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Apresentação da Proposta da Professora

Capítulo 3: Descrição e Discussão de Resultados

3.1 A Atividade Ensino-Aprendizagem de Inglês e o Padrão Mediacional

3.1.1 O Padrão Mediacional no Compartilhamento de Significados

3.1.1.1 Apresentação da Proposta da Professora

A presente pesquisa foi iniciada com a apresentação da proposta da professora- pesquisadora para os alunos na Discussão sobre a Escolha das Histórias (21 de maio de 2007). O objetivo da professora era conseguir a adesão dos alunos à proposta e, para isso, pediu a eles que escolhessem alguns contos de fada para serem trabalhados em conjunto com os jogos. No estudo dos dados, pode-se perceber que esse momento foi marcado por contradições de cunho sócio-cultural, que ocorrem quando os participantes têm diferentes sentidos sobre o objeto/motivo da Atividade em foco. Em outras palavras, quando os representantes de uma cultura – neste caso, a professora – introduzem um objeto/motivo que difere do objeto/motivo da Atividade dos outros participantes – neste caso, os alunos.

Esse momento revelou, assim, a compreensão dos sentidos distintos que os participantes tinham em relação à Atividade Ensino-Aprendizagem de Inglês, naquele contexto particular, mostrando contradições no objeto dessa Atividade, nas regras e na divisão de trabalho. Para os alunos, parece haver uma divisão de trabalho clara em que a professora é a responsável por dar aulas, isto é, pelo dizer na sala de aula; enquanto eles, os alunos, são aqueles que realizam, que fazem as tarefas, propostas e decididas unilateralmente pela professora. As regras que pautam essa divisão de trabalho seriam as de uma tradição autoritária, de um padrão mediacional em que o professor manda e o aluno obedece, o que é, de fato, o dominante nos contextos escolares com foco na ação individual de cada participante na produção de conhecimento.

A professora, por outro lado, tem como objetivo trazer uma nova divisão de trabalho, em que os alunos, além de realizarem as tarefas propostas, participam das decisões sobre essas tarefas, ou seja, são agentes na Atividade Ensino-Aprendizagem de Inglês, como propõem as pesquisas de cunho colaborativo. O trabalho está, assim, baseado na compreensão de um sujeito social, em que os alunos não são meros recipientes de conteúdo escolar. As regras que pautam essa proposta da professora seriam as de um padrão mediacional colaborativo, em que há participação conjunta e compartilhamento de significados que podem levam à transformação de valores na organização do contexto em questão, e não só na apropriação individual da língua inglesa.

Exemplo 1 – Diferentes modos de ver a relação professor-aluno

T4: Não, o que a gente tem pra fazer aqui que é o programa do curso a gente vai acabar... então a gente tem que escolher algumas coisas... e eu quero que vocês me ajudem a escolher, porque ó, antes da aula da prova a gente tem três aulas que a gente vai poder fazer algumas coisas e eu tenho algumas idéias e eu queria saber... queria que vocês me ajudassem na escolha... das idéias.

V1: Como assim das idéias?

T5: É assim olha, nós temos três aulas e eu tava pensando assim como vocês já têm um nível de inglês legal, né? Já estão no IIIC... então, eu pensei da gente fazer o

seguinte... eu tenho aqui um livro... que tem algumas atividades, tem algumas... tem alguns...na verdade tem alguns nomes de histórias de contos de fadas...

V3: Oh...

R2: João e Maria. T7: Ah?

H3: Que legal. V2: Sério?

T6: Sim... já tão...né? já tem, já tem um nível legal... já tão um ano e meio estudando inglês né, não é qualquer coisa... (...)

T8: Legal, né? Então, tem algumas aqui e eu queria que vocês me ajudassem pra gente escolher, como a gente vai ter três aulas...

V4: Pra que escolher?

T9: Escolher pra gente trabalhar... porque aí eu tava pensando ... eu tava pensando em fazer assim eu chego aqui... eu conto as histórias pra vocês, né? Bem legal, a gente faz umas atividades, uns jogos, umas brincadeiras... entendeu?

V5: Teacher, você vai fazer brincadeira?

Obs.: Discussão sobre a Escolha das Histórias, 21 de maio de 2007.

No excerto acima a professora apresenta a proposta buscando estabelecer o contexto colaborativo, marcado pela escolha lexical da expressão dêitica que representa a primeira pessoa do plural, “a gente”: (T4: (...) a gente tem que escolher algumas coisas (...) a gente vai poder fazer algumas coisas (...)). As respostas da aluna Vanessa

revelam quase uma incredulidade em relação à proposta da professora, o que demonstra como os alunos ainda não se veem como participantes da Atividade, pois o sentido que pode ser depreendido pelo enunciado da aluna é que a responsabilização pelo fazer é da professora: tanto pela escolha lexical do seu questionamento (V2: Sério?), quanto pelo uso da segunda pessoa do singular ao perguntar sobre a divisão de trabalho da Atividade proposta (V5: Teacher, você vai fazer brincadeira?). Esses enunciados parecem dar indício de que o sentido que ela tem sobre o papel da professora é como aquela que vai tomar todas as decisões sobre as tarefas a serem realizadas na sala de aula.

