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2 QUEM FOI CLARICE LISPECTOR

3.1 Análise da narrativa

Para analisar as partes do enredo de “Felicidade Clandestina” se faz necessária essa retomada teórica para que se tome conhecimento de todas as partes de uma narrativa e suas peculiaridades: o conflito, elemento criador de tensão, que organiza os fatos da história, prende a atenção do leitor e apresenta o “problema” da história. Além dos conflitos entre personagens, existem os conflitos entre personagem e ambiente, conflitos morais, religiosos, econômicos e psicológicos.

Segundo Cândida Vilares Gancho (2003) o conto é uma narrativa curta, que possui características centrais, em que é possível tornar conciso o tempo, o espaço e restringir o número de personagens. É um tipo de narrativa tradicional, que vem sendo adotado por inúmeros autores desde os séculos XVI e XVII.

Atualmente, o seu público é imenso, tanto para autores quanto para escritores, mesmo que tenha adquirido características um tanto quanto diferentes das primeiras, como exemplo, deixa à parte a intenção moralizante e adota o fantástico ou o psicológico para a elaboração do enredo. Assim, o conto pode ser definido enquanto uma unidade narrativa de ação, curta e universal, sendo mais literário que a crônica.

A partir de agora será feito o estudo de cada elemento que compõe a estruturação de uma narrativa, neste caso o conto. Em cada elemento da narrativa será feita uma pequena conceituação teórica e posterior aplicação no conto em questão.

3.1.2 Enredo

O enredo é baseado na ação dos personagens, e vale dizer que duas questões são essenciais no enredo: sua estrutura e a sua natureza ficcional.

O conflito é fundamental na narrativa, porque vai determinar as partes do enredo:

• Exposição: é o início da história, é a parte que situa o leitor diante da historia que irá ler.

• Complicação: onde se desenvolve o conflito, sendo que pode existir mais de um conflito na mesma história.

• Clímax: é o ápice da história, de maior tensão, ponto de referência para as outras partes do enredo.

• Desfecho: é a solução para os conflitos. Há vários tipos de desfecho, podendo eles ser felizes ou não, cômicos ou trágicos.

No enredo psicológico, os fatos não são evidentes, porque não equivalem a ações concretas dos personagens, mas sim, a movimentos interiores, ou seja, fatos emocionais, que designariam o enredo psicológico.

Narrado em primeira pessoa, o conto “Felicidade clandestina” conta a história de uma menina apaixonada por livros. No conto são abordados os modos de posse e desapropriação tanto da leitura quanto do livro, caracterizados pelo desejo de ler, quando a narradora traz em seu íntimo uma felicidade ilusória, clandestina.

A menina que humilha a outra é feia, mas, por outro lado, seu pai é proprietário de uma livraria, o que a torna elemento chave para sua arrogância e reinado. Um fato importante é que ela não gostava de ler, o que a diferenciava das demais garotas da sua idade, que adoravam. Por isso, não presenteava ninguém com livros, somente com cartões postais, e também não emprestava livros a ninguém, por orgulho.

Sua maldade é imensa, que encontra alguém e passa a narrativa toda correndo atrás dela para conseguir um livro que tanto queria emprestado. Clarice Lispector conduz o conto de tal forma que o leitor espera o melhor da protagonista, e isso acontece. A narrativa toma outro rumo quando a mãe da garota perversa descobre o que sua filha está fazendo com a outra menina, e a partir daí a mãe determina-se a fazer o mesmo com sua filha. A mãe, em sua sabedoria, apenas pede à filha que entregue o livro à incansável menina.

Nesse episódio observa-se a presença misteriosa e suspensa do livro como instrumento transgressor e transformador de uma realidade linear. A posse do volume nas mãos traduz um indecifrável sentimento na menina. Tal qual as outras personagens leitoras, a menina busca a leitura como a um amante e, a sua posse causa-lhe uma indecifrável felicidade. A menina sonhadora passa a saborear, lentamente, aquela “Felicidade clandestina”.

