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1 INTRODUÇÃO

2.2 Geotecnologias como ferramenta de gestão

2.2.4 Aplicações na gestão ambiental e de recursos hídricos

Apontam-se pelo menos quatro grandes dimensões dos estudos ambientais em que é grande o impacto do uso das geotecnologias: mapeamento temático, diagnóstico ambiental, avaliação de impacto ambiental e prognósticos ambientais (MEDEIROS; CÂMARA, 2001, p. 1).

Paes, Candeias e Sobral (2010) ressaltaram a complexidade envolvida na gestão de reservatórios, com análise integrada de diversos dados, como qualidade da água, uso e ocupação do solo. O SIG desenvolvido possibilitou emissão de relatórios e elaboração de mapas temáticos para apoio à tomada de decisão. Planos e projetos com influência no reservatório, outorgas, licenças ambientais, imagens aerofotogramétricas e de satélite são exemplos de informações constantes do sistema (PAES, 2012). Benedini (2011) destacou a relevância dos modelos matemáticos para gestão dos recursos hídricos, particularmente para avaliação da qualidade das águas dos rios, incluindo a utilização de SIG na modelagem. Para ilustrar a aplicação de modelos matemáticos e a estimativa das suas incertezas, o autor apresentou a Figura 12, destacando a relevância de procedimentos para testes e validação. Figura 12 - Fontes de incertezas nos modelos matemáticos.

Fonte: Adaptado de Benedini (2011, p. 38).

Souza Júnior et al. (2013) desenvolveram um atlas eletrônico analítico para geração de mapas interativos em Pernambuco, fornecendo também tabelas, gráficos, relatórios etc. Perguntas como as

descritas a seguir foram apontadas como opções para auxiliar à tomada de decisão dos gestores: quais são as estruturas hídricas existentes na região? Quais os postos hidrológicos existentes em uma determinada bacia hidrográfica e em determinado município? Quais as barragens existentes em determinada bacia? Existem, em um dado município, outras fontes para abastecimento humano? Fan, Collischonn e Rigo (2013) construíram um modelo para simulação da qualidade da água acoplado com SIG para representação de impactos causados por lançamentos de poluentes, permitindo uma visão de toda a bacia hidrográfica. O modelo pode ser especialmente útil nos casos em que não se sabe ao certo onde vão ocorrer os despejos de efluentes.

Cavalcanti, Tavares Júnior e Candeias (2013) mapearam os riscos de inundação ao longo de uma bacia hidrográfica, valendo-se de modelo numérico do terreno, imagens RapidEye, setores censitários do IBGE e álgebra de mapas. Os autores apontaram algumas limitações da análise, tal como critério da distribuição uniforme da população, gerando imprecisão. A visualização 3D da área estudada consta da Figura 13.

Figura 13 - Visualização 3D com curvas de nível com equidistância de 10m

Fonte: Cavalcanti, Tavares Júnior e Candeias (2013, p. 708).

Delipetrev, Jonoski e Solomatine (2014) desenvolveram um protótipo de aplicativo-web colaborativo e com dados interoperáveis, com três objetivos principais: gestão de dados espaciais; suporte a modelos para recursos hídricos; e otimização de recursos hídricos. Quanto aos dados, foram incluídos vetores referentes a rios, canais, usuários, agricultura, reservatórios etc., além de séries históricas. Quanto aos modelos, a plataforma tem acesso aos dados armazenados e permite ao usuário acrescentar e editar dados. Quanto à otimização, essa funcionalidade refere-se apenas à operação otimizada de um reservatório específico. Os autores ressaltaram ainda que, apesar das vantagens referentes às plataformas-web serem reconhecidas, isso ainda não se reflete na prática. Entre os motivos, tem-se a conveniência para os consumidores utilizarem as plataformas tradicionais e o fato

delas serem também mais lucrativas para os fabricantes, além de que as contínuas e rápidas mudanças nas tecnologias web podem dificultar sua padronização e desencorajar investimentos.

