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Aproximações Racionais e Convergentes

1.2 Conceitos da Teoria da Complexidade Algorítmica

2.1.3 Aproximações Racionais e Convergentes

Qualquer fracção contínua permite obter excelentes aproximações racionais para o número real α que representa. Estas aproximações, que se podem obter “truncando” a fracção con-

tínua após cada um dos seus quocientes parciais, constituem de facto uma sucessão de números racionais convergente paraα, recebendo, devido à sua grande utilidade, a seguinte designação:

Definição 2.2 (Convergente). Dados um inteirok ≥ 0 e uma fracção contínua [a0;a1, a2, · · · ],

à fracção contínua finita [a0;a1, · · · , ak] chama-se convergente de ordem k de [a0;a1, a2, · · · ].

Naturalmente, e por se tratar de uma fracção contínua finita, o convergente de ordemk de

uma determinada fracção contínua pode ser escrito na forma de uma fracção simplesAk/Bk.

Nesta fracção,Ak eBk são números inteiros que satisfazem a seguinte relação de recorrência:

               Casos Base: A−1= 1, A0=a0 B−1= 0, B0 = 1 P. Indutivo: Ak=akAk−1+Ak−2 Bk=akBk−1+Bk−2

Os inteirosAkeBkdesignam-se, respectivamente, por numeradores e denominadores parciais

de ordem k, e satisfazem algumas propriedades e relações interessantes a estudar ao longo

deste texto. O ponto de partida para grande parte destes resultados é a seguinte proposição: Proposição 2.3. Os convergentes Ak−2/Bk−2, Ak−1/Bk−1 e Ak/Bk de qualquer fracção

contínua verificam as equações

AkBk−1− Ak−1Bk= (−1)k−1 para qualquerk ≥ 0, (2.2)

AkBk−2− Ak−2Bk= (−1)kak para qualquerk ≥ 1. (2.3)

Demonstração. A demonstração de (2.2) pode ser feita por indução na ordem k do conver-

genteAk/Bk. Deste modo, debruçamo-nos em primeiro lugar sobre esta. Para k = 0, tendo

em conta a relação de recorrência referida anteriormente podemos facilmente concluir que

A0B−1− A−1B0 =a0· 0 − 1 · 1 = −1 = (−1)−1.

Supondo então que (2.2) se verifica para qualquer convergente de ordem menor quek, obtém-

se também

AkBk−1− Ak−1Bk = (akAk−1+Ak−2)Bk−1− Ak−1(akBk−1+Bk−2)

= − (Ak−1Bk−2− Bk−1Ak−2)

(H.I.)

2.1. CONCEITOS FUNDAMENTAIS

o que demonstra o resultado. Quanto à equação (2.3), tendo em conta que (2.2) se verifica para

k ≥ 0 é também fácil de concluir que, para qualquer valor de k ≥ 1, são válidas as equações AkBk−2− Ak−2Bk= (akAk−1+Ak−2)Bk−2− Ak−2(akBk−1+Bk−2)

=ak(Ak−1Bk−2− Bk−1Ak−2)

= (−1)kak.

Com base nesta proposição podemos demonstrar agora dois resultados importantes no con- texto do “método das fracções contínuas”:

Corolário 2.4. Os convergentes Ak/Bk da fracção contínua de qualquer número realα ver-

ificam as seguintes propriedades:

(a) Os convergentes de ordem par formam uma sequência estritamente crescente, en- quanto que os de ordem ímpar formam uma sequência estritamente decrescente; (b) Qualquer convergente de ordem ímpar é maior que qualquer convergente de ordem par; (c) α é maior que qualquer convergente de ordem par e menor que qualquer convergente

de ordem ímpar.

Demonstração. A propriedade (a) é fácil de demonstrar tendo em conta que, de acordo com

a Proposição 2.3, se verifica Ak BkAk−2 Bk−2 = (−1) ka k BkBk−2

para qualquer k ≥ 1. Deste modo, e uma vez que os inteiros ak e Bk são positivos para

qualquer k ≥ 1, facilmente se conclui que o sinal de Ak/Bk− Ak−2/Bk−2 é igual a (−1)k.

