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4. Os fatores linguísticos e extralinguísticos

4.8. As condições de referência

Conforme expusemos anteriormente, o PU apresenta um paradigma verbal

reduzido, de cinco e quatro flexões. Temos cinco quando os falantes empregam a

segunda pessoa direta com a sua desinência distintiva, e quatro quando os

falantes empregam mais a desinência zero, isto é, a 2ª pessoa indireta conjugada

na 3ª pessoa singular. Da mesma forma que no PB, acreditamos que esse

número reduzido de flexões também levou o PU a valer-se mais das formas de

sujeito preenchidas. Como consequência disso, Duarte (2003:120) afirma que “é

compreensível que o licenciamento do sujeito nulo passe a depender das

condições de referência, ou seja, quanto mais acessível o referente, mais

facilmente se licencia e se identifica o sujeito nulo”. Nesse sentido, conforme

vimos anteriormente, quando não há um referente acessível, há um favorecimento

do preenchimento do sujeito e, ao contrário, quando temos um sujeito

sintaticamente acessível, o sujeito nulo é a opção realizada.

Para Calabrese (1986, apud D

UARTE

, 1995:), que trata das condições de

referencias do italiano, para que o sujeito nulo se realize nessa língua, deve ter

um referente esperado, por outro lado, a realização do pleno “implica uma

referência disjunta ou a inaceitabilidade da sentença”.

De acordo com Duarte (2003), no seu estudo da fala popular carioca, a

realização do sujeito nulo ou pleno vai depender das condições estruturais de

referência, isto é:

1. o referente sintaticamente acessível favorece o sujeito nulo se o

antecedente está em função de sujeito, sem elementos intervenientes que

ameacem a identificação do sujeito, com o qual mantém identidade de

referência;

2. o referente não sintaticamente acessível favorece o sujeito pleno se o

antecedente está em outra função sintática que não seja a de sujeito ou há

elementos intervenientes entre o sujeito e seu antecedente ou nos casos

de contraste ou ênfase.

Como podemos observar, os contextos de referência são muito importantes

para observar a realização ou não do sujeito. Cabe observar, antes de prosseguir,

que dadas as características do tipo de amostra com que contamos não pudemos

realizar a análise quantitativa que esperávamos fazer em relação ao fator

condições de referência. Como se trata de um texto de língua falada, que foi

transcrito seguindo as normas de transcrição de Análise da Conversação, no

momento de realizar a análise sintática tivemos sérias dificuldades pela sua

estrutura que poderíamos classificar de fragmentada em termos de uma sintaxe

mais adequada à análise da escrita; o texto apresenta muitas frases truncadas,

elipses, inclusive do sujeito, em especial quando se trata da resposta a uma

pergunta feita imediatamente antes pela entrevistadora. Nesse sentido, Corrêa

Dias (1999:187), falando a respeito das condições do texto da língua falada,

aponta que “a simultaneidade entre o planejamento e a produção do texto deixa

suas marcas na sintaxe: desvios, construções fracassadas, interrompidas,

excesso de intromissão de elementos extra-estruturais e assim por diante”. Com

base no que aponta Corrêa Dias, e pelas dificuldade que enfrentamos no

momento de realizar a análise sintática nas 37 entrevistas que compõem a nossa

amostra, optamos por não codificar as condições de referência e somente

apresentar alguns exemplos de como elas ocorrem no PU.

A seguir, ilustramos alguns exemplos das condições de referência no PU,

de acordo com o que aponta Duarte (2003) para o PB.

• Exemplos nos quais o referente é sintaticamente acessível e o

antecedente está em função de sujeito, sem elementos intervenientes:

(1) Eu oio é o SBT que dišem... É o que cv más oio, as novela, filme. (A 13)

(2) porque.... nós trabaiemos no Uruguay se cv vamo trabaia y se cv vamo contrabandeá y cv

compremo lá y cv deišemo o dinhero lá não tein nenhuma grasa... entonse cv compremo lá e cv deišemo o dinhero lá nunca cv deišemo aqui... ( L.79-83- A1)

(4) y as pesoas se não contrabandeiam... de que cv veven

Conforme Duarte (2003), no PB já se observam ocorrências de pronomes

plenos também quando o referente está sintaticamente acessível; também no PU

registramos alguns casos desse tipo, como em:

(5) as ves eu sinto até vergonha porque eu gostaria de falá /asim qui sei eu que nós falase

tudo em espanhol (L-A7)

(6) si fose más barato aquí cv não te digo que eu não compraria biste?..(B1)

(7) Al meno foi o que o Presidente dise... que ele ia tomá medida cuando estabilisasen us

presio (B4)

(8) é brabo é como te digo uma profesora de espanhol daqui de Rivera que:: sigue a carrera

de profesora de idioma espanhol... ela erra, numa proba que ela erra ela ža perde u ano... por qué? por o maldito portunhol... eu eu pra mí é pésimo (B7)

• Exemplos em que o referente não é sintaticamente acessível, pois o

antecedente está em outra função sintática que não a de sujeito:

(9) eu tenho uns conhesidos qui moram en Montevidéu né? que agora cv estão na situasão

económica... beim não? y tu sabe qui eles faseim di tudo pratratá de escondé que eles são daqui (B7)

(10) eu tenho uma amiga que não deiša que a gurisinha fale. Reta ela cuando ela tá

falando...(B12)

• Exemplos em que o referente não é sintaticamente acessível, pois há

elementos intervenientes entre ele e seu antecedente:

(11) Brasilero é más ...música cv festeža tudo. cv veve na na alegria... nei que cv težem

(12) Uma profesora de espanhol daqui de Rivera que:: sigue a carrera de profesora de idioma

espanhol... ela erra, numa proba que ela erra, ela ža perde u ano... por qué? por o maldito portunhol... eu eu pra mí é pésimo (B7)

(13) Doc: claro e:: a tua mãe falava contigo em em dialeto... sempre falou?

Em dialeto... sempre sempre cv faló em dialeto... tanto é asim que era na:: dificuldade de

ela falá espanhol ela imediatamente voltaba a falá o dialeto porque era a manera de nós

entender .

• Exemplos de referente não sintaticamente acessível, casos de

contraste ou ênfase:

(14) Doc: tu gosta da tua lingua? Não sei eu gosto, mas eu gostaria de falá espanhol né?

Ah eu ašo qui teim ... cv não sei, porque eles pronun/pronunsiam palabras assim, mais por exemplo, nos disemo “más” e eles “ mais, eu qui sei né? (A7)

(15) é ruim é a mesma cosa ansim que nós temo te dišendo como uruguaio eles vão te diše a

mesma cosa (L142-43-A14)

(16) bueno pra iso tá nós somos... portu/ portunhol... nós não semo brasilera neim semo

uruguaia... nós temo acá/aquí nu portunhol este:: nós somos portunhol (C2)

(17) ah eu penso que:: eu me sinto más a vontade cum o dialeto no? cum u dialeto más a

vontade (L123-C14)

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