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Antecedentes históricos: da implantação do Plano Real à crise institucional de

4 O Estado Brasileiro da Crise

4.1 Antecedentes históricos: da implantação do Plano Real à crise institucional de

irresponsabilidade monetária, fiscal e, consequentemente, de crises econômicas. Desde os tempos do Brasil colônia, não havia grande preocupação com o planejamento econômico, provocando distorções na busca de respostas rápidas para problemas econômicos complexos. O financiamento dos crescentes gastos públicos, atrelado ao endividamento público, por exemplo, eram resolvidos com a emissão de moeda, simplesmente. Prática constante que deu origem a uma das maiores crises de crédito e inflacionária, enfrentada pelo país, o encilhamento, no início do período republicano. Nessa época, o estouro de bolha econômica, gerada pelo volume de negociações infladas euforicamente no mercado, resultou em crises, falências e inflação altíssima. Essa última uma infeliz constante na realidade econômica nacional.

Marcelo de Paiva Abreu, em 1989, se referindo à situação econômica do país, alertava sobre o histórico brasileiro de crises: ―O centenário da república está sendo comemorado em meio ao que é provavelmente a maior crise da história econômica do Brasil independente‖237

. A república iniciou-se em meio a uma grande crise inflacionária e completou seu centenário, no início do período de redemocratização do país, em meio a pior crise inflacionária da história. ―Nesses cem anos do encilhamento à hiperinflação o país aprendeu, dolorosamente, a lição de que a ordem monetária é a única base do progresso duradouro‖238

.

Durante esse primeiro centenário da república brasileira, passamos por períodos de revolução239, várias moedas e planos econômicos falidos. Nesse processo, a inflação se alimentou e cresceu à galope, impulsionada pelas crises econômicas, com o plano de fundo da instabilidade política e institucional do país, somada a grotescos retrocessos sociais, gerados pelos planos econômicos mirabolantes240.

237 ABREU, Marcelo de Paiva. Inflação, estagnação e ruptura:1961-1964. In: ABREU, Marcelo de Paiva (Org.).

A ordem do progresso: cem anos de política econômica republicana, 1889-1989. Rio de Janeiro: Campus, 1989, p. 19.

238

LEITÃO, Miriam. Saga brasileira: a longa luta de um povo por sua moeda. 4ed. Rio de Janeiro: Record, 2011, p. 19.

239 Revolução de 1930 e, por que não dizer em 1964, com o golpe militar diante da ruptura abrupta do poder

político e da ordem social pela qual passou o país.

240 Exemplo disso foi a criação da correção monetária, pelo governo militar, que reajustava os preços pela

A partir da década de 1980, a inflação só fez aumentar, em razão das grandes desvalorizações da moeda, em 1979 e 1983, e da ineficácia dos remédios econômicos utilizados em seu enfrentamento. A instabilidade e dificuldade no enfrentamento eram tamanhas que, entre o início de 1986, ano de implantação do Cruzado, até o fim de 1994, ano do Real, o país teve nove Ministros da Fazenda241.

Os efeitos da hiperinflação vão muito além dos preços, prejudicando a economia brasileira como um todo e gerando perdas e abismos sociais irreparáveis. Gustavo Franco faz a leitura do fenômeno sob a perspectiva da economia globalizada que estava se formando e as perdas de oportunidade do processo inflacionário brasileiro:

A perda de importância do Brasil no cenário global do investimento internacional ao longo da década de 80 é muito significativa. [...] o Brasil cai de sétimo a decimo quarto no ranking dos países receptores de investimento direto. [...] a mensagem é clara: o Brasil perdeu valiosas oportunidades nos anos 80, mercê de fatores internos, num período em que o investimento direto internacional experimentava um

boom sem precedentes242.

A reforma monetária que resultou na implantação do plano real foi o início do plano de estabilização econômica do país, criando a condição necessária para o controle da inflação. Entretanto, inicialmente, foi eliminada a indeterminação das taxas de inflação. Seria necessário criar uma âncora nominal e todas as tentativas nesse sentido já teriam fracassado. Após eventos econômicos traumáticos, tais como a hiperinflação, o congelamento de preços e o violento confisco das poupanças, durante a implantação do Plano Collor, a busca pela solidez de uma moeda nacional passou a representar bem mais que uma melhora nos dados econômicos do país.

