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As CDT, as Equipas Técnicas e o relacionamento entre ambas

No documento Dispositivos de Controlo das Dependências (páginas 76-80)

3.6 Tentativa de interpretação transversal

3.6.2 As CDT, as Equipas Técnicas e o relacionamento entre ambas

Recordemos que os membros das CDT foram nomeados uma única vez40, estando em funções desde 12 Julho de 2001, embora o fossem por um período de três anos41, eventualmente renováveis. Não nos foi possível apurar quaisquer outros despachos semelhantes, pelo que desde já reputamos de anómala a situação.

Sabemos quem são os membros das CDT, pois os seus nomes constam do supracitado despacho. Ficamos foi sem saber qual a sua formação específica para o exercício do cargo. Foram nomeados, logo não foram escolhidos por concurso. Na ocasião, foram conectados com nomeações políticas e partidárias, mas foi com eles que se começou a trabalhar numa perspectiva técnica.

Conseguimos apurar que existem as mais variadas formações entre os membros das comissões. Em todas elas existem juristas nomeados pelo Ministro da Justiça. Depois,

40 Despacho nº 14 539/2001 ( 2ª Série) em 12 de Julho de 2001 do Gabinete do Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros

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Vide nº 1 do artº 3 do Decreto-Lei nº 130-A/2001 de 23 de Abril, prevendo o seu nº 2 que o mandato dos membros da comissão é renovável por idênticos períodos.

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há “um bocadinho de tudo – psicólogos clínicos, técnicos do serviço social, pessoas sem formação específica, licenciados em ciência politica, em religião, em literatura, etc. Mas também há psiquiatras, psicólogos, etc.”.

Foi preciso tempo para retirar esta conotação e esta carga política. No fundo, foram nomeações de ministros diversos e não se teve em conta o curriculum e o perfil das pessoas. Este nem sempre era o mais adequado, como acontece em muitas nomeações.

Tal facto levou a algumas tensões junto da equipa técnica, que procurava trabalhar numa outra perspectiva.

Com o tempo os membros das comissões foram fazendo formação, supervisão, seminários, e a maior parte deles foi interiorizando uma lógica de intervenção, que se foi construindo ao caminhar. Conseguiu-se trabalhar nesses moldes, embora, tanto quanto conseguimos apurar, persistam disparidades.

No início não foi especialmente fácil. Os membros das comissões partiram para o terreno imbuídos da concepção: “substituto de um órgão soberano”, “esta matéria não depende agora dos Tribunais, somos a comissão”, “ a comissão, por si é soberana”!

A autonomia foi encarada, essencialmente, quanto ao contexto, à realidade cultural, social, às estruturas que são diferentes no litoral e no interior, no norte e sul e nas regiões autónomas. Segundo os entrevistados há algumas disparidades, em termos de funcionamento, em termos de lógica de intervenção, mas não especialmente graves. No fundo, já são alguns anos no terreno e foram estabelecendo, de facto, uma rede, que se articula com as estruturas que existem a nível local.

Facilmente se notaram ambivalências, quer entre os membros das comissões, quer entre as comissões e as equipas técnicas. Trabalhar em rede não é fácil e não se consegue de um dia para o outro.

Quando os membros das CDT foram nomeados, tiveram uma formação teórica, entre outras, sobre toxicodependência, legislação, contra-ordenações, etc. Mas essa formação não passou pelo IDT.

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As equipas técnicas, tanto quanto viemos a apurar, foram a grande aposta do IDT. Com a equipa técnico-administrativa abriu-se uma «porta», que a comissão poderia consultar. “Não é taxativo, não é vinculativo, mas a CDT tem essa possibilidade. Pode não o fazer, e como tal podem ser soberanos (o presidente com os vogais), mas não estão sós”.

Contrariamente ao que se passou com as CDT, a constituição das equipas técnicas foi por concurso nacional.

Mais de mil candidatos foram avaliados do ponto vista curricular e alguns passaram à fase de entrevista. Só depois desta é que foram formadas as equipas, preferencialmente com técnicos que demonstrassem experiência na área.

