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MORADIAS ESTUDANTIL E DE SUAS FAMÍLIAS

7.5. O contexto das ajudas: o tempo, o custo e a confiança

7.5.2. As ajudas constantes, crônicas e custosas

Buscou-se analisar, nesse subitem, o contexto em que aconteciam as situações das ajudas constantes, crônicas e custosas, as quais, supostamente, poderiam estar associadas a maiores investimentos financeiros e de tempo dos seus provedores. Como situações crônicas foram identificados os aportes recebidos em relação às situações de saúde, viagens, mudanças e pequenos empréstimos, bem como a identificação dos grupos que provinham tais aportes (família, amigos, vizinhos, amigos de igreja, órgãos da instituição, profissionais especializados ou de outros).

135 Gráfico 73 (Elaborado pela autora) – Origem das ajudas constantes, crônicas e custosas

Fonte: Dados da pesquisa.

De modo diferente do que ocorria em relação às ajudas imediatas e de baixo custo, nas situações que envolviam um maior custo e maior tempo no préstimo dessas ajudas, os vizinhos (tampouco a igreja) foram relacionados aos grupos e/aos indivíduos provedores das ajudas. Pode-se supor que essas situações específicas envolvem um maior grau de confiabilidade e proximidade – o que não estaria associado aos vizinhos.

Relataram situações constantes ou crônicas de saúde 32% dos entrevistados. Desse grupo, 36% tinham ajuda da família, seguida pelos órgãos da instituição (24%) e por profissionais especializados (19%)39. Nessas situações, a família estava mais próxima no sentido de acompanhar, mesmo à distância, a melhora e solução dos problemas bem como ajudar financeiramente na aquisição de medicamentos, exames e consultas especializadas, justificando assim seu apoio em maior proporção.

Nas situações de viagens mais custosas, as solicitações recaíam também sobre a família (68%). Essas situações estiveram associadas, sobretudo, às viagens acadêmicas, relacionadas a eventos ou até mesmo de intercâmbio universitário – oportunidades que eram vistas como muito importantes pelos estudantes e pelas famílias. Contudo, a participação de

39Os casos relatados se referiam às situações de enfermidades ou necessidade de cuidados mais específicos e uso

de medicamentos por um período superior a cinco dias, sendo citados: rinites, alergias, sinusites, infecções de ouvido, entre outras.

136 “outros” (14%), dos órgãos da instituição (10%) e até mesmo dos amigos (6%) também foi

relacionada como provedoras em algumas dessas situações. A família era também a principal acionada (53% dos casos) nas situações de mudança. Essas situações envolviam, entretanto, um percentual significativo dos amigos (27%), de órgãos da instituição (12%).

A ocorrência de pagamento nas situações de ajudas constantes, crônicas e/ou mais custosas se dava de acordo com o aporte e o grupo da ajuda. Para melhor compreender essa questão, apresentamos o gráfico a seguir.

Gráfico 74 (Elaborado pela autora) – Situações de ajudas constantes, crônicas e custosas que envolveram pagamento

Fonte: Dados da pesquisa.

Nas situações de saúde, o pagamento esteve associado aos profissionais especializados (46% dos casos)40; aos órgãos da instituição (30%)41, e à família (15%). As

demais situações envolvendo os demais grupos não incluíram pagamento. Nesses últimos casos, a ajuda esteve relacionada a apoio moral, acompanhamento e atendimento ambulatorial e a demais procedimentos realizados gratuitamente dentro ou fora da instituição.

40 Trata-se esses casos de procedimentos médicos, consultas, exames ou medicamentos realizados fora da

instituição.

41 Os pagamentos referem-se a pequenos procedimentos médicos, laboratoriais e medicamentos realizados na

137 O valor envolvido nas situações analisadas também foi um fator determinante no retorno dos préstimos. Assim, por exemplo, as viagens que envolviam maiores custos frequentemente incluíam pagamentos aos grupos associados, mesmo que fossem grupos de maior proximidade dos estudantes. Nesse caso, por exemplo, houve o pagamento dos préstimos aos grupos dos amigos (29%), da família (12%) e dos demais, “outros” (23%), órgãos da instituição (19%). Essa mesma lógica prevaleceu nos casos de pagamento para as mudanças associadas a maiores investimentos por parte dos pesquisados: profissionais especializados (33%), amigos (13%) e família (7%) para os mais diversos serviços.