Na era das moedas multinacionais, parece até primitivo que o Brasil lute tanto para ter a sua própria, sua única e exclusiva moeda, que atravesse décadas perseguindo o mesmo sono e instale no mesmo panteão dos símbolos nacionais. O que vale um real de tão curta história perto de um marco alemão arquivado no auge de sua solidez e glória?243

zeros da moeda, e denominando-a de Cruzeiro Novo. Mas a medida garantia somente os proprietários e não os trabalhadores, que tinham a remuneração corrigida pela projeção inflacionária, sempre superada. Essa ilusão fez com que, nos anos, 1970, a inflação voltasse a subir.

241

Dílson Funaro, Luiz Carlos Bresser Pereira, Mailson da Nóbrega, Zélia Cardoso de Mello, Marcílio Marques Moreira, Gustavo Krause, Paulo Haddad, Eliseu Resende, Fernando Henrique Cardoso, Rubens Ricopero e Ciro Gomes.

242 FRANCO, Gustavo Henrique Barroso. O desafio brasileiro: ensaios sobre desenvolvimento, globalização e

moeda. Editora 34, p. 34.

243 LEITÃO, Miriam. Saga brasileira: a longa luta de um povo por sua moeda. 4ed. Rio de Janeiro: Record,

Contudo, um dos aspectos que mais interessam é a questão da insegurança jurídica das relações econômicas travadas antes da implantação do Plano Real, sobretudo em relação aos contratos. A hiperinflação do período chegava a inviabilizar a realização de negócios em determinados tipos de mercado, em especial aqueles submetidos à maior indexação dos preços. Afinal, ―a segurança jurídica é o mínimo de previsibilidade necessária que o Estado de Direito deve oferecer a todo cidadão, a respeito de quais são as normas de convivência que ele deve observar e com base nas quais pode travar relações jurídicas válidas e eficazes‖ 244

. Sob a regência do princípio da segurança jurídica, as regras de conteúdo econômico, notadamente, são prescritas visando reger relações futuras e vincular os agentes, com base nas expectativas criadas a partir das ―regras do jogo‖, estipuladas em lei.

Os contratos firmados sob a vigência de determinados índices inflacionários (menores) tornavam inviável o seu cumprimento, até mesmo, em curto prazo de tempo, pois no momento da prestação seus custos poderiam ter duplicado ou se multiplicado pela aplicação dos novos índices inflacionários (maiores) em relação aos seus insumos. Desse modo, fica clara a importância da segurança jurídica a economia que sempre foi, se não explícita, pelo menos implicitamente reconhecida pelos economistas245246.

O Plano Real, implantado em 1994, deveria representar não apenas mais uma reforma monetária, mas um plano de estabilização econômica do país, que foi implantado a partir de fases, de modo a assegurar, exatamente, maior segurança jurídica dos negócios firmados no país e maior credibilidade entre agentes econômicos de mercado.

O Real foi criado com a aprovação da Medida Provisória nº 434, de 27 de fevereiro de 1994, que criou a URV. Posteriormente, após uma série de Medidas Provisórias, a Medida Provisória nº 1.027, 20 de junho de 1995, foi convertida na Lei nº 9.069, de 29 de

244

NICOLAU, Jr., M. Segurança jurídica e certeza do direito: realidade ou utopia num Estado democrático de direito? Apud COELHO, E. Administração pública e o princípio da segurança jurídica. Revista Consultor Jurídico, mar. 2005. Disponível em: www.met.gov.br/legis/consultoria_jurídica/artigos/ordem_juridica.htm Acesso em: 21.06.2017.

245

Existem registros de que Adam Smith lecionou Law and Jurisprudence, em Edimburgo, antes de se tornar professor na Universidade de Glasgow, onde escreveria suas obras mais conhecidas (Cf. PINHEIRO, Armando Castellar. Segurança jurídica, crescimento e exportações. Texto para discussão do Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas – Ipea.

Disponível em: http://www.en.ipea.gov.br/agencia/images/stories/PDFs/TDs/td_1125.pdf Acesso em:

21.06.2017.

