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Professora 5: Aos 45 anos a professora é graduada em pedagogia, atua como professora desde os 18 anos Conta que seu sonho, desde menina era ser

3.7. Análise dos dados a partir das entrevistas com médicos perítos

As médicas perítas I e II relatam a respeito das licenças com base em seus atendimentos, em suas avaliações foi possível constatar que, os maiores índices de afastamento são ocasionados por doenças psiquiátricas e na voz. A perita I afirma que, em sua avaliação os afastamentos por problemas na voz são inevitáveis e que, os afastamentos por problemas psiquiátricos poderiam ser reduzidos ou evitados se houvesse um ambiente de trabalho favorável. No que diz respeito à redução do período de afastamento em alguns casos as

37 duas peritas concordam. Das licenças concedidas, os casos que mais se prolongam são os afastamentos por motivos psiquiátricos. Ambas entrevistadas creditam que, as doenças são decorrentes do ambiente de trabalho e da insegurança relatada pelos pacientes. Afirmam e acreditam na necessidade de afastamento para tratamento de saúde, mas alguns casos poderiam ser por menos tempo. A quantidade de professores afastados as preocupa por não haver professores em sala de aula. Na opinião da perita I a redução de carga horária não reduziria a demanda por afastamentos, porém melhores salários reduziriam essa demanda. Na opinião da períta II a redução de carga horária e o aumento de salários não reduziriam número de afastamentos, pois acredita que os causadores dos problemas sejam; a insegurança no ambiente de trabalho, desinteresse dos alunos e estrutura precária. A afirmação de que a redução de carga horária não melhoraria a qualidade de vida, reduzindo assim os adoecimentos e consequentemente à busca pelo afastamento para tratamento de saúde nos leva a refletir a respeito do pensamento Marxista sobre o trabalho:

Todas essas conseqüências derivam do facto de que o trabalhador se relaciona ao produto do seu trabalho como a um objecto estranho. Com base neste pressuposto, é claro que quanto mais o trabalhador se esgota a si mesmo, tanto mais poderoso se torna o mundo dos objectos, que ele cria perante si, tanto mais pobre ele fica na sua vida interior, tanto menos pertence a si próprio. (MARX 1988. O Capital, v.I, p. 81 apud OLIVEIRA 2007, p. 130)

Quando o trabalhador interpreta sua relação com o objeto de trabalho com estranheza, se colocando distante de tal, se afasta de si. Há uma relação paradoxal entre o homem e o mundo dos objetos produzidos por sua força de trabalho, quanto mais ele se esgota na criação do objeto, mais o objeto se torna poderoso diante de si, o tornando pobre em sua essência.

Marx (1988) traz em O Capital a questão do trabalho excedente que, é quando o trabalhador ultrapassa a produção necessária para o qual seria esperado para aquele dia. Vamos supor que a carga horária do trabalhador seja oito horas diárias para que ele possa produzir um tanto “X” de objetos,

38 mas em seis horas ele concluiu a meta. Mesmo assim, o trabalhador precisa cumprir a carga horária de oito horas e tudo que é produzido nessas duas horas excedentes vai para o bolso do patrão, se tornando um lucro excedente, mais capital para enriquecer os capitalistas. Esse trabalho excedente de duas horas não é pago, pois não é visto nem reconhecido, não se recebe a mais por isso, visto que o patrão está amparado pelo contrato de trabalho que é de oito horas por dia.

Quando as peritas 1 e 2 falam sobre a falta de professores em sala de aula estão se baseando na quantidade excessiva de professores que, precisaram ser readaptados depois de longos períodos de licença para tratamento de saúde. Para ressaltar vejam novamente suas falas a cerca do assunto:

Períta I. “Não há professores dentro da sala de aula!”. Períta I. “Quem ficará nas salas de aula?”

No ponto de vista clínico percebemos á partir das respostas das perítas que a necessidade de se ter um professor em sala de aula, se mostra nesse momento como prioridade em detrimento de sua saúde física e mental. As características de uma sociedade capitalista, onde o trabalho é prioridade em detrimento da saúde para que se possa obter um valor aquisitivo para então se inserir na sociedade vigente que se constitui, nos mostra nesse momento:

A primeira fase da dominação da economia sobre a vida social levou, na definição de toda realização humana, a uma evidente degradação do ser em ter. A fase presente da ocupação total da vida social, em busca da acumulação de resultados econômicos conduz a uma busca generalizada do <<ter>> de parecer, de forma que o ter perde seu efetivo prestígio imediato e sua função ultima. Assim, toda realidade individual se tornou social e diretamente dependente do poderio social obtido. Somente naquilo que ela não é, lhe é permitido aparecer. (DEBORD, 2003, p.18)

Percebemos neste contexto apresentado e fundamentado por Debord (2003) que a questão da saúde não é vista como prioridade diante do

39 fato, de que mesmo doente faz se necessário cumprir seu trabalho para manter o capital equilibrado e continuar com poder aquisitivo para manter-se inserido nos padrões sociais exigidos.

