• Nenhum resultado encontrado

5. RESULTADOS

5.2 Análise dimensional

5.2.1 Análise de classe latente – o melhor modelo e a melhor solução

De acordo com a proposta de pesquisa do RDoC, todos os sujeitos da amostra (n=58), a despeito dos grupos de origem, foram submetidos a uma LCA, a fim de identificar subgrupos mais homogêneos em relação ao perfil atencional.

Empregando seis variáveis contínuas e observáveis, três diferentes modelos foram construídos, conforme apresentado na Figura 4. Em cada um dos modelos, optou-se por incluir variáveis relacionadas ao funcionamento atencional (índices retirados dos índices do CCPT e teste de dígitos ordem inversa) e medidas comportamentais (escala de problemas atencionais e o índice de autorregulação do CBCL). Diferentes combinações foram propostas, com maior ênfase em índices extraídos de testes cognitivos ou incluindo mais índices obtidos a partir de inventário de aspectos comportamentais, para se avaliar qual formato melhor reagruparia os participantes da amostra.

Modelo 1

3 variáveis do CPT - Omissões, Hit RT, Hit RT ISI Dígitos ordem inversa

Índice de autorregulação CBCL Índice de problemas atencionais CBCL

Modelo 2

4 variáveis do CPT - Omissões, Hit RT, Hit RT ISI, Hit RT Block Change Índice de autoregulação CBCL

Índice de problemas atencionais CBCL

Modelo 3

5 variáveis do CPT - Omissões, Hit RT, Hit RT ISI, Hit RT Block Change, Variabilidade Índice de problemas atencionais CBCL

Figura 4. Modelos construídos para a análise de classes latentes dos participantes da amostra. Os modelos foram avaliados em relação aos seguintes índices de ajuste: AIC, BIC e BIC ajustado ao tamanho da amostra (ssaBIC), entropia, VLMR e LRT. Os valores dos índices de ajuste para os três modelos e para as soluções de classes são mostrados na Tabela 10. Como pode ser notado, quanto mais alto o número de classes a ser extraído, menor os valores dos índices AIC, BIC e ssaBIC. De forma geral, quanto menor o valor desses índices, melhor o modelo.

Tabela 10. Índices de ajuste dos modelos considerados.

Modelo

Número de

classes AIC BIC ssaBIC Entropia

Classe 1 Classe 2 Classe 3 Classe 4 VLMBLR PBLRT M1 2 classes 1649,966 1689,114 1629,375 0,924 33 25 0,0182 <0.001 3 classes 1604,293 1657,865 1576,117 0,954 22 29 7 0,205 <0.001 4 classes 1579,858 1647,853 1544,096 0,959 28 17 5 8 0,3301 <0.001 M2 2 classes 1615,736 1654,885 1595,146 0,919 35 23 0,1827 <0.001 3 classes 1576,535 1630,106 1548,358 0,948 8 15 35 0,1318 <0.001 4 classes * * * * M3 2 classes 1363,358 1402,506 13,767 0,925 19 39 0,1102 <0.001 3 classes 1304,36 1357,931 1276,184 0,951 15 38 5 0,055 <0.001 4 classes * * * *

Nota: M = Modelo; AIC = Akaike Information Criterion; BIC = Bayesian Information Criterion; ssaBIC = BIC ajustado ao tamanho da amostra; VMBLR = Vuong-Lo-Mendell-Rubin Likelihood Ratio; PBLTT = Parametric Bootstrapped Likelihood Ratio Test.

Comparando-se os três modelos, identificou-se que o Modelo 3 apresentou o menor valor de AIC, BIC e ssABIC. Portanto, o modelo 3 foi escolhido como sendo o melhor conjunto de variáveis para reagrupar os sujeitos em relação ao perfil atencional. Adotando o modelo 3, ainda se teria de escolher entre as soluções de 2 ou de 3 classes, para avaliar qual dessas opções melhor agruparia os sujeitos em relação ao perfil atencional, para, em seguida, dar continuidade às demais análises de validação do modelo e de investigação das bases neurobiológicas das novas classes. A queda dos valores dos índices de ajuste entre as soluções de 2 e 3 classes não foi considerável, optando-se, portanto, por levar em consideração critérios clínicos na escolha de uma dessas soluções. Nas Figuras 5 e 6, é possível avaliar como os participantes se agruparam em relação aos índices do CCPT adotados no modelo 3 nas soluções de 2 e 3 classes.

O modelo 3 com solução de 3 classes (Figura 5) reagrupou a amostra em 3 novos grupos que parecem estar relacionados a perfis atencionais heterogêneos: classes A, B e C.

A classe A (representada por linha azul no gráfico) incluiu uma estimativa de 64,2% da amostra (n = 38) e se caracterizou por desempenho dentro da faixa média (escore Z dentro da faixa média) nas medidas atencionais cognitivas extraídas do CCPT

(omissões, tempo médio de reação, Hit RT ISI, Hit RT BC e Variabilidade). A classe B (linha vermelha) foi composta por uma estimativa de 26,9% da amostra (n=15) e apresentou um desempenho abaixo do esperado para faixa-etária (escore Z ≤ -1,0) em todas as medidas do CCPT consideradas, (omissões, tempo médio de reação, Hit RT ISI, Hit RT BC e Variabilidade), com desempenho especialmente pior nas medidas relacionadas ao número de omissões e variabilidade (escore Z ≅ -2,5). A classe C (linha azul), por sua vez, foi constituída por uma estimativa de 8,9% da amostra (n=5). Essa classe caracterizou-se, principalmente, por uma alta susceptibilidade a apresentar omissões aos estímulos-alvo e uma alta variabilidade intra-sujeito no tempo de reação. Contudo, apesar da grande variabilidade no tempo de reação, este não demonstrou ficar mais lento ao longo da tarefa (escore Z ≅ 0,0 no índice Hit RT BC). Em relação aos demais índices, apresentou dificuldade em nível leve em relação à velocidade média do tempo de reação e em relação à capacidade de adaptação aos diferentes intervalos entre estímulos.

Figura 5. Médias do escore Z para os cinco índices do CCPT do Modelo 3 com a solução de 3 classes.

Ainda em relação à solução de 3 classes, no que concerne ao desempenho das novas classes no índice de problemas atencionais da escala CBCL, notou-se que a classe A apresentou pontuação indicativa de ausência de problemas em níveis clínicos (escore T<60), enquanto a classe B obteve pontuação sugestiva de problemas

atencionais em níveis clínicos (escore T>70). A classe C, por sua vez, apresentou pontuação em níveis sub-clínicos (escore T >60 e <70) (Tabela 11).

Tabela 11. Escore T das classes na escala de problemas atencionais do CBCL (Modelo 3 com a solução de 3 classes).

Classes T-score DP

Classe A (azul) 56,145 1,587

Classe B (vermelha) 73,296 2,21

Classe C (verde) 68,830 4,123

Nota: DP = Desvio padrão

A LCA não inclui uma classificação definitiva de um participante em uma classe ou em outra e, assim, trabalha com o conceito de misclassification. No entanto, para fins de melhor caracterização das classes, nas tabelas abaixo, são apresentados os grupos diagnósticos de origem dos membros das classes (Tabela 12). Como se pode ver, a Classe B foi composta tanto por indivíduos do grupo TDAH-I como do grupo DT. As Classes A e C foram compostas integralmente por indivíduos do grupo TDAH-I, demonstrando então que os participantes do grupo TDAH-I se distribuíram entre três diferentes classes, de acordo com o perfil atencional.

Tabela 12. Grupos de origem dos membros das classes latentes – solução de 3 classes.

TDAH-I DT

Grupo

Classe A 10 28

Classe B 15 0

Classe C 5 0

Como descrito anteriormente, nem todos os participantes da amostra tiveram os sintomas de desatenção e hiperatividade/impulsividade registrados por meio da resposta dos responsáveis ao SNAP. São apresentadas nas tabelas abaixo os sintomas de desatenção e hiperatividade/impulsividade em níveis significativos (classificação bastante ou demais) entre aqueles participantes de cada classe que tiveram a SNAP respondida pelos responsáveis (Tabelas 13 e 14). Os dados demonstram que participantes de todas as classes apresentam sintomas de desatenção em níveis significativos, o que sugere que a redistribuição dos participantes em novas classes não foi feita com base na gravidade dos sintomas.

Tabela 13. Número de critérios de desatenção em níveis consideráveis (bastante e demais) de acordo com a escala SNAP das classes latentes – solução de três classes.

Classe A (n =21) Classe B (n = 11) Classe C (n=3) Sintomas de desatenção Frequência Porcentagem válida Frequência Porcentagem válida Frequência Porcentagem válida 0 – 1 10 47,7% 0 0% 0 0% 2 – 3 2 9,5% 0 0% 0 0% 4 – 5 2 9,5% 4 36,4% 0 0% 6 – 7 5 23,8% 3 27,3% 1 33,3% 8 – 9 2 9,5% 4 36,4% 2 66,7% Total 21 100% 11 100% 3 100%

Em relação aos sintomas de hiperatividade/impulsividade (Tabela 14), nota-se que houve uma concentração levemente maior de participantes com sintomas de hiperatividade entre os membros da classe B, mas ainda, assim, em níveis abaixo dos considerados clínicos (até 5 sintomas).

Tabela 14. Número de critérios de hiperatividade/impulsividade em níveis consideráveis (bastante e demais) de acordo com a escala SNAP das classes latentes – solução de três classes.

Classe A (n =21) Classe B (n = 11) Classe C (n=3) Sintomas de hiperatividade/ impulsividade Frequência Porcentagem válida Frequência Porcentagem válida Frequência Porcentagem válida 0 – 1 17 80,9% 3 27,3% 0 0% 2 – 3 0 0% 1 9,1% 2 66,7% 4 – 5 4 19% 7 63,7% 1 33.3% 6 – 7 0 0% 0 0% 0 0% 8 – 9 0 0% 0 0% 0 0% Total 21 100% 11 100% 3 100%

Em termos cognitivos e comportamentais, o modelo 3 seria um bom modelo para agrupar os participantes em relação aos diferentes perfis atencionais e seria o que mais se aproximaria ao modelo do RDoC, justamente por apresentar classes com desempenho heterogêneo nas medidas consideradas. No entanto, devido ao reduzido tamanho da presente amostra, foi necessário avaliar se o número de sujeitos em cada uma dessas três classes permitiria que as análises seguintes, relacionadas à neuroimagem, fossem conduzidas. Ponderou-se que a classe C, apesar de ter agrupado aproximadamente 10% da amostra, contou com apenas 5 participantes. A

este dado, somou-se o fato de que nem todos os exames de neuroimagem atenderam aos critérios de qualidade, reduzindo ainda mais o número de exames de neuroimagem por classes. Assim, em relação à neuroimagem, as classes do Modelo 3 contaram com a seguinte estimativa de distribuição de sujeitos por classe solução: classe A = 10; classe B = 28; classe C = 4.

Portanto, em termos neuropsicológicos, optou-se inicialmente pela solução de 3 classes como melhor reagrupamento dos indivíduos em relação ao perfil atencional, mas, a partir de critérios estatísticos, a análise comparativa dos dados de neuroimagem entre essas classes não foi recomendada, uma vez que a classe A e classe C tinham uma amostragem tão diferente (28 versus 4 participantes). Por esse motivo, optou-se por dar continuidade às análises com o Modelo 3 com solução de 2 classes.

O Modelo 3 com solução de 2 classes (Figura 6) reagrupou os indivíduos em dois novos grupos: a “classe com desenvolvimento normal das funções atencionais” (DN), representada pela linha azul e com uma estimativa de 66,9% da amostra (n=39) e “classe de alto risco para problemas atencionais” (AR), representada pela linha vermelha, com uma estimativa de 33,1% da amostra (n=19). Os novos grupos não diferiram significativamente com respeito à idade (t(56) = 0,897, p=0,139) ou sexo (x²(1) =0,018, p=0,894). Os novos grupos também não diferiram significativamente em relação à pontuação de QI estimado. A média de QI estimado do grupo DN foi 118,00 (15,96) e a do grupo AR foi 110,74 (14,07) (t(55) = -1,682, p=0,098), o que descarta que a diferença observada no desempenho das classes em relação às medidas atencionais seja decorrente de diferenças nas pontuações de QI.

Figura 6. Escore Z para os cinco índices do CCPT do Modelo 3 na solução de 2 classes.

A classe DN apresentou um desempenho de acordo com a faixa média em todas as variáveis cognitivas adotadas (escore Z ≤-0,35 e ≥0,5). A classe AR caracterizou-se por apresentar um desempenho comprometido nesses mesmos índices cognitivos considerados. Na Tabela 15, pode-se verificar o desempenho das classes DN e AR em relação aos índices do CCPT considerados.

Tabela 15. Escore Z das classes do Modelo 3 na solução de 2 classes nas medidas do CCPT.

Variáveis do CCPT Classe DN (azul) Classe AR (vermelha)

Omissões -0,209 (0,167) -3,784 (0,686)

Tempo médio de reação (Hit RT) 0,511 (0,186) -1,018 (0,227)

Hit RT ISI -0,310 (0,096) -1,512 (0,230)

Hit RT Block Change 0,114 (0,136) -0,658(0,314)

Variabilidade -0,302 (0,188) -4,431 (2,208)

Nota: CCPT = Conners’ Continuous Performance Test; DN = Desenvolvimento normal da atenção; AR = Alto risco para problemas atencionais; Hit RT = tempo de reação; Block change = mudança de bloco; ISI = intervalo entre estímulos.

