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2. Revisão de Literatura

2.4 Aplicação de Tecnologias Sociais

2.4.1 Definições de Tecnologias Sociais

A tecnologia, se considerarmos toda a amplitude do seu conteúdo, nos remete aos primórdios da revolução industrial até os aparelhos, máquinas e seus recursos tecnológicos

que nos rodeiam, e como a humanidade foi modificada, influenciada e desenvolvida por ela. Cabe ressaltar que a tecnologia possui três camadas de significado: a que abrange objetos físicos, tais como máquinas, equipamentos e materiais; a de formas de conhecimento e como parte de um conjunto complexo de atividades humanas (MARTINS E SASSO, 2008).

Dado os multifacetados conceitos e a dificuldade em se estabelecer uma definição precisa de tecnologia, busca-se aqui delimitar o que se entende por Tecnologia Convencional (TC) e a sua contraposição, as Tecnologias Sociais (TS). A Tecnologia Convencional é voltada para a lógica do mercado capitalista, gerando exclusões e raramente atua na minimização da baixa renda e pobreza extrema, visando a “maximização do lucro privado” (DAGNINO, 2008).

Porém, antes de avançarmos nas definições acerca das TS e seu papel na sociedade, é de suma importância ressaltar a perspectiva simétrica no decorrer de seu desenvolvimento e aplicação não somente nesta pesquisa conduzida pela Teoria Ator-Rede, mas sim, em todos os casos, visto que as Tecnologias Sociais auxiliam na mitigação da precarização de uma determinada construção social ou forma de trabalho7.

Considera-se que geração de conhecimento para a inclusão demanda uma mudança na configuração das relações entre os diferentes sujeitos implicados na pesquisa, configurando uma estrutura não mais hierárquica, vertical, mas sim horizontal, de trocas e benefício mútuo. O conceito de inclusão aparece, nesse contexto, no âmbito socioeconômico, propondo não uma contraposição à predominância do modelo econômico em vigência, mas a inserção das demandas emergentes dos MS às agendas do poder público (DAGNINO, 2008).

As Tecnologias Sociais surgem como um contraponto às Tecnologias Convencionais (TC), só se constituindo “como tal quando tiver lugar um processo de inovação, um processo do qual emerja um conhecimento criado para atender aos problemas que enfrenta a organização ou grupo de atores envolvidos” (DAGNINO, 2004). Lassance e Pedreira (2004, p. 10) classificam a TS “como um conjunto de técnicas e procedimentos, associados a formas

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No contexto da pesquisa aqui colocada, a articulação se dá pela integração entre Movimentos Sociais (MS) e Universidade. Essa simetria permite que a Universidade ouça as demandas dos grupos, para então desenvolver as TS com base nas demandas colocadas pelo MS.

de organização coletiva, que representam soluções para a inclusão social e melhoria da qualidade de vida” Outro ponto interessante é a fácil reaplicabilidade, baixo custo e simplicidade do processo, método ou instrumento (PENA e MELLO, 2004). Novaes e Dias (2009, p.18-19) exemplifica a contraposição que a TS representa frente à tecnologia capitalista convencional reunindo os seguintes aspectos:

Ser adaptada a pequenos produtores e consumidores; não promover o tipo de controle capitalista, segmentar, hierarquizar e dominar os trabalhadores; ser orientada para satisfação das necessidades humanas (...); incentivar o potencial e a criatividade do produtor direto e dos usuários; ser capaz de viabilizar economicamente empreendimentos como cooperativas populares, assentamentos de reforma agrária, a agricultura familiar e pequenas empresas.

O desenvolvimento de TS tem que ser adaptado e voltado às necessidades do MS ou grupo às suas realidades locais, com a escuta e apreensão destas demandas. A Tecnologia, se imposta pelo pesquisador, perde sua efetividade, afastando-se do elemento social por ignorar as demandas daquele grupo. Apropriando-se da fala de Dagnino (2004, p.33), a TS é o “resultado de um casamento previamente existente entre a “oferta” e a “demanda” assegurado por um novo modo de elaboração de projetos de pesquisa”.

Em texto mais recente, o autor correlaciona que a TS e a tecnociência capitalista é o resultado da ação do capitalista sobre um processo de trabalho que, em função de um contexto socioeconômico e de um acordo social que ensejam, no ambiente produtivo, um controle (imposto e assimétrico) e uma cooperação (de tipo taylorista e fordista), permite uma modificação no produto gerado, passível de ser por ele apropriada (DAGNINO, 2011).

Quanto à questão do funcionamento e adaptação das TS, Thomas (2011) alerta para o “desenho” dessas tecnologias e para a importância da incorporação de aspectos político- institucionais de onde está sendo aplicado e sócio-culturais. Apropriando-se da fala da Adélia Borges (2012) no campo da aplicação de Design no artesanato, é necessário “Interferir sem ferir”.

O ponto de encontro entre os conceitos de Tecnologias Sociais e a Teoria Ator-Rede (porém por outro viés) é a abordagem sociotécnica. Sob a óptica de Dagnino (2004, p.38), as “tecnologias seriam construídas socialmente na medida em que os grupos de consumidores, os interesses políticos e outros similares influenciam não apenas a forma final que toma a tecnologia, mas seu conteúdo”. Desta forma, a TS é em si mesma é um processo de

construção social (e não apenas um produto). Bava (2004) ressalta que esta visa à solução de demandas sociais concretas, vividas e identificadas pelo grupo.

Neste caso e em geral, as TS têm dimensão local, e aplicam-se a pessoas, famílias e associações (LASSANCE e PEDREIRA, 2004). Após ouvirmos as demandas dos artesãos na Associação, buscou-se, com a integração do Design e da Engenharia de Materiais, o desenvolvimento de aprimoramentos em simetria com as demandas emergidas das entrevistas, caracterizando a aplicação de TS. Depois, aplicaremos nas matérias-primas e produtos. Desta forma, Thomas (2011, p. 419) cita que as tecnologias sociais são inclusivas porque explicitamente abrem a possibilidade de participação dos seus usuários e beneficiários no processo de criação e implementação. E ressalta que as TS são uma das “expressões mais claras do direito do cidadão”.

Neste itinerário que perpassa por algumas definições acerca da TS proposto por este capítulo, Fernandes e Maciel (2010, p. 9) sintetiza que estas “são reveladores da capacidade que a sociedade tem de se organizar em função dos interesses da comunidade”. A coletividade constitui e revelam os contornos das TS, e “esse processo de organização vem acompanhado do trabalho, em parceria, de técnicos e pesquisadores, mas é importante destacar que esse acompanhamento não é uma condição para que se constituam as TS”. Nesta fala encontra-se a tônica da aplicação de TS proposta nesta pesquisa: a integração de pesquisadores de diferentes áreas disciplinares.