionando vantagens na competição por nutrientes (PARSONS; TAKAHASHI, 1973). Apesar disso, o índice de diversidade calculado a partir das respostas do microfitoplâncton às alterações ambientais, parece refletir a elevada diversidade específica da comunidade fitoplanctônica e suas variações, mesmo não levando em consideração os organismos dominantes do nanoplâncton. Assim, a utilização da diversidade específica do microfitoplâncton para estimar a diversidade da comunidade planctônica como um todo, em regiões tropicais oligotróficas, parece ser uma estimativa rápida e apropriada, como já demonstrado em trabalhos anteriores para regiões costeiras (MARGALEF 1969a, 1969b, 1970, 1972).

Documentos relacionados