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Os conteúdos observados e registrados nas sessões do grupo e nas entrevistas individuais foram analisados de forma conjunta e organizados para efeitos didáticos e operacionais em três categorias de análise previamente definidas, por se caracterizarem em fases seqüenciais na linha da vida:

Na primeira categoria, foram reunidas informações, relatos e percepções sobre situações e significados anteriores ao conhecimento do diagnóstico, buscando compreender e inter-relacionar os possíveis fatores que configuraram e caracterizaram as vulnerabilidades e riscos que levaram à infecção pelo HIV/SIDA, denominada de fase pré-diagnóstica;

Na segunda categoria, foram reunidos relatos de situações vividas, reveladoras de atitudes, informações e percepções, construídas no processo de busca e realização do teste anti-HIV, que recebeu o nome de fase diagnóstica;

Na terceira categoria, foram agrupados os conteúdos que traduziam estratégias individuais e coletivas de enfrentamento no âmbito do viver com HIV e SIDA, com repercussões no indivíduo, família e na comunidade, que denominamos de fase pós-diagnóstica.

Thompson (1995), em seu livro “Ideologia e Cultura Moderna”, propõe uma forma sistematizada de análise de formas simbólicas que se constitui em um marco referencial metodológico denominado de Hermenêutica de Profundidade. Para o autor, formas simbólicas são discursos, conteúdos, interações e expressões

significativas de várias naturezas, inseridas em contextos e processos sócio- históricos específicos, dentro dos quais e por meio dos quais são produzidas, transmitidas e recebidas. É com base nesse referencial que tratamos as formas simbólicas observadas nas sessões de grupo e nas entrevistas individuais, percorrendo três fases distintas e complementares: análise sócio-histórica; análise formal; interpretação e re-interpretação.

A análise sócio-histórica é a primeira fase do processo de análise e interpretação de dados pela hermenêutica de profundidade, que prevê a construção das condições sociais e históricas em que as formas simbólicas obtidas foram produzidas. A reconstrução da história de Moçambique e a contextualização dos diversos aspectos sociais, culturais e programáticos que envolvem os adolescentes e jovens e sua relação com a epidemia do HIV/SIDA, possibilitou criar as bases para uma primeira análise dos conteúdos obtidos nas sessões do grupo de convivência e nas entrevistas individuais.

A segunda fase da hermenêutica de profundidade prevê uma analise formal e discursiva das formas simbólicas, já que elas são produtos de ações que estão baseadas em regras e recursos disponíveis ao produtor, assim como construções simbólicas complexas, por meio das quais, algo é expresso ou dito. Por esta fase ter seu enfoque na organização interna das formas simbólicas, com suas características estruturais e seus padrões e relações, a partir do pressuposto de que, por trás do discurso aparente simbólico e polissêmico esconde-se um sentido que convém desvelar, as técnicas de análise de conteúdo se apresentaram apropriadas para apoiar este momento de análise.

Desta forma, utilizou-se a técnica de análise de conteúdo de BARDIN (1997), que está fundamentada em um conjunto de técnicas de análise das comunicações, que por procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens revelam indicadores quantitativos ou não, que permitem a inferência de conhecimentos relativos às condições de produção e recepção destas

mensagens. Uma das primeiras tarefas do pesquisador consiste em efetuar um recorte dos conteúdos em elementos que deverão em seguida, serem agrupados em torno de categorias, que neste caso, como já nos referimos acima, foram classificadas por fase pré-diagnóstica, fase diagnóstica e fase pós-diagnóstica.

Facilitado pelas duas fases anteriores, a interpretação e reinterpretação das formas simbólicas se apresentou como a última fase do processo da análise de acordo com a hermenêutica de profundidade, implicando num novo movimento de pensamento, onde a interpretação se procedeu por síntese e pela construção criativa dos possíveis significados.

De acordo com Thompson, (1995), as formas simbólicas representam algo, elas dizem alguma coisa sobre algo, e é esse caráter transcendente que deve ser compreendido pelo processo de interpretação. Como as formas simbólicas fazem parte de um campo pré-interpretado, elas são interpretadas pelos sujeitos que constituem o mundo sócio-histórico. Foi o momento em que realizei uma análise detalhada dos conteúdos, interpretando-os em conformidade com os fatores culturais, macro-conjunturais e pessoais de risco e de proteção, a luz dos conceitos de vulnerabilidade e resiliência.

Assim, pelo fato do processo interpretativo da Hermenêutica de Profundidade se dar num campo pré-interpretado, sempre correremos o risco de projetarmos um significado possível divergente ao significado construído pelos sujeitos que constituem o mundo sócio-histórico. A interpretação sempre será um processo arriscado, cheio de conflitos e, sobretudo, um campo nunca fechado em si mesmo. Haverá sempre a possibilidade de uma nova interpretação, o que não significa a invalidação de outra interpretação, afinal, como nos alerta Thompson (1995: 64), “a possibilidade de um conflito de interpretação é intrínseco ao próprio processo de interpretação” e Gadan (1983:36), quando afirma que “uma interpretação definitiva parece ser uma contradição de si mesma, aventurar-se neste campo é

arriscado, mas, sobretudo, fundamental, mesmo porque, conhecimento é, antes de mais nada, um auto-conhecimento”.

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