Ainda quanto às plataformas colaborativas, acrescenta-se que há uma tendência no Brasil de maior abertura de dados, trazendo mais transparência às ações governamentais (FREITAS; DACORSO, 2014, p. 885; TCU, 2014b). No âmbito do controle social, um importante marco foi a promulgação da Lei de Acesso à Informação (Lei n. 12.527/2011). Essa lei apresenta-se como uma quebra de paradigma, porque o acesso às informações passou a ser tratado como regra e o sigilo como exceção. As solicitações de informações pelos cidadãos prescindem de motivação e o artigo 1° da lei estabelece que o regulamento é válido para todos os órgãos públicos, incluindo a administração direta e indireta, das esferas federal, estadual e municipal (BRASIL, 2011).

São vários os casos da utilização de SIG na gestão ambiental e de recursos hídricos. A ANA e a Agência Executiva de Gestão das Águas da Paraíba, por exemplo, disponibilizam na internet o HidroWeb e GeoPortal, respectivamente, com disponibilização de dados para o Brasil e para a Paraíba - http://hidroweb.ana.gov.br e http://geo.aesa.pb.gov.br/. O usuário pode navegar diversos níveis de informação. Os mapas são dotados de escalas geográficas que podem ser alteradas, barra de ferramentas e suas camadas geográficas, contendo diferentes informações. O mesmo se observa no contexto internacional, como é o caso de www.cuahsi.org e www.earthobservations.org, sendo o primeiro mais centrado na América do Norte e o segundo em um contexto mais global (DELIPETREV; JONOSKI; SOLOMATINE, 2014, p. 35; NATIVI et al., 2015, p. 85).

A disponibilização das informações na internet é mais um estímulo ao controle social. A adaptação dos SIG à internet permite maior difusão da tecnologia, tal como mencionado por Medeiros et al. (2013), em aplicação no âmbito do Poder Executivo. Os autores construíram o “SIG Web Ceará em Mapas Interativo” para disponibilizar dados socioeconômicos e cartográficos para a sociedade e subsidiar gestores públicos, envolvendo imagens de satélite, limites municipais, meio ambiente, recursos hídricos, equipamentos públicos, altimetria e indicadores socioeconômicos.

Duba e Di Maio (2014) evidenciaram os mapas participativos para promoção da cidadania no conceito da Cartografia Social. Os autores criaram um web map, chamado de “Mapa Solidário”, para a Região Metropolitana do Rio de Janeiro, permitindo participação dos internautas na sua construção, tornando acessível um mapa participativo contendo banco de dados sobre projetos culturais, educacionais e esportivos, podendo ser atualizado pelos usuários.

Quanto a ações de controle da gestão ambiental, o Tribunal de Contas da Noruega apresentou exemplo de aplicação em auditoria sobre as ações governamentais para prevenção de inundações e

desmoronamentos, por meio da análise de mapas de riscos e quantificação das construções nas áreas vulneráveis (NORWAY, 2010).

Musa (2012) relatou aplicações de GNSS, sensoriamento remoto e SIG em auditorias ambientais realizadas na Indonésia, como auxílio na identificação de áreas desmatadas e queimadas, localização dos pontos de coleta de amostras e na elaboração dos relatórios.

Freire e Castro (2014) investigaram a correlação entre uso e ocupação do solo e qualidade da água em várias sub-bacias hidrográficas no Espírito Santo, empregando sensoriamento remoto e SIG com aplicação de geoestatística para avaliar correlações. Os resultados indicaram correlação entre as atividades humanas sobre o solo e degradação da qualidade da água.

Souza et al. (2014), em estudo abrangendo a cidade de Recife-PE, identificaram as áreas mais vulneráveis a desastres decorrentes de chuva, considerando aspectos como número de óbitos, densidade demográfica, renda per capita, população, condições de habitabilidade e índice de desenvolvimento humano. Características fisiográficas da área não foram consideradas diretamente. Quanto a análises multicritério, Cordão, Rufino e Araújo (2013) utilizaram-se de SIG como sistema de apoio a decisão espacial no planejamento da disposição reservatórios de água para abastecimento público. Foram gerados mapas de riscos de desabastecimento em lotes urbanos e mapeadas zonas consideradas como ótimas para novas unidades. A área onde devem ser instaladas novas unidades em determinada zona estudada (zona A) é apresentada na Figura 14.

Figura 14 - Indicação de áreas para disposição de novos reservatórios de água.

O monitoramento via satélite vem sendo utilizado com frequência em escala global para a área ambiental. O Joint Research Centre, da Comissão Europeia, desenvolveu uma metodologia para monitorar a cobertura florestal entre os trópicos na América Latina, Sudeste Asiático e África, com imagens Landsat Thematic Mapper e Enhanced Thematic Mapper. As imagens foram selecionadas, pré-processadas, segmentadas e classificadas em cinco diferentes classes de cobertura da terra para a construção de estatísticas globais e regionais sobre a mudança da cobertura florestal tropical (BEUCHLE et al., 2011; RAŠI et al., 2011).

Suarez e Candeias (2014) avaliaram a dinâmica do desmatamento e seus impactos na Mata Atlântica em Pernambuco, com base em imagens de satélite ao longo de três décadas, identificando as principais variáveis explicativas do fenômeno do desmatamento para a área estudada. Os autores concluíram que o desmatamento foi intensificado junto a manchas urbanas e a desmatamentos pré- existentes, e foram repelidos em áreas com maiores declividades.

Lopes et al. (2015) empregaram imagens Landsat-TM para monitorar e quantificar a concentração de clorofila-a no reservatório de Itaparica, no rio São Francisco. Os autores concluíram pela aplicabilidade do modelo para análises espaciais não pontuais e multitemporais, permitindo visualizar a distribuição da concentração por determinados períodos.

Ribeiro Neto et al. (2015) integraram modelos matemáticos em um sistema de suporte à decisão para previsão e alerta de cheias na bacia hidrográfica do rio Una-PE. Os autores utilizaram modelo digital do terreno com resolução espacial de 0,5 m, precisão batimétrica de 15 cm e modelagem hidrológica- hidrodinâmica para simular o escoamento na bacia. De posse da previsão de chuva na bacia, determinam-se vazão, nível da água e áreas atingidas nas cidades localizadas às margens do rio estudado, permitindo a mobilização com antecedência para assistência à população. É também uma alternativa para avaliar ações para redução de impactos das cheias.

Considerando as vantagens de informações atualizadas para gestão de riscos de enchentes, Horita et al. (2015) procuraram integrar diversas fontes, com destaque para rede de sensores sem fio (wireless sensor network) e informações voluntárias20 prestadas por cidadãos moradores de áreas de alto-risco.

Os autores desenvolveram um sistema de suporte à tomada de decisão espacial, intitulado AGORA- DS, que integrou bases de dados e apresentou resultados unificados. Apontaram-se, também, evidências da possibilidade de utilizar os dados encaminhados pelos cidadãos de maneirar estatisticamente equivalente aos adquiridos por sensores, desde que recebam o tratamento adequado.

20 O conceito de informações voluntárias faz referência à participação de usuários, pessoais físicas, na montagem, criação e divulgação de informações.

A arquitetura conceitual do AGORA-DS está ilustrada na Figura 15. O sistema é composto por três camadas: camada de aquisição, camada de integração e camada de suporte à decisão.

Figura 15 - Arquitetura de um sistema espacial de suporte à tomada de decisão colaborativo.

Fonte: Adaptado de Horita et al. (2015, p. 86).

Quanto à operacionalidade do sistema, os autores destacaram três dificuldades (HORITA et al., 2015): (i) dados com formatos diversos (a exemplo de fotos versus valores numéricos) e com diferentes níveis de percepção na medição (níveis de água medidos versus percepção dos cidadãos); (ii) interoperabilidade dos dados; e (iii) transformar os dados em informação de fácil entendimento.

Pesquisa avançadas são realizadas para monitoramento de áreas degradadas, gestão de bacias hidrográficas, saneamento básico, planejamento urbano etc. Os estudos descritos mostram o leque de opções e o potencial das geotecnologias para planejamento, execução e controle. As aplicações abrangem diferentes usos e níveis de complexidade, desde repositório de dados até análises espaciais avançadas, envolvendo qualidade da água, cenários atuais e previstos, combinação de diferentes mapas e imagens de satélite, incluindo análises multicritério, modelos matemáticos e correlações entre variáveis. A aplicação das geotecnologias é abrangente, sendo frequentemente utilizadas como apoio no processo de tomada de decisão.