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3 MATERIAL E MÉTODOS

4.2 Análise histomorfométrica

4.3.2 Anticorpo monoclonal anti CD

O anticorpo CD34 apresentou marcação positiva, com imunorreatividade de hemácias e endotélio vascular com frequência menor de marcação destes nas amostras injetadas com PSS do grupo de 21 dias, em comparação com as amostras injetadas com veneno de Bothrops

jararaca e Bothrops leucurus do mesmo período (Figura 18).

A análise imuno-histoquímica das amostras de pele do grupo de 45 dias injetadas com os venenos de Bothrops e marcadas com anticorpo CD34 apresentou marcação positiva, com imunorreatividade de hemácias e endotélio. As amostras de PSS apresentaram padrão de marcação reduzido em relação aos grupos com veneno (Figura 19). Neste grupo observou-se a maior diferença após a quantificação do endotélio vascular com um aumento de 403% do número de vasos sanguíneos marcados na comparação entre o controle e a amostra injetada com veneno de B. jararaca

O anticorpo CD34 apresentou marcação positiva, com imunorreatividade de endotélio, com marcação mais frequente nas amostras de veneno de Bothrops do grupo de 60 dias analisadas, com destaque para a marcação de células da derme em área de proliferação fibrosa observada em amostra de B. leucurus (Figura 20).

Figura 18: Análise imuno-histoquímica dos efeitos dos venenos botrópicos 21 dias após a injeção intradérmica. O tecido foi retirado após 21 dias e foi marcado com anticorpo CD34. As imagens

Figura 19: Análise imuno-histoquímica dos efeitos dos venenos botrópicos 45 dias após a injeção intradérmica na pele. O tecido foi retirado após 45 dias e foi marcado com anticorpo CD34. As

imagens retratam o corte histológico dos grupos analisados. As barras representam 20 µm.

Figura 20: Análise imuno-histoquímica dos efeitos dos venenos botrópicos 60 dias após a injeção intradérmica. O tecido foi retirado após 60 dias e foi marcado com anticorpo CD34. As imagens

5 DISCUSSÃO

Os resultados obtidos neste trabalho indicam que os venenos de Bothrops jararaca e

Bothrops leucurus são capazes de induzir dano tecidual local agudo, observado no primeiro

dia do envenenamento. Além disso, as alterações evidenciadas pela análise histopatológica demonstram o perfil diferenciado destas peçonhas e a sua capacidade de produzir efeitos de caráter crônico como a angiogênese e a saponificação do tecido adiposo persistente mesmo após 60 dias de aplicação intradérmica do veneno. A origem destas alterações é extremamente complexa, uma vez que são induzidas pela ação combinada de diferentes toxinas presentes nos venenos, tais como proteases, fatores hemorrágicos, metaloproteinases e fosfolipases (SGRIGNOLLI, 2011; CECILIO et al., 2013).

A injúria local observada nos tecidos estudados, ou seja, bolhas, edema, dermonecrose e hemorragia são consequências graves do acidente botrópico (GUTIÉRREZ et al, 2006). O efeito local produzido após a penetração do veneno ocasiona o surgimento de lesões que possivelmente estão relacionadas à produção de mediadores inflamatórios liberados em resposta aos componentes presentes no veneno (KAMIGUTI, 1988; KAWANO et al., 2002; NUNES et al., 2011 ).

De acordo com os resultados deste estudo foi possível reproduzir os sinais de dano tecidual local agudo descritos na literatura (ARAÚJO, 2005; JIMÉNEZ et al., 2008). Nas 24 horas iniciais, após o envenenamento, foi identificada resposta aguda demonstrada pela análise histopatológica, com padrão diferenciado nos grupos específicos.

A urgência necessária no tratamento com o soro antiofídico pode ser indício importante na explicação para escassez de estudos na fase crônica, sendo os trabalhos experimentais com camundongos e toxina ofídica representados basicamente pela fase aguda do envenenamento (JIMÉNEZ et al., 2008; VONK et al., 2011). Os soros antiofídicos são imprescindíveis no processo de neutralização das alterações sistêmicas da mordedura por serpentes. Entretanto, a neutralização dos efeitos locais é dificultada, diante do contexto emergencial em que se desenvolve o dano tissular e do tempo decorrido da inoculação da peçonha até a chegada da vítima ao centro de saúde com soroterapia disponível. Como

conseqüência, seqüelas permanentes se desenvolvem em grande número de pacientes (WARREL, 2010).

A falta de investigações mais específicas se torna ainda mais contundente quando se avalia a ausência de informações disponíveis sobre a patogênese das alterações induzidas pelo veneno de serpentes na pele, em detrimento da sua relevância clínica. Jiménez e colaboradores (2008) determinaram um modelo de avaliação dos efeitos agudos da dermonecrose induzida pela peçonha de Bothrops asper através da análise das alterações patológicas observadas na orelha de camundongos sob efeito da metaloproteinase BaP1 isolada do veneno desta serpente, que foi capaz de induzir edema, hemorragia e necrose local.

Os resultados obtidos neste estudo para o período de 72 h da injeção local do veneno foram consistentes com algumas evidências encontradas na literatura, como o que foi descrito por Jímenez (2008), embora com maior variabilidade qualitativa das reações em virtude da comparação abordar duas peçonhas distintas. Em todos os casos houve aumento progressivo do edema e do infiltrado inflamatório, sendo que no grupo injetado com B. jararaca observou-se proeminente hemorragia com áreas de congestão vascular, assim como hemácias permeando a região dérmica, ausentes no grupo injetado com B.leucurus. A hemorragia local induzida pelo veneno é uma manifestação bastante frequente observada nos animais envenenados e é atribuída à atividade hemorrágica das metaloproteinases, principalmente da classe P-III, presentes no veneno da B. jararaca, como a jararagina, capazes de provocar lesões na membrana basal dos capilares e vênulas (PAINE et al., 1992; ASEGA, et al., 2014).

Sabe-se que a jararagina é uma potente metaloproteinase presente no veneno de B.

jararaca capaz de promover o sangramento local ou sistêmico. Em outro estudo foi

demonstrado a sua capacidade de promover a inflamação e a inibição da agregação plaquetária induzida pelo colágeno (KAMIGUTI, 1988; GARCÍA et al., 2004). Tem sido proposto que o rápido dano causado in vivo nas células endoteliais pelas metaloproteinases é resultado de forças hemodinâmicas sobre a vasculatura que distende a integridade dessas células após lesões na membrana basal, consequência da clivagem proteolítica de seus componentes (MURAYAMA et al, 1997; ASEGA et al., 2014). Outra toxina do veneno de B.

uma lectina do tipo C, capaz de inibir com eficiência a trombina e, prejudicar a ativação plaquetária (ZINGALI et al., 1993; MONTEIRO, 2005)

Em todos os camundongos dos grupos injetados com veneno observou-se necrose extensa, comprometendo inclusive os anexos, sendo este aspecto observado com maior extensão no grupo de B. leucurus. Todos os animais seguiram invariavelmente para a cicatrização, com reepitelização das áreas necróticas, em um período que variou de 14 a 21 dias, resultado que está de acordo com os resultados descritos por Araújo e colaboradores (2005).

A análise microscópica da amostra de tecido 14 dias após a inoculação do veneno de

B. leucurus, revelou em cortes histológicos de animais distintos, áreas com septo de tecido

conjuntivo no meio da hipoderme, ainda, com características de inflamação persistente. A avaliação das amostras do grupo que recebeu veneno de B. jararaca no mesmo período apresentou cicatriz intra-adiposa com septo espessado e fibrose septal, sendo estas evidências de destruição do tecido adiposo. A partir do 21º dia, evidenciou-se a proliferação fibrosa da derme e recuperação parcial dos anexos em todos os grupos estudados, os animais do grupo controle apresentaram recuperação completa e os grupos com veneno mostraram recuperação parcial da área lesada. As maiores diferenças observadas, em termos de interferências agudas nos tecidos analisados, entre os grupos de B. jararaca e B. leucurus foram a maior interferência na hemostasia com B. jararaca, enquanto que leucurus provocou necrose e inflamação mais intensas.

A enzima da família das fosfolipases Bl-PLA2 isolada a partir do veneno de Bothrops

leucurus e caracterizada por Nunes e colaboradores (2011) apresentou atividade pró-

inflamatória e miotóxica após a injeção intramuscular em camundongos. A análise histopatológica das alterações encontradas nos tecidos injetados com veneno de B. leucurus apresentou características encontradas em outros estudos com amostras de tecido de origem diferente, sendo uma das principais a capacidade de ativação leucocitária (SERRANO et al., 1999; MARANGONI, 2013).

A análise de colágeno total do grupos de 45 e 60 dias revelou perfil de redução do percentual de colágeno total nas amostras de pele injetadas com as peçonhas botrópicas em comparação com o controle. Estes resultados podem estar relacionados com processo de

cicatrização tecidual, tendo como agravante o processo de saponificação do tecido adiposo ainda em curso. De acordo com Hopkinson e colaboradores (2014) a regeneração tecidual é a substituição completa e restauração da massa tissular adulta com função e arquitetura normais, enquanto que a reparação envolve a migração de fibroblastos ao sítio da ferida, formação de tecido de granulação e deposição de colágeno em padrão desorganizado, com formação de tecido cicatricial, dessa forma pode-se suspeitar que as peçonhas de B. jararaca e B. leucurus tenham provocado desorganização na distribuição do colágeno total.

Durante a cicatrização de feridas cutâneas, ocorrem extensas interações entre as células da epiderme e da derme (HOPKINSON et al., 2014). Essas interações são importantes para coordenar corretamente as diferentes fases da cicatrização de feridas, iniciando com a inflamação e continuando com a renovação de tecidos conjuntivo, proliferação de queratinócitos, migração do tecido de granulação, ativação de fibroblastos e formação de cicatrizes (DAGNINO, 2014). Embora a cicatrização de feridas na pele ocorra de forma eficiente na maioria dos indivíduos, o tecido regenerado geralmente não é completamente recuperado. Em alguns indivíduos, a cicatrização excessiva pode comprometer a função tecidual, enquanto que em outros casos os defeitos no processo de reparação podem resultar no desenvolvimento de feridas crônicas (DAGNINO, 2014). Mello e colaboradores (2000) destacaram a dificuldade de cicatrização e alterações com características neoplásicas, após evolução crônica, no sítio de inoculação do veneno botrópico em paciente acidentado.

A análise histomorfométrica revelou que na fase aguda a epiderme dos grupos injetados tanto com o veneno de B. jararaca quanto com de B. leucurus estava consideravelmente mais espessa do que a dos camundongos do grupo controle As alterações observadas na fase aguda sugerem que iniciou-se um de processo proliferação celular e que a degeneração da epiderme pode ter ocorrido nas primeiras horas após a injeção do veneno. É sabido que os venenos de serpentes desencadeiam efeito local alguns minutos após a sua inoculação, como por exemplo na lesão muscular observada após o acidente com B. jararaca (PATRÃO-NETO et al., 2013). Nos experimentos realizados neste trabalho, após decorridos 60 dias a espessura da epiderme e da derme retornaram aos padrões de normalidade.

Nesta situação não pode-se afirmar que a função deste tecido tenha sido reconstituída, apesar da espessura da epiderme e da derme estarem semelhantes ao controle. O trabalho de Lopes e colaboradores (2012) relatou intensa desorganização tecidual observada 24h após a

injeção intradérmica do veneno de Bothrops cotiara, sendo o processo de cicatrização efetiva observado após 21 dias da injeção desta peçonha.

Em relação ao processo de regeneração da camada hipodérmica, observou-se alteração principalmente devido ao processo de saponificação, que levou ao aumento do tamanho dos adipócitos. No grupo de 14 dias injetado com peçonha de B. jararaca foi possível identificar formação de septos de tecido conjuntivo entre os adipócitos, onde também foi identificado infiltrado inflamatório, porém nos grupos de 60 dias injetados com as peçonhas botrópicas não foram observados estes septos de tecido conjuntivo, mas permaneceram com a camada hipodérmica relativamente mais espessa em comparação com o controle, o que pode significar que houve o processo de saponificação. As características histopatológicas encontradas assemelham-se ao relatado por Silverman e colaboradores (1999) ao investigar a formação de lipoblastoma nódulo de tecido extraído do pescoço, referindo indícios de massa tumoral composta de células em processo de saponificação, divididas por septos de tecido conjuntivo e envolvidos por cápsula fibrosa.

A epiderme é um epitélio estratificado constituído, principalmente, de queratinócitos pós-mitóticos proliferantes (SIMPSON et al., 2011). O estado de diferenciação dos queratinócitos epidérmicos é o resultado da especificidade do padrão de expressão de citoqueratinas (MOLL et al., 1982; SCHWEIZER, et al., 2006). As citoqueratinas são proteínas do citoesqueleto, e, alterações em sua expressão têm sido relacionadas com estados da diferenciação, mas não necessariamente como ação promotora do estado de diferenciação tissular (COULOMBE & LEE, 2012).

Os resultados obtidos em relação à expressão da citoqueratina 14, apresentaram padrão de marcação restrito à camada basal na epiderme dos camundongos injetados com solução salina. Após 45 dias da injeção dos venenos de Bothrops jararaca e Bothrops

leucurus, houve imunorreatividade na camada basal até as camadas mais superficiais da

epiderme. Choi e colaboradores (2010) demonstraram que a marcação epidérmica suprabasal observada com CK14, indica diferenciação do epitélio simples para o estratificado, podendo ser o início da formação de tumor de células escamosas (ALMEIDA Jr., 2004; ALAM, 2011).

O desenvolvimento de tumores está diretamente relacionado com o processo de angiogênese (DERYUGINA & QUIGLEY, 2010; FLORENCE et al., 2011). Araújo e

colaboradores (2005) demonstraram que a injeção intradérmica do veneno de B. jararaca na pele da cauda do camundongo induziu angiogênese após 60 dias sugerindo que o veneno de

B. jararaca possa ser um possível agente promotor tumoral.

Os resultados deste trabalho foram semelhantes aos de Araújo (2005), de acordo com o padrão de marcação observado com o anticorpo para CD34, principalmente na derme das amostras de tecido do grupo de 60 dias injetadas com B. leucurus e B. jararaca. A partir destes resultados, sugere-se que não apenas o veneno de B. jararaca, mas também a peçonha de B. leucurus possam ser possíveis agentes promotores tumorais. Para comprovar estas evidências pode-se sugerir que sejam realizadas administrações do veneno com maior frequência e por períodos mais prolongados, com o objetivo de identificar possíveis tumores cutâneos.

De acordo com o trabalho proposto por Gadó e colaboradores (2001) a capacidade de indução da carcinogênese por um composto complexo, neste caso indução química pelo composto pristane, é diretamente influenciada pelo tempo de exposição ao agente nocivo. Estes indícios sugerem que é necessário determinar o perfil crônico com o maior período possível para obter sucesso na confirmação de carcinogênese.

Os resultados da marcação da citoqueratina 14 na epiderme, da angiogênese evidenciada pela marcação com anticorpo para CD34 e da alteração persistente do tecido adiposo podem sugerir que os venenos de Bothrops jararaca e Bothrops leucurus sejam possíveis agentes promotores tumorais. As alterações observadas na epiderme 14 dias após a administração dos venenos com a dose de 3 mg/Kg não foi observada com a dose de 1 mg/Kg de veneno de Bothrops jararaca como demonstrado por Araujo (2005). Apesar do padrão de marcação de CK14 na epiderme dos grupos de 60 dias ter voltado a expressão normal, ainda foi possível observar angiogênese e alteração do tecido adiposo, neste caso pode-se sugerir que talvez o aumento do tempo de exposição ao veneno, associado à administração deste por 2 ou 3 vezes no mesmo local possa simular o ocorrido no paciente acidentado. Estes indícios estão de acordo com o relato de caso descrito por Mello e colaboradores (2000), no qual o paciente apresentou ulceração crônica decorrente de acidente ofídico com Bothrops

jararacussu, que evoluiu após 23 anos para carcinoma de células escamosas, provocando a

6 CONCLUSÃO

Foram reproduzidas as lesões cutâneas pós-empeçonhamento, por meio da indução experimental com os venenos das serpentes Bothrops jararaca e Bothrops leucurus, possibilitando a reprodução de estados diferentes de injúria tecidual, desde a fase aguda até a cicatrização.

Experimentalmente o veneno de B. jararaca induziu intensa hemorragia com alterações transitórias na epiderme, enquanto que a peçonha de Bothrops leucurus apresentou intenso infiltrado inflamatório, com padrão proliferativo diferenciado de reparação de feridas. Identificou-se hiperplasia na epiderme. Na derme foi observada cicatriz e angiogênese, caracterizada pela marcação com anticorpo monoclonal anti - CD34, persistente até 60 dias após a indução da lesão com o veneno. A utilização de anticorpo monoclonal para citoqueratina 14 mostrou-se útil na avaliação das alterações da diferenciação epidérmica nas lesões cutâneas.

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