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Desde o início do programa, Angola avançou significativamente no sentido do equilíbrio da sua posição externa: a excessiva sobrevalorização construída durante o período de taxa de câmbio fixa foi eliminada, os passivos externos líquidos continuam a ser administráveis e a adequação das reservas de divisas tem vindo a melhorar. A transição para um regime cambial mais flexível tem sido um factor importante para que isso aconteça e criou um amortecedor relevante contra choques externos. Pelas metodologias padrão, considera-se que a posição externa é consideravelmente mais forte do que o justificado pelos fundamentos para 2019, com uma subvalorização estimada do kwanza superior a 15%. O choque da COVID-19 e o colapso dos preços do petróleo são uma fonte de grande incerteza para o futuro, mas o novo regime cambial deverá desempenhar um importante papel estabilizador1.

1. A conta corrente (CC) de Angola manteve um excedente substancial em 2019. Apesar da

evolução adversa do sector petrolífero – queda de 8% nos preços e 6,5% na produção de petróleo – a balança comercial (em percentagem do PIB) pouco mudou em relação a 2018, uma vez que as importações também permaneceram moderadas, reflectindo principalmente o papel de absorção de choques da taxa de câmbio. Numa

perspectiva de longo prazo, o reforço da conta corrente nos últimos anos reflecte sobretudo a

recuperação dos preços do petróleo desde a queda de 2015–17, juntamente com uma diminuição gradual do défice dos serviços – coerente com o declínio da produção petrolífera (Figura 1 do texto).

2. As vulnerabilidades dos fluxos de capital são limitadas. Embora a perda temporária de

acesso ao mercado limite o financiamento externo, o cenário de base de Angola não prevê o recurso ao mercado de Eurobond nos próximos quatro anos. Em relação a outros tipos de fluxos de capitais, os fluxos de investimento de carteira em acções e títulos de dívida privada são limitados, sendo que o grosso dos fluxos financeiros se refere a aplicações de longo prazo do sector público no estrangeiro, financiamentos de projectos e actividades do sector bancário de facilitação do comércio internacional.

1 Preparado por Ioannis Halikias.

Figura 1 do texto. Angola: Componentes do saldo da conta corrente

3. As fortes flutuações da taxa de câmbio efectiva real (TCER) nos últimos anos refletem sobretudo mudanças na política cambial (Figura 2 do texto). É possível distinguir vários

subperíodos a este respeito2.

Até ao final de 2017, Angola manteve, de facto, uma taxa de câmbio fixa em relação ao dólar. A paridade fixa era apoiada por uma forte intervenção, o que resultou em grandes perdas de reservas devido ao declínio dos preços do petróleo a partir de 2015. Para além da intervenção, as autoridades impuseram um extenso racionamento de divisas baseado numa “lista de prioridades”. A consequência foi uma enorme sobrevalorização da taxa de câmbio até ao final de 2017.

Perante o esgotamento das reservas, a paridade foi abandonada no início de 2018. Ao longo dos três primeiros trimestres desse ano, permitiu-se uma rápida depreciação do kwanza, com a lista de prioridades a ser simplificada e, finalmente, abandonada. Em virtude de uma maior flexibilidade cambial e da menor intervenção, a avaliação do corpo técnico por altura do pedido do programa de Financiamento Ampliado do FMI foi que a sobrevalorização do kwanza tinha sido praticamente corrigida até ao final de 2018, com as metodologias “EBA- lite” a sugerirem uma taxa de câmbio bastante coerente com os fundamentos (Relatório do

FMI n.º 18/370).

A partir do quarto

trimestre de 2018 e até ao primeiro semestre de 2019, ocorreu uma nova

mudança da política cambial. O ajustamento da taxa de câmbio nominal passou a ser mais restrito, com uma forte intervenção que fez com que o país ficasse muito aquém do critério de desempenho para o final de junho de 2019 sobre as reservas internacionais líquidas

(RIL). A pausa na depreciação da TCER (e a sua ligeira apreciação), numa altura em que a baixa dos preços do petróleo pressupunham uma taxa de câmbio de equilíbrio em queda, resultou no ressurgimento gradual da sobrevalorização expressiva do kwanza, refletida no aumento do prémio do mercado paralelo em relação ao oficial de 20% para mais de 40%. Figura 2 do texto. Angola: Taxa de câmbio efetiva real, 2014–20

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No início do quarto trimestre de 2019 houve outra grande mudança no regime cambial. Passou-se a permitir a flutuação do kwanza – com intervenções muito limitadas – guiada pela adopção, com o apoio do FMI, de um orçamento de intervenção cambial coerente com as metas de RIL do programa. O resultado foi uma depreciação acentuada em outubro, até que o câmbio viesse a se estabilizar perto do nível de equilíbrio do mercado, evidenciado pela redução do prémio do mercado paralelo em relação ao oficial para menos de 20%. • Com o colapso dos preços mundiais do petróleo em março de 2020, na sequência da

pandemia da COVID-19, a TCER começou novamente a depreciar-se acentuadamente, uma tendência coerente com uma taxa de câmbio de equilíbrio depreciada.

