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CAPÍTULO 01 REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA,

3.4 As Alfaiatarias

Em entrevista com a presidente do SINDCOST, descobrimos que em Cianorte há atualmente apenas seis alfaiates. São trabalhadores que apesar de serem representados pelo Sindicato dos Oficiais Alfaiates, Costureiras, Trabalhadores nas Indústrias de Confecções de Roupas de Cianorte, não são filiados a eles. São homens de idade avançada que atendem a um público muito específico de clientes, também do sexo masculino, geralmente na mesma faixa etária.

É um serviço muito caro e muito raro na cidade hoje, se eles fossem filiados ao nosso sindicato hoje, se enquadrariam mais na condição de empresários, talvez seriam filiados ao sindicato dos empregadores. Os alfaiates de Cianorte não têm mais empregados, nem aprendizes. Os seus funcionários é que poderiam ser filiados ao Sindicato dos Trabalhadores, mas esses empregados não existem mais. Que jovem sonha em ser alfaiate agora? As lojas fazem quase todos os ajustes das roupas, por isso o trabalho deles passou a ser bem menos procurado (EL, Entrevista, 04/02/09).

Com base dos dados oferecidos por EL, tentamos encontrar um desses profissionais na cidade. Encontramos Sr. Cido, com mais de sessenta anos, profissional da área desde os vinte e seis anos, com sua alfaiataria instalada em um bairro próximo ao centro.

Assim como o seu estabelecimento, as alfaiatarias ficaram tão descaracterizadas, com a proliferação das roupas industrializadas e com a concorrência de empresas que produzem roupas em grande escala por preços bem baratos, que ficou quase impossível reconhecê-las na teia urbana. Descaracterizadas, sobretudo pelas diferentes atividades que foram obrigadas a agregar com a desvalorização crescente de seu ofício.

Sr. Cido, por exemplo, há mais de dez anos passou a fazer consertos de roupas masculinas. Disse-nos que há aproximadamente seis anos arruma apenas camisas e calças sociais compridas masculinas, ternos, coletes e até gravatas, mas que hoje, “com a crise de serviços”, arruma também calça jeans, camisetas, qualquer roupa que trouxerem, “mesmo roupas femininas se for o caso”. Às vezes conserta até sapatos masculinos, para aumentar a baixa renda que obtêm atualmente com seus serviços (Entrevista, 04/02/09).

O alfaiate vem de uma família dedicada à costura. O pai era alfaiate61, a mãe e as irmãs eram costureiras, em um período “em que ter esse ofício entre os homens era questão de orgulho”, como nos contou. Os filhos tomaram rumos diferentes na profissão, foram para a área médica, “não quiseram seguir os caminhos profissionais do pai e do avô (Entrevista, 04/02/09).

Ao resgatar no tempo as características dessa profissão, Ferraz comenta que;

Na Inglaterra e nos Estados Unidos, no final do século XIX, os alfaiates passaram a utilizar o trabalho dos emigrantes, especialmente os judeus.62

Depois as mulheres passaram de simples operárias a aprendizes de alfaiates em número cada vez maior, [...], porém ambos contratados como trabalhadores temporários e semiqualificados [...] Por volta de 1898 e 1910, a indústria do vestuário, principalmente na Inglaterra, expandiu- se, no entanto sem causar a falência das lojas de alfaiates, assim como das ‘costureiras a dias’. Pelo contrário, este sistema aumentou o trabalho a domicílio. […] A modernização de todos os processos industriais continuou, introduzindo o planejamento computadorizado, o corte a laser e o desenvolvimento, pelos japoneses, de máquinas que bordam até em tecidos muito delicados. Hoje até a alfaiataria de fábrica por encomenda utiliza pontos feitos à máquina que imitam os aspectos do ponto feito à mão (2007:2).

Em que pese o salto histórico, vale lembrar que com a reestruturação produtiva, ocorrido no setor com mais impulso a partir do início da década de 1990, as

61 No século XVII, na Europa, as lojas de alfaiates eram compostas por comerciantes estabelecidos que

tinham capital suficiente para alugarem uma loja numa zona chique das cidades, para terem estoque de tecidos caros e oferecer crédito ilimitado às pessoas da sociedade que formavam sua clientela. O comércio era sazonal e os trabalhadores das alfaiatarias eram contratados e despedidos conforme as necessidades (FERRAZ, 2007).

alfaiatarias também não desapareceram, se readequaram à lógica da flexibilização do trabalho e dos direitos do trabalhador.

