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Não se aplica o princípio da insignificância para remessa de divisas por meio de dólar-cabo, ainda que em valores inferiores a 10 mil reais

No documento Márcio André Lopes Cavalcante ÍNDICE (páginas 30-32)

Nos casos de evasão de divisas praticada mediante operação do tipo "dólar-cabo", não é possível utilizar o valor de R$ 10 mil como parâmetro para fins de aplicação do princípio da insignificância.

STJ. 6ª Turma. REsp 1.535.956-RS, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 1º/3/2016 (Info 578).

O simples fato de enviar dinheiro para o exterior é considerado algo ilícito?

NÃO. No entanto, para a pessoa enviar recursos para o exterior, ela deverá cumprir as condições previstas na legislação.

O que a legislação exige para a remessa de valores ao exterior?

REGRA: para que a pessoa envie dinheiro (nacional ou estrangeiro) para fora do Brasil, ela deverá fazê-lo por meio de instituição autorizada a operar no mercado de câmbio (art. 65 da Lei nº 9.069/95). Ex: o indivíduo tem uma filha que mora na Alemanha e deseja enviar dinheiro a ela; para isso, será necessário que procure uma instituição autorizada para remeter a quantia.

EXCEÇÃO A ESSA REGRA:

O dinheiro poderá ser enviado para o exterior mesmo sem a intervenção de instituição autorizada, desde que o indivíduo leve os valores consigo, pessoalmente.

Neste caso, é necessário distinguir duas situações:

I - se o valor que o viajante está levando é de até R$ 10 mil (não importa se é em real ou o equivalente em moeda estrangeira): ele não precisará declarar nada. Pode viajar tranquilo levando o dinheiro. É o que acontece com a maioria dos turistas que viaja para o exterior.

II - se o valor que o indivíduo está levando é superior a R$ 10 mil (não importa se é em real ou o equivalente em moeda estrangeira): ele precisará, antes de viajar, entrar no site da Receita Federal, fazer uma "Declaração Eletrônica de Porte de Valores" (DPV) e imprimir um recibo disso. Além disso, terá que levar consigo o comprovante de que comprou os valores em instituição financeira autorizada (ou, então, outro comprovante de como obteve o dinheiro estrangeiro).

Esta regra e exceções encontram-se previstas no art. 65 da Lei nº 9.069/95.

Dólar-cabo

Existe muita gente que possui dinheiro de origem ilícita e, como uma forma de proteger estas quantias ou de gastar "tranquilamente" este numerário, decide mandar tais valores para fora do país.

Ocorre que, como são quantias obtidas ilegalmente, a pessoa não poderá mandar este dinheiro por meio das instituições autorizadas pelo Banco Central, já que ficaria provado que ela possui mais recursos do que declarou ao imposto de renda.

Tais pessoas procuram, então, formas de remeter os recursos para o exterior por meios não oficiais. Um desses meios é chamado de "dólar-cabo". Existem algumas variações, porém o tipo mais comum de dólar-cabo consiste no seguinte: o corrupto procura um doleiro no Brasil e entrega a este determinada quantia em moeda nacional (ex: 4 milhões de reais), pedindo que este envie para Miami (EUA). O doleiro entra em contato com um parceiro seu no exterior (outro "doleiro") e este abre uma conta ou uma empresa em nome do corrupto ou de um "laranja" e lá deposita o equivalente em dólar (ex: 1 milhão de dólares). Vale ressaltar que estes doleiros não estavam autorizados a fazer esta transação e nem a comunicaram ao Banco Central.

instituição no exterior (www.bcb.gov.br/glossario).

Se a pessoa fosse fazer a remessa de forma correta, deveria procurar uma instituição autorizada e o envio das quantias seria realizado mediante transferência bancária.

A prática de dólar-cabo é crime?

SIM. A prática de dólar-cabo configura o crime de evasão de dividas, previsto no art. 22, parágrafo único, 1ª parte, da Lei nº 7.492/86 (Lei dos Crimes contra o Sistema Financeiro):

Art. 22. Efetuar operação de câmbio não autorizada, com o fim de promover evasão de divisas do País: Pena - Reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos, e multa.