Dos casos comoventes com que a perita I se deparou, o que mais lhe tocou foi um caso de paciente com tumor na cabeça inoperável. O caso mais comovente atendido pela perita II foi o da professora que vinha sendo ameaçada de morte por um aluno. Percebemos que os percalços que acometem os professores, comovem as pessoas, pois, são muito forte quando relatados e saber que os profissionais da educação passam por todos esses obstáculos no ambiente de trabalho, que é onde deveria encontrar um ambiente, acolhedor e seguro para passar adiante com qualidade todo conhecimento adquirido em anos de estudos e pesquisas nos desmotiva a ponto de refletirmos sobre o fato de uma profissão tão necessária a sociedade ser tratada com tamanho descaso.

4 - Considerações finais

Presenciar os relatos dos professores que, encontravam-se solicitando licença do trabalho por problemas de saúde causados no ambiente de trabalho causou uma profunda reflexão por infinitas vezes, sobre a profissão, pois, ali foi presenciado o que poderia acontecer conosco ao exercer a profissão, para qual, se havia preparado durante longos anos e escolhido sem conhecer a totalidade de suas implicações.

No início, as opiniões pessoais se misturavam aos comentários que eram presenciados por quem estava acostumado a ouvir esses relatos: os médicos peritos. A opinião de alguns peritos é bem preconceituosa em relação aos relatos dos professores e concebem que poucos professores têm um relato contraditório, por vezes, querem estender uma licença sem necessidade com o intuito de completar o tempo mínimo exigido pela Junta Médica do IPM para ser readaptado.

40 Passamos a observar melhor os relatos dos professores e a considerar fatores como: a idade; o gênero; o tempo de serviço; a carga horária o ambiente de trabalho e a remuneração. Os relatos em sua grande maioria tinham pontos em comum. De acordo com as observações, poucos são os casos em que os profissionais da educação que solicitam afastamento para acompanhar familiar ou por problemas pessoais. No primeiro ano de observação percebeu-se que a maioria das licenças era para professoras em início de carreira, com faixa etária entre 25 e 35 anos. Podia-se concluir nesse momento que não tinham se adaptado á profissão. Os problemas de saúde mais recorrentes eram os seguintes: depressão; síndrome do pânico e problemas na voz.

No segundo ano começaram a surgir os casos de professoras, quase em idade de se aposentarem e professores de todas as faixas etárias, com grande índice de afastamento por síndrome do pânico e depressão. Os relatos semelhantes traziam os argumentos seguintes: apatia, desânimo diante da profissão, pânico dos alunos e do ambiente escolar, violência causada pelos alunos ou pais dos mesmos, problemas de convivência com os colegas, tendências a irritabilidade, falta de concentração, insônia e afonia.

Nos deparamos com os percalços que acometem os professores. No entanto devemos levar em consideração, o ambiente familiar, o ambiente de trabalho e o contexto socioeconômico em que vivem e que trabalham.

Podemos observar nesse estudo que o fator desencadeante é o adoecimento dos professores é a convivência com grandes quantidades de alunos a serem atendidos, alunos com diversas realidades sociais, que na maioria das vezes não recebem em casa o básico como: alimentação adequada; violência; pobreza atenção dos pais e educação. Os alunos vão para a escola forçados e quando chegam às mesmas não se comportam, não respeitam os professores, causando desordem no ambiente escolar e todos esses fatores refletem diretamente no trabalho a ser desenvolvido em sala de aula pelo professor. Uma vez que o professor se sentindo tolhido diante da turma, não consegue desenvolver as atividades propostas e isso o faz se sentir incapaz. Nesse momento ingressa a reflexão do profissional diante dos seus

41 saberes e da sua profissão. Diante dessa problemática surgem então os sintomas recorrentes citados nos relatos e entrevistas dos professores e dos perítos, que são: afonia; angústia, apatia, irritabilidade, tristeza, impotência, exaustão, insônia, estresse, agressividade e palpitações.

Segundo Souza (2007 apud FLEURY & MACÊDO, P. 220) diante dessa realidade vivida pelos professores surge o mal estar comum a sociedade contemporânea, por ser uma condição existencial ao homem moderno. Quando o mal estar diante da realidade permanece e se agrava os leva a síndrome de

Burnout, conhecida como síndrome do esgotamento profissional.