246 Entretanto, o detalhamento, a formalização e a mensuração da influência da segurança jurídica sobre o

domínio econômico só tiveram início recentemente, a partir dos ferramentais desenvolvidos pela teoria econômica neoinstitucionalista e o movimento de Law and Economics. Ainda que utilizando abordagens distintas, ambos enfatizam o papel da segurança jurídica na promoção do investimento e da eficiência econômica, seja reduzindo os custos de transação, seja estimulando uma alocação eficiente de recursos (Cf. PINHEIRO, Armando Castellar. Segurança jurídica, crescimento e exportações. Texto para discussão do

Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas – Ipea, p. 4. Disponível em:

junho de 1995. Fato é que, a partir de 1º de julho de 1994, com a realização da reforma monetária, o Real passou a ser a moeda oficial do país, até os dias de hoje. O Ministro da Fazenda, na época de lançamento do plano, era Fernando Henrique Cardoso, durante o governo de Itamar Franco, a quem foram atribuídos seus créditos pelo plano real, que lhe renderam a presidência do país, entre 1995-2002.

O Real, como se sabe, definiu soluções muito particulares para problemas típicos, e complexos, de qualquer programa de estabilização: coordenação decisória, desindexação, equilíbrio contratual, administração da remonetização e da liquidez, e gerência de demanda, para dizer alguns. Não foram implementadas soluções coercitivas do tipo congelamento de preços ou confisco temporário de ativos e, em boa medida, o processo de estabilização envolveu a definição de incentivos econômicos naturais para escolhas racionais exercidas voluntariamente e das quais resultaria um empreendimento social que elevaria o bem estar coletivo. Nada tiveram de simples os expedientes que levaram a esses resultados247.

O plano de implantação do Real deu-se em duas fases. Inicialmente, todos os preços, inclusive o câmbio, deveriam ser expressos em Unidade Real de Valor – URV, de modo que todos os contratos e salários fossem reajustados com base nos índices governamentais, divulgados diariamente, com base em uma cesta de índices de inflação. Entretanto, o meio de pagamento continuava sendo o Cruzeiro Real (moeda corrente à época). Apenas quando completado o primeiro ciclo e todos os preços estivessem expressos em URV, ocorreria a segunda fase da reforma monetária. Nesse momento, o cruzeiro real perdeu sua função monetária de instrumento de troca, sendo criadas as respectivas notas substitutivas no meio circulante, com o nome de Real. Somente, a partir de então, é que o Real passou a ser utilizado com a totalidade de funções da moeda, ou seja, como instrumento de troca, reserva de valor, unidade de conta e padrão de pagamentos diferidos248.

No dia da reforma monetária a URV valia R$2,75 por dólar americano e a taxa cambial, que também era essa, foi fixada em R$1,00 por dólar americano, em câmbio fixo. A partir disso, os preços relativos poderiam ser alterados, mas deixaria de ter qualquer relação com os índices de preços.

Com a intenção de conter os níveis de preços, após a mudança monetária, o Brasil adotou o regime de crawling peg, um câmbio deslizante, como âncora cambial. Nesse

247

FRANCO, Gustavo. O plano real e a URV fundamentos da reforma monetária brasileira de 1993-94. p. 1-2. Disponível em: http://www.economia.puc-rio.br/gfranco/URV_e_bibliografia.pdf Acesso em: 19.06.2017.

sistema, houve uma ―trajetória de depreciação do câmbio nominal a uma taxa prefixada, funcionando como uma âncora nominal dos preços dos bens trandables‖249. Além disso, para o sucesso do plano, a taxa básica de juros foi colocada em níveis reais iniciais muito elevados e a expansão do crédito controlada.

A âncora cambial não se sustentou e precisou ser abandonada em 1999250251, dando origem ao regime econômico de âncora nominal, fundamentada no regime de metas de inflação, junto à fixação de metas para os superávits primeiros, voltadas para reduzir gradualmente a dívida líquida do setor público consolidado, em proporção ao PIB; e o câmbio flutuante252.

O Plano Real, com relação ao sistema financeiro nacional, permitiu a adoção de uma série de medidas econômicas e legais para uma ampla reestruturação institucional e uma revisão dos instrumentos reguladores, com ênfase na promoção do ―desenvolvimento equilibrado do país‖, de modo ―a servir aos interesses da coletividade, em todas as partes que o compõem‖, conforme determinado no art. 192 da Constituição.

