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CAPÍTULO 4 – ANÁLISE DOS LIVROS E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

4.7 Análise de Patativa do Assaré, o poeta passarinho

O livro Patativa do Assaré, o poeta passarinho conta a história do poeta Antônio Gonçalves da Silva, o Patativa do Assaré, desde seu nascimento, em Assaré, no estado do Ceará, passando pela infância, época em que o menino conheceu a poesia e se encantou com a beleza das palavras, até a vida adulta, quando se tornou reconhecido pelos seus versos e rimas. A biografia de Patativa é narrada de maneira poética e repleta de exemplos que ilustram o modo de vida sertanejo. Gostaríamos de salientar que neste livro a história não gira em torno da relação ser humano-natureza, pois somente alguns trechos abordam especificamente essa relação. No entanto, são trechos bastante significativos que fazem essa dimensão transparecer mesmo quando se fala de outros assuntos. Um resumo com mais detalhes se encontra no apêndice G.

No livro37 encontramos quatro trechos que servirão de base para nossa categorização. Os trechos abordam a relação do poeta com a terra onde vivia, com os animais que a habitavam, sugerindo uma relação de bastante carinho e respeito. Notamos a ocorrência

37 O livro apresenta também algumas poesias de Patativa, demonstrando seu modo particular de descrever as coisas do sertão, mas optamos por não analisar essas poesias, pois acreditamos que seria necessário um trabalho específico para tal.

das correntes naturalista e crítica. Podemos verificar um exemplo do tipo de concepção da relação ser humano-natureza que o livro traz, no trecho “Foi no trato com a terra que o menino aprendeu a ouvir a natureza. Escutava o canto dos pássaros, um prelúdio de chuva e o som quase silencioso de um pé de feijão crescendo” (SANTOS, 2008, p. 08). Acreditamos que a corrente naturalista se sobressai nesse parâmetro, uma vez que ela tem como um de seus enfoques o experiencial, onde se vive na natureza e se aprende com ela (SAUVÉ, 2005a). Logo no início do livro, em uma apresentação feita por Gilmar de Carvalho38, lemos que “o menino criado no chão da Serra de Santana, livre como uma patativa, aprendeu todos os mistérios da natureza” e podemos perceber que a relação de aprendizado com a terra em que vivia se faz presente em vários momentos do livro. É uma relação de aprendizagem, “respeitando a natureza e os outros homens e mulheres que estão aqui neste mesmo barco, fazendo esta mesma viagem, lutando por um mundo melhor e mais justo”39.

O livro trata da vida e obra de um autor que escreve de maneira diversa da norma culta da língua portuguesa40, uma vez que a força da poesia de Patativa vem da sua oralidade, refletindo a maneira de falar do sertanejo nordestino. Reflete também uma cultura e um modo de vida que são diferentes do que costumamos ter como padrão em nossas escolas (inseridas nos centros urbanos). Nesse sentido, acreditamos que na consideração acerca das diversidades sociais, culturais e naturais, o livro se insere na corrente crítica, que considera as diversidades e pretende que os valores dominantes sejam questionados (SAUVÉ, 2005a). Um exemplo da maneira diferente de ver o mundo refere-se à percepção e medida do tempo, distinta da que costumamos utilizar: “Quando ficou meninote, Antônio foi para escola. Coisa de pouco tempo, coisa de seis luas cheias” (SANTOS, 2008, p. 10).

Com relação à abordagem da experiência ética, acreditamos que não há a valorização do ser humano sobre os demais seres vivos e não vivos e tampouco desses outros seres perante o ser humano. Leis e D’Amato (1995 41 , citados por BONOTTO;

38 Escritor e professor da Universidade Federal do Ceará. Pesquisa em:

http://www.onordeste.com/onordeste/enciclopediaNordeste/index.php?titulo=Gilmar+de+Carvalho&ltr=g&id_p erso=870. Acesso em 12/01/11.

39 Trecho da apresentação feita por Gilmar de Carvalho, na página 03.

40 Gostaríamos de ressaltar que Patativa do Assaré também escreveu alguns poemas na norma culta e convencional da língua portuguesa.

41 LEIS, H. R.; D’AMATO, J. L. O ambientalismo como movimento vital: análise de suas dimensões histórica, ética e vivencial. In: CAVALCANTI, C. (Org.). Desenvolvimento e natureza: estudos para uma sociedade sustentável. São Paulo: Cortez; Recife: Fundação Joaquim Nabuco, 1995.

