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1 FORMAS DEMOCRÁTICAS E A HISTÓRIA DA ANGOLA

1.3 MATRIZ AFRICANA

1.3.6 As Consequências Imediatas da Guerra

Passada uma década, o exército português continuava a luta militar na África, o que obrigava a mobilizar importantes meios financeiros e militares, sem vislumbrar resultados positivos. Em certas frentes de luta, como Guiné-Bissau, poder-se-ia mesmo dizer que as tropas coloniais sofriam algumas derrotas graves e humilhações, apesar do aparato das forças ao seu dispor, além do fato de a “manutenção da ordem pública” ter- se transformado numa aventura militar. Pensava-se que viria a ser a sua ação esperada, forçando, pouco a pouco, os militares portugueses às diferentes frentes de combate na África, tomando consciência da impossibilidade de uma vitória militar no continente africano. Ora, se é verdade que, face aos movimentos de libertação de Angola, as forças portuguesas davam ares de encontrar poucas dificuldades, a situação noutras regiões do continente africano era muito diferente.

Na Guiné-Bissau, depois de uma análise objetiva das condições da luta armada, seguida de boa preparação militar, psicológica e moral dos combates, o Partido Africano para a independência da Guiné-Bissau e das Ilhas de Cabo-Verde (PAIGC), sob a direção do seu líder carismático, Amilcar Cabral, obteve 1963 resultados satisfatórios. Botelho Moniz,

ministro português da defesa dessa época, foi obrigado a admitir os sucessos dos guerrilheiros guineenses contra as suas tropas.

Na mesma ocasião, também admitiu que o Movimento de Amílcar Cabral controlasse 15%, do território nacional. Em tais condições, como compreender a constante teimosia de Lisboa em não conceder a independência à Guiné-Bissau, ainda que pressionada pelas críticas do brigadeiro Louro de Sousa, que considerava que a guerra estava definitivamente perdida; a única explicação plausível talvez se justifique pelo temor de ver essa decisão servir de ponto de contágio entre Angola e em Moçambique.

A morte brutal de Amílcar Cabral, em janeiro de 1963, em nada modificou a situação existente, pelo contrário. Após terem ultrapassado as dificuldades no interior do movimento, os combatentes do PAIGC, dotados, já nessa altura, de armamento sofisticado fornecido pela ex-URSS, lançaram, a partir de maio de 1973, várias ofensivas militares contra as tropas portuguesas, em diferentes zonas de combate. Esses ataques foram batizados de “Operações Amílcar Cabral”, em homenagem ao líder do seu movimento; o sucesso foi de tal ordem que, em setembro daquele ano os guineenses proclamaram (unilateralmente) a independência do seu país.

Por seu lado, Moçambique entrou em guerra contra Portugal, em 1964. Foi precisamente nesse ano que a Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO) lançou os seus primeiros ataques nas regiões de Nyassa e de táctica, sob a direção de Samora Machel, que acabara de ser empossado como líder da organização. Depois da morte de Eduardo Mondlane, o movimento fez convergir os seus esforços de guerra para a região de Tete, considerada o centro nevrálgico do país, pois era ali onde se encontrava a maior concentração de colonos portugueses. A essa altura, um dos militantes mais exaltados e zelosos do regime fascista de Lisboa, o general Kaúlza de Arriaga, convencido, de antemão, do sucesso das suas opções estratégicas, lançou a operação “Nó Górgio”, que mobilizou mais de 30 mil homens armados a serviço de Portugal; visava, segundo os termos dos seus mentores, à erradicação da FRELIMO do território moçambicano (MBAH, 2010, p. 240).

Mais tarde, humilhado pelo fracasso da operação “Nó Górgio”, apesar da utilização massiva de bombas napalm, o exército português organizou, em 1972, uma série de represálias contra as populações civis moçambicanas suspeitas de simpatias para com os guerrilheiros. Esses massacres tornaram-se célebres na história colonial de Moçambique; os locais em que os mesmos tiveram lugar passaram a servir de memórias para as gerações vindouras. Eis dois desses locais: o primeiro em Wiriyamu, onde houve mais de 400 mortos, e o segundo em Mucumbra.

