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Análise multitemporal do índice de vegetação: proposta de indicador do processo de desertificação

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

2.2 Desertificação: discussão conceitual, métodos de estudo, causas e consequências e indicadores ambientais

2.2.2 Análise multitemporal do índice de vegetação: proposta de indicador do processo de desertificação

A vegetação possui características específicas devido à adaptação das espécies ao ambiente onde se desenvolvem. Isso quer dizer que as feições vegetais possuem peculiaridades incomuns para os diferentes biomas e que as análises dos problemas e/ou aspectos da vegetação devem considerar as especificidades ambientais das áreas de estudo. Em muitos locais, a ocorrência de chuvas demarca o período de preparação da terra para a plantação, início do plantio e colheita, o que altera os padrões de densidade da biomassa em determinadas épocas do ano.

No ambiente semiárido do Brasil, as características das formações vegetais e, ainda, grande parte das atividades agropecuárias são sujeitas às condições climáticas, sobretudo em relação à ocorrência das chuvas. Com isso, a investigação da deterioração e degradação da biomassa necessita ocorrer de forma que sejam consideradas as peculiaridades ambientais e processos consequentes das alterações dos padrões da densidade da biomassa. Em consequência de explorações econômicas no semiárido brasileiro, muitos problemas ambientais surgiram e surgem, como é o caso da desertificação. Os impactos decorrentes desse processo possuem uma magnitude notável por ampliar a pobreza humana, pela intensidade da degradação ambiental, pela rede de fatores envolvidos em sua concepção que dificultam o seu reconhecimento, convivência, mitigação e reversão.

A análise da biomassa é de grande relevância para diagnosticar a vulnerabilidade ambiental à desertificação. As feições vegetais são de importância para a manutenção do equilíbrio ambiental:

la importancia y significación de la vegetación en los estudios del medio físico salta a la vista si se tienen en cuenta no solo el papel que desempeña este elemento como asimilador básico de la energía solar, constituyéndose así en productor primario de casi todos los ecosistemas, sino también sus importantes relaciones con el resto de los componentes bióticos y abióticos del medio: la vegetación es establizadora de pendientes, retarda la erosión, influye en la cantidad y calidad del agua, mantiene microclimas locales, filtra la atmosfera, atenúa el ruido, es el hábitat de las especies animales etc. (ESPAÑA, 2004, p. 383)13.

Ao passo que a vegetação não é conservada nem preservada, os processos que têm influência direta no desencadeamento da desertificação são potencializados, como a erosão, variação climática local, redução da infiltração da água no solo, estratificação vegetal e outros. Nimer (1988) afirmou que o desmatamento é a pressão humana mais preocupante sobre o ambiente semiárido pelo fato de ocasionar impactos que alimentam o processo de desertificação. Assim, evidenciou-se que a deterioração das formações vegetais é um fator crucial para ampliação da vulnerabilidade à desertificação.

O estudo da degradação da biomassa pode ser desenvolvido por meio de diversos procedimentos. Neste trabalho, optou-se em realizá-lo pelo índice de vegetação com o propósito de identificar as alterações das áreas recobertas por biomassa ou de solo exposto no intervalo de doze anos (2001 a 2012), haja vista que a exposição do solo às intempéries por um período considerável é um fator contribuinte para a ampliação da vulnerabilidade à desertificação. O índice de vegetação é considerado um indicador de desertificação em diversas literaturas, entre as quais Matallo Junior (2001), Navone e outros (2006), Sales (2003a), Schenkel e Matallo Junior (1999).

A biomassa quantificada pelo índice de vegetação inclui as formações vegetais da caatinga (nas suas mais diversas formas: gramíneas, arbustiva, arborizada, florestada etc.), plantios, pastagens e solos recobertos por vegetação ruderal. A figura 9 representa a

13 A importância e significação da vegetação nos estudos do ambiente físico é indiscutível, se considera o

papel que ela desempenha como assimiladora no solo da energia solar, constituindo-se assim em uma produtora primária de quase todos os ecossistemas, mas também a relevância relacionadas com os demais componentes bióticos e abióticos do ecossistema: a vegetação é estabilizadora da encosta, retarda a erosão, influencia na quantidade e qualidade da água, mantém microclimas locais, filtra a atmosfera, reduz ruído, é habitat de espécies animais etc. (tradução nossa).

importância da análise multitemporal do índice de vegetação nos estudos sobre a desertificação

Figura 9 – Importância do índice de vegetação nas pesquisas sobre a desertificação

Elaboração: Israel de Oliveira Junior, 2014

O índice de vegetação tem uma vasta aplicabilidade no estudo da cobertura vegetal. Ponzoni (2009) indicou que é uma ferramenta potencial para a construção de perfis sazonais e temporais das atividades da vegetação e posteriores comparações dos produtos. Os resultados da aplicação do índice de vegetação devem ser relacionados com outros dados, a exemplo do mapa de uso e cobertura da terra, e aqueles obtidos em levantamentos de campo, pois assegura o reconhecimento dos tipos de alvos identificados, como as classes de cultivos, pastagens, solos expostos, vegetação e outras.

Lobão e Silva (2013) realizaram um estudo sobre o ambiente semiárido da Bahia, no intuito de subsidiar o ordenamento territorial para a região. Neste trabalho, analisou-se o Índice de vegetação da diferença normalizada (normalized difference vegetation index – NDVI) aplicados em imagens MODIS (resolução de 500 m) do período chuvoso e seco entre os anos de 2001 a 2008. Estes produtos tiveram o objetivo de quantificar a biomassa e destacar as áreas de degradação e vulnerabilidade ambiental. As autoras ressaltaram a importância de estudar a biomassa do semiárido baiano considerando o intervalo de tempo

e a sazonalidade climática, para monitorar o ambiente semiárido, com o intuito de identificar as áreas prioritárias do bioma caatinga, os ambientes de vegetação conservada e preservada, degradados e vulneráveis à desertificação.

Na avaliação multitemporal da biomassa para estabelecer a vulnerabilidade à desertificação, devem ser consideradas as características predominantes do ambiente. A fragilidade ambiental, comum na região semiárida, é condicionada pelos aspectos naturais, como o climático (Figura 9). A sazonalidade climática demarca um longo período seco e poucos meses de chuvas (caracterizadas como torrenciais e concentradas) e exige das espécies vegetais presentes no bioma caatinga a adaptação à falta de umidade no solo em um extenso período anual. Essas, por serem em sua maioria caducifólias, permanecem intervalos longos de tempo sem as folhas e o solo fica com pouca proteção.

As investigações acerca do processo de desertificação, tendo como indicador o índice de vegetação, fazem da análise multitemporal e sazonal uma exigência, pela qual são obtidos resultados mais consistentes (Figura 9); o processo de desertificação não pode ser avaliado em apenas um ano ou mesmo em intervalos de tempo pequenos, porque a sua ocorrência está atrelada ao grau de pressão humana exercida sobre o ambiente com diferentes repercussões temporais. Além disso, a falta de água, devido à seca, em determinados anos, no sistema solo-planta-atmosfera, acarreta mudanças importantes no ambiente, que tendem a mascarar os estados de deterioração e de degradação pelo distanciamento da realidade ambiental, como a encontrada no polo regional de Jeremoabo.

A sazonalidade climática reflete, no período das chuvas, a alta densidade da biomassa – pois a vegetação rapidamente recupera as folhagens e as gramíneas recobrem boa parte dos solos – e o inverso no período das estiagens. Se no estudo da desertificação são utilizadas apenas imagens de satélites obtidas na temporada das estiagens para aplicar o índice de vegetação, os resultados podem demonstrar a alta vulnerabilidade à desertificação sem examinar a outra situação ambiental, onde, com a ocorrência das precipitações pluviométricas, as feições vegetais se recompõem e há o início de grande parte do plantio agrícola. No entanto, pela avaliação de ambos os períodos poderão ser comparados os níveis de vulnerabilidade entre eles. Com isso, a análise multitemporal do índice de vegetação é indispensável no estudo do processo em questão, pois:

a vegetação pode mudar abruptamente em curtos períodos de tempo e dentro de pequenas distâncias. Seu estudo permite conhecer, por um lado, as condições naturais do território e, por outro, as influências antrópicas recebidas, podendo-

se inferir, globalmente, a qualidade do meio. Assim quanto mais próxima a vegetação estiver de seus limites de tolerância às variações dos fatores abióticos e bióticos, mais vulnerável será, caso em que a resposta da vegetação pode ser explícita e de permanência mais longa. Em suma permite descrever o estado, ao mesmo tempo, deduzir os vetores de pressão que os produzem (SANTOS, 2004, p. 90).

Santos (2004) indicou que as variações nos padrões da vegetação são influenciadas, quando não determinadas, pela pressão humana sobre o ambiente, configurando um estado e impactos ambientais. Os componentes do meio, sensíveis às mudanças da vegetação, corroboram para o rompimento do equilíbrio ecológico e elevação do nível de degradação ambiental. Esses fatos contribuem para a perda da produtividade agropecuária e, por sua vez, amplia a pobreza, dificulta a sobrevivência das populações locais e tornam complexas as respostas sociais frente aos problemas identificados.

Entre os resultados que podem ser analisados no estudo multitemporal da biomassa, têm-se a verificação do desmatamento, alterações abruptas da cobertura do solo em razão da sazonalidade climática, recuperação da biomassa, localização de solos permanentemente expostos, continuidade de plantios, entre outros, que, agregados, possibilitaram indicar a vulnerabilidade ambiental ao processo de desertificação do polo regional de Jeremoabo (Figura 9).

Sabe-se que a retirada da cobertura vegetal amplia a rusticidade ambiental, pelo fato de expor o solo totalmente às intempéries climáticas e torná-lo mais vulnerável aos diferentes tipos de erosão, devido à estrutura pedológica, declividade do relevo, concentração e torrencialidade das chuvas e técnicas de uso da terra agrícola. A exploração da biomassa pela humanidade sem respeito aos limites de manutenção do equilíbrio ambiental, gera impactos ambientais de diferentes magnitudes e efeitos nos períodos chuvoso e seco.

Estudos demonstraram o número alarmante do desmatamento das formações vegetais da caatinga, com a indicação de que resta muito pouco delas. A área aproximada do bioma caatinga, segundo o IBGE, é de 826.411 km² e se estende pelos estados do Nordeste brasileiro e, ainda, nordeste de Minas Gerais. Das feições vegetais da caatinga, tanto nativa como secundária, cerca de 45,39% foram suprimidas (BRASIL, 2010) para o desencadeamento de atividades agropastoris, construção de estradas, mineração e outras.

Entre os resultados do monitoramento das feições vegetais da caatinga realizado entre os anos de 2002 e 2008 pelo Ministério do Meio Ambiente (MMA) e Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), constataram

a redução da vegetação ocasionada pela pressão humana sobre o ambiente, sendo que os números foram maiores no estado da Bahia (BRASIL, 2010).

A apropriação do ambiente com consequências na biomassa colaborou para aumentar os níveis de vulnerabilidade ambiental à desertificação no Brasil. Por isso, o índice de vegetação como indicador do estado ambiental tem se tornado comum nos estudos do referido processo. Contudo, os resultados da pesquisa, em razão das peculiaridades ambientais regionais, são mais consistentes quando realizada numa escala multitemporal e sazonal, como a que se propõe neste estudo. Assim, para a melhor compreensão da dinâmica natural do meio semiárido, do estado de degradação das feições vegetais – onde as caatingas são predominantes – e da ocorrência dos plantios, é necessária considerar as implicações ambientais resultantes da sazonalidade climática.