Parágrafo único. Incorre na mesma pena quem, a qualquer título, promove, sem autorização legal, a saída de moeda ou divisa para o exterior, ou nele mantiver depósitos não declarados à repartição federal competente.

Imagine agora a seguinte situação hipotética:

João procurou um doleiro para remeter dólares para o exterior.

Ele entregou R$ 9 mil ao doleiro, que entrou em contato com seu parceiro em Nova York, que depositou U$ 2 mil em uma offshore pertencente a João.

Ocorre que a Polícia Federal já estava investigando o doleiro e, em uma busca e apreensão realizada em seu escritório, descobriu esta operação ilegal.

Diante disso, João foi denunciado pelo MPF por evasão de divisas.

Em sua defesa, o réu afirmou que o art. 65 da Lei nº 9.069/95 autoriza que a pessoa leve para o exterior, em mãos, moeda estrangeira em valor equivalente a R$ 10 mil sem declaração ao Banco Central. Logo, o mesmo raciocínio deveria ser aplicado para o presente caso, o que geraria a atipicidade de sua conduta.

A tese de João foi aceita pelo STJ? Em caso de remessa ilegal de quantia em valor inferior a R$ 10 mil, é possível aplicar o princípio da insignificância?

NÃO.

Nos casos de evasão de divisas praticada mediante operação do tipo "dólar-cabo", não é possível utilizar o valor de R$ 10 mil como parâmetro para fins de aplicação do princípio da insignificância.

STJ. 6ª Turma. REsp 1.535.956-RS, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 1º/3/2016 (Info 578). As transações conhecidas como operações "dólar-cabo" - nas quais são efetuados pagamentos em reais no Brasil, com o objetivo de disponibilizar, por meio de quem recebe tal pagamento, o respectivo montante em moeda estrangeira no exterior - preenchem os elementos do delito de evasão de divisas, na forma do art. 22, parágrafo único, primeira parte, da Lei nº 7.492/86.

Não prospera a tese de que deve ser considerado atípico o envio de moeda ou divisas ao exterior se o volume de cada operação não exceder a R$ 10 mil. Isso porque, em primeiro lugar, ressalvada a hipótese do porte de valores em espécie, o ingresso no país e a saída do país, de moeda nacional e estrangeira "serão processados exclusivamente através de transferência bancária, cabendo ao estabelecimento bancário a perfeita identificação do cliente ou do beneficiário" (art. 65, caput, da Lei nº 9.069/95). Ou seja, a legislação excepcionou, em relação ao valor inferior a R$ 10 mil (ou seu equivalente em moeda estrangeira), apenas a saída física de moeda.

No caso de transferência eletrônica, saída meramente escritural da moeda, a lei exige, de forma exclusiva, o processamento através do sistema bancário, com perfeita identificação do cliente ou beneficiário. Além disso, no caso da transferência clandestina internacional, por meio de operações do tipo "dólar- cabo" ou equivalente, existe uma facilidade muito grande na realização de centenas ou até milhares de operações fragmentadas sequenciais. É muito mais simples do que a transposição física, por diversas vezes, das fronteiras do país com valores inferiores a R$ 10 mil.

Admitir a atipicidade das operações do tipo "dólar-cabo" com valores inferiores a R$ 10 mil é deixar a porta aberta para a saída clandestina de divisas.

Evasão de divisas não é crime tributário

Vale ressaltar, por fim, que, em caso de crimes tributários, se o valor dos tributos sonegados for inferior a R$ 10 mil é possível a aplicação do princípio da insignificância. Este entendimento não vale para o presente caso porque a evasão de divisas é crime contra o sistema financeiro e não delito tributário.

EVASÃO DE DIVISAS

Complexidade do esquema criminoso como circunstância negativa na dosimetria da pena

No documento Márcio André Lopes Cavalcante ÍNDICE (páginas 30-32)

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