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Capítulo 2 A Humidade em Museus

2.2 Clima Interior em Museus

2.2.3 Risco e Conforto Higrotérmico

2.2.3.1 As Coleções

Os objetos museológicos que fazem parte das coleções são constituídos por uma variedade enorme de materiais como: a pedra, a madeira, os têxteis, o marfim, etc. que apresentam comportamentos diferentes quando sujeitos às mesmas solicitações higrotérmicas. A falta de controlo das condições higrotérmicas pode causar danos, muitas vezes irremediáveis, nos objetos que constituem as coleções, pois se há materiais que se comportam bem quan- do expostos a humidades muito elevadas, há outros que, quando a humidade relativa e con- sequentemente teor de humidade diminuem, contraem-se e deformam-se. Por outro lado, ambientes muito húmidos são favoráveis ao aparecimento de fungos e ao desenvolvimento de bolores. Os três tipos de deteriorações que se podem encontrar nos objetos museológi- cos são: os danos físicos devidos a variações dimensionais, as reações químicas e a biode- terioração. Na Tabela 2.11, Francesca d’Ambrosio e Vanessa d’Agostino procuram estabe- lecer uma relação entre as causas e as deteriorações provocadas pelos agentes de degrada- ção: humidade relativa e temperatura.

Tabela 2.11 — Agentes de degradação [40].

Agente de Degradação Deterioração Causas

Humidade Relativa Valores muito altos ou muito baixos - Bolores

- Corrosão (valores elevados) - Diminuição da capacidade re- sistente (valores baixos)

- Mudança do tempo/clima - Humidade de condensação - Humidade de infiltração - Ventilação insuficiente - Humidade ascensional - Limpeza Variações rápidas - Fraturas - Dobras - Deformações Temperatura Valores altos ou baixos - Aumento da deterioração - Diminuição da capacidade re- sistente

- Aquecimento inadequado - Mudança do tempo/clima - Iluminação

- Isolamento do edifício insu- ficiente

- Controlo do aquecimento in- suficiente Variações rápidas - Fraturas - Dobras - Deformações

Entre 1999 e 2001, decorreu um projeto Europeu de investigação multidisciplinar que teve como objetivo identificar as principais causas de risco para o património cultural devido a utilização inconsciente da tecnologia e ao turismo em massa. A análise efetuada às condi- ções higrotérmicas de quatro museus, expostos a diferentes condições climáticas e de polu-

ição, permitiu concluir que: os museus tradicionais localizados em edifícios históricos be- neficiam da ação de armazenamento de temperatura e humidade relativa das espessas pare- des e dos revestimentos interiores constituídos por materiais higroscópicos; os sistemas de ar condicionado são em geral projetados para o conforto dos visitantes e muitas vezes fun- cionam apenas durante o período de abertura dos museus, esta prática pode ser perigosa para os objetos museológicos pois provoca alteração dos gradientes de temperatura e hu- midade no tempo e no espaço; o turismo em massa é rentável no entanto produz um impac- to negativo nos objetos museológicos, na medida que os visitantes transportam para o inte- rior dos museus partículas poluentes, o vapor de água, o dióxido de carbono e o calor [41].

De forma a complementar as condições de conforto e de risco higrotérmico de vários tipos de materiais que constituem os objetos museológicos, apresenta-se na Tabela 2.12 e na Ta- bela 2.13 o risco de deterioração devido à ação da temperatura e da ação da humidade rela- tiva que traduzem um conjunto de requisitos para as condições ambientais de armazena- mento, exposição ou empréstimo das coleções ou objetos museológicos. Estes requisitos constam da Specification for Environmental Conditions for Cultural Collection – PAS 198 publicada no Reino Unido, pelo BSI em Março de 2012.

Tabela 2.12 — Risco de deteriorações devido à ação da temperatura (adaptado de [35]).

> 30 Itens com baixa sensibilidade

Itens com sensibilidade moderada Itens com elevada sensibilidade (materiais quimicamente instáveis)

Intervalo de temperatura que exigirá um gasto reduzido de energia no inverno-primavera Intervalo de temperatura que exigirá um gasto reduzido de energia no verão-outono Intervalo de conforto humano para visitantes Requisito mínimo legal se as pessoas trabalharem no mesmo espaço

Risco de danos causados pelo congelamento de tubos, etc. abaixo de 5 °C

← → ← ← 30 24 26 16 18 20 22 28 Considerações Energéticas Temperaturas de Referência Estabilidade Quimica 12 14 Temperatura (ºC) -20 -5 0 2 4 6 8 10

Tabela 2.13 — Risco de deteriorações face à ação da humidade relativa (adaptado de [35]).

0 100

Elevada sensibilidade à hidrolise Sensibilidade média à hidrólise Baixa sensibilidade à hidrólise Estabilidade

Mecânica

Intervalo de segurança para a maior parte de itens higroscópicos não compostos e não forçados para evitar danos mecânicos Risco de desenvolvimento de fungos/bolores a 20ºC

Risco de crescimento de fungos/bolores Energia reduzida exigida para humidificação no inverno-primavera Energia reduzida exigida para deshumidificação no verão-outono 90 Estabilidade Quimica Risco de fungos/bolores Considerações Energéticas Humidade Relativa 10 20 30 40

Os materiais orgânicos podem tornar-se menos flexíveis, aumentando o risco de danificação por utilização indevida

50 60 70 80

Cada objeto museológico pode ser constituído por vários tipos de materiais, no entanto, analisando as tabelas apresentadas, podem-se tecer algumas considerações gerais para as condições de temperatura e humidade relativa das coleções ou objetos museológicos [35]:

— As altas temperaturas são prejudiciais para os objetos dos museus, pois potenci- am o desenvolvimento de reações químicas e em alguns materiais podem até causar deteriorações físicas inaceitáveis;

o Nos materiais orgânicos a taxa da reação duplica em cada aumento de temperatura de 5 °C;

o Os materiais quimicamente instáveis (materiais que se autodestroem), como por exemplo: o papel ácido, os filmes de nitrato ou acetato, a celu- lose e os objetos de borracha, requerem atenção especial, pois as altas temperaturas são extremamente prejudiciais;

o Alguns materiais como os plásticos, as ceras, as resinas, as colas, as pin- turas e os vernizes, quando expostos a temperaturas superiores a 30 °C, são suscetíveis de sofrer distorções permanentes, alterações de aspeto ou do ponto de fusão.