A postura da mãe é decisiva para o desfecho do conto, pois a menina, então possuidora do livro, demonstra o que está sentindo, o momento valioso, já que em sua concepção, valia muito mais ter o livro por tempo indeterminado do que tê-lo para sempre. Tal afirmação remete ao título do conto: “Felicidade clandestina”, já que ter algo que não seja de fato próprio, torna-se clandestino, no caso da menina o livro de Monteiro Lobato.

Na condição dos elementos narrativos expostos por Cândida Vilares Gancho, o enredo do conto “Felicidade clandestina” conta com uma exposição que é delimitada até o parágrafo 3º. A complicação ocorre do 4º parágrafo até o 6º parágrafo, o clímax acontece a partir do 7º parágrafo em que a mãe da menina má intervém em benefício da menina sonhadora, o desfecho da história acontece no último parágrafo, quando a menina toma posse do tão desejado livro e torna-se realizada e com a “felicidade clandestina” conquistada.

Assim, fica claro que o conto não possuí um enredo psicológico, uma vez que os fatos e as ações dos personagens ficam evidentes nas suas movimentações dentro da narrativa.

3.1.3 Narrador

Para Cândida Vilares Gancho “não existe narrativa sem narrador, uma vez que ele é o elemento estruturador da história” (p. 26). São utilizados dois termos para designar a função do narrador na história: foco narrativo e ponto de vista. Os tipos de narrador podem ser: terceira pessoa (narrador observador, está fora dos fatos narrados, seu ponto de vista é imparcial); pode ainda ser onisciente, sabedor de tudo que acontece na narrativa, onipresente, está em todos os lugares da história; narrador intruso, fala com o leitor ou ainda julga o comportamento dos personagens. O narrador parcial é aquele que se identifica com algum personagem e o defende implicitamente. Já o narrador de primeira pessoa ou narrador personagem, é aquele que participa diretamente do enredo, não é onisciente e nem onipresente. Esse tipo de narrador pode ainda ter variantes, como narrador testemunha, aquele que não é o personagem principal, mas narra acontecimentos em que participou, e o narrador protagonista, que é também o personagem principal. Para que fique claro, narrador não é autor, conforme GANCHO (2003, p. 29) sublinha: “as variantes de narrador em primeira pessoa, ou em terceira pessoa podem ser inúmeras, uma vez que cada autor cria um narrador diferente para cada

obra”. Por isso, é importante não fazer referência à vida pessoal do autor para justificar atitudes do narrador, válido também para as autobiografias, nas quais não há a total verdade dos fatos.

O encontro, a situação de impossibilidades, assemelha-se à descoberta do amante e a menina vive seu momento único, encantador. “As reinações de Narizinho”, de certa forma, a própria descoberta de um narrador-leitor ou de um personagem que se desvenda e transforma o ato de ler. O segredo e a revelação de um leitor ficcional, que, era uma entidade física, torna o conto mais próximo da realidade, de um pacto estabelecido inicialmente entre obra e leitor. Pode-se definir o narrador também como narrador personagem.

3.1.4 Verossimilhança

A verossimilhança é o elemento ficcional na narrativa, pois é aquela que dá a ilusão da verdade, que faz o leitor acreditar no que está lendo. Pode-se ainda defini- la como a essência do texto de ficção, a lógica interna do enredo, pode ser constatada na relação causal do enredo, ou seja, cada fato tem causa, logo, desencadeará uma consequência.

No conto “Felicidade clandestina” o elemento da verossimilhança está evidente ao longo da narrativa, tamanho é seu poder dentro do conto que faz com que o leitor envolva-se na história, levando-o a acreditar no que está lendo. O momento culminante é a partir do momento que a menina protagonista começa a sua trajetória em busca do livro Reinações de Narizinho.

Personagem, por sua vez, é o ser que só existe se participa da história, do enredo, se age ou fala. Por mais real que pareça, é sempre um ser ficcional, uma invenção, até mesmo quando são baseados em pessoas reais. Eles só se definem mediante o que dizem ou fazem.

Quanto a sua classificação:

• Protagonista: é o principal;

- herói: o protagonista, com características que sobressaem aos demais personagens;

- anti-herói: o protagonista que possuí características iguais ou inferiores às do seu grupo; os anti-heróis são sempre vítimas dos seus próprios “erros” e defeitos de caráter.