O profissional reclama do status que perdeu junto à sociedade cianortense com a proliferação de lojas e indústrias do setor, segundo ele, “expandindo-se muito rápido, às vezes até com roupas e tecidos de baixa qualidade”. De um profissional que “atendia à um público fiel, sofisticado e restrito, mas que pagava bem pelos serviços, passei a me ver como um trabalhador instável. Cheguei a costurar para donos de grandes indústrias de jeans aqui, que só usavam roupas sociais finas. Alguns ainda procuram os serviços, mas são poucos, como são poucos os que ainda utilizam o trabalho de barbeiros e sapateiros. Tenho um amigo que é cliente há 45 anos. A mulher dele é costureira, mas sou eu quem arrumo as suas roupas.

Na

alfaiataria se sente em casa. Tudo é feito do jeito que ele pede” (Sr. Cido, Entrevista, 04/02/09).

Para quem já chegou a ter três funcionários no passado, hoje, quando costura uma peça inteira, o alfaiate entrevistado faz todo o serviço sozinho - desde o conserto das duas máquinas de costura reta, bastante antigas, que possui no estabelecimento de pouquíssimos metros quadrados, acoplado a uma casa de madeira - até o acabamento da peça.

No início de fevereiro de 2009 entrevistamos o Sr. José63, alfaiate desde

1967 em Cianorte, que nos contou como aprendeu a profissão.

Aprendi a costurar com outros alfaiates, na verdade com um senhor de São Paulo, que sabia e me ensinou. Entrei na alfaiataria como ajudante e aprendiz. Lá eu fazia arremates, pregava botões, arrumava barras de calças compridas masculinas, caseava e assim eu fui aprendendo. Eu era muito jovem, morava no sítio e como em casa tinham muitos filhos homens, minha mãe me botou para aprender a profissão. Ele era vizinho da gente no sítio (Entrevista, 10/02/09).

Sr. José trabalha em uma sala alugada, no centro de Cianorte, com a esposa, que administra o negócio da família e dois filhos. Seus filhos, atendentes, ajudam também na organização do estabelecimento, mas “não seguiram os rumos do

63 Usamos nome fictício para preservar a identidade do entrevistado. A entrevista foi realizada por

pai na escolha da profissão”. Um deles se formou em Administração de Empresas e atende o balcão64. A filha, formada em Biologia e com Mestrado, recentemente passou

a trabalhar em uma empresa do setor financeiro.

O alfaiate possui ainda dois outros funcionários, um inclusive com 82 anos de idade, que veio de Minas Gerais e que está com eles há muitos anos. O “amigo de longa data e companheiro de trabalho” veio para Cianorte viajando como alfaiate. “Naquela época, os alfaiates viajavam demais, saiam de uma região onde a venda e a confecção de roupas estava fraca para procurar outra com demanda melhor, afinal se ganhava e ainda se ganha por peça” (Sr. José, Entrevista, 10/02/09).

Sobre as alternâncias no perfil dos clientes, Sr. José nos relatou;

No começo a maioria de meus clientes era da zona rural. As roupas que eles encomendavam para eu desenhar, cortar e confeccionar eram também para trabalhar na roça. Eu costurava para os senhores que lidavam com o café nessa região. Eles tinham muito dinheiro na época. O que mudou é que esse pessoal não existe mais. Tem uma quantidade muito pequena de pessoas na roça atualmente e os que ficaram estão com problemas financeiros. Esse é para mim o motivo da mudança do perfil dos meus clientes: a questão do êxodo rural (10/02/2009).

O alfaiate entrevistado chegou a ter vinte funcionários na empresa. Mas disse-nos que o número de funcionários sempre variou muito: “já tive vinte pessoas trabalhando comigo, como já tive quinze, três e dez funcionários. Atualmente trabalhamos aqui em seis pessoas. Isso muda muito”.

Ao narrar a respeito das mudanças pelas quais passou sua profissão e suas condições de trabalho, Sr. José enfatizou;

Muitas alfaiatarias deixaram de existir porque o alfaiate permaneceu fazendo aquele mesmo serviço, sem mudar com o tempo. Na década de 1970 em Cianorte, havia mais de vinte e uma alfaiatarias. A cidade era dominada pelos alfaiates. Atualmente temos seis ou sete profissionais destes por aqui. São pessoas com mais idade. Agora minha alfaiataria é mais parecida com uma loja, sou alfaiate e comerciante também. Meu sistema de trabalho é diferenciado. Viver só de “paletozinho profissional”, ou seja, só de mão-de-obra, não dá mais.