SEMPREBONE, 2010, p. 133) salientam que assim como o antropocentrismo assume uma posição radical ao exaltar a espécie humana como o centro de todas as coisas, outras proposições também se valem de radicalismos e acabam por colocar o ser humano fora da natureza, ou seja, “muda-se a forma como são encarados o ser humano e a natureza, mas permanece a relação de domínio e separação entre eles”. Percebemos que no livro não há radicalismos, cada ser é respeitado em seu nível de existência. Até mesmo a seca que castigava o sertão onde Patativa cresceu é vista com certo respeito, assim como podemos notar no trecho que descreve um aspecto da infância do poeta: “desde cedo ajudava a família. Aprendendo a cultivar a esperança debaixo de um céu sem nuvens. Esperando a chuva como quem espera um presente sagrado. Cavando a terra e lançando sementes na fé de colher o feijão nosso de cada dia” (SANTOS, 2008, p. 08).

Pensando na experiência estética com a natureza, notamos que a história é narrada de maneira a nos envolver com o jeito como Patativa se relacionava com os outros seres – pássaros, pessoas, plantas – e com a beleza como são descritos vários episódios da vida do poeta: “o menino nasceu numa serra no meio do sertão do Ceará. A serra de Santana, no Assaré. Uma serra que se pintava de verde no tempo de chuva e ficava a maior boniteza do mundo” (SANTOS, 2008, p. 04). Nesse sentido, acreditamos que a corrente naturalista se sobressai, uma vez que ela valoriza a experiência estética tanto pela imersão no ambiente natural quanto pela contemplação por meio dos diversos sentidos (SAUVÉ, 2005a), buscando outros meios sensíveis, como por exemplo, um livro. Marin (2006, p. 278) nos lembra que:

(...) educar pressupõe trabalhar com as sensibilidades, afetividades, capacidades imagética e criadora e, ao fazê-lo, despertar para a verdadeira essência ética do ser humano. (...) a educação estética, hoje tão minimizada na educação formal, é, mais que um instrumento, uma urgência para o processo educativo.

No livro, não encontramos nenhum trecho para subsidiar a categorização dos parâmetros “responsabilização pelas causas dos problemas ambientais”, “estratégias de transformação/mudança” e “proposta de atuação mais individual ou coletiva”. Entretanto, acreditamos que podemos categorizar esse último parâmetro na corrente crítica, pois apesar de o livro não o abordar especificamente, temos o seguinte trecho que, ao falar dos versos de Patativa, nos serve de exemplo: “uma poesia que celebrava o amor, a natureza, a justiça, a

igualdade, a fraternidade, a liberdade, o sonho, a esperança e a luta por um mundo melhor” (SANTOS, 2008, p. 28). A corrente crítica, ao propor valores como a coletividade e a cooperação (SAUVÉ, 2005a), também se fundamenta nos ideais celebrados na poesia de Patativa do Assaré. No quadro 9 estão sistematizadas as categorias encontradas no livro, relacionadas aos parâmetros elencados e os trechos ou características que subsidiaram a categorização.

Quadro 9: Sistematização das categorias encontradas no livro Patativa do Assaré, o poeta passarinho, com os parâmetros utilizados para análise, a corrente predominante e um trecho ou comentário ilustrativo da obra.

Parâmetros (Tendências) Categoria Trecho ou característica 1 – Concepção da relação

ser humano-natureza

Naturalista “Foi no trato com a terra que o menino aprendeu a ouvir a natureza. Escutava o canto dos pássaros, um prelúdio de chuva e o som quase silencioso de um pé de feijão crescendo”.

2 - Consideração acerca das diversidades sociais, culturais e naturais

Crítica “Quando ficou meninote, Antônio foi para escola. Coisa de pouco tempo, coisa de seis luas cheias”. 3 - Abordagem da

experiência ética e estética

com a natureza Naturalista

“O menino nasceu numa serra no meio do sertão do Ceará. A serra de Santana, no Assaré. Uma serra que se pintava de verde no tempo de chuva e ficava a maior boniteza do mundo”.

4 - Responsabilização pelas causas dos problemas ambientais

_ Não aborda essa dimensão

5 - Proposta de atuação mais

individual ou coletiva Crítica

“Uma poesia que celebrava o amor, a natureza, a justiça, a igualdade, a fraternidade, a liberdade, o sonho, a esperança e a luta por um mundo melhor”.

6 - Estratégias de

transformação/mudança _ Não aborda essa dimensão