- antagonista: oponente ao protagonista, o vilão.

-personagens secundários: os menos importantes dentro da narrativa, possuem uma menor participação na história.

Os personagens também podem ser classificados como planos: possuem poucas características, com pouca complexidade, identificados facilmente pelo leitor. Esse tipo de personagem pode ainda ser dividido em duas categorias:

- tipo: possui características invariáveis, sejam elas de cunho moral, social, econômico etc.

- caricatura: possui características fixas e ridículas, personagem presente em narrativas de humor.

Em relação aos personagens redondos, GANCHO escreve:

Ao se analisar um personagem redondo, deve-se considerar o fato de que ele muda no decorrer da história e que a mera adjetivação, isto é, dizer que é solitário, ou alegre, ou pobre, às vezes não dá conta de caracterizar o personagem. (GANCHO 2003, p. 20)

Sendo assim, os personagens redondos possuem maior complexidade do que os planos, uma vez que apresentam mais características do que os demais (físicas, psicológicas, sociais, ideológicas e morais) como o exposto acima.

No conto “Felicidade clandestina” a menina má é identificada pela narradora como o embargo, principal obstáculo entre os leitores e os livros, esta exercia seu poder maquiavelicamente (podendo ser caracterizada como antagonista da história), de forma a impossibilitar o contato da leitora e seu objeto de desejo: o livro. Ter o livro em mãos transmitia um indecifrável sentimento na menina, tamanha era a felicidade; que ela, estremecida de satisfação, saboreava lentamente “aquela coisa clandestina”.

A menina dona dos livros, além de não possuir qualidades de beleza, acumulava os adjetivos próprios à maldade, com talento para a crueldade, sádica e vingativa, ocupava a situação de humilhar as demais, diante do seu poder particular: possuir o livro desejado pela leitora ansiosa:

Mas que talento para a crueldade. (...) Comigo exerceu com calma e ferocidade o seu sadismo. Na minha ânsia de ler, eu nem notava as humilhações a que me submetia: continuava a implorar-lhe emprestados os livros que ela não lia. (LISPECTOR,Clarice 1998 p.09).

Assim como a protagonista (personagem redonda, alegre, sonhadora, humilde) e a antagonista (personagem redonda, má, vingativa, superior aos demais), o conto em questão possui personagens secundárias (a mãe da menina dona dos livros e também o seu pai, o livreiro), podendo ser caracterizados como personagens planos). Mesmo que a mãe da menina seja peça fundamental para o desfecho da história, pois é a partir da atitude dela que a protagonista alcança a sua felicidade, ela ainda pode ser considerada secundária.

O tempo, interno ao texto ou fictício, pode ter vários níveis. É importante observar que a época em que acontece a história nem sempre é a mesma data em que foi escrita ou publicada. Os fatos narrados apresentam uma duração curta em relação aos romances, em que o tempo é mais extenso. O tempo cronológico é aquele que transcorre na ordem natural dos fatos, do início para o fim, está ligado ao enredo linear, em que não é alterada a ordem em que os fatos acontecem, pode acontecer em questão de horas, dias, meses, anos e séculos.

O tempo psicológico, por sua vez, é delimitado pela imaginação do narrador ou dos personagens, uma vez que a ordem natural dos fatos é alterada, assim, está ligado ao enredo não linear.

No conto “Felicidade clandestina” o tempo em que a narrativa é descrita pode ser definido como cronológico, (dias) para chegar ao seu desfecho. A história é limitada ao Recife PE, nas ruas até a casa da menina má e efetivamente na casa do livreiro, podendo ser definido como cronológico, linear.

3.1.7 Espaço

O espaço é o local em que se situam as ações das personagens e se estabelece uma interação. É, por definição, o local onde acontece a narrativa, podendo ser ele aberto ou fechado, urbano ou rural.

Para descrever um lugar físico, psicológico, econômico, social, entre outros, é utilizado o termo ambiente, logo, pode-se dizer que é a designação que deixa mais próximo tempo e espaço, que estabelecem um clima (características que permeiam os personagens).

O espaço em que a narrativa “Felicidade clandestina” acontece, é urbana, nas ruas de Recife PE, bem como no trajeto da casa do livreiro.