Já o jogo estabelecido no uso dos dêiticos “eu”, “vocês” e “a gente” pela professora no turno T8 (Legal, né? Então, tem algumas aqui e eu queria que vocês me ajudassem pra gente escolher) pode indicar que a professora está propondo uma nova

divisão de trabalho. Por essa colocação da professora, os alunos tornam-se, também, responsáveis pelas decisões sobre as tarefas a serem realizadas na sala de aula – a escolha das histórias a serem trabalhadas, por exemplo –, tal como propõem as pesquisas colaborativas (Bray et al., 2000; Magalhães, 1994/2007; Cole e Knowles, 1993; Rizzini et al., 1999; John-Steiner et al., 1998; John-Steiner, 2000). São, portanto, indícios do esforço da professora-pesquisadora de trabalhar com os alunos, uma vez que pede a participação deles na escolha das histórias, diferentemente do que acontece no ensino tradicional.

Outras escolhas lexicais corroboram essa postura da professora, como, por exemplo, as modalizações de valor pragmático que, segundo Bronckart e Machado (2004), explicitam as intenções do agente (T4: (...) e eu quero que vocês me ajudem a escolher, (...) e eu queria saber... queria que vocês me ajudassem na escolha... das

idéias.). O uso dessas modalizações, expressadas pelo verbo “querer”, revela a intenção da professora em envolver os alunos nas decisões da pesquisa, em torná-los agentes na Atividade Ensino-Aprendizagem de Inglês.

As escolhas lexicais da professora-pesquisadora dão indícios de sua busca pela participação dos alunos; porém, também revelam que para ela, naquele momento, essa participação se restringe à escolha das histórias a serem trabalhados e não à escolha dos jogos que serão realizados e/ou à sua condução, por exemplo: ações que não aparecem em sua enunciação. Esse sentido inicial da professora-pesquisadora sobre os papéis de aluno e professor, apesar de seu desejo em estabelecer um contexto colaborativo é, ainda restringido pelo que foi construído ao longo de sua história pessoal. Para ela, naquele momento, os alunos deveriam participar de algumas decisões do novo projeto, porém as decisões sobre condução das tarefas permaneciam como sendo apenas de sua responsabilidade. Além disso, a escolha ficou restrita ao momento da apresentação da proposta e votação das histórias pelos alunos, sem uma justificativa, por parte da professora, das razões, nem da maneira de utilização dessas histórias e dos jogos.

Num momento posterior dessa discussão (exemplo 2), uma pergunta feita por Vanessa pode revelar a compreensão escolarizada de seu sentido de ensino- aprendizagem e divisão de papéis na aula de inglês: uma relação baseada na transmissão de conhecimento e em avaliações de conteúdo memorizado (V8: Teacher, antes de

qualquer coisa, preciso falar uma coisa... teacher, a matéria da prova... o que que é?

Exemplo 2 – Modos diferentes de ver a divisão de papéis

T13: ( ) Okay... então, ó, eu preciso que vocês me ajudem... a gente pode escolher... quanto vai ser.. três aulas... né?

V7: Teacher ( )

T14: Umas seis histórias... aí eu não sei se vai dar tempo de usar todas, vamos ver como vai ser mas...

((alunos começam a falar ao mesmo tempo))

V8: Teacher, antes de qualquer coisa, preciso falar uma coisa... teacher, a matéria da prova... o que que é? ((aluna abre o livro)) É, é, é, é isso... ((apontando para a matéria no livro)) as roupas...

T15: Hum-hum.

V9: As roupas... o: o:: ( ) T16: As roupas, as abilities...

Obs.: Discussão sobre a Escolha das Histórias, 21 de maio de 2007.

As escolhas lexicais da aluna parecem dar indício das regras que movem as suas ações. Por exemplo, o uso da expressão “antes de qualquer coisa” denota uma urgência que é confirmada pela modalização deôntica “preciso falar”, que, segundo Bronckart e Machado (2004), explicita os determinantes externos do agir, ou seja, aquilo que regula externamente a ação do sujeito. O excerto parece revelar uma tentativa de entendimento da proposta da professora sob a perspectiva do sentido de ensino-aprendizagem que a aluna tem e uma urgência em entender as regras que determinarão a sua ação diante dessa nova proposta. Este trecho também parece demonstrar que há uma preocupação da aluna em localizar os conhecimentos no livro, nas estruturas aprendidas da língua, em função da finalização do curso que se realiza na materialização de uma prova final.