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Capítulo III. Electrocardiografia ambulatória canina

C. Artefactos associados com a interpretação

Os artefactos relacionados com o aparelho de leitura não são muito comuns e dizem respeito a situações muito pontuais de cada aparelho. No entanto são os mais preocupantes quando se recorre a leituras automáticas (Adamec & Adamec, 2008).

Um artefacto raro é o associado à leitura de uma cassete em sentido oposto ao normal (Adamec & Adamec, 2008).

2.4.2. Ritmos sinusais

O ritmo sinusal é por definição o ritmo considerado fisiológico.

Nos animais o ritmo sinusal representa uma sucessão de complexos sinusais em que cada onda P está associada a um complexo QRS e a uma onda T. O seu ritmo é regular, visto que, os intervalos entre os vários QRS são muito semelhantes apresentando entre si uma variação inferior a 10% (Tilley & Smith, 2008; Ware, 2007; Martin, 2000).

Num cão com ritmo sinusal a FC varia entre 60 a 180 batimentos por minuto (bpm), dependendo do tamanho do cão e do nível de stress que apresenta (Martin, 2000) (figura 7). Quer a frequência quer o ritmo normal dependem da actividade do NSA que é altamente influenciada pelo SNA. Se a FC é menor que o normal, então estamos perante uma bradicardia que tendo origem no NSA é uma bradicardia sinusal; pelo contrário uma frequência elevada é uma taquicardia sinusal (Tilley & Smith, 2008; Ware, 2007; Martin, 2000).

Nos cães é comum detectar-se uma variação do ritmo sinusal, denominada arritmia sinusal ou arritmia sinusal respiratória. Esta caracteriza-se por um aumento e posterior diminuição da FC, detectando-se um padrão de irregularidade cíclico. Geralmente está associada a movimentos respiratórios, diminuindo a FC na expiração e aumentando na inspiração (Tilley & Smith, 2008; Ware, 2007; Martin, 2000).

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Figura 7 – Representação de três segmentos correspondentes, cada um, a 7,5 segundos de

um traçado Holter com ritmos sinusais (NorthEast Monitoring, Inc.).

Legenda: as três linhas dizem respeito aos canais 1, 2 e 3, no sentido cima-baixo; a verde estão os complexos sinusais: A - bradicardia sinusal (± 43 bpm); B – ritmo sinusal (± 90 bpm); C – taquicardia sinusal (± 190 bpm).

Num traçado Holter como não é possível analisar a onda P da mesma maneira que num ECG de rotina, a determinação de um ritmo sinusal baseia-se na identificação de ondas P positivas com morfologia semelhante e com um intervalo PR normal. Uma aceleração ou desaceleração, desde que progressiva, também está associada a um ritmo sinusal; por outro lado um ritmo demasiado regular pode estar associado a um foco ectópico, bem como uma desaceleração abrupta pode estar associada a bloqueio sinoatrial (Adamec & Adamec, 2008).

Frequências muito elevadas podem tornar difícil a leitura sendo fundamental identificar se o seu começo foi gradual ou abrupto. Para isso é útil avaliar um traçado longo (Adamec & Adamec, 2008). Com estas frequências o aparelho pode não detectar complexos prematuros pois a diferença no intervalo R-R entre estes complexos prematuros e dois complexos sinusais com elevada frequência é muito pequena. Assim, estes complexos podem não ser correctamente detectados e analisados (Adamec & Adamec, 2008).

Um estudo de Holter feito a 16 cães saudáveis, de várias raças (Boxer, Labrador, Springer Spaniel, Pointer, Collie, Golden Retrivier, Boarder Collie e cruzados) de ambos os sexos, com peso compreendido entre os 18 e os 34 quilogramas e idades entre os 2 e os 4 anos, demonstrou que a FC mínima e máxima obtida durante os Holter variou entre os 17 e os 46 bpm e os 110 e os 300 bpm, respectivamente. As frequências máximas foram obtidas em períodos em que os animais estavam acordados e estavam principalmente associadas a períodos de exercício ou alimentação; pelo contrário as baixas estavam associadas a períodos quiescentes, nomeadamente sono. Assim a FC atingiu os seus extremos de variação em períodos de excitação ou exercício e sono (Hall et al., 1991). Este estudo salientou, então, a importância de se correlacionar o traçado com os níveis de actividade desenvolvidos (Petrier, 2005) e permitiu também verificar que, os períodos de elevada actividade estão consistentemente associados a aumentos da FC e consequentemente à abolição de períodos de bradicardia e que em alguns animais saudáveis podem detectar-se períodos de arritmia sinusal.

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É curioso verificar que ambos os valores extremos da FC foram detectados no mesmo cão, um Boxer (Hall et al., 1991). Os Boxers realmente parecem possuir características rítmicas peculiares, conforme demonstrado em vários estudos, nomeadamente o de Hall e colegas (1991). Nesse estudo cerca de metade dos animais monitorizados apresentaram arritmias no traçado. Tratavam-se de Boxers de diferentes idades e clinicamente saudáveis. Nos 41,7% que não apresentaram arritmias as FC mínimas detectadas variaram entre os 50 e os 79 bpm e as máximas entre os 153 e os 208 bpm e nos que apresentaram alterações (58,3%) as mínimas estiveram entre os 46 e os 68 bpm e as máximas entre 157 e os 218 (Nogueira et al., 2006).

De modo semelhante ao estudo referido, um estudo realizado com 228 cães Beagle, clinicamente saudáveis, de ambos os sexos, com peso compreendido entre os 8 e os 16 quilogramas e idade entre os 8 e os 24 meses conseguiu correlacionar de um modo preciso a variação da FC com a rotina diária de cada cão. Tal foi possível uma vez que se tratava de animais de experimentação alojados individualmente em ambientes amplamente controlados. Desta forma foi possível constatar que os valores da FC aumentavam nos períodos da manhã em que os animais eram submetidos a períodos de observação, alimentação e prestação de cuidados, diminuindo depois com a diminuição do contacto humano. Depois a meio da tarde com a ausência de contacto humano a FC tendia a diminuir. Assim, constatou-se que a FC varia com as alterações no ambiente envolvente e as actividades desenvolvidas. As FC tenderam a ser mais baixas que as FC mínima de um ECG de rotina, pois incluíram períodos de sono (Ulloa, Houston, & Altrogge, 1995).

2.4.3. Ritmos com hiperexcitabilidade supraventricular (arritmias supraventriculares)