Não dá para ficar esperando o cliente chegar e pedir a encomenda de uma roupa, temos que mostrar as roupas para ele, oferecê-las, sofisticar o serviço e o atendimento, oferecer créditos aos clientes, ou seja, produtos de qualidade. Com isso já estou há 33 anos pagando meu INSS (10/02/2009).

Segundo comentários do alfaiate, sua empresa se transformou “em uma loja diferenciada e que atende a um público bem específico e diferenciado também”. Agora, nas vitrines da “loja/alfaiataria” ele expõe ternos, paletós, calças compridas, camisas finas e outros produtos masculinos desenhados, cortados e costurados por ele mesmo. De acordo com o entrevistado, “são produtos personalizados e com alta durabilidade, o que destoa em grande medida das chamadas roupas masculinas industrializadas” (Sr. José, Entrevista, 10/02/09).

Seus serviços são ainda bastante procurados pelos homens da cidade, “de meia idade e principalmente com idade mais avançada”. Mas o seu público mais consistente se concentra entre os vários viajantes e vendedores que freqüentam a cidade ainda hoje. O cliente escolhe uma roupa na vitrine e Sr. João a ajusta conforme as necessidades e gostos do comprador, que pode retornar à loja quantas vezes quiserem para fazer arremates, penças, qualquer outro reparo ou acréscimo na peça. Foi a forma encontrada pelo alfaiate para se manter “nesse mercado local bastante competitivo, flexível e tomado por cursos de especialização na área da confecção”, como comentou (Sr. José, Entrevista, 10/02/09).

Para Sr. João essas pessoas que trabalham se deslocando rapidamente de uma cidade para outra, “geralmente chegam desinformadas no município, não conhecem ninguém e acabam procurando-o para pedir informações, fazer ajustes de roupas para eventos rápidos. E são pessoas que têm pressa, aliás cada dia têm mais pressa para tudo” (Sr. José, Entrevista, 10/02/09).

Porém, afirma que só faz consertos das roupas costuradas por ele próprio. O conserto é algo muito demorado, e não se pode cobrar muito por ele. O cliente pensa que é fácil consertar uma peça, porque ele não entende o processo. Não sabe que a roupa forrada e a bainha invisível dá muito trabalho. É um serviço trabalhoso, delicado, complexo e que leva tempo demais. Confeccionar a peça inteira, como paletó e calça comprida rende mais (Sr. José, Entrevista, 10/02/09).

No parecer de Sr. João a maioria dos estudantes de Moda de Cianorte acaba se especializando no designer de roupas femininas, a chamada ‘modinha’ e têm poucos profissionais especializados na confecção de roupas sociais masculinas.

Se cria muitos modelos de modinha nessa cidade, para atender ao público feminino que é muito diferente do cliente masculino. As mulheres vestem roupas diferenciadas, com aplicação de muitos produtos e variedades, uma modinha diferente por semana. O homem veste uma roupa padrão, não gosta muito de detalhes chamativos nas peças, roupa de homem é mais padronizada até hoje [...]. Os homens mais jovens não vestem mais ternos e paletós, nem vão mais às festas trajados assim. Eles não têm mais o hábito de mandar fazer roupas sob medida. Não têm essa visão que nós tínhamos. Eles só imaginam a roupa quando estão dentro dela, não conseguem prever e imaginar a construção de uma peça, comprar um tecido e idealizar uma peça diferenciada. Os jovens não planejam as roupas mais. Raramente usam uma peça dessas em uma formatura. Eu faço no capricho, no tamanho e nas medidas exatas do corpo. Nas lojas podem até ser mais baratos, mas são diferentes. Vejo na rua pessoas com roupas de tamanhos diferentes de seus corpos, sobrando manga, com costura erradas, pontos largos, faltando tecido é a chamada roupa industrializada e padronizada para todos (Sr. José, Entrevista, 10/02/09).

