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ANTECEDENTES SOCIO-HISTÓRICOS E IDEOPOLÍTICOS NA ESTEIRA DA QUESTÃO SOCIAL

PARTE I – O INEVITÁVEL ENCONTRO COM O MARXISMO

1 ANTECEDENTES SOCIO-HISTÓRICOS E IDEOPOLÍTICOS NA ESTEIRA DA QUESTÃO SOCIAL

Quando o pensamento de Marx polarizou o movimento político dos trabalhadores organizados contra a ordem capitalista nos anos 40 do sec. XIX, momento em que Marx e Engels se envolveram com a mobilização dos comunistas (e nunca mais perderam o elo político de continuidade desse movimento), durante as revoltas de 1848 decorrentes da guerra franco -prussiana que desestabilizou a sociedade francesa, o capitalismo industrial estava chegando no seu ápice. O modo de produção capitalista já havia formado a classe trabalhadora subjugadando-a a super exploração do trabalho, em troca de salários irrisórios e condições de trabalho extremamente precárias. O empobrecimento das condições da vida social dos trabalhadores, àquele momento, já se tornara o cenário não apenas do interior das indústr ias, mas também, dos recantos de moradia e vivência cotidiana das famílias operárias. Dinâmica de realidade social perfeitamente ilustrada na narrativa feita por Victor Hugo em 1862, em Os Miseráveis, cujas relações sociais de sofrimento, injustiça social, super exploração do trabalho e precárias condições de vida humana tecem a trama da luta de classes que já se fazia presente na sociedade parisiense (e francesa de modo geral) dos meados do sec. XIX, retratando o abismo social conflituoso estabelecido entre a classe trabalhadora e o Estado capitalista, chamado de questão social.

Santos (2012) explica que a questão social surge sob a égide do pleno desenvolvime nto do modo de produção capitalista, na dura contradição da indústria têxtil inglesa, quando ao tornar-se o vetor econômico da europa, passa a causar os impactos sociais no desenvolvime nto urbano e nas condições sociais dos trabalhadores, tornando “visível o processo acentuado de pauperização da classe trabalhadora na Inglaterra e fora dela” (p. 35), consumindo o trabalho de crianças e mulheres com extensas horas de trabalho, “altas taxas de mortalidade por exaustão do trabalho [...] desprezo pelas condições de vida operária [...] habitações em locais insalub res, doenças, fome, baixos salários.” (p. 37). Momento sintomático do início do capitalismo com todas as suas características manifestas, estabilizadas por um movimento consistente e acelerado representadas pela categórica “posse privada dos meios de produção por uma classe e a exploração da força de trabalho daqueles que não o detêm” (MARTINELLI, 2008, p. 31), relação social que além de separar o trabalhador e subordiná-lo aos meios de produção,

determina o regime de acumulação vivificante do capital, conforme mostra a seguinte passagem:

O novo modo de produção exigia a concentração dos trabalhadores em um espaço específico: a fábrica, a indústria, locus da concentração da produção, tendo em vista a expansão do capital. A máquina a vapor e o tear mecânico tornaram-se os verdadeiros deuses dos capitalistas, e a fábrica, o seu templo. Aos seus novos deuses não hesitavam em louvar continuamente, brindando -os com renovadas oferendas, mantendo-os alimentados da energia vital que roubavam dos trabalhadore s, homens, mulheres, jovens, adultos e até mesmo crianças, expropriando -os de sua força de trabalho. O seu templo – a moderna indústria – permanecia sempre cheio, porém não de adoradores, mas de operários, cuja vida era cotidianamente sacrificada em nome da acumulação do capital e da produção da mais -valia. (MARTINELLI, 2008, p. 36).

Aparentemente como um fato puramente econômico, a opressão capitalista sobre o operariado também tem seu caráter político e social. Para o capital manter o domínio sobre o trabalho necessitava também do poder de governo sobre a sociedade e, principalmente a nova classe social que estava formando – a classe trabalhadora. Pois, uma vez sob a sujeição coletiva, os trabalhadores começam a evidenciar formas de resistência e defesa do aviltamento e agonia travada na relação com seus abusadores, os capitalistas. Nesse movimento contraditório, os trabalhadores se reconhecem e passam a se organizar como classe para si (PAULO NETTO, 2006), identificando seus papéis de produção e sustentação do capital e/ou de revolucionár ios, com poder social (político e econômico) de destruição desse regime opressor da força de trabalho.

