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O aparato institucional da gestão dos recursos hídricos na Lei nº 9.433/97

CAPÍTULO 2 FUNDAMENTOS DA PROTEÇÃO E GESTÃO DE ÁGUAS DOCES NO BRASIL

2.1 PUBLICIZAÇÃO E PRINCIPIOLOGIA INFRACONSTITUCIONAL NA PROTEÇÃO DAS

2.1.2 O aparato institucional da gestão dos recursos hídricos na Lei nº 9.433/97

Verificou-se que a Política Nacional de Recursos Hídricos (PNRH) surgiu no contexto da desregulamentação jurídica, econômica e política dos anos 90 no Brasil e é gerida, em níveis federal, estadual e até municipal, com a participação de agências reguladoras. A evolução da forma direta de intervenção do Estado para a sistemática de retração do mesmo, com a relevância de uma função regulatória, levou à criação de órgãos altamente especializados, para estabelecer regras nos mercados então privatizados. O formato de regulação então implantado e efetivado por meio de agências

reguladoras independentes surgiu como fenômeno que sucedeu a privatização das estatais prestadoras de serviços públicos no país66. Esse fenômeno pode ser caracterizado institucionalmente pela independência política e especialização técnica, visando prover um ambiente propício à atração de investimentos e de fornecimento de estabilidade de investimentos para o capital internacional.

No caso do Brasil, foram criadas as agências reguladoras independentes, sendo pioneiras a Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) e a Agência Nacional de Telecomunicações (ANATEL), como já referido. Ainda no contexto de reformas ocorrido na ultima década, foi criado um órgão regulador com competência geral para fundamentar o planejamento nacional do setor de recursos hídricos, a Agência Nacional de Águas, como autarquia sob o regime especial, com autonomia administrativa e financeira e vinculação ao Ministério do Meio Ambiente (MMA).

Basicamente, as agências são autarquias sob regime especial, parte da Administração Pública indireta e caracterizadas por independência administrativa, estabilidade de seus dirigentes, autonomia financeira e ausência de subordinação hierárquica. As dimensões características do arranjo institucional comum da maior parte das novas agências reguladoras independentes são: a) Os dirigentes das agências possuem mandatos fixos, não coincidentes com o presidente da República, e estabilidade; b) Suas indicações, feitas pelo Executivo, precisam ser aprovadas pelo Legislativo; c) As agências não são subordinadas hierarquicamente aos ministérios e constituem a última instância de recurso no âmbito administrativo; d) Possuem delegação normativa, poder de instruir e julgar processos e poder de arbitragem; e) Possuem orçamento e quadro de pessoal próprio. f) Alta especialização e qualificação

66 PEREIRA, Luis Carlos Bresser. A reforma do estado nos anos 90. Lógica e Mecanismos de controle.

técnica são exigidas de seu quadro de pessoal.67 A independência das agências se constitui igualmente numa questão relevante no cenário atual, pois seu isolamento pode ser considerado um aspecto antidemocrático, em face da possível caracterização de um ambiente de atuação tecnocrático-autoritário68.

As agências estão submetidas a marcos regulatórios que vão desde a própria Constituição Federal até legislações infraconstitucionais e instrumentos legais mais específicos, à exemplo dos regulamentos expedidos pelas agências reguladoras. A imposição de marcos regulatórios é um dos principais mecanismos de controle previstos no modelo institucional vigente das agências reguladoras independentes. Agências reguladoras, então detentoras de largas parcelas de competência normativa, por meio das quais podem inovar o ordenamento jurídico, expedindo normas gerais e abstratas que vinculam os agentes reguladores e impõem-lhes obrigações.

No tocante aos aspectos legais do sistema institucional de recursos hídricos, a Lei nº 9.433/97 estabelece que é atribuição da Agência Nacional de Águas estimular e apoiar as iniciativas voltadas para a criação dos diversos órgãos gestores de recursos hídricos. Além destas atribuições, a ANA apóia a gestão de recursos hídricos nos Estados, mediante a celebração de Convênios de Cooperação com os órgãos gestores estaduais, para a implementação dos instrumentos daquela lei. A atuação colegiada da PNRH está fundamentada no Princípio da Subsidiariedade, que pela sua relevância para o objeto desse estudo, deveremos detalhar.

67 Gustavo Binenbojm ressalta que “a produção de normas com aptidão para inovar o ordenamento

jurídico, criando direitos e obrigações, constituiria, assim, segundo parcela significativa da doutrina nacional e alienígena, autêntica nota característica das agências reguladoras”. BINENBOJM, Gustavo.

Uma teoria do direito administrativo. Direitos fundamentais, democracia e constitucionalização. Rio de

Janeiro: Renovar, 2006, p. 260.

68 Nesse contexto se legitimam algumas ações visando ao controle das agências, como o Projeto de Lei

Federal no 3.337/2004, que defende o fortalecimento dos ministérios diante das agências, por meio de iniciativas que estabelecem a obrigatoriedade do contrato de gestão e a passagem das atribuições de outorga e concessão da agência para o ministério, ou mesmo o aprofundamento do controle social, ampliando as esferas de participação popular, bem como a criação de ouvidorias específicas.

A análise do comportamento dos entes institucionais, descritos como órgãos especializados e normas específicas da gestão de águas são uma das esferas do problema da interpretação normativa, uma vez que os regulamentos emitidos compõem o contexto de normas incidentes sobre os casos concretos, ou o marco regulatório incidente sobre as questões colocadas para interpretação.

Se o conjunto institucional colocado para solução dos conflitos jurisdicizados funciona adequadamente, esse fator é igualmente responsável pela promoção do desenvolvimento. Caso contrário, de nada valem os esforços interpretativos sobre as matérias levadas ao intérprete constitucional, nem tampouco poderão ser emitidas decisões com o respaldo institucional necessário.

A gestão de águas, essencial para o desenvolvimento estrutural do país, está dotada de ampla base institucional que pode torná-la um espaço adequado para a efetivação das políticas públicas que demandem o uso desse recurso natural, consoante os princípios da proteção ao meio-ambiente. Não obstante, a gestão do conflito pelo uso da água tem tido uma demanda crescente no país.

2.2 DESENVOLVIMENTO E PRINCÍPIO DA SUBSIDIARIEDADE NA ATUAÇÃO