4. As RIL aumentaram para USD 11,3 mil milhões no final de 2019, o equivalente a

8,5 meses de importações potenciais de bens e serviços, o que evidencia um sólido desempenho das políticas no âmbito do programa, não obstante o movimento adverso no sector petrolífero, mas também fatores pontuais – em especial a emissão de Eurobonds no valor de USD 1,5 mil milhões. O aumento das RIL elevou as

reservas internacionais brutas (RIB) para USD 17,3 mil milhões, ou 98% da métrica ARA do FMI para a avaliação da adequação das reservas (Figura 3 do texto). Projecta-se que o ajustamento contínuo das políticas ao abrigo do programa, conjugado com o aumento do acesso proposto, o

financiamento de outras instituições financeiras internacionais, apoiado igualmente pela

reestruturação da dívida pelo G-20 e pelos grandes credores de Angola, eleve as RIB para um nível ligeiramente inferior a 110% da métrica ARA até ao final do programa – embora um pouco abaixo do limiar de 120% considerado relevante para os grandes exportadores de matérias-primas.

Figura 3 do texto. Angola: Adequação das reservas internacionais, 2017–21

5. Apesar da acumulação de RIB, a posição de investimento internacional líquido (PIIL) de Angola deteriorou-se um pouco (em

percentagem do PIB), passando para -35% do PIB no final de 2019 (Figura 4 do texto). Esta deterioração reflecte plenamente um efeito denominador –

redução real da PIIL em termos de dólares dos EUA. As

tendências de 2019 para a PIIL foram mais uma vez dominadas pelo aumento da dívida externa soberana, reflectindo a emissão

contínua de Eurobonds. No geral, o corpo técnico do FMI continua a considerar que as

vulnerabilidades de Angola são fáceis de gerir, com risco limitado de reversão dos fluxos de capital. Os fluxos do investimento de carteira em acções e título de dívida privada são limitados, sendo que o grosso dos fluxos financeiros se refere a aplicações de longo prazo do sector público no

estrangeiro, financiamentos de projectos e actividades do sector bancário de facilitação do comércio internacional. Sem a emissão de Eurobonds prevista para os próximos anos, prevê-se que a PIIL de Angola se estabilize e haja uma melhoria da sua composição, com o investimento direto estrangeiro a representar uma parcela cada vez maior do passivo externo.

6. Após a mudança para um regime cambial mais flexível, a posição externa de Angola passou a ser considerada mais forte do que o justificado pelos fundamentos. Com base nos

resultados da balança de pagamentos para 2019, os cálculos da metodologia EBA-lite sugerem que a sobrevalorização, que tinha ressurgido em meados de 2019, foi corrigida antes do final do ano, sendo que actualmente o kwanza está moderadamente subavaliado. Isto talvez seja o resultado da correcção excessiva que ocorreu na sequência da liberalização cambial em meados de outubro de 2019. Especificamente, a metodologia EBA-lite da conta corrente aponta para uma subvalorização ligeiramente superior a 15% (Tabela 1 do texto), sendo que a metodologia da TCER sugere um quadro semelhante (Tabela 2 do texto).

Figura 4 do texto. Angola: Posição de investimento internacional líquido, 2005–19

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Tabela 1 do texto. Angola: Metodologia da conta corrente, 2019 (Em %)

Fonte: Autoridades angolanas e cálculos do corpo técnico.

Tabela 2 do texto. Angola: Metodologia EBA-Lite – TCER

(Nas unidades indicadas)

Fonte: Autoridades angolanas e cálculos do corpo técnico.

7. Em termos futuros, o recente colapso dos preços do petróleo, na sequência da

pandemia da COVID-19, criou um novo período de incertezas. Embora se preveja um défice da

conta corrente e a diminuição das RIB em 2020, a taxa de câmbio mais flexível deverá desempenhar o seu papel enquanto amortecedor de choques. Até ao momento, a evolução cambial desde a queda do preço do petróleo parece coerente com a taxa de câmbio de equilíbrio depreciada: em abril de 2020, a depreciação da TCER atingiu quase 35% em termos homólogos e o diferencial entre o mercado oficial e o paralelo tem-se mantido dentro de um intervalo de 6–30%, o que sugere que o kwanza se manteve próximo das percepções do mercado sobre o novo equilíbrio. Porém, a recente volatilidade extrema dos preços do petróleo e os riscos globais para os quadros macro e de políticas exigem um acompanhamento atento.

Anexo V. Transição para uma Taxa de Câmbio Determinada pelo