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CAPÍTULO 5 — Análise de Performances com o PRISMA

5.3 Análise Videográfica Comparada

Fazemos aqui nesta seção uma análise comparativa tomando por base o resultado gravado em vídeo. As performances foram gravadas consecutivamente e o conteúdo de uma performance poderia influenciar a próxima. Reiteramos que o PRISMA possui um dispositivo de memória que

armazena as últimas sequências gravadas em tempo real. O objetivo foi verificar como a trajetória dos três intérpretes foi conectada pelo PRISMA, mesmo sem terem nenhuma informação da performance do anterior. Os últimos sons gravados pelo intérprete anterior teriam o potencial de influenciar o próximo. Mas este tipo de interação dependeria da forma como os intérpretes seguissem o comportamento sonoro do PRISMA.

Desta forma, assistindo ao vídeo das três performances na sequência em que foram gravadas, pudemos observar fatores importantes do comportamento sistêmico desenvolvido pela interação dos intérpretes com o PRISMA. As análises foram feitas a partir do material videográfico gravado e editado posteriormente pelo pesquisador. Os cortes foram feitos apenas com o intuito de separar as performances individuais, sem omitir ou completar o vídeo. As marcas de tempo que se seguem aos comentários a seguir estão relacionadas à marcação de tempo individual relativa a cada performance.

O Intérprete 01 inicia sua performance com poucos elementos (0.00 a 4.40)38 e em dinâmicas predominantemente piano e faz uma trajetória de dinâmica passando por dinâmicas fortes e com um grande número de ataques, tornando a sonoridade e o comportamento do computador nitidamente mais complexo (4.40 a 8.02). No final da performance, o Intérprete 01 utiliza poucos ataques e dinâmicas piano (10.19 a 11.41). Notamos que o padrão de comportamento do computador se modificou nos diferentes momentos da performance e houve uma curva de complexidade, que culminou com muitos ataques seguidos de um gradual decrescendo de dinâmicas e complexidade.

Quando é iniciada a performance do Intérprete 02, notamos que o comportamento do computador é semelhante ao que estava sendo realizado no final da performance do Intérprete 01. Podemos observar que o canhão de luz indica o mesmo setup de percussão e repete os processamentos sonoros que já estavam sendo utilizados anteriormente (0.00 a 2.58). Essa retomada do mesmo comportamento em diferentes performances ocorre em virtude do PRISMA armazenar os últimos sons produzidos em tempo real pelo intérprete. Esse

procedimento foi apresentado e discutido no terceiro capítulo na seção 3.2.1 Critérios de Interação entre Timbres e Cores.

O Intérprete 02 passa a seguir esse comportamento do computador e, apesar de alguns pequenos trechos fortes e mais complexos, a performance de aproximadamente 16 minutos fica em sua grande maioria focada em poucas notas e dinâmica piano (2.59 a 16.11). O Intérprete 02, ao buscar manter o padrão de sonoridade que estava sendo produzido em tempo real pelo computador, acabou modificando pouco as sonoridades, os processamentos do PRISMA, o seu comportamento e, em contrapartida, o comportamento do computador.

Já na performance do Intérprete 03 vemos claramente uma mudança súbita no comportamento sonoro do sistema. Podemos observar que, já no início da performance, o computador retoma uma sonoridade complexa e forte como da primeira improvisação (0.00 a 1.01). Além do vídeo, pudemos observar ao analisar as respostas do Intérprete 03 que ele se posiciona dizendo que não buscou interagir com as sonoridades do sistema no início de sua performance. Assistindo ao vídeo, podemos observar que o Intérprete 03 já inicia sua performance em dinâmica forte e com muita complexidade rítmica (0.00 a 3.00). Esse comportamento é mantido durante um longo período, fazendo com que o comportamento do computador se modificasse completamente. Observamos que o computador passa a executar trechos mais complexos e utilizar dinâmicas mais fortes (4.07 a 6.02).

Em alguns momentos, em decorrência daquilo que está armazenado na memória da performance anterior, o computador utiliza alguns trechos menos complexos e em dinâmica piano (6.02 a 6.21), mas rapidamente esses trechos são substituídos por outros mais complexos e com dinâmicas mais intensas. O Intérprete 03 continuou a improvisar trechos em dinâmica forte e ritmicamente complexos. No final da performance, o Intérprete 03 acaba seguindo as sonoridades do computador pois, nesse momento, o número de ataques é grande e, provavelmente, a distribuição de probabilidade utilizada pelo computador é a descrita pelo Critério 6 da Tabela 7 do Capítulo 3. Apenas reiterando a ideia: se o intérprete produz muitos ataques, o Critério 6 aumenta a probabilidade de ouvir a

repetição da sua própria improvisação. No momento de maior complexidade, a identidade sonora do sistema é justamente a transformação em tempo real da memória de trabalho que armazena os trechos gravados em tempo real.

Da análise comparada dos três vídeos, aprendemos os seguintes fatos: a) É possível desenvolver uma performance na forma de arco com começo, clímax e final, como foi realizada pelo Intérprete 01;

b) A memória de trabalho do PRISMA pode influenciar o comportamento do intérprete desde que ele seja suscetível e permeável a essa interação, como fez o Intérprete 02;

c) Em situações de alta complexidade, o PRISMA passa a reagir como uma cópia sonora do intérprete, como foi observado na performance do Intérprete 03;

d) No PRISMA, o intérprete e o computador estabelecem um jogo sonoro de onde derivam-se novas sonoridades advindas dos encontros que homem e máquina realizam durante a performance. Esse jogo foi observado nas três performances.

A relação entre encontros e jogos já foi destacada por Debrun (1996b, pg.13) como uma forma de descrever a auto-organização em sistemas complexos: “Há auto-organização cada vez que, a partir de um encontro entre elementos realmente (e não analiticamente) distintos, desenvolve-se uma interação sem supervisor (ou sem supervisor onipotente) – interação essa que leva eventualmente à constituição de uma "forma" ou à reestruturação, por "complexificação", de uma forma já existente.” (Debrun, 1996b, pg. 13).

Poderíamos ampliar ainda mais a análise comparada se pudéssemos ter acesso a todos os dados produzidos pelo computador em tempo real. Verificamos que seria muito útil para relacionar a análise videográfica com o comportamento expresso no questionário, o desenvolvimento de um arquivo de

log do sistema39 onde, então, todas as mudanças de parâmetros estariam gravadas num arquivo texto. Tal procedimento deverá ser um dos próximos desenvolvimentos do PRISMA.