Segundo Mbah (2010, p. 241), a presença militar portuguesa naÁfrica não devia ultrapassar os 105 mil homens: 54 mil em Angola; 20 mil na Guiné-Bissau e 31 mil em Moçambique.

Essa fragmentação de forças nas zonas de combate levava mais em conta a necessidade de prolongar, indefinidamente, a guerra do que as condições particulares da situação militar real, observada em cada país. Pode-se evocar a realidade econômica, em particular o peso dos investimentos estrangeiros, sobretudo em Angola.

Sob o ponto de vista militar, não restam dúvidas: a Guiné-Bissau era de longe a frente de guerrilha mais bem organizada, a que mais problemas ocasionava às forças armadas coloniais portuguesas. Paradoxalmente, Angola, a mais fraca das três frentes, foi acolônia que maior número de tropas portuguesas recebeu. Vale salientar que essa opção era sobretudo resultante de interesses de ordem econômica e humana, ao contrário da Guiné-Bissau e Moçambique, que antes de qualquer coisa constituíam importantes colônias de povoamento. Em Angola, tratava-se não somente de proteger os interesses econômicos estrangeiros, mas também garantir a segurança dos colonos portugueses.

Outro fato importante, capaz de estigmatizar a degradação da situação militar na África, era o número de homens em armas, que não cessou de aumentar a partir de 1973, à medida que crescia a pressão exercida pelos movimentos africanos de guerrilha. Como resultado, o exército português contratou então 65.592 homens, em Angola, entre os quais 27.819 recrutados no país e 37.773 vindos de Portugal, em 1961; no princípio da guerra, essa cifra era de 28.477 soldados (MBAH, 2010,p. 242).

A percentagem dos efetivos das tropas, resultados no seio do exército colonial, Portugal, na qualidade de potência de ocupação, tinha-os na sua maioria. No conjunto das suas forças baseadas em África, 71% eram constituídas por soldados vindos da metrópole, contra 29% recrutados na África. Este número variava sempre, em função das três colônias africanas. Em Angola, registavam-se 69% de portugueses contra 31% de angolanos; na Guiné-Bissau, a relação era de 84% portugueses para 16% de africanos; em Moçambique 60% contra 40% (MBAH, 2010, p. 242).

As estatísticas sobre perdas humanas do lado das tropas portuguesas, em doze anos de guerra, entre 1961 e 1973, são relativamente modestas. Não se dispõe, até à data, de números oficiais. Segundo o que consta nessas estatísticas, o número de vítimas foi avaliado em 8.831 mortos, nas três frentes africanas, repartidos da seguinte maneira: 3.455 em Angola, 3.136 na Guiné-Bissau e 2.240 em Moçambique. A metade dessas vítimas, estimadas em

cerca de 4.280 soldados portugueses, teriam morrido em combate, dos quais 1.369 em Angola, 1.342 na Guiné-Bissau e 1.569 em Moçambique (MBAH, 2010, p. 242).

O processo de descolonização, isto é, luta de libertação nacional angolana tinha especificidade muito interessante; sendo que fatores externos também contribuíram para a agudização dos conflitos entre os movimentos e o atraso da descolonização. Para ser mais preciso, o trio FNLA, MPLA e UNITA teve apoio externo, para que lutassem contra o principal opositor, Portugal. O MPLA era apoiado pela União Soviética e seus aliados e, na África e posteriormente pela ex-Zaíre. A FNLA tinha o apoio, inicialmente, dos EUA, China e, em África, pelo ex-Zaire (RDC). Finalmente, a UNITA tinha o apoio da China, mais tarde, da África de Sul e da Zâmbia.

No entanto, parecia que o domínio português estava a se desenhar para o final, tendo- se em conta os seguintes fatores: O dia 25 de abril de 1974 é uma data que marcou a política nacional em Portugal, internamente, mas que influenciou, do ponto de vista externo, as suas colônias: Moçambique, Guiné-Bissau, Cabo Verde, S. Tomé e Angola, a queda da ditadura salazarista e o início da democracia em Portugal. Trata-se da famosa ‘Revolução dos Cravos’, que implicou a extinção da ditadura em Portugal pelos militares portugueses do Movimento das Forças Armadas.

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