Assim, se k é par esta diferença é positiva, e se k é ímpar esta é negativa, ficando portanto

demonstrada a propriedade (a). Quanto à propriedade (b), é conveniente notar em primeiro lugar que, de acordo com (2.2), se verifica a desigualdade

A2k−1

B2k−1

> A2k B2k

para qualquerk ≥ 0. (2.4)

Assim, se existisse algum convergente de ordem par maior ou igual a algum convergente de ordem ímpar teria que se verificar A2k−1

A2k−1

A2k0

B2k0 para algum par de inteiros k, k

0 ≥ 0.

No entanto, e de acordo com a propriedade (a), se k0 < k tem também que se verificar

A2k−1

B2k−1 <

A2k

B2k, enquanto que se k < k

0 tem que se verificar A2k0−1

B2k0−1 <

A2k0

B2k0, sendo cada uma

destas desigualdades absurda tendo em conta (2.4). Deste modo, conclui-se que (b) se verifica. Por fim, e notando que, de acordo com a Definição 2.2, os convergentes da fracção contínua de α constituem uma sucessão convergente para este número real, conclui-se imediatamente

que (c) é também verdadeira.

2. MÉTODO DAS FRACÇÕES CONTÍNUAS

Corolário 2.5. O convergente Ak/Bk de ordem k de qualquer fracção contínua verifica

mdc (Ak, Bk) = 1.

Demonstração. Tendo em conta a equação (2.2), e denotando pord o valor de mdc (Ak, Bk),

facilmente se verifica qued divide obrigatoriamente (−1)k−1, e portanto qued = 1.

Como referido no início desta secção, os convergentes de uma qualquer fracção contínua proporcionam aproximações racionais de grande qualidade ao número por esta representado. O seguinte teorema, de grande importância neste contexto, indica-nos então um majorante para a diferença entre o número representado e estas mesmas aproximações:

Teorema 2.6. Sendoα um número real arbitrário e Ak/Bk o convergente de ordemk para α,

verifica-se a desigualdade α −Ak Bk < 1 BkBk+1 .

Demonstração. Como facilmente se conclui, tendo em conta o Corolário 2.4 é válida para

qualquerk ≥ 0 a desigualdade α − Ak Bk < Ak+1 Bk+1Ak Bk

. Assim, e de acordo com a Proposi-

ção 2.3, é também válida a desigualdade equivalente

α − Ak Bk < |AkBk+1− Ak+1Bk| BkBk+1 = 1 BkBk+1 .

Embora este resultado garanta a qualidade da aproximação efectuada ao utilizarmos um convergente da fracção contínua de α como aproximação a este número irracional, sempre

que o fazemos estamos, ainda assim, a cometer um determinado erro de truncatura. De facto, truncando o desenvolvimento da fracção contínua de um dado número irracional α antes do

quociente parcial de ordemk ≥ 1, verifica-se que existe um número irracional αk > 1 tal que

α = a0+ 1 a1+ 1 a2+ · · · 1 ak−1+ 1 αk (def) = [a0;a1, a2, · · · , ak−1;αk],

o qual representa, de certa forma, o erro cometido na aproximação deα por Ak−1/Bk−1. A

este número irracional,αk, dá-se habitualmente o nome de quociente completo de ordem k.

De modo geral, é costume tomar-se α0

(def)

= α, demonstrando-se facilmente [8, pp. 139–140]

que os restantes quocientes completos da fracção contínua de qualquer número realα verificam α = αkAk−1+Ak−2

αkBk−1+Bk−2

para qualquerk ≥ 1. (2.5)

Como caso particular desta última equação, e resultado de grande interesse no contexto do “CFRAC”, temos o caso dos números irracionais da forma√m, com m inteiro positivo. Para

2.1. CONCEITOS FUNDAMENTAIS

Teorema 2.7. Os quocientes completos da fracção contínua [a0;a1, a2, · · · ; αk] de qualquer

número irracional da formam, com m ∈ N, podem ser escritos na forma αk=

m + Pk

Qk

, (2.6)

tomando P0= 0, Q0 = 1 e, para cada k ≥ 1, Pk=ak−1Qk−1− Pk−1 eQk= (m − Pk2)/Qk−1.

Demonstração. A demonstração deste resultado pode ser feita, uma vez mais, por indução

na ordem k dos quocientes completos. Uma vez que o quociente completo α0 é igual a

m,

facilmente se conclui que o resultado se verifica com P0 = 0 e Q0 = 1. Supondo então que

este é válido para qualquer quociente completo de ordem menor que k, tendo em conta a

hipótese de indução e o facto de que αk = (αk−1− ak−1)−1 podemos naturalmente escrever

αk= 1 √ m+Pk−1 Qk−1 − ak−1 = √ Qk−1 m + Pk−1− ak−1Qk−1 ,

e portanto, tomando Pk tal como no enunciado, obtemos a equação

αk= Qk−1m − Pk = Qk−1( √ m + Pk) m − P2 k .