Martinelli (2008) e Paulo Netto (2006) apontam que a organização política do proletariado é uma consequência própria das relações sociais empreendidas pelo modo de produção capitalista com os trabalhadores. Relações essas que o homogeneízam em uma classe social notadamente em oposição a classe burguesa dominante, estabelecendo, a partir daí, o antagonismo de classes que Marx denominou de luta de classes. E que Paulo Netto (2006) definiu ser marcado pelos eventos violentos de 1848, ano em que Marx e Engels entregam o Manifesto Comunista à Liga dos Justos a pedido da maior associação de trabalhadores comunistas na Europa daquele momento.

Para Coggiola (2005)10, o fato de o Manifesto Comunista ter sido uma encomenda feita pelos líderes da Liga dos Justos já é a grande prova do envolvimento pessoal, prático e teórico de Marx com os operários que demonstravam consciência de classe e se reivindicavam os comunistas daquela época, haja vista que na Europa daqueles dias já fervilhava a atmosfera de revolução. Diz o historiador que o lançamento do “Manifesto coincidiu com o início da

10 COGGIOLA, Osvaldo. 150 anos do Manifesto Comunista. In: MARX, Karl; ENGELS, Friedrich. Manifesto Comunista. Organização e Introdução Osvaldo Coggiola. São Paulo: Boitempo Editorial, 2005.

esperada revolução”11. E que Marx e Engels gozavam de grande admiração e confiança política por parte dos operários associados à associação comunista.

A Liga dos Justos era composta por trabalhadores, principalmente artesãos, alemães exilados, alocados em Londres, Bruxelas e Paris e em algumas partes da Alemanha. Não se tratava de proletários modernos trabalhando em grandes fábricas mecanizadas . No entanto, eles foram atraídos pelas concepções de Marx e Engels acerca da natureza da sociedade capitalista moderna. A Liga dos Justos trazia em sua bandeira o slogan “Todos os homens são irmãos!”. Quando abraçou as concepções de Marx e tornou -se a Liga dos Comunistas, adotou o chamado do Manifesto: “Proletários de todos os países, uni-vos”.12

Sob o véu dessa interlocução política proletária, Marx e Engels se filiam a Liga dos Justos em 1847 e passam a debater dentro do movimento um processo de radicalização dos preceitos. A partir daí a associação se fortalece na proposta de destruição da sociedade burguesa, do antagonismo de classes e a fundação de uma sociedade comunista, sem classes nem propriedade privada. É quanto a Marx e Engels, se consolidam como dirigentes operários. Para Löwy, (2010)13 o engajamento de Marx e Engels na luta dos trabalhadores europeus também inicia antes de 1848, estando representada pela sua obra elaborada em três textos produzidos de 1844 a 1850, centrados na luta de classes. No prefácio do exemplar Luta de Classes na Alemanha, o sociólogo analisa os três escritos voltados para situações de injust iça social vivenciadas pelos trabalhadores. No primeiro, Glosas críticas. “O rei da Prússia e a reforma social. De um prussiano”, elaborado em agosto de 1844, Marx faz sua primeira crítica sobre a opressão feita aos tecelões da Silésia por Guilherme IV, no governo prussiano. Löwy comenta que além de se tratar de um trabalho digno de legitimação teórica, também é o primeiro alerta de Marx para a força política e revolucionária do proletariado e sua vocação para o socialismo, aspecto nunca percebido pelos teóricos da época, principalmente pelo seu interlocutor do texto que produz, para o qual a revolta dos tecelões da Silésia não passava de um simples movimento social14. Nesse aspecto, Löwy destaca:

Segundo Marx, o levante silesiano de junho de 1844 era dirigido não só contra as máquinas – como revoltas similares na França e na Inglaterra (o assim chamado “ludismo”) – mas diretamente contra o poder dos patrões e dos banqueiros, assim como contra a propriedade privada burguesa. O resultado político foi que o levante acabou por reforçar “o servilismo e a impotência” da burguesia. Até aqui a rebelião

11 COGGIOLA, Osvaldo. In: MARX; ENGELS, 2005. p. 8.

12 Ibid., p. 10.

13 LÖWY, Michael. Prefácio. In: MARX, Karl; ENGELS, Friedrich. Luta de classes na Alemanha. Apresentação de Michael Löwy; tradução de Nélio Schneider. São Paulo: Boitempo, 2010.

14 Vale ressaltar que Marx e Engels sempre se dirigiram seus escritos para os operários, por eles reconhecidos como os sujeitos revolucionários. Jamais se preocuparam com os profissionais liberais e trabalhadores assalariados.

dos tecelões parece confirmar as intuições de Marx em seu artigo sobre a filosofia do direito de Hegel15.

Sobre os demais feitos de Marx, norteados pela preocupação e comprometimento com o movimento dos operários foram realizados em 1848 e 1850, como documentos de recomendações diretas de Marx para o Partido Comunista. As Reivindicações do Partido Comunista da Alemanha, escrito em março de 1848, durante o início do processo revolucioná r io ocorrido na Alemanha é um trabalho que evidencia a importância da atuação dos comunis tas na luta de classes que estava em movimento. Já a Mensagem do Comitê Central à Liga dos Comunistas, escrito em 1850 trata de recomendações dos dirigentes Marx e Engels ao movimento revolucionário alemão.

Sobre a produção de março de 1848, logo após a publicação do Manifesto Comunis ta, Löwy (2010) comenta ser “um testemunho que tinha, para os dois lutadores, a intervenção dos comunistas no processo de luta de classes revolucionária que se iniciava ”16. Depois, analisando o conteúdo da publicação, acrescenta que:

Trata-se de um programa que busca articular dialeticamente reivindicações democrático-burguesas, antifeudais, e outras, próprias às classes populares e mesmo à classe operária. Em sua dinâmica geral é um programa democrático-revolucionário , mas que vai bem além dos limites de uma simples transformação do regime político, incluindo medidas pouco compatíveis com a propriedade privada burguesa”.17

Em seguida o sociólogo marxista observa que esse texto de Marx, não somente revela seu desejo revolucionário de derrubada da sociedade semifeudal alemã, com a aliança da burguesia, mas, sobretudo, a grande ilusão em creditar à burguesia sua participação na frente democrática e antifeudal que propunha.

Do artigo Mensagem do Comitê Central à Liga [dos Comunistas] Löwy destaca que se trata de uma evidência do compromisso de Marx e Engels, cuja dinâmica de vida estava completamente voltada para o processo revolucionário que se agitava na Europa. “Essa modesta circular interna é na verdade um dos documentos políticos mais importantes escritos pelos autores do manifesto”18, uma vez que ele traz, pela primeira vez, na obra de Marx um delineamento das revoluções ocorridas no século XX, fato que significa para Löwy, o lançamento da ideia da revolução permanente.

Outro intérprete dos escritos de Marx e Engels, Paulo Netto (2006) também defende a tese de que o amadurecimento do proletariado europeu ocorre nas lutas de 1848, quando o

15 Ibid., p. 12.

16 LÖWY, Michael. In: MARX; ENGELS, 2010. p. 14.

17 Ibid., p. 15.

proletariado se promove em classe para si, depois de ter passado por vários fracassos causados por equívocos em relação as contradições da dominação capitalista sobre os trabalhadores.

As amargas derrotas sofridas pela classe operária (e, de fato, pelo conjunto dos trabalhadores, a que se s eguiu pelo menos uma década de refluxo do seu moviment o em escala euro-continental, destruindo todo um acervo de ilusões em relação quer às possibilidades da revolução segundo a tradição blanquista, quer aos arcos de aliança então viáveis – tais derrotas constituíram o material histórico a partir do qual, prática e politicamente o proletariado começa a construir a sua identidade como protagonista histórico-social consciente. É nos anos sessenta que o refluxo mencionado se vê revertido – como o indica a fundação da Associação Internacional dos Trabalhadores. Inicia-se, então um largo processo, que só estará consolidado às vésperas da Primeira Guerra Mundial, pelo qual a classe operária urbana vai elaborar os seus dois principais instrumentos de intervenção sócio-política, o sindicato e o partido proletário. (PAULO NETTO, 2006, p. 55).

Organizado em torno dos sindicatos e dos partidos políticos de esquerda, o proletariado responde duramente às práticas de contenção dos espaços de trabalho, cuja consequência direta é o massivo desemprego, e a desvalorização humilhante do salário, que assola a pobreza extrema. Devidamente capacitado, política e idelogicamente, o proletariado responde de forma contundente com táticas e estratégias diversas tanto no território europeu quanto nos Estados Unidos.

A resposta do movimento operário não vem apenas na forma de grandes greves e mobilizações (recordem-se, como marcos: a greve de 1878, na Inglaterra; as mobilizações operárias de 1886, em Chicago; a greve de 1980, na Alemanh a; a revolução russa de 1905); vem plasmada no auge associativo -sindical já mencionado: trata-se de um movimento sindical que responde menos à crise do que ao caráter

novo tanto da emergente organização monopólica do capitalismo – que se engendra

também na estratégia burguesa de atenuar as formas tradicionais da crise – quanto da própria classe operária – já basicamente urbanizada e vinculada aos setores dinâmicos da ‘segunda revolução industrial’. (PAULO NETTO, 2006, p. 57).

O que nosso crítico marxista quer dizer é que, inegavelmente esse discernimento da classe operária está estreitamente relacionado à militância de Marx pela libertação do operariado do subjugo capitalista, cujo ativismo embora não tenha conseguido garantir a unidade do pensamento revolucionário entre o movimento operário perante os recursos poderosos da classe capitalista na dinâmica da luta de classes, conseguiu acumular conhecimento e experiência teórico-prática para mostrar sua força social e política de embate ideopolítico e objetivo contra o capital. Para Paulo Netto (2011)19 a parceria de Marx com o operariado produziu não apenas a obra do pensador revolucionário anticapitalista, mas a madurez do proletariado.

19 Aula 1 DVD 1 Curso o Método em Marx com José Paulo Netto. João Vicente Nascimento Lins. Publicado em 22 de set de 2011. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=tTHp53Uv_8g&t=1249s >. Acesso em: mar. 2016.

O compromisso de Marx com a classe operária, não é um compromisso apenas de natureza política e ideológica. É evidente que Marx foi um dirigente revolucionário, que participou de processos revolucionários “à quente”. Pensem na aventura alemã de 1848 – 1849. Marx foi um dirigente operário. Pensem na criação da Associação Internacional dos Trabalhadores em 1864. Pensem no protagonismo de Marx em defesa da Comuna de Paris – daquele famoso “assalto ao céu” em 1870 -1871. É evidente que há um compromisso de Marx com os trabalhadores, mas evidentemente com o proletariado urbano-industrial. Mas essa vinculação não é uma vinculação externa, não é uma opção pessoal de Marx, apenas. Ela é também uma vinculação interna, um nexo constitutivo da sua obra20.

Contudo, essa relação orgânica entre o pensamento de Marx com os movime ntos políticos e sociais das sociedades europeias da sua época cuja peculiaridade evoca o aspecto revolucionário da sua obra produziu o histórico e complexo problema das divisões políticoideológicas, de princípios, concepções, táticas e estratégias no movimento operário já daquele tempo. Fato que Paulo Netto21 (2011) ressalta com maestria quando cita que “o movimento socialista não coincide necessariamente com o movimento operário. As fronteiras do movimento operário são muito mais amplas que as do movimento socialista”. A título de ilustração o autor conta que os primeiros socialistas não pensaram a sociedade socialista com a presença do proletariado, fato que evidencia o caráter burguês da proposta socialista, completamente avesso a proposta comunista, que nasce no seio do operariado. O que leva Paulo Netto (2011) a enfatizar que foi Marx quem fez “a primeira confluência entre essas duas grandes tradições22”: a comunista e a socialista. As duas doutrinas políticas e ideológicas dominantes da modernidade inseridas no movimento operário e nos movimentos sociais e intrinsecame nte articuladas a luta de classes sociais, antagônicas, constituintes da sociedade burguesa, se remetem à época do jovem Marx e vêm provocando a existência das variadas tendências que conformam o movimento dos trabalhadores do século XIX até hoje. Notadamente, marcados pela defesa e/ou extinção da propriedade privada, o socialismo e o comunismo representam as concepções que protege a manutenção ou a derrubada do sistema capitalista. No caso do socialismo, a proteção é definida legalmente, exercida através de políticas sociais. Por isso ao socialismo se profere o reformismo, enquanto ao comunismo a revolução.

Em meio ao movimento político do proletariado socialista e comunista no embate ao regime capitalista, sua aproximação com Marx e Engels, e a ordem social capitalista em ação, o serviço social surge nos acontecimentos da sociedade burguesa europeia como recurso oficial/institucional patrocinado pela burguesia, apoiado pela Igreja Católica, e sob a gestão do

20 Aula 1 DVD 1 Curso o Método em Marx com José Paulo Netto. João Vicente Nascimento Lins. Publicado em 22 de set de 2011. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=tTHp53Uv_8g&t=1249s >. Acesso em: mar. 2016.

21 Ibid.

Estado burguês, com o específico e profissional papel de mediar as relações de exploração e opressão entre o capital e o trabalho em meio ao caos social já manifesto pela questão social.

A princípio, até a segunda metade do século XIX , como foi visto, a questão social se resumia no pauperismo, como bem expõe Paulo Netto (2004), vivenciado pelos trabalhadores em meio as situações de desemprego, fome e demais privações das necessidades básicas humanas, se diferenciando singularmente das classes sociais devidamente amparadas pelo Estado e pelo arranjo econômico da época. “Com efeito, a pauperização (neste caso, absoluta) massiva da população trabalhadora, constituiu o aspecto mais imediato da instauração do capitalismo em seu estágio industrial-concorrencial.” (PAULO NETTO, 2004, p. 42). Contudo, os empobrecidos reagiram veementemente aos embargos de seus direitos humanos e sociais, fato que surpreendeu os capitalistas que não os consideravam como seres humanos, ao se perceberem diante de movimentos políticos intensamente revoltosos e reivindicatór ios, “configurando uma ameaça real às instituições sociais existentes,” (PAULO NETTO, 2004, p. 43), colocando a ordem burguesa na iminência de entrar em desordem. Foi a partir dessa tensão “que o pauperismo designou-se como questão social” como explica Paulo Netto (2004, p. 43).

Os embates políticos do proletariado culminaram na experiência das revoltas proletárias de 1848, simbolizadas pela ocorrida em Paris, mas que se alastraram por toda a França, colocando em primeiro plano a garantia da ordem burguesa e transformando a questão social num evento próprio das relações sociais capitalistas, enquanto um problema inerente da sociedade capitalista, moderna, explicado pela visão fortemente conservadora. Conservadorismo que passou a divulgar a questão social como desigualdade social, vulnerabilidade social, fragilidade econômica, injustiça social e outros termos até hoje comumente lidos nos trabalhos de assistentes sociais, mas que fazem parte do repertório ideológico e politicamente conservador do Serviço Social.

E foi carregado da consciência burguesa conservadora, e religiosa, que o assistente social entra na vida social dos trabalhadores, na segunda metade do sec. XIX (MARTINELLI, 2008), a favor da manutenção da ordem burguesa, na relação contraditória entre a política marxista dos trabalhadores com a classe capitalista, nas condições sociais em que estavam organizados em torno do socialismo, motivados pela super exploração em que se encontrava m. Nas condições sociais objetivas, notadamente envoltas de miséria e privações dos direitos sociais básicos, o proletariado passa a conviver com mecanismos atenuantes das implicações da questão social na acumulação capitalista e sua garantia de lucros. Aplicando as medidas sociais inspiradas nos filantropos, o Estado burguês operava a intervenção social com esse proletariado sujeito as ondulações da questão social emergida concomitante com a classe

trabalhadora nos meados do século XIX, por meio de conciliações de classe feitas com os grupos reformistas, em torno das reivindicações dos direitos sociais dos trabalhadores ao Estado, que vão aparecer com o surgimento do Serviço Social, profissão instituída pelo Estado capitalista especificamente para operar com as manifestações da questão social que afetavam diretamente a vida produtiva do proletariado.

Obviamente que foi golpeando os trabalhadores que o Serviço Social entrou na vida social dos setores populacionais maltratados pelo modo de produção capitalista, preenchendo aquele espaço político contraditório evidenciado (acima) na relação entre o movime nto proletário e a burguesia dominante, contradição posta pelas fraquezas e equívocos do proletariado diante da sedução burguesa, que resultou na cisão do movimento nos dois grandes blocos políticos dos trabalhadores: a socialdemocracia e o comunismo23. E no vácuo dessa relação inconsistente, em direção oposta ao movimento marxista, com papel ideopolítico bem definido, o Serviço Social entra na sociedade burguesa pela mão do Estado, a partir do final do século XIX já com a dupla função de executar as políticas sociais na Europa e Estados Unidos,