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6. ANÁLISES

6.2 As condições relativas aos alunos

6.3.1 As apreensões na aprendizagem de Geometria

As atividades também contemplaram os três processos cognitivos descritos por Duval (2011): visualização, construção e raciocínio, exemplificados a seguir.

A visualização compreende a exploração heurística de uma situação complexa. Para ver uma figura matematicamente é necessário modificar o olhar sem que a representação no papel seja modificada. Esse processo cognitivo pode ser evidenciado na atividade dos canudos, na qual os alunos, a partir de suas construções bidimensionais (2D), realizaram uma desconstrução dimensional para espaços unidimensionais (segmentos de reta) e pontos (0D) de modo a identificar linhas poligonais abertas, fechadas, simples ou não simples em suas próprias produções. Assim, para que fosse possível ver geometricamente estas linhas foi necessária uma desconstrução dimensional em outras formas sem que nada mudasse na figura original.

O processo de construção pode ser verificado em vários momentos, em especial quando os alunos se valeram de instrumentos como régua e transferidor para obter os modelos solicitados (polígonos, polígonos convexos, polígonos regulares, etc.). Neste processo, as ações e os resultados observados são ligados aos objetos matemáticos representados.

Já o raciocínio compreende o processo de discurso para a prova e para a explicação. Ressalta-se que a sequência didática não previa provas ou demonstrações nem explicações para a resolução de questões mais complexas, porém o processo cognitivo do raciocínio pode ser evidenciado a partir de algumas falas dos alunos tais como o trecho a seguir:

Aluno G: Professora eu percebi que é como eu te falei mesmo, pra desenhar a figura a extremidade do segmento que começa é o mesmo que termina, eu desenhei aqui e vi que vale pra toda figura fechada.

Neste trecho o aluno G tenta explicar um procedimento geral encontrado por ele para identificar linhas poligonais fechadas.

Considera-se que o processo de ensino e aprendizagem do conteúdo de polígonos evidenciado nesta sequência didática foi desenvolvido em quatro níveis de apreensão geométrica: sequencial, perceptiva de formas, discursiva e operatória.

As atividades que envolviam construções geométricas requereram as três primeiras formas de apreensão: sequencial – na medida em que os alunos perceberam que a reprodução e/ou a construção das figuras dependiam de propriedades e de instrumentos (régua e transferidor); perceptiva – uma vez que as construções exigiram diversas passagens das dimensões D0 (pontos), D1 (segmentos de reta), D2 (polígonos ou não polígonos) e discursiva – durante a interpretação das unidades figurais (ponto, segmentos de retas, curvas, etc.) enfatizando-se a articulação com os enunciados e as propriedades do objeto a que se pretendia representar.

Já em relação às apreensões operatórias (ou tratamento figural) que segundo Duval (2012) são as operações que o aluno realiza na figura inicial de modo a auxiliá-lo na resolução de um problema ou no cumprimento de uma atividade, foi possível destacar modificações mereológicas, óticas e posicionais.

Dentre as modificações mereológicas que compreendem a divisão de uma figura em várias subfiguras foi possível destacar as operações de reconfiguração e de desconstrução dimensional.

As operações de reconfiguração que se apoiam na percepção permitindo modificações ou decomposições da figura em unidades figurais de mesma dimensão puderam ser evidenciadas nas atividades da elaboração do quebra cabeça, representada pela Figura 32(a), pois os alunos decompuseram o polígono regular (2D) em vários outros polígonos (2D) e, também na atividade que envolvia os canudos, Figura 32(b), na qual após a construção dos objetos (2D) solicitou-se aos alunos que identificassem em suas próprias representações linhas poligonais (2D) e as classificassem.

Figura 32: Operação de reconfiguração identificada na atividade (a) quebra cabeça e (b) atividade dos canudos

32(a) 32(b)

Fonte: acervo da pesquisadora

Conforme apresentado na Figura 32(a), com o intuito de constituir as peças do quebra cabeça poligonal, o aluno decompôs o heptágono regular em sete polígonos distintos; já na Figura 32(b) o aluno decompôs a casa em linhas poligonais. Estas operações caracterizam a apreensão operatória, pautada na modificação mereológica de reconfiguração, pois não houve

mudança de dimensão a partir da figura inicial: em ambos os casos a dimensão da figura inicial era bidimensional e após as decomposições estas permaneceram na mesma dimensão.

Já as operações de desconstrução dimensional puderam ser evidenciadas nas atividades que envolviam as fichas de atividade (B e D) que solicitavam a classificação das linhas a partir de desenhos previamente destacados (Figura 33) e na identificação a partir de suas próprias representações, respectivamente, nas quais alguns alunos, a partir das linhas (2D), identificaram os segmentos de reta (1D) e os pontos de intersecção (0D) com a finalidade de classificá-las.

Figura 33: Operação de desconstrução dimensional identificada na ficha de atividade B

Fonte: acervo da pesquisadora

Na Figura 33 é possível evidenciar a apreensão operatória a partir de uma modificação mereológica que envolve a desconstrução dimensional: a partir das linhas poligonais (bidimensionais) o aluno identificou os segmentos de reta (unidimensionais) e os pontos (dimensão zero) com a finalidade de classificar as linhas em poligonais ou não poligonais.

As modificações óticas foram evidenciadas a partir das reproduções que os alunos fizeram da lousa para o caderno, realizando uma redução das figuras de modo que a segunda fosse vista como imagem da primeira.

As modificações posicionais que tratam do deslocamento em relação a um referencial também foram evidenciadas na atividade de montagem dos quebra cabeças (Figura 34). Nota- se que, para compor o quebra cabeça, os alunos precisavam modificar várias vezes as posições dos polígonos de modo a obter o polígono regular que dava origem às peças.

Figura 34: Modificações posicionais realizadas na formação do quebra cabeça

Fonte: acervo da pesquisadora

Dessa forma, considera-se que a sequência didática promoveu a formação, o tratamento e conversão de registros de representação semiótica, o que pode ter contribuído para a atividade cognitiva específica da aprendizagem em geometria, em especial do conceito de polígono.