Deste modo, resta apenas provar queQk−1 | m − Pk2, ou seja, que m − Pk2



/Qk−1 é de facto

um número inteiro. Com efeito, utilizando uma vez mais a hipótese de indução concluímos que

Qk−1 =  m − Pk−12 /Qk−2 com Qk−1, Qk−2 ∈ Z, e portanto que m − P2 k Qk−1 = m − (ak−1Qk−1− Pk−1) 2 Qk−1 = m − P 2 k−1 Qk−1 − a2k−1Qk−1+ 2ak−1Pk−1 =Qk−2− a2k−1Qk−1+ 2ak−1Pk−1,

sendo este obviamente um número inteiro, uma vez que a hipótese de indução garante que

Qk−1, Qk−2 e Pk−1 são números inteiros. Deste modo, Qk−1 | m − Pk2, o que implica que o

resultado é válido também para o quociente completo de ordemk.

Por nos serem de grande importância no decorrer do nosso estudo, utilizamos de agora em diante a notação Pk eQkpara fazer referência aos inteiros definidos neste resultado. Pk eQk

verificam ainda dois outros resultado extremamente importantes, os quais, por estarem na base do funcionamento do “CFRAC”, descrevemos em seguida.

2. MÉTODO DAS FRACÇÕES CONTÍNUAS

Teorema 2.8. O convergente de ordemk − 1 da fracção contínua de qualquer número irra- cional da formam, com m ∈ N, verifica para qualquer k ≥ 0 a equação

A2

k−1− mBk−12 = (−1)kQk. (2.7)

Demonstração. Parak = 0 facilmente se conclui que este resultado é válido, já que A−1 = 1,

B−1 = 0 e Q0 = 1. Suponhamos então que k ≥ 1. Por um lado, tendo em conta a equação

(2.5) o quociente completoαk de ordem k da fracção contínua de

m satisfazm = αkAk−1+Ak−2 αkBk−1+Bk−2 . (2.8)

Por outro lado, tendo em conta o Teorema 2.7 podemos escrever √ m = ( √ m + Pk)Ak−1+QkAk−2 (√m + Pk)Bk−1+QkBk−2 ,

de onde resulta que√m (QkBk−2+PkBk−1) +mBk−1 =

mAk−1+QkAk−2+PkAk−1. Ora,

uma vez que√m é, por hipótese, um número irracional, esta última equação implica que QkBk−2+PkBk−1=Ak−1 e QkAk−2+PkAk−1=mBk−1,

e portanto, resolvendo ambas as equações em ordem a Pk, igualando-as e simplificando a

expressão resultante, conclui-se, de acordo com a Proposição 2.3, que se verifica

A2k−1− mBk−12 = (−1)k−2Qk= (−1)kQk

Lema 2.9. Nas condições do Teorema 2.7, são válidas para qualquerk ≥ 0 as desigualdades

|Pk| <

m e 0< Qk ≤ 2

m.

Demonstração. O resultado verifica-se para k = 0, uma vez que as condições impostas a

m obrigam a que m ≥ 2, e já que, por definição, os inteiros P0 e Q0 são iguais a 0 e 1.

Suponhamos então que o resultado é válido para Pk−1 e Qk−1. Por um lado, notando que

0 < αk−1 − ak−1 < 1 e também que ((

m + Pk−1)/Qk−1) −ak−1 = (

m − Pk)/Qk−1,

facilmente se conclui que 0<

m − Pk

Qk−1

< 1, ou seja, que 0 <m − Pk< Qk−1.

Ora, por hipótese de indução verifica-se Qk−1 < 2

m, pelo que a equação anterior implica

obviamente que |Pk| <

m, como pretendemos. Por outro lado, uma vez que o quociente

completo de ordem k da fracção contínua dem verifica, por definição, αk > 1, tendo em

conta o Teorema 2.7 conclui-se facilmente que 0<Qk m + Pk < 1, ou seja, que 0 < Qk<m + Pk< 2m.

2.1. CONCEITOS FUNDAMENTAIS