3.1.8 Ambiente

A função do ambiente é possibilitar aos personagens situarem-se no tempo, no espaço, nas condições em que estão vivendo. Dar sentido aos conflitos vividos pelos personagens, tornar possível e identificável a projeção destes conflitos. O ambiente pode ser caracterizado sobre os seguintes aspectos: época, características físicas, aspectos socioeconômicos, aspectos psicológicos, morais e religiosos.

Ambientado em Pernambuco, Recife, no conto fica claro o ambiente no momento em que são descritas as características da cidade, as suas belas pontes (no momento em que se fala dos cartões postais que a menina má presenteava as suas “amigas”).

3.2 ANÁLISE DO CONTO SEGUNDO A ESTÉTICA DA RECEPÇÃO

Além dos elementos narrativos expostos acima, o conto “Felicidade clandestina” abre um leque de possibilidades aos leitores, uma vez que a busca pela leitura da protagonista do conto vem acrescentar uma reação, um efeito em seus leitores. Jauss atribuí à leitura uma natureza emancipatória, segundo a qual a experiência da leitura libera o leitor de adaptações, prejuízos e apertos de sua vida prática, atribuindo-lhe a possibilidade de emancipar e empreender novas percepções, sentidos e até interpretações para o mundo o qual faz parte. É justamente esta sensação que o leitor tem quando faz a leitura do conto “Felicidade clandestina”, almeja que a protagonista alcance a tão sonhada conquista do livro.

Assim, em determinado momento, o leitor encontra-se com a realidade ficcional e percebe um estranhamento envolvido de perspectivas das mais variadas realidades. Em certo ponto de vista, o texto passa a representar um momento histórico-cultural, ele é preenchido, sobremaneira, pelo leitor. Característica esta que fica evidente no momento em que o leitor se depara com a condição de “personagem” da história, e também enquanto leitor, fazendo parte da narrativa, concordando ou não com os fatos acontecidos no texto.

Nesse contexto textual dois fatores - leitor e texto - possibilitam o refazer da atmosfera pré-existente, ou conforme Iser, (2002), que seja aberto o espaço para “uma atividade performativa”, em cujo “efeito estético” a “função da representação [...] torna perceptíveis as formas constitutivas da natureza; completa o que a natureza deixara incompleto”. A literatura é uma questão de simplicidade, portanto, nada mais natural que ela responda e seja operada por e para quem é destinada.

Analisando hipoteticamente a obra de Clarice Lispector em questão se constata que a sua simplicidade é sinônimo de uma representação do leitor como protagonista, destacando-se por sua inconstância em encontrar um livro que atenda às suas experiências ou um que rompa com suas expectativas de leitura.

Regina Zilberman (2001) em seu texto Ler faz bem?, faz um apanhado dos enredos em que leitor e leitura aparecem como parte fundamental para a narrativa, nas quais o livro surge como objeto transgressor e transformador da realidade. No conto “Felicidade clandestina” não é diferente, o leitor é levado a pôr-se no lugar da protagonista e desvendar meios para que ela consiga chegar ao seu objetivo, formas de conquistar a sua felicidade clandestina.

O encontro e a situação de impossibilidades assemelha-se à descoberta do amante e a menina vive seu momento único, encantador. “As reinações de Narizinho” é, de certa forma, a própria descoberta de um narrador-leitor ou de um personagem que se desvenda e transforma o ato de ler. O segredo e a revelação de um leitor ficcional, que, era uma entidade física, torna o conto mais próximo da realidade, de um pacto estabelecido inicialmente entre obra e leitor.

Pode-se dizer que o conto “Felicidade clandestina”, é escrito por um autor, notado e experienciado nas entrelinhas, mas que, no entanto, não pode ser identificado como tal, mesmo se considerado o texto de Wolfgang Iser, cuja teoria se baseia na aparição de um autor implícito, o qual também é uma entidade ficcional.

O texto de Clarice Lispector exemplifica a leitura como um processo de descobertas e de amadurecimento dos horizontes de expectativas do leitor. Assim, estabelece-se um relacionamento íntimo de cumplicidade com a escrita: “Às vezes sentava-me na rede, balançando-me com o livro aberto no colo, sem tocá-lo, em êxtase puríssimo. Não era mais uma menina com um livro: era uma mulher com o seu amante (LISPECTOR, 1998, p, 10).