Os profissionais da educação são vítimas em potencial dessa síndrome, principalmente os professores, pois a cada dia que passa lhes é exigido pelo mercado de trabalho mais qualificação, mais dedicação e principalmente que esteja conectado as novas tecnologias e suas inovações.

As exigências propostas pelo capitalismo na contemporaneidade estão diretamente ligadas ao adoecimento dos trabalhadores especialmente a classe docente:

Os adoecimentos laborais expressam uma das formas prementes de precarização do trabalho nas condições do capitalismo global: a precarização do homem-que-trabalha (no sentido de homem como ser humano-genérico). (ALVES, 2013, p. 13)

A carga horária cada dia mais exaustiva, a busca pelo aperfeiçoamento das atividades a serem realizadas, o desejo de realizá-los perfeitamente em tempo hábil vem esgotando física e psicologicamente os trabalhadores, inclusive a classe docente:

O adoecimento laboral é a explicitação contingente, no plano da singularidade do homem singular, das contradições insanas da sociedade burguesa hipertardia. Na verdade, o que está em questão no século XXI é a capacidade histórica de o movimento do proletariado como classe dar respostas efetivas, no plano histórico-mundial, às novas condições objetivas da luta de classes no capitalismo global. (ALVES, 2013, p. 14)

42 Além disso, temos a insegurança no ambiente de trabalho, que foi relatado pelos professores e pelos médicos perítos. Por último e não menos importante, a exaustiva carga horária de trabalho a que se submetem é resultado do valor salarial que, segundo os profissionais está aquém das suas necessidades básicas.

43 5 - Referencias:

Marxismo, Educação e luta de classes: pressupostos ontológicos e desdobramentos ídeo-políticos/Organização Suzana Jimenez, Jackline Rabelo, Maria das Dores Mendes Segundo - Fortaleza: EdUECE, 2010.

Oliveira, Jorge Luís de. Alienação, trabalho e emancipação humana em Marx. / Jorge Luís de Oliveira. - Fortaleza: Edições UFC, 2007.

DEBORD, Guy. A sociedade do espetáculo: comentários sobre a sociedade do espetáculo. 9. reimpr. Rio de Janeiro: Contraponto, 2007. 237p. ISBN 9788585910174 (broch.)

FREIRE, Paulo: Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa / Paulo Freire. – São Paulo: Paz e Terra, 1996. – (Coleção Leitura) http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=76623546002 Em 02/04/16 às 20:48 http://www.histedbr.fe.unicamp.br/revista/edicoes/36/art03_36.pdf Em 02/04/16 às 20:55 http://www.unioeste.br/cursos/cascavel/pedagogia/eventos/2008/2/Artigo%2012 .pdf Em 02/04/16 às 21:20 http://www.editora.ufrrj.br/revistas/humanasesociais/rch/rch22n2/humanas22n2 p213_229movimentosindicaldocente.pdf Em 02/04/16 às 21:29 http://www.scielosp.org/pdf/csp/v22n5/14.pdf Em 02/04/16 às 21:35 http://www.scielo.br/pdf/%0D/pe/v7n1/v7n1a03.pdf Em 02/04/16 às 21:42 http://pepsic.bvsalud.org/pdf/psyche/v8n13/v8n13a11.pdf: Em 16/09/2016 às 10:09 hs. http://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/rap/article/view/7030/5589 / Em 21/01/2017 às 22:03 hs

Krentz, L. (1986). Magistério: vocação ou profissão? Educação em Revista, 3, 12-16. /// Costa, M. (1995). Trabalho docente e profissionalismo. Porto Alegre: Sulina.

O mal estar docente para além da modernidade: uma análise psicodinâmica. Site: https://dialnet.unirioja.es/servlet/articulo?codigo=4047171 Em 02/04/16 às 20:45

Síndrome de burnout e fatores associados: um estudo epidemiológico com professores. Site: http://www.scielosp.org/pdf/csp/v22n5/14.pdf: Em 02/04/16 às 21:35

Trabalho docente e proletarização. Site:

http://www.histedbr.fe.unicamp.br/revista/edicoes/36/art03_36.pdf Em 02/04/16 às 20:55

Você, Você, Você Burnout: Revista Nova Cosmopolitan, ano 44, nº11, novembro 2016. Ed. Abril P. 110,111 e 112.

44 06- Anexos

ROTEIRO PARA ENTREVISTA SEMI-ESTRUTURADA COM MÉDICOS PERÍTOS

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