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1 FORMAS DEMOCRÁTICAS E A HISTÓRIA DA ANGOLA

3.1 EXERCÍCIO DAS LIBERDADES PÚBLICAS

3.1.1 Liberdade de Reunião e de Manifestação

Esta liberdade, em epígrafe, é consagrada na CRA no seu art. 48. Tem sido um dos direitos mais polemizado. Quando os cidadãos, ou uma organização querem exercer este direito, surgem situações que contrariam o que está plasmado na Constituição. E um dos constrangimentos tem ligação com a leitura ou interpretação do nº 2 do artigo em estudo: “as reuniões e manifestações em lugares públicos carecem de prévia comunicação à autoridade competente, nos termos e para os efeitos estabelecidos por lei”.

Constata-se, muitas das vezes, que as autoridades angolanas impedem as manifestações, argumentando que não lhes foram solicitadas. Ora, a Constituição não diz que se deve solicitar somente, mas comunicar. Assim, se está perante uma violação da Constituição; quando, às vezes, são realizadas surgem relatos de que os cidadãos são agredidos física e moralmente.

Embora se registre que as manifestações constituem direitos consagrados na Constituição angolana de 2010, todavia, a sua concretização na vida real do cidadão tem sido questionada, uma vez que a interpretação desse assunto, por parte das autoridades, tem sido frequentemente contrária ao legalmente obstruída basta observar as diversas tentativas de manifestações em que cidadãos, de forma singular e coletiva, fizeram. Há exemplos de manifestações que algumas sociedades civis organizaram e que lhes foram negadas pelas autoridades nacionais, sobretudo nas províncias; isto em 2010, após a entrar em vigor a Carta Magna. “Não parta minha casa” é o título de uma manifestação que se realizaria na província de Benguela, pela OMUNGA40 – uma das organizações da sociedade civil, sediada na província: pretendia evocar a sua indignação pela retirada compulsiva das populações de suas

habitações, por autorização do executivo angolana em nome de projetos de reorganização habitacional.

Assistimos na praça pública em Angola manifestações pró-executivo, que são levadas a cabo pelas organizações da sociedade civil, cujas bases políticas são pró-MPLA. Existem outras que as autoridades no poder político as rotulam de anti-MPLA e que são influenciadas pelos partidos políticos da oposição. Importa, por enquanto, dizer que a interpretação da lei de manifestação está a ser “interpretada” de forma equivocada, justamente pelas autoridades que dirigem o partido no poder, MPLA, e que esteve na liderança do apoio da atual Constituição, que consagra este mesmo direito. Não raras vezes, quando ocorrem manifestações, as autoridades alegam que precisam de previa autorização. Segundo a Constituição Angolana, no nº. 1, art.47 CRA, os cidadãos ou organizações que queiram exercer o direito à manifestação têm de, somente, comunicar às autoridades, para que estas possam se precaver de eventuais excessos, isto é: defender os participantes na marcha.

Se, por um lado, apresentou-se certa lista de fatores - a questão da história política do país, a guerra e a falta de cultura democrática - que concorrem, ainda, para que os direitos de cidadania não sejam exercidos de forma efetiva, é porque também outras questões devem ser observadas. Como, por exemplo, a existência das forças ocultas por detrás das manifestações das populações, consubstanciadas com a falta de liberdade de pensamento, de expressão e de imprensa. O caso mais paradigmático foi a publicitação de uma manifestação para o ano de 2011, o famoso “7 de março”, o qual tinha como propósito a reivindicação das políticas do regime MPLA/José Eduardo dos Santos. O MPLA, como forma de se contrapor, chamou a sociedade para que fizesse uma marcha no dia 5 de março; dois dias antes, portanto, para desencorajar a manifestação do dia 7, fato que surtiu o efeito desejado.

Se a democracia é um regime que vela pelo poder do público e em público, então, a manifestação marcada para 7 de março de 2011 não estava a cumprir alguns pressupostos legais e/ou democráticos, visto que não foram apresentados os rostos das pessoas ou do grupo de pessoas que estaria à frente da tão propalada manifestação. Logo, se se acreditar que a democracia é um regime que se baseia na legalidade dentro das normas, então, nada se poderá ocultar, sobretudo numa manifestação de caráter público. Por outro lado, houve tentativas de manifestações formalmente bem fundamentadas, que foram obstruídas pelo partido da situação, MPLA, alegando que estavam a criar “confusão” na sociedade angolana. Uma vez mais, uma forma de manipular a sociedade.