A reestruturação253 e fortalecimento das instituições econômicas e financeiras do país, a partir das medidas preconizadas pelo novo plano econômico gerou a necessidade de transformações no funcionamento do sistema financeiro, como um todo. O progressivo aumento na demanda por crédito no país, as perdas de ganhos inflacionários e a crescente globalização de mercados pressionaram as mudanças, que foram atentamente supervisionadas pelos entes reguladores, sobretudo pelo Banco Central, que ganhou destaque nesse cenário.

249 PASTORE, Affonso Celso. Inflação e crises: o papel da moeda. Rio de Janeiro: Elsevier, 2015, p. 139.

250

A política econômica de elevação da taxa de juros foi capaz de conter os efeitos da crise tequila e da crise asiática, mas não foi capaz de conter a fuga de capitais proveniente da crise de credibilidade gerada no mercado nacional, pelos elevados déficits públicos, ao lado do câmbio real fortemente valorizado e aos efeitos da crise russa.

251 ―Em meados de 1998, a crise alcançou a Rússia, que vivia um processo mal sucedido de transição do

socialismo ao capitalismo. A moratória decretada em agosto, em plena crise de governabilidade e de desvalorização do rublo, levou ao retraimento das aplicações e linhas de crédito colocadas nos países emergentes, abrindo uma crise de confiança que ameaçou deslanchar uma crise sistêmica. A nova onda teve repercussões imediatas em outras regiões, em especial no Brasil, que assistiu a saídas maciças de capitais de curto prazo e a uma diminuição do volume de crédito voluntário oferecido pelas instituições privadas‖ (ALMEIDA, Paulo Roberto de. O Brasil e as crises financeiras internacionais, 1929-2001. Revista Cena Internacional. Ano 3. n.2, dez. 2001, p. 97.).

252

O valor do câmbio passa a ser determinado pelo próprio mercado, através da oferta e demanda, sem interferência direta governamental.

253 Nessa reestruturação, o Banco Central passou a atuar com ênfase no estabelecimento de regras prudenciais

sólidas para o funcionamento de instituições financeiras, conforme determina a Lei nº 4.595/1964, que atribui ao Banco Central a competência para aperfeiçoamento das instituições e dos instrumentos financeiros, com vistas a conferir maior eficiência no sistema da pagamentos e à mobilização de recursos, zelando pela liquidez e solvência das instituições financeiras.

O papel do Banco Central no saneamento do sistema financeiro ficou ainda mais nítido, com a crise de confiança enfrentada em 2002, na transição entre o governo de Fernando Henrique Cardoso e o governo Lula. Havia grande preocupação entre investidores internacionais e o Fundo Monetário Internacional – FMI254 com um possível default255 da dívida. A preocupação com as contas públicas e a responsabilidade fiscal se tornaram uma constante e os questionamentos em relação aos compromissos nacionais com a dívida pública não cessavam, mesmo diante da recém-aprovada Lei de Responsabilidade Fiscal256 e da negociação da dívida pelos Estados. ―As dúvidas sobre a postura de Lula quanto à austeridade fiscal contraíam a demanda de ativos brasileiros por parte dos estrangeiros, levando simultaneamente ao aumento dos prêmios de risco e à depreciação cambial, abrindo a possibilidade de uma crise‖257

.

Era fundamental reduzir a relação entre o crescimento da dívida em relação ao PIB, aumentando o superávit primário, com o objetivo de evitar que as dúvidas sobre o compromisso do governo com a sustentabilidade da dívida pudessem levar à fuga de capitais, que provocaria crescimento ainda maior da dívida dolarizada, consequentemente, elevando o risco de calote, fechando um ciclo vicioso de crise.

Após o período de dúvidas na transição do governo de Fernando Henrique para o governo Lula, no qual ambos cooperaram, foram definidos os princípios de política econômica para transição, firmados em um acordo com o FMI. Mediante a aceitação e cumprimento de acordo pelos dois governos, as metas de superávits primários passaram a ser cumpridas, o mercado foi se acalmando e a economia reagindo ao choque de 2002. A política fiscal cortou gastos em 2003 e elevou o superávit primário, valorizando a moeda. Ao Banco Central, coube controlar os efeitos de crise sobre a inflação, controlando-a, e retomar as metas de inflação, que precisaram ser claramente reformuladas para 2004.

