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A análise de riscos (Risk analysis) é um processo constituído de três componentes: avaliação do risco, gestão do risco e comunicação do risco, que são

relacionados entre si, mas constituem-se em distintas fases (BUCHANAN e WHITING, 1996).

O processo para cientificamente avaliar a probabilidade de ocorrência e severidade de um conhecido ou potencial efeito adverso à saúde resultante da exposição humana a um perigo microbiológico é denominado avaliação de risco (risk assessment). A definição de avaliação de riscos inclui tanto expressões qualitativas quanto quantitativas. As avaliações qualitativas de riscos são tratamentos descritivos ou categóricos das informações, enquanto as avaliações quantitativas contam pesadamente com o uso de dados numéricos e suposições, fornecendo uma expressão numérica do risco. Em ambos os casos, a ênfase é dada na descrição da incerteza e variabilidade das informações usadas para derivar o risco estimado. Idealmente estudos quantitativos são desejados, todavia, o reconhecimento de que em muitos casos, dados quantitativos para os patógenos não estarão disponíveis, faz com que avaliações qualitativas sejam realizadas, tendo-se como vantagem a possibilidade de posterior incorporação de novas informações aos modelos de riscos à medida que dados forem sendo adquiridos (LAMMERDING, 1997, LAMMERDING, FAZIL e PAOLI, 2001).

A análise de riscos para gestão de perigos determinados pela avaliação de riscos apresenta um triplo propósito: i) determinar os efeitos à saúde associados à uma atividade; ii) comparar estratégias de controle e redução designadas para reduzir estes riscos e iii) ajustar prioridades de gestão. Este processo inclui a determinação da significância de vários riscos, comunicação efetiva dos riscos e tomar decisões, ações e/ou adotar políticas objetivando-se à gestão ou controle dos riscos. Devido à natureza inclusiva da análise de riscos, o processo requer

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microbiologia, tecnologia de alimentos, epidemiologia, economia, medicina veterinária, política pública e cientistas sociais (JAYKUS, 1996).

Segundo o Codex Alimentarius (CODEX, 1999), a avaliação de riscos é um processo cientificamente baseado consistindo das seguintes etapas: (i) identificação do perigo, (ii) caracterização do perigo, (iii) avaliação da exposição e (iv) caracterização do risco.

A primeira das etapas da avaliação de riscos é a determinação do seu objetivo. O estudo só deve ser iniciado com um claro conhecimento (transparência) do propósito da avaliação, já que ele pode definir o escopo da avaliação, estabelecer suposições chaves e parâmetros a serem considerados, além de fornecer um guia em relação ao grau das suposições adicionais a serem feitas (BUCHANAN, 1997).

A identificação do perigo envolve o uso de informações epidemiológicas, biológicas, além de outras juntamente com o conhecimento de especialistas, pertinentes aos agentes biológicos, o alimento, e a presença da doença nos consumidores. Estimativas em relação às quantidades, freqüências, e fontes das agentes biológicos que levam a doença devem ser feitas nesta fase. As fontes dos dados para a identificação do perigo vêm de avaliações do processo, vigilância epidemiológica e investigações epidemiológicas. Muitas vezes, o perigo já é bem estabelecido, particularmente quando o propósito da avaliação do risco é avaliar os riscos relativos associados com mudanças no sistema dos alimentos (processo ou formulação ou outras variações) (BUCHANAN, 1997).

A avaliação da exposição tem por objetivo estimar o real número dos agentes biológicos ingeridos pelos consumidores, o que normalmente requer

considerações da probabilidade de que agentes biológicos estarão presentes nos alimentos, o impacto do processamento e manuseio sobre eles, e a duração e freqüência da exposição. Alguns dos fatores e fontes de informações que podem ser considerados são: padrões de consumo, dados demográficos, práticas de manipulação dos consumidores, distribuições dos agentes biológicos, e modelos preditivos para estimar os efeitos do processamento, comercialização e preparação sobre o patógeno (BUCHANAN, 1997). De acordo com Buchanan e Whiting (1996), o uso dos modelos preditivos permite que o impacto das diferentes etapas do processamento sobre um patógeno (uma limitação dos estudos de avaliação quantitativa de riscos) seja adequadamente estimado. Ao se considerar nos modelos de avaliação de riscos os eventos associados aos patógenos microbianos (crescimento, inativação ou sobrevivência, por exemplo) em cada uma das diferentes operações unitárias, através do uso de modelos preditivos podem-se estimar o impacto do processamento, preparação e estocagem nos níveis dos patógenos num determinado alimento e conseqüentemente o número destes que estarão presentes nos alimentos no momento do consumo (avaliação da exposição). Todavia, é importante considerar-se que a microbiologia apresenta algumas limitações (complexidade dos sistemas biológicos, cuidado na validação dos modelos e na extrapolação além dos limites usados para gerar os modelos) que devem ser observadas quando de usa aplicação nos modelos de avaliação de riscos (McNAB, 1997).