Mas o alfaiate mostra também o que ele compreende como as vantagens dessas transformações sociais: “a aquisição, por parte dos clientes, de mais informações sobre suas medidas e sobre a moda e a capacidade de escolha quanto ao seu estilo, tipo de uso e de tecido para as roupas. Antes não era assim. Era muito difícil porque os homens pediam a roupa e deixava tudo sob minha responsabilidade. Eu conhecia bem os clientes, mas tinha que ficar fazendo muitos ajustes” (Sr. José, Entrevista, 10/02/09).

A alfaiataria de Sr. João passou por mudanças significativas ao longo desses quarenta e dois anos de existência, mas ele preferiu não alterar muito seu estilo de atendimento.

Antes era tudo diferente. Só para você ter uma idéia: a gente comprava o algodão grosso, fervia a vapor, botava para secar, para só depois poder riscar, cortar e fazer um paletó. Hoje colamos feltro a vapor, fica impecável, lisinho, fácil de passar. Antigamente saía uma moda diferente em São Paulo e demorava dois anos para chegar aqui em Cianorte. Hoje é tudo tão rápido, chega numa velocidade impressionante! Aliás, produzimos moda aqui! As pessoas que vêm de fora querem roupa

rápida. Deixo tudo no jeito. Se precisar fazer alguma alteração é em uma barra e só (Sr. José, Entrevista, 10/02/09).

Em Maringá, município próximo a Cianorte, também Aníbal Verri, 65 anos, há 51 anos como alfaiate, é um desses profissionais que viveram o auge da alfaiataria e resistiram na profissão. Mas para se manter também foi obrigado a diversificar sua área de atendimento, no caso dele passando a produzir roupas para locação.

Na década de 1960 existiam aproximadamente 30 alfaiatarias em Maringá, cada uma delas tinha uns 30 funcionários. Hoje não temos nem a metade disso. [...] o perfil do cliente mudou muito. Atendemos clientes 'especiais', a maioria, gordinhos ou baixinhos, que não encontra nas lojas roupas que respeitem as suas medidas e por isso nas procuram. A qualidade da roupa produzida por um alfaiate também é diferente. É possível personalizar tudo. Fazemos tudo com o melhor material, do jeito que o cliente quer [...] Tenho um cliente que nunca vi. Ele mora em Vilhena, Rondônia. Me envia as medidas dele pelo correio, depois deposita o dinheiro na minha conta e eu mando a roupa. Atendo ele há mais de dez anos e não tenho nem idéia de como ele é [...]. (apud

LANDIM, 2006: 1)

Em cidades como Londrina, Maringá, Curitiba, entre outras no estado ainda encontramos “alfaiatarias ateliês” requintadas, que cobram caro pelos serviços bastante especializados e personalizados, conforme os “gostos e o poder aquisitivo do cliente”. Às vezes esses estabelecimentos, como em Londrina, reúnem em um mesmo espaço e para atender a um único cliente, geralmente do sexo masculino: costureiras, alfaiates, modelistas, designer, entre outros profissionais da moda. Em Londrina há também alfaiates que não possuem mais funcionários no próprio estabelecimento. Eles passaram a fazer roupas sociais masculinas e entregaram a responsabilidade das vendas para os chamados “ambulantes”. São vendedores da própria família, que percorrem de carro os municípios vizinhos e reencontram, geralmente na zona rural, filhos de seus antigos clientes, que no auge da comercialização do café acostumavam freqüentar as lojas65.

Referindo-nos mais a Cianorte, foco da pesquisa, podemos dizer que as condições de trabalho desses profissionais também sofreram as transformações

causadas pela reestruturação produtiva e pela avalanche de facções de roupas que se proliferaram na cidade por conta da busca incessante das(os) empresárias(os) pelo aumento da produção a baixíssimos custos. Seu trabalho especializado, dedicado quase que exclusivamente ao público masculino, foi agora redimensionado e revitalizado pela flexibilização e informalização crescente na produção local de jeans e modinha, tornando-se quase que tão precário quanto o trabalho das costureiras faccionistas e domiciliares.

3.5 Divisão Sexual do Trabalho nas Facções, Alfaiatarias e nas Empresas de Cianorte

A divisão sexual do trabalho, como já demonstrado por Amorim (2003: 24), é uma forma de organização do trabalho, resultante das relações sociais e tem como fundamento uma visão hierárquica e assimétrica em relação ao papel desempenhado pelas mulheres e pelos homens na esfera produtiva e reprodutiva.

Em contraposição à valorização do trabalho masculino, o feminino é avaliado com base em estereótipos sexistas, que atribuem o lugar das mulheres na estrutura hierárquica das empresas ou a permanência delas no trabalho doméstico, ao ‘destino biológico’ do seu sexo, naturalizando, com isso, a condição desigual das mulheres na sociedade (AMORIM, 2003: 24).

Na indústria de confecções de Cianorte, o trabalho nas facções domiciliares, segundo Gonçalves (2005: 132), é “um trabalho sexuado”. O autor enfatiza que a mão- de-obra empregada nas facções é quase que 100% feminina, “salvo casos em que um homem da própria família (filho, sobrinho ou mesmo esposo), passa a contribuir executando qualquer tarefa que exija pouca especialização.”

Na região há uma predominância muito forte da força de trabalho feminino, subcontratada e domiciliar, em todo o complexo produtivo local, especialmente utilizado pelas pequenas e médias empresas do setor de confecção de jeans. Nas empresas de médio e de grande portes, raras em Cianorte, dado o crescimento constante da

descentralização e da terceirização, realizam-se uma inter-relação desigual entre diferentes formas de organização da produção, ou seja, a combinação da introdução de inovações tecnológicas e organizacionais, com a flexibilização da produção através da subcontratação.

Nas grandes empresas a força de trabalho predominante é a feminina. A divisão sexual do trabalho é mais nítida em outros elos da cadeia produtiva, como no corte por exemplo. Dias já havia verificado essa questão;

[...] devido às particularidades que permeiam a indústria de confecções, parcela majoritária do número de empregos criados pelo setor é formada por mão-de-obra feminina. [...] Nesse sentido, as trabalhadoras a domicílio de Cianorte possuem um papel importante na indústria de

confecções da cidade, enquanto mão-de-obra especializada

subcontratada, contribuindo para o aumento da produção e elevação do nível de qualidade dos produtos (1998: 84).

Importante lembrar também, como já fizeram Araújo e Amorim (2001/02), que além da facilidade do transporte do maquinário, a externalização de tarefas produtivas envolvendo as mulheres é facilitada nesse ramo de produção pelo fato de algumas habilidades serem adquiridas por elas através do processo de socialização e de formação de gênero no espaço doméstico. Mas, o grande estímulo para a subcontratação de tarefas, realizadas predominantemente pela força de trabalho feminina, está no fato de que “as empresas podem se beneficiar dos salários mais baixos que são pagos às trabalhadoras nas pequenas e microempresas e no trabalho a domicílio” (2001/02: 276).

Como acrescenta Gazzona:

[...] qualidades e habilidades consideradas naturais à mulher como a docilidade, a menor combatividade, a maior sensibilidade aos problemas da família ou o desempenho de algumas atividades como a costura, são produto de educação e de formação, nem sempre adquiridas por vias formais e sim, por exemplo, como parte das atribuições de uma dona-de-casa (1997: 90).

Mas, o aprendizado da costura, como mais uma das atividades domésticas, a fim de suprir suas necessidades, do esposo e dos filhos, permitiu a muitas mulheres

buscar ofício de costureira a domicílio, usufruindo do ganho derivado dessa habilidade, sem precisar se ausentar do espaço doméstico.

Mesmo levando em consideração as permanências em relação à tradicional inserção da mulher na costura, podem ser visualizadas em Cianorte, paulatinamente, algumas alterações desse perfil, como o rompimento com a idéia de que a função de costureira pertence culturalmente à mulher. Essa mudança ocorre também por ocasião da abertura de novas oportunidades profissionais em etapas anteriores à fase da costura, particularmente para as trabalhadoras que tiveram a possibilidade de ingressarem nos programas de formação e puderam dar continuidade aos estudos, inserindo-se em outros postos como: designs, modelagem e outras funções ligadas às atividades imateriais desse setor. Mas, outras mulheres conseguem apenas empregos temporários durante a preparação da EXPOVEST, no final do ano ou próximo às datas comemorativas, períodos de pico de produção, no contexto da sazonalidade dos produtos fabricados na região.

Como a indústria de confecção, no final da década de 1990, já era a principal empregadora da cidade, segundo Dias (1998), encontrava-se em curso uma participação maior dos homens em atividades produtivas antes exclusivamente ocupadas por mulheres, tais como: cortar, costurar, dobrar e passar roupas nas indústrias e lavanderias. A inserção dos homens, de acordo com o referido autor, ainda

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