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As contribuições da análise da interação para o

Consideramos também como Varizo (1995) que, nas últimas duas décadas, cada vez mais a escola pública vem sendo freqüentada por segmentos da sociedade que anteriormente não tinham acesso a ela, com vistas a uma escola para todos. Convivem na sala de aula alunos das mais diversas características culturais, interagindo, então, diferentes valores que diferem, por sua vez, dos valores do próprio professor. Isso dificulta a atuação do professor, que não conhece normalmente os padrões de julgamento, valores e aspirações de seus alunos, o que acaba dificultando a comunicação entre alunos e professor. Os sociolingüistas já mencionados, como Gumperz e Hymes, no final dos anos sessenta, verificaram que importantes divisões sociais nas modernas sociedades de massa como: classe, raça, etnia e background de língua materna se correlacionam com as diferenças no estilo de comunicação. Essas diferenças de estilo entre professores e alunos teriam uma importância muito grande no baixo rendimento escolar e no ânimo dos alunos provenientes de grupos minoritários. Se os professores e os alunos têm diferenças nas expectativas implícitas no que diz respeito aos comportamentos apropriados ao contexto, eles acabam se comportando de forma que cada um cometa falhas de interpretação. Suas expectativas são derivadas de experiências fora da escola, naquilo que os sociolingüistas denominam comunidades de fala ou redes de fala (GUMPERZ, 1972). As redes se caracterizam por grupos de pessoas que se associam estreitamente e que passam a compartilhar suposições comuns a respeito de

estilos e usos apropriados de comunicação. Segundo Hymes (1972), os modos de falar culturalmente distintos diferem de uma rede de fala para outra:

As diferenças culturais nos modos de falar e de escutar entre a rede de fala da criança e a do professor, de acordo com a explicação do processo comunicativo, levam a sistemáticas e recorrentes falhas de comunicação na sala de aula. (HYMES, 1972)

Erickson (1987) relata o seguinte exemplo em relação a essa questão: Se o estudante vem, por exemplo, de uma rede de fala em que as perguntas diretas devem ser evitadas por serem consideradas intrometidas e o professor as faz, esse aluno pode achar que o professor está bravo; em outra situação, se o professor pertence a uma rede de fala que considera que as pessoas devem ter contato direto nos olhos e o aluno, por sua vez, aprendeu que não se deve olhar diretamente e por isso tem um olhar desviado, o professor pode achar que o aprendiz está confuso ou chateado, ou ainda, que ele é mal educado. Desse modo, os alunos percebem, em algum nível, quando a escola está aceitando as suas maneiras de atuar (e, portanto, as de sua comunidade) e, assim, sentem-se seguros como se estivessem em um ambiente familiar.

Segundo Erickson, a concepção sociolingüista passou a ser, em meados dos anos setenta, muito questionada pelo sociólogo John Ogbu. Ele argumentava que a causa do fracasso escolar estava fora dos bancos escolares. Segundo o seu ponto de vista, o motivo principal para o baixo rendimento de muitos alunos, nos Estados Unidos, provenientes de grupos minoritários (negros, mexicanos e

porto-riquenhos) residia no fato de estes estudantes, tanto quanto seus pais e companheiros, acreditarem que o sucesso escolar não os ajudaria a destruir as injustiças no acesso ao emprego que atribuíam ao racismo endêmico na sociedade americana. A percepção do mercado de trabalho pelos grupos minoritários de imigrantes asiáticos era diferente, pois, encorajados por seus pais, acreditavam que o esforço e a persistência na escola seriam recompensados com um emprego futuro. (ERICKSON, 1987)7

Para Erickson (op. cit.), é também fundamental que professor e alunos tenham confiança entre si, porque o ensino-aprendizagem é como um contrato de risco entre professor e aluno: se o aluno não confia no professor, o aluno não irá correr um alto risco de revelar-se a si próprio e aos outros como incompetente em situação de ensino-aprendizagem. Concordamos com o autor e consideramos que na construção da interação em sala de aula podem se produzir mal- entendidos, adivinhações e conflitos, para cuja resolução a confiança mútua é necessária.

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Para Erickson, a questão de linguagem na construção do sucesso ou do fracasso escolar é fundamental: “Sejam quais forem as razões do fracasso escolar nas escolas, é necessário que os educadores transformem as práticas rotineiras e os sistemas simbólicos em suas próprias escolas, bem como trabalhem para modificar a sociedade mais ampla. Mudar a sociedade é um objetivo muito vasto, mudar as sociedades escolares é também um objetivo amplo, pois envolve uma reorientação nas lutas diárias da prática escolar de um trabalho coletivo que visa ao sucesso. Esta posição enfatiza o papel dos estilos comunicativos verbais e não-verbais, culturalmente adquiridos, na explicação dos altos índices de fracasso escolar dos alunos de status socieconômico baixo e background étnico e cultural minoritário. ” (ERICKSON, 1987:3)

CAPÍTULO 2

METODOLOGIA E CONTEXTUALIZAÇÃO DA PESQUISA

A nossa trajetória profissional compreende doze anos de atuação em sala de aula na educação infantