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A casa antiga ou secular ganha esta designação por remeter para a memória da arquitectura continental, sendo a que mais influências recebeu do continente, tendo sido erguida por mestres construtores de edifícios de religiosos e militares do Funchal com origens no século XV. É a tipologia que melhor demonstra a evolução e continuidade arquitectónica dos primeiros séculos de povoamento da ilha. Persistem até à actualidade alguns exemplos desta casa tais como: o Solar de Dona Mécia (Funchal), a Casa das Mudas (Calheta), o Solar do Morgado Esmeraldo (Ponta de Sol), o Solar dos Reis Magos (Caniço), entre outros.

137Técnica de desenho ou pitura em fresco que consiste no levantamento da camada de tinta superior e

visível para deixar aparecer a camada subjacente.

Imagem 96 - Casa Torreada, Caminho de Santo António, nº 326, Funchal

Imagem 98 - Solar do Esmeraldo (1973), Ponta de Sol Imagem 97 - Reconstrução do Solar do Esmeraldo

Esta tipologia desenvolve-se, em dois pisos. O piso térreo destina-se à adega, ao armazenamento das ferramentas e dos produtos agrícolas – remetendo para a tradição continental. O primeiro piso é a zona nobre da casa, onde se encontram as salas, os quartos de dormir e a cozinha (integrada no volume habitacional e com uma grande chaminé). O acesso ao piso superior é realizado por uma escadaria exterior ou pelo encosto de um topo

ao terreno que permite o acesso directo pela maior cota do terreno. A sua volumetria é predominantemente paralelepipédica, de espacialidade generosa que remete para as primitivas casas senhoriais. Possui grandes vãos recortados por molduras de argamassa ou cantaria, telhados de quatro águas baixos com beirais e sub-beira que transmitem «austeridade e harmonia»138. Victor Mestre citando António Aragão: «Afirma-se aí que as

casas construídas nas elevações, vilas ou casas de campo dos principais mercadores, são mesmo limpas e elegantes, ao passo que as da cidade são geralmente muito más»139.Outra

característica desta tipologia é o corredor e a compartimentação interior demonstrando que esta é um exemplo da casa complexa. Outra característica é os tectos de alfarge140, cujo tipo

de estrutura é constante em toda a ilha e denota a relação entre a arquitectura popular e a erudita. A armação confere uma aparência delicada aos telhados de quatro águas. As janelas e as portadas, i.e. a janela-portada estão presentes em toda a arquitectura popular madeirense, cuja caixilharia remonta ao século XV e funciona com um caixilho afixado exteriormente numa das portadas. Originalmente, a portada continha um postigo141 de

madeira e sem vidro que evolui para vidraça no fim do século XVIII. No início não possuíam vidro sendo simples aberturas para ventilar a casa e deixar entrar luz. A aplicação de vidro ocorre por influência estrangeira.

Em suma, as casas seculares caracteristicamente abastadas e antigas, têm um carácter quase erudito, podendo até introduzir-se em outras tipologias habitacionais, não fosse a sua antiguidade. Todavia, apesar das suas semelhanças com as outras tipologias, têm outro tempo pelo que Victor Mestre considera-as uma tipologia habitacional da arquitectura popular madeirense por si só.

138 Victor Mestre em “Arquitectura Popular Madeirense”, pg. 90

139Victor Mestre citando António Aragão em Arquitectura Popular da Madeira, pg. 90

140Tecto em madeira criado por um elaborado trabalho de marcenaria com ornamentos e composições

geométricas.

141“Pequenos vazios redondos ou quadrados, por onde se efectua o arejamento contínuo e por onde

passava um réstia de luz” Victor Mestre em Arquitectura Popular da Madeira, pg. 202

Imagem 99 – Tecto de alfarge Solar Dona Mécia (1957), Funchal

Solares

Dentro da tipologia das casas seculares e antigas, incluem-se também, os solares – denominação que José Sainz-Trueva dá às «casas rurais de grandes dimensões espalhadas um pouco por toda a ilha»142 em especial no concelho de São Vicente (ver imagem 64). Este autor

relata estas casas rurais «de forte carácter e sobriedade, quase todas datando do século XVIII, época de desafogo económico [...] dispensam qualquer ostentação: largas fachadas corridas de muitas janelas, portas simétricas, com espessas molduras de cantaria, quatro águas cobertas por telha portuguesa, com beiral simples ou duplo, terminados por espigão ou pombinha […] A um corpo principal primitivo outros se foram acrescentando à medida da necessidade […], criando volumetrias que deram […] uma beleza singular. O rés-do-chão era destinado ao lagar, e a arrecadar alfaias agrícolas […] o sobrado, a zona nobre da casa, […] ostentava tectos de caixotão […] Estas são casas de aspecto rude, mas duradoiro.»143

142Victor Mestre em Arquitectura Popular Madeirense, pg. 92

143Victor Mestre citando António Aragão em Arquitectura Popular Madeirense, pg. 92-93

Imagem 101 - Entrada do Solar Dona Mécia em cantaria (1940), Funchal

E – As furnas

As furnas ou “grotas” são uma das mais antigas formas de habitar do Homem. São habitações construídas a partir de compartimentos de modestas dimensões escavados na rocha que modela escultoricamente o espaço. Actualmente encontram-se praticamente extintas na ilha. Funcionavam como abrigos temporários até que se reunissem as condições necessárias à construção de uma casa e constituíam o último recurso em tempo de crise.

Tipologicamente, são consideradas por Victor Mestre como uma excepção. Inserem-se na categoria da casa secular pela sua antiguidade

e na da casa elementar pela sua simplicidade formal.

Desenvolvem-se, geralmente, em profundidade e não possuem mais que dois compartimentos comunicantes. Ao compartimento da entrada dá-se o nome de “casa de fora” é aqui que se localiza a cozinha sem chaminé, com pequenos orifícios superiores ou laterais.

Em alguns casos podem ter uma fachada exterior dependendo da qualidade da pedra e da disposição do espaço existente, bem como funcionar como apoio a outra construção.

Imagem 102 – Furna na estrada da Levada do Norte, Sítio da Ribeira do Escrivão, Quinta Grande

Imagem 103 – Furnas no Sítio da Ribeira do Escrivão, Quinta Grande