— As baixas temperaturas podem levar à deterioração física de alguns materiais plásticos e alguns tipos de pinturas que se tornam quebradiços;

o Muitos materiais toleram temperaturas extremamente frias, (na ordem dos -30 °C) podendo estas reduzirem os problemas de autodestruição química;

o Para temperaturas inferiores a 5 °C, as coleções correm maiores riscos de deterioração devido à possibilidade de congelamento das águas das tubagens e posterior inundação.

— As variações de temperatura do ar ao longo do tempo podem causar deteriora- ções físicas inaceitáveis;

o Se a temperatura do objeto variar mais rapidamente que o tempo de res- posta térmica desse objeto, ocorrerá um gradiente interno de temperatura que causará tensões internas que darão origem a dilatações e contrações nos materiais;

o Quando os objetos museológicos são constituídos por diferentes materi- ais, o problema torna-se mais grave;

o Os materiais frágeis como a cerâmica e o vidro, especialmente quando combinados com camadas de metais, são exemplos de materiais que apresentam este tipo de deteriorações quando sujeitos a variações brus- cas de temperatura.

— Os elevados valores de humidade relativa têm influência nas dimensões, na forma dos objetos e nos processos químicos e biológicos;

o Os materiais higroscópicos têm capacidade para adsorver moléculas de água, pelo que, com o aumento da humidade relativa dilatam e com a diminuição retraem. Com as variações de peso, os materiais deformam- se, partem fibras e fissuram;

o A corrosão dos metais, a descoloração dos têxteis e o enfraquecimento das fibras são reações químicas que são favorecidas com valores eleva- dos de humidade relativa;

— A humidade relativa não deve descer abaixo dos 30 % pois o risco de danos fí- sicos aumenta rapidamente. Cada redução de 5 % abaixo dos 30 %, causa quase o dobro da resposta dimensional em relação à redução de 5 % quando a humi- dade relativa está acima dos 30 %;

— Tal como acontece com a temperatura, a variação da humidade relativa não po- de ser repentina quando comparada com o tempo de resposta dos objetos. As va-

riações de humidade relativa repentinas geram um gradiente interno de humida- de relativa que pode provocar danos físicos.

— A definição dos limites de temperatura e dos limites de humidade relativa deve ser em conjunto devido à relação existente entre elas;

— A conjugação de valores de humidade relativa acima dos 65 %, com valores de temperatura acima dos 20 °C aumenta o risco de desenvolvimento de bolores e acelera o ciclo vital de numerosos insetos.

Na Tabela 2.14 apresentam-se as condições higrotérmicas de referência, (humidade relativa e temperatura) para alguns tipos de materiais que constituem os acervos museológicos, re- colhidas por Francesca d’Ambrosio e Vanessa d’Agostino.

Tabela 2.14 — Valores médios da humidade relativa e temperatura de diversos materiais que constituem os objetos museológicos [40].

Classe Temperatura [°C] Humidade Relativa [%] Armaduras, armamento 15-25 0-65 Marfim, ossos 0-25 20-65 Bronze 15-25 0-60

Papel, pasta de papel 15-25 0-65

Coleções anatómicas (animais, múmias...) 0-25 20-55

Coleções mineralógicas, esculturas e pedras 10-30 0-70

Couro, peles, pergaminho 18-24 35-65

Registos fonográficos 10-60 40-60

Fita magnética 4-21 40-60

Coleções botânicas 18-24 35-65

Filmes e fotos a cores -5-15 0-50

Filmes e fotos a preto e branco -5-20 0-60

Insetos e caixas entomológicas 15-24 40-65

Tintas orientais 19-24 35-65

Madeira 15-25 35-65

Madeira pintada, esculturas policromáticas 19-24 35-65

Livros, manuscritos 12,8-24 0-65

Tabela 2.14 — Valores médios da humidade relativa e temperatura de diversos materiais que constituem os objetos museológicos [40].

Classe Temperatura

[°C]

Humidade Relativa [%]

Materiais plásticos 19-24 30-50

Metais e ligas, latão, prata, chumbo, cobre e liga de estanho 20-25 0-65

Mobiliário embutido e lacado 19-24 35-65

Mosaicos 6-25 0-60

Ouro 21-23,5 0-55

Pinturas Murais 6-25 45-65

Papiros 21-25 0-65

Pastel, aguarelas, desenhos 6-24 0-60

Impressões 19-25 0-65

Pelos e penas 15-25 25-60

Tecidos pintados 0-24 35-65

Porcelanas, cerâmicas, grés e terracota 16-30 0-70

Seda 2-25 30-65

Têxteis, carpetes, tapeçarias 2-25 35-65

Vidros 18-23,5 0-60

No passado, tentou-se estabelecer intervalos de temperaturas e humidades relativas univer- sais que fossem seguros para toda a coleção, o que resultou na adoção de condições insegu- ras nas coleções mais atípicas e no uso irracional da energia. Hoje, os materiais e as estru- turas dos objetos museológicos que constituem a coleção é que determinam esses interva- los e as variações de temperatura e humidade relativa admissíveis [35].

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