A leitura instigadora traz oportunidades, bem como o texto que, dessa forma, também vai causando estranhamento no leitor. E, mesmo que a autora não tenha preocupação com o outro, a sua produção escrita parece demonstrar o contrário, pois o outro é, ao mesmo tempo, início e fim da narrativa: “todo autor legítimo escreve para ninguém ou escreve para todos. Quem escreve para que possa ser lido por estes e aqueles, merece não ser lido” (LIMA, 2002).

Em Regina Zilberman (2004) “nada contradiz mais a condição do autor que a do leitor” o autor é um alguém, produzido por nossa sociedade moderna e “o autor nunca é mais do que aquele que escreve”, logo, o seu papel na obra é secundário, deixando brechas que o narrador e o leitor deverão preencher, ou seja, obra mais leitor são suficientes para compreenderem-se, afinal, o “poeta é um fingidor” e Clarice Lispector destaca nessa realidade ficcional: “. “O leitor pode intervir no coração, no centro”.

No conto em questão fica perceptível a dupla atividade da ficção em que a função de escritor e leitor se alternam, estabelecendo um repertório mínimo à compreensão da própria realidade do fazer literário.

Como eixo central do conto “Felicidade clandestina” está o conceito de “felicidade”. Nele, fica evidente que a escritora parece se questionar sobre o que de fato representa a felicidade? A narrativa em questão dá a impressão de que a menina sonhadora e protagonista do conto parece fazer uso do dito popular

“felicidade é bom, mas dura pouco”, porque ela se utiliza de todas as formas para prolongar seu sentimento de felicidade. Sendo que ela conquistou o seu “sonho” de ficar com o livro pelo tempo que desejasse, ela o deixa no quarto e finge esquecer que o possui, só para se redescobrir possuidora dele.

Entretanto, sua felicidade aparece como um sentimento “clandestino”, já que nem ela mesma pode se conscientizar de sua própria felicidade para que esse sentimento não acabe.Assim, compreende-se que a felicidade deve ser descoberta a todos os momentos e nas coisas mais simples.

Sob a ótica da Estética da Recepção, fazer a leitura do conto “Felicidade clandestina” nada mais é do que trazer à tona o papel do leitor, uma vez que este tem por dever ser capaz de construir sentidos, e deixar a sua marca interpretativa no texto, além de se apossar da narrativa a fim de dotá-la de existência, afinal todo signo passível de leitura abre infindáveis possibilidades de significações.

Mesmo sendo uma prática que se liga à inteligência, a leitura não é elemento intelectual abstrato, é fazer uso do corpo como um todo, e também a relação dos leitores consigo mesmos e com o mundo, é pratica interpretativa capaz de ligar texto e leitor, fazendo com que ambos criem relações intimas e de caráter reflexivo. No conto “Felicidade clandestina”, Clarice Lispector em sua sabedoria, faz com que cada leitor seja capaz de esperar o melhor da protagonista da história, bem como tentar compreender as atitudes da antagonista da narrativa. Assim:

Quando lemos, é função do que já lemos- não somente ao texto que lemos, mas em outros textos -,e os acontecimentos imprevistos, que encontramos no decorrer de nossa leitura, obriga-nos a reformular nossas expectativas e a reinterpretar o que já lemos, tudo o que já lemos até aqui e em outros. A leitura procede, pois, em duas direções ao mesmo tempo, para frente e para trás, sendo que um critério de coerência, existe no princípio da pesquisa do sentido e das revisões contínuas pelas quais a leitura garante uma significação totalizante a nossa experiência. (COMPAGNON. 2003, p. 149)

Portanto, a prática de leitura é um imenso percurso em busca de se atribuir sentido ao texto. Afinal, nenhum signo textual pode ser aprendido de uma vez só, o

leitor é alguém capaz de desvendar em sua longa viagem de leitura, significados, sentidos, inúmeras possibilidades interpretativas que a obra é capaz de lhe oferecer. Em Wolfgang Iser (2002), observa-se que o texto literário traz em si

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