No entanto, após o “7 de março de 2011, em situação em que se vivia naquele ano na Líbia (manifestação da população contra o ditador Mohamar Kadhafi), as autoridades

angolanas, constatou-se que começaram, embora timidamente, a permitir que os cidadãos pudessem manifestar nos locais públicos.

No dia 3 de setembro de 2011, ocorreu uma outra manifestação, protagonizada por grupos de jovens estudantes universitários, contra o “excesso” do Presidente da República no poder e contra a situação de vida social dos cidadãos. A polícia reprimiu os manifestantes, majoritariamente jovens. Aquela repressão resultou em mortes, feridos, apreensões, e condenação de alguns jovens. Estima-se que 21 jovens foram condenados a 3 meses de prisão. A sociedade civil, com destaque da ADRA foi a público com um comunicado41 (ADRA, 2011), para deplorar a atitude da polícia Nacional de Angola por ter, uma vez mais, descumprido a CRA:

a) O direito à manifestação está consagrado na lei e deve ser garantido pelas autoridades do Estado;

b) As manifestações são legais, ainda que mobilizadas por partidos políticos e,

c) As detenções devem acontecer apenas como forma de evitar a violência da lei e, quando ocorrem, devem ser feitas no estrito cumprimento da lei.

Para Hilário e Webba (2010, p. 51-52), este processo, referia-se a questão das manifestações, sofre um retrocesso, na medida em que o legislador ordinário não regulamentou, ainda, a alteração da norma constante da lei sobre reunião e manifestação que pune as autoridades que proíbem os direitos referidos. Se a Constituição não alega a autorização por parte das autoridades para as pessoas que queiram manifestar, somente estas têm a obrigação de comunicar; então, é uma violação dos direitos fundamentais do cidadão, relativamente a esta questão concreta.

Segundo conversa informal mantida com um dos cidadãos ativos e regulares nas diversas manifestações que se realizaram em Angola, sobretudo em Luanda, aponta que os agentes da polícia nacional vêm cometendo atos criminosos, pois, em vez de salvaguardarem a lei e a ordem, maltratam os manifestantes, quer de ponto de vista físico, quer psicológico, ou seja, reprimem as manifestações de forma brutal, não raramente usando “gases muito estranhos”. Além disso, no momento de prestarem os depoimentos, a polícia nacional não é fiel à veracidade dos fatos; reproduzem as falas dos políticos no poder, atribuindo aos manifestantes os rótulos de “arruaceiros” (malcriados) (MUCUTA, 2011). Portanto, a polícia

41 Comunicado que resultou do Conselho Diretivo da referida Associação. Que teve como agenda “posição

pública sobre manifestações no país”, em 10 de setembro de 2011, Luanda. Posteriormente, no fecho deste trabalho, surge em última da hora novo comunicado alegando a sua posição pública sobre a manifestação que ocorreu em Luanda no dia 10 de março de 2012.

nacional em Angola tem-se mostrado ser apenas mais um dos instrumentos do Poder Político vigente.

Ainda de acordo com este interlocutor, as manifestações nada têm a ver com os impulsos de forças estrangeiras ou nacionais, antes, são frutos da fome e da miséria que assola o povo angolano. É muito comum faltar água, e pão, durante as manifestações; logo, como alegar que forças internacionais estão por detrás dos jovens manifestantes? Trata-se, na realidade, de se desviar a atenção do foco, pois “mas vale morrer a lutar, do que morrer à porta do hospital, por falta de um medicamento urgente.

O acesso às fontes de informação, à liberdade de imprensa e expressão entre outras categorias informativas que ajudam o cidadão em estar informado sobre as mais variadas questões de utilidade pública e privada são um do viés que a democracia liberal decreta. Para não ser muito fastidioso, o presente estudo apenas debruça-se sobre a liberdade de imprensa, omitindo referência a outras categorias de natureza midiática.

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