254 O Brasil tinha acordo firmado com o FMI e ―pelo pacote de ajuda [...], o Brasil se habilitou a receber cerca de

US$ 20 bilhões no espaço de três meses e até 32 bilhões no prazo de um ano, do FMI e de membros do BIS, demais de US$ 9 bilhões das instituições multilaterais de crédito (BIRD e BID). Ele se comprometeu a manter a disciplina monetária e preservou intacta sua política cambial, baseada num regime flexível de desvalorizações dentro de uma banda de flutuação administrada pelo Banco Central. O regime cambial seria, em janeiro de 1999, radicalmente alterado em sua forma de funcionamento, no decorrer da crise do modelo implantado em julho de 1994 e ajustado em abril de 1995, adotando-se a partir de então um regime de flutuação. [...]Em outros termos, parte dos recursos foi liberada para integrar as reservas do Brasil, independentemente da necessidade de cobertura de obrigações cambiais imediatas. As etapas mais significativas do relacionamento do Brasil com o FMI no período recente (1992-2001)‖ (ALMEIDA, Paulo Roberto de. O Brasil e as crises financeiras internacionais, 1929-2001. Revista Cena Internacional. Ano 3. n.2, dez. 2001, p. 99.).

255 Significa que a dívida poderia deixar de ser paga, ou que ocorressem alterações unilaterais no contrato que

afetassem o cumprimento das contraprestações acordadas inicialmente.

256 Lei Complementar nº101, de 4 de maio de 2000.

Em 2008, quando sobreveio a crise econômica mundial, por contágio da crise econômica americana, a situação econômica do país era promissora. Havia a crença de que o Brasil seria um dos países em desenvolvimento com maior crescimento econômico e com certa ―estabilidade‖ para se investir. Ainda em 2003, o banco Golden Sachs apontava o país como um dos integrantes do grupo dos emergentes BRICs (Brasil, Rússia, Índia e China) que iria dominar a economia mundial. Isso com base na condução regular da política econômica, desde a década de 1990; na, então, recente descoberta e exploração de petróleo da camada pré-sal; e na elevação das exportações e preços das commodities brasileiras. De fato, conforme gráfico a seguir258, a trajetória gráfica do PIB brasileiro obteve crescimento e alta em, praticamente, todos anos de 2003 à 2014, sofrendo queda drástica somente em meados de 2008, com a eclosão da grande crise mundial.

A recuperação da crise de confiança de 2002 veio através da ―nova matriz de política econômica‖ baseada em taxa de juros baixa, câmbio depreciado e política fiscal para redução da dívida pública. Contudo, como o ambiente político era favorável ao governo, o grau de investimento tinha sido atingido e a dívida líquida do setor público era relativamente mais baixa, o governo sentiu-se confortável em abandonar a redução da dívida pública como pilar econômico e trabalhar com superávits menores, nos últimos anos. O grande problema foi a prática da chamada ―contabilidade criativa‖, que escondia o real tamanho dos superávits primários.

Uma característica marcante da política econômica da era lula foi o ativismo econômico259, sendo que as reduções de impostos e os financiamentos concedidos por bancos públicos260 não beneficiaram todos os setores produtivos, apenas alguns setores específicos foram contemplados, tais como o setor automobilístico, através de recursos provenientes do Tesouro Nacional261. Havia uma constante busca pelo ―paradoxo da credibilidade‖262, no qual a política econômica governamental tinha forte tendência de fazer as escolhas convenientes ao mercado, na busca de aceitação credibilidade, ainda mais, na primeira fase do governo Lula. Os bons ânimos de políticas econômicas, como essa, mascararam o déficit estrutural econômico do país, que deixou de investir adequadamente em infraestrutura básica e, através de errôneos mecanismos de indução econômica, levaram ao enfraquecimento da economia, com baixas taxas de industrialização e de riqueza, ao longo dos últimos anos.

Entre 1980 e 2003 continuamos estagnados: até o início da década de 1990 com alta inflação, e, a partir daí, com os ajustes neoliberais, com baixa inflação, mas com alto desemprego. De 2003 a 2008, vivemos a ilusão da falsa recuperação do processo de desenvolvimento, graças ao chamado "efeito China". Mas a ilusão se desfez já desde meados de