Em relação ao desempenho na escala de problemas atencionais do CBCL, como pode ser visto na Tabela 16, a classe DN obteve pontuação indicativa de ausência de problemas atencionais em níveis clínicos e a classe AR apresentou pontuação sugestiva de problemas atencionais em níveis clínicos.

Tabela 16. Escore T das classes na escala de problemas atencionais do CBCL (Modelo 3 com a solução de 2 classes).

Classes T-score DP

Classe DN (azul) 56,819 2,151

Classe AR (vermelha) 72,191 1,208

Nota: DN = Desenvolvimento normal da atenção; AR = Alto risco para problemas atencionais; DP = Desvio padrão.

No que se refere à composição de cada classe, como apresentado na tabela abaixo (Tabela 17), a classe DN foi composta por participantes de ambos os grupos de origem (I e DT) e a classe AR foi composta apenas por participantes do grupo TDAH-I.

Tabela 17. Grupos de origem dos membros das classes latentes – solução de 2 classes.

TDAH-I DT

Grupo

Classe DN 11 28

Classe AR 19 0

No que se refere à gravidade dos sintomas de desatenção e

hiperatividade/impulsividade dos membros de cada classe (isto é, os membros que têm probabilidade de estar em cada uma das classes), nota-se que, de acordo com a resposta dos responsáveis à escala SNAP, 77% dos participantes da classe AR apresentaram 6 ou mais sintomas de desatenção em níveis consideráveis (bastante ou demais). Aproximadamente 32% participantes da classe DN também apresentaram sintomas de desatenção em níveis consideráveis (Tabela 18). A partir desses dados, pode-se afirmar que, apesar de haver um predomínio de sintomas de desatenção entre os participantes da classe AR, também se observou esses sintomas em níveis significativos entre participantes da classe DN, indicando que a as novas classes não foram configuradas a partir da gravidade dos sintomas.

Tabela 18. Número de critérios de desatenção em níveis consideráveis (bastante e demais) de acordo com a escala SNAP das classes latentes – solução de 2 classes.

Grupo DN (n =22) Grupo AR (n = 13) Sintomas de desatenção Frequência Porcentagem válida Frequência Porcentagem válida 0 – 1 10 45,4% 0 0% 2 – 3 2 9,1% 0 0% 4 – 5 3 13,6% 3 23,1% 6 – 7 5 22,7% 4 30,8% 8 – 9 2 9,1% 6 46,2% Total 22 100% 13 100%

Concernente aos sintomas de hiperatividade/impulsividade, de acordo com a resposta dos responsáveis à escala SNAP, notou-se que mais membros da classe AR apresentaram sintomas em níveis consideráveis (bastante e demais), porém, mesmo entre os participantes dessa classe, o número total de sintomas foi inferior a cinco (Tabela 19).

Tabela 19. Número de critérios de hiperatividade/impulsividade em níveis consideráveis (bastante e demais) de acordo com a escala SNAP das classes latentes – solução de 2 classes.

Grupo DN (n =22) Grupo AR (n = 13) Sintomas de hiperatividade/impul-sividade Frequência Porcentagem válida Frequência Porcentagem válida 0 – 1 17 77,3% 3 23,1% 2 – 3 2 9,1% 3 23,1% 4 – 5 3 13,6% 7 53,9% 6 – 7 0 0% 0 0% 8 – 9 0 0% 0 0% Total 22 100% 13 100%

Além das caracterizações apresentadas anteriormente, para avaliar a qualidade dos indicadores que foram selecionados para fazer o reagrupamento da amostra, foi calculada a entropia dos mesmos, isto é, a capacidade dos indicadores em discriminar os novos subgrupos (Tabela 20).

Tabela 20. Contribuição específica dos índices em relação à entropia.

Índices Entropia univariada

Omissões 0,674 Hit RT 0,414 Hit RT ISI 0,520 Hit RT BC 0,199 Variabilidade 0,622 Problemas atencionais 0,481

Nota: Hit RT = tempo de reação; BC = mudança de bloco; ISI = intervalo entre estímulos.

Conforme apresentado na Tabela 20, o indicador com melhor capacidade para discriminar os participantes das classes DN e AR foi o índice de omissões do CCPT (entropia = 0,674). Por outro lado, mudança no tempo de reação ao longo dos blocos (Hit RT BC) foi o índice com menor entropia (0,199) e, portanto, com menor poder de discriminação das novas classes.