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Seguidamente, descrever-se-ão sumariamente o processo de fabrico e as principais características das argamassas de cal aérea, que foram um dos materiais utilizados na campanha experimental desta dissertação.

As argamassas de cal aérea são materiais porosos e higroscópicos, que resultam da mistura de cal aérea, água e areia (em alguns casos, incluindo ainda adjuvantes ou aditivos), num

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determinado traço. O traço é a proporção, geralmente dada em termos volumétricos, dos diversos constituintes de uma argamassa.

A cal aérea é um ligante resultante da cozedura de rochas incluindo na sua composição uma percentagem maior ou igual a 95% de carbonato de cálcio (CaCo3 - rocha cálcica) ou

carbonato de cálcio e magnésio (CaMg(CO3)2 - rocha dolomítica). Das rochas dolomíticas

resulta a cal aérea dolomítica (ou magnesiana) e das rochas cálcicas, a cal cálcica (Faria 2004, por exemplo).

A cal pode ser gorda ou magra consoante o teor de impurezas. A primeira tem cor branca e provém de calcários praticamente puros com teores de carbonato superiores a 99%. A última é acizentada e deriva de calcários com teores de argila e de outras impurezas compreendidos entre 1 e 5% (Sousa Coutinho 2002). Actualmente, a cal normalmente usada nas argamassas de cal aérea é a cal gorda, porque as suas propriedades plásticas concedem bastante trabalhabilidade (Sousa Coutinho 2002, citando Sampaio 1975).

A utilização da cal em argamassas configura, desde o fabrico da cal até ao endurecimento da argamassa, um ciclo constituído por quatro fases: calcinação, hidratação, amassadura e endurecimento (figura 2.4).

Figura 2.4- Ciclo da cal aplicado às argamassas de cal aérea de construção (adaptado de Guimarães e Cincotto 1985)

A calcinação dá-se com temperaturas a rondar os 900ºC. O carbonato de cálcio da rocha decompõe-se em dióxido de carbono (CO2), que é libertado para o ar, e em óxido de cálcio

(CaO), que constitui a chamada cal viva ou virgem:

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Tal como indicado por Margalha (1997) e Faria (2004), a cal usada em argamassas tem de ser previamente extinta (hidratada) visto ser um produto bastante instável (o processo de hidratação pode desencadear-se espontaneamente, por exemplo, apenas pela acção da humidade do ar). Embora haja casos em que a cal viva era previamente misturada com a areia, nomeadamente em argamassa antigas (Margalha 1997), a cal normalmente é extinta antes da sua utilização.Os processos de extinção mais comummente utilizados são a imersão em água ou a aspersão, sendo estes os referidos por vários autores, por exemplo Faria (2004). Existem ainda outros processos, como a utilização de autoclaves referida por Coelho et al. (2009) que, de acordo com este autor, é o processo mais corrente nos EUA. Na presença de água, o óxido de cálcio transforma-se em hidróxido de cálcio:

CaO + H2O  Ca(OH)2 + calor (Equação 2.2)

Na extinção da cal ocorre desagregação, com efervescência e produção de calor, libertação de vapores cáusticos e aumento de volume (geralmente para o dobro). Chega a atingir-se 3 a 3,5 vezes o seu volume inicial (Coelho et al. 2009). O hidróxido de cálcio originado constitui a chamada cal apagada, cal extinta ou cal hidratada.

Da extinção da cal viva por aspersão, realizada com a quantidade de água estritamente necessária à hidratação, surge a cal apagada em pó. No caso de a extinção ser feita por imersão, obtém-se uma pasta que se pode conservar por muito tempo desde que não entre em contacto com o ar. Esta extinção é feita mergulhando blocos de cal viva em água abundante até o material entrar em efervescência; nessa altura são colocados em barris tapados (Coelho

et al. 2009), com uma lâmina superior de água.

À cal hidratada junta-se areia, num determinado traço volumétrico, e eventualmente água, procedendo-se então à amassadura. A água tem que ser potável e concede trabalhabilidade à argamassa. Não deve ser utilizada em excesso, pois tende a aumentar a retracção de secagem da argamassa, o que pode levar à fissuração. A areia deve ser bem limpa. Além de conferir resistência à argamassa, um dos seus objectivos é reduzir a retracção do produto, dividindo-o numa enorme quantidade de pequenas fracções localizadas que arejam a argamassa, facilitando a sua carbonatação, ao mesmo tempo que se dá a secagem.

A cal aérea não endurece debaixo de água, uma vez que não tem propriedades hidráulicas. O endurecimento da argamassa desenvolve-se em duas fases. Na primeira fase, dá-se a evaporação da humidade em excesso, ficando a argamassa firme ao tacto, embora ainda marcável com a unha. A segunda fase corresponde à carbonatação da cal: o hidróxido de cálcio reage com o dióxido de carbono existente na atmosfera, retomando a composição química do carbonato de cálcio original:

Ca(OH)2 + CO2  CaCO3 + H2O + calor (Equação 2.3)

O processo de carbonatação é lento, nomeadamente se o material se encontrar saturado de água uma vez que a difusão do dióxido de carbono é muito mais lenta na água do que no ar. Contudo, este processo precisa de alguma água (Faria 2004).

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Um modo expedito de se verificar se um provete de argamassa de cal aérea já se encontra carbonatado é através do uso de um indicador de pH. O pH é um índice que indica a acidez, neutralidade ou alcalinidade de um meio. Para o caso das argamassas de cal, é sabido que a cal apagada é altamente alcalina e a cal carbonatada praticamente neutra. Pode ser usada uma solução de fenolftaleína como indicador de pH, que adopta cor rosa em meio alcalino e se mantém incolor em meios neutros ou ácidos (Lawrence 2006). De acordo com Agostinho (2008), o uso de fenolftaleína padece de limitações. Foram observados por este autor casos de superfícies que indicavam estar totalmente carbonatadas embora a sua resistência continuasse a aumentar, o que sugeria que o processo de carbonatação ainda estava a decorrer. Não obstante, a aplicação de uma solução de fenolftaleína é o processo correntemente utilizado em laboratório na avaliação da carbonatação da cal em provetes de argamassa, tendo sido também o utilizado na presente dissertação.

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