Foi aproveitado e dada preferência a candidatos que, para além de terem um percurso na área das toxicodependências, (estágios, formações, experiência nos CAT, nas unidades terapêuticas), tivessem a sua situação profissional instável e não definida. Tiveram a oportunidade de estabelecer um contrato de trabalho sem termo, que lhes oferecia outra estabilidade. Aproveitou-se, por exemplo, alguns dos técnicos de serviço social que à altura estavam como mediadores do programa “Vida e Emprego” e como tal, com alguma «fragilidade» de emprego. Foram encarados como uma mais valia, devido ao facto de terem experiência de mediação, e com esta componente de vida e emprego, com outras perspectivas de ressocialização. A parte mais clínica foi suprida com técnicos que tinham experiência oriunda dos CAT.

Estas equipas técnicas são normalmente constituídas por um psicólogo clínico, um técnico de serviço social, um jurista para apoiar o jurista membro da comissão, e dois outros técnicos administrativos, todos com formação e experiência.

Em Junho de 2001 decorreram acções de formação sobre aquilo que pareceu pertinente aos responsáveis na altura, dado o perfil das pessoas, os conhecimentos que tinham, sendo portanto, uma formação já muito direccionada.

A par de módulos específicos, a formação foi conjunta para juristas, psicólogos e técnicos de serviço social.

Assinalemos por interessante que até os administrativos tiveram uma formação na área da toxicodependência, pois considerou-se que, se iriam lidar com uma população específica, importava terem uma formação a condizer – tipo de população, familiares, pessoas ansiosas, inquietas, agitadas, perturbadas, algumas patologias mais correntes e

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vicissitudes do dia a dia, como lidar com as pessoas de uma forma muito pragmática –, e que soubessem mais do que as simples questões específicas, como sejam as jurídicas ou administrativas e processuais (organização do processo, actos da secretaria, notificações, etc.). Aos poucos, sentiram-se parte integrante de uma equipa. Mas mais, segundo os responsáveis pela formação, tiveram consciência que iam fazer parte de um dispositivo e que iam lidar com um utente alvo muito diferente do de um supermercado ou banco.

O pessoal técnico teve uma formação distinta e específica na área da intervenção, da redução de danos e da reinserção, pois iria trabalhar em moldes muito diferentes daqueles utilizados até então no IEFP ou nos CAT.

Muita formação, supervisão, reuniões conjuntas. Por vezes só com os membros das CDT, outras só com os técnicos. Por fim, reuniões conjuntas com toda a equipa, para poderem coordenarem a actuações.

Era fácil antecipar o que poderia surgir do ponto de vista relacional entre os membros da comissão e da equipa técnica, era necessário prevenir possíveis clivagens na compreensão e legitimação do dispositivo. Caso contrário, só haveria «ruído», o que tornaria a acção pouco eficaz.

Em bom rigor, às comissões, o IDT só assegurou o apoio técnico que se revelasse necessário ou conveniente, e que não estivesse cometido por lei a outra entidade.

O Departamento de Apoio às Comissões para a Dissuasão da Toxicodependência do IDT não tem a tutela das comissões, não está investido de poder para efectivar, de facto, uma tutela, para poder dar orientações.

Para o conseguir, teve que obter «reconhecimento social». Os técnicos, ao socorrerem- se do departamento, embora funcional e hierarquicamente dependentes das comissões, criaram as condições para esse reconhecimento.

Não foi um percurso fácil, nem linear. Os membros das comissões não reportam ao Ministro (da tutela), porque no seu entendimento isso não faz sentido. Eles acabam por reportar ao departamento, de forma mais sistemática uns que outros. Isto tem a ver mais com as necessidades e o entendimento de cada um. Acerca de tudo o que era importante

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ou não, foram assim compelidos a lidar com esta experiência em rede, na base do senso comum, esquecendo o sentido da hierarquia.

Rede ou pirâmide? Uns nomeados, outros por concurso, uns investidos de um poder que diríamos legal ou político, outros de um poder vindo do saber técnico e da praxis, todos teoricamente coordenados, numa ambivalência muito grande.

No documento Dispositivos de Controlo das Dependências (páginas 76-80)