A avaliação de dose resposta, estima à relação quantitativa entre a quantidade do agente biológico consumido e a freqüência e magnitude dos efeitos adversos na população. Tipicamente, avaliações de dose-resposta estimam taxas de infecção, morbidade e mortalidade. As fontes para obtenção destes dados

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podem ser: estudos com voluntários humanos, dados epidemiológicos, dados de animais modelo e estudos clínicos e laboratoriais de determinantes da virulência dos patógenos. Fatores adicionais como seqüelas, infecções secundárias, estado fisiológico de subpopulações específicas e o efeito do substrato (mudanças nas relações dose-resposta associadas com as características do alimento), devem ser considerados. A avaliação da severidade é incluída como parte da avaliação de dose-resposta, pois fornecem meios para avaliação do impacto relativo de um efeito à saúde (BUCHANAN, 1997). A probabilidade de doença é função de fatores complexos associados com o triângulo da doença: o hospedeiro (status imunológico, fisiologia, conteúdo estomacal, idade e doença pré-existente), o patógeno (dose, potencial de crescimento no alimento, potencial de colonização no trato gastrintestinal do hospedeiro, patogenecidade e virulência da espécie, cepa ou sorotipo) e o ambiente (alimento veiculador, tipo de consumo e a presença de microrganismos competidores no alimento e no trato gastrintestinal do hospedeiro) (COLEMAN e MARKS, 1998).

A caracterização do risco é a etapa final da avaliação quantitativa do risco e envolve a integração dos resultados das avaliações de dose-resposta e exposição para fornecer uma estimativa da probabilidade e magnitude do perigo. O risco é uma função da exposição vezes a dose-resposta (Risco= exposição x dose- resposta). Uma parte integral da caracterização do risco é a descrição adequada das incertezas estatísticas e científicas associadas com a avaliação. Como todas as etapas, a caracterização do risco deve ser transparente e a avaliação de risco é sempre mais efetiva quando todas as suposições, resultados, análises e interpretações são adequadamente descritas e discutidas. Além de fornecer as informações necessárias para tomada de decisões dos gestores de riscos, uma

boa caracterização do risco também identifica dados chave atualmente indisponíveis que melhorariam a exatidão de futuras avaliações. Assim, avaliações de riscos para agentes biológicos podem sempre ser aumentadas ou substituídas (melhoradas) quando conhecimento científico ou fatores que influenciam o risco mudem (BUCHANAN, 1997).

A gestão do risco (risk management) é responsável por ponderar políticas alternativas na luz dos resultados da avaliação quantitativa do risco e, se requerido, selecionar e implementar opções de controles apropriados (LAMMERDING, 1997). Ela é o componente do processo de análise de riscos representado pelos setores governamental e produtivo de alimentos e na prática é o início do processo de análise de riscos (PAS, 2004). Desta forma, um estudo de avaliação de risco somente é útil quando claramente responde à questão da gestão do risco (LAMMERDING, FAZIL e PAOLI, 2001). A gestão de riscos é estruturada da seguinte forma (FAO, 1997): i) análise da avaliação de riscos; ii) avaliação das opções para gestão do risco; iii) implementação das opções de gestão do risco e iv) monitoramento e revisão das ações implementadas.

A troca de informações e opiniões a respeito do risco e dos fatores relacionados de uma maneira interativa entre assessores de riscos, gestores de riscos e outras partes interessadas é conhecida como comunicação do risco (risk communication) (LAMMERDING, 1997, FAO, 1997). A importância da comunicação do risco se deve ao fato de que antes que uma análise de riscos formal seja iniciada, as informações adequadas ao caso devem ser obtidas das partes interessadas para preparar o perfil do risco (PAS, 2004).

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3.14.1. Interação entre os Elementos da Análise de Riscos:

O indivíduo responsável pela gestão de risco (gestor de risco) é quem identifica qual o perigo em questão, enquanto o assessor de risco é quem disponibiliza as informações científicas a respeito do perigo selecionado. O assessor de risco determina o nível de exposição ao perigo, tanto através da análise microbiológica dos produtos como pela descrição completa do seu processo de fabricação, desde a matéria-prima até o consumo final, incluindo processamento, armazenamento, transporte e etc.. Assim, os níveis do perigo em diferentes cenários podem ser estimados, bem como a probabilidade da população ser exposta a ele. Para a estimativa final do risco, o assessor de risco caracteriza o risco através da combinação dos dados de exposição ao perigo com os dados em relação à dose-resposta e gravidade dos efeitos, tendo como resultado a estimativa da probabilidade da enfermidade causada pelo perigo em questão, no alimento em consideração, para um consumidor específico. Após a conclusão da avaliação de riscos, tem-se a gestão do risco, onde o gestor de riscos leva em conta os dados da avaliação de riscos e verifica possíveis ações para gerir o risco (boas práticas de fabricação, APPCC) e implementa estas ações e monitora seu funcionamento para se certificar de que elas estão de fato controlado o perigo. Esta avaliação é feita não somente levando-se em conta os dados científicos, mas também questões sociais, éticas, econômicas de maneira a decidir quais ações são necessárias e quais ações são possíveis (OLIVEIRA e FRANCO, 2003). Tendo-se em vista que poucos recursos estão normalmente disponíveis para os gestores de riscos, a integração de análise de riscos e análise econômica pode auxiliá-los a tomar a melhor decisão, baseando-se no seu custo benefício (MORALES e McDOWEEL, 1998). O comunicador de risco comunica

aos interessados (consumidores, indústria e governos) qual a gravidade do problema, quando existente (OLIVEIRA e FRANCO, 2003).

3.14.2. Importância e Limitações da Análise de Riscos:

A habilidade de conduzir estudos de avaliação quantitativa de riscos mudará a forma como órgãos governamentais e a indústria de alimentos conduzem o comércio internacional, já que o maior impacto inicial da ferramenta seja provavelmente nas áreas de equivalência e harmonização. Além disso, a ferramenta irá enfatizar que nenhum alimento é livre de riscos e que cada etapa do processo de produção do campo à mesa tem um papel para garantir a segurança dos alimentos (ICMSF, 1998). Assim, a importância da avaliação de riscos está não somente na habilidade de estimarem-se os riscos de contaminantes dos alimentos e ingredientes, mas também no seu uso como uma estrutura para organizar a gestão do risco baseado em níveis de tolerância em diferentes alimentos (LUPIEN e KENNY, 1998).

Além disso, por analisar os riscos desde a obtenção da matéria-prima até o consumo, a ferramenta melhora o entendimento de pontos chave nos quais informações críticas são necessárias, permitindo sua atualização e melhoria e constantes (LAMMERDING, 1997).

Apesar das melhorias nos últimos anos no campo da microbiologia preditiva, computação, microbiologia analítica e epidemiologia terem permitido o desenvolvimento e impulsionado os estudos de modelagem quantitativa de riscos, a técnica ainda apresenta algumas limitações: i) é uma ferramenta que auxilia a tomada de decisões, mas não substitui julgamentos adequados; ii) decisões

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pobres oriundas do uso inapropriado ou má interpretação desta ferramenta, impediriam a aceitação do processo de avaliação de riscos; iii) falta de treinamento dos cientistas ligados à segurança de alimentos nas técnicas de modelagem de riscos; iv) como a avaliação de riscos é baseada na identificação e caracterização dos perigos, ela não pode predizer riscos à saúde humana associados com novos patógenos, para os quais não há dados epidemiológicos, clínicos e microbiológicos. No entanto, a ferramenta pode ser considerada uma forma sistemática de se investigar as informações prioritárias requeridas em diferentes estágios do processo produtivo (ICMSF, 1998).

3.15. Modelagem de Monte Carlo e as Distribuições Estatísticas para