Tratando-se de pequenos empréstimos, relacionados a pequenas quantias que eram solicitadas, estes se davam pela ajuda de amigos (91%), de outros (75%) e em menor proporção da família (72%). Nota-se que esta situação envolvia pequenos valores, mas em 86% dos casos foi relatada a necessidade do pagamento da dívida.

Em quaisquer das situações analisadas que não acarretassem grandes custos havia um envolvimento maior dos grupos locais – o que foi evidenciado no local de residência dos grupos provedores das ajudas que tiveram suas residências associadas às unidades residenciais de moradia estudantis da UFV, à instituição e ao município de Viçosa. Assim, nessas situações o estudante procurava seus pares, ou seja, aqueles com os quais se poderia contar para determinadas ações, como se representou no gráfico relacionado aos aportes e seus provedores. Nos casos de ajudas custosas, notadamente os casos de mudanças e viagens, a família sempre é a instituição mais solicitada.

138 Gráfico 75 (Elaborado pela autora) – Residência dos provedores das ajudas constantes, crônicas e custosas Fonte: Dados da pesquisa.

Destaca-se que, nas situações de relevância moderada, como mudanças e pequenos empréstimos, o provedor poderia ser também o companheiro de residência, o também morador da unidade de moradia estudantil. Esse dado evidencia a relação de solidariedade estabelecida entre os moradores, cujas situações podem ajudar na criação (ou fortalecimento) dos laços de amizade e de cumplicidade entre os estudantes na situação de compartilhamento da residência.

Considerando que o alto grau de confiança associado aos provedores apresentou índices próximos a 100% em todas as ajudas recebidas, entendemos que a solicitação dos aportes não foi ignorada pelos grupos envolvidos, compondo assim uma rede de apoio à qual o estudante buscava quando necessitava.

139 Gráfico 76 (Elaborado pela autora) – Grau de confiança associado ao provedor da ajudas constantes, crônicas e custosas

Fonte: Dados da pesquisa.

A regularidade do contato entre os estudantes amostrados e os grupos provedores das ajudas de todas as formas de contato foi relacionada na pesquisa, conforme pode ser visto na representação gráfica, observando a incidência do contato pessoal prevalecendo nas ocorrências. Depois dele, os contatos por telefone e a comunicação por meio das redes sociais, e mesmo os e-mails, intermediavam essas relações.

Gráfico 77 (Elaborado pela autora) – Forma de contato com o provedor das ajudas Fonte: Dados da pesquisa.

140 Destacou-se nas situações das ajudas constantes, crônicas e custosas que o apoio vinha preferencialmente da família, seguido dos amigos, órgãos da instituição e dos demais relacionados na pesquisa. As questões que envolviam algum tipo de pagamento estavam relacionadas a procedimentos técnicos ou devolução de valores emprestados, preservando o caráter de empréstimo financeiro, considerando que o grau de confiança em todas as situações de ajuda foi alto e a forma de contato evidenciada com o provedor das ajudas foi pessoalmente.

Podemos compreender que qualquer pessoa pode ser fonte de apoio nas mais diferentes situações relacionadas a saúde, viagens, mudanças e pequenos empréstimos, porém, quando os vínculos revelam relações mais íntimas e de confiança, elas tendem a ser referência para as solicitações de ajuda por parte dos entrevistados. Isso porque, de acordo com Marques (2010), as redes são socialmente específicas e variam segundo o grupo social considerado, assim como entre os indivíduos, além de mediar o acesso a bens e serviços, elas são essenciais para o bem-estar dos indivíduos socialmente providos. Assim, podemos encontrar diferentes estágios de confiança e custos da ajuda que se entrelaçam de forma dinâmica da reciprocidade material, imaterial e simbólica (MARQUES; 2010, p. 189).

Diante dos elementos apresentados, vimos que as redes variaram de acordo com as situações e momentos da vida dos indivíduos em situação de pobreza e em termos de sociabilidade. Outras diferentes situações que necessitaram de ajudas foram exploradas, relacionadas à heterogeneidade das redes para acesso a bens e serviços, influenciando as condições de vida dos indivíduos pesquisadas nesse trabalho, sendo, portanto, apresentadas as ajudas em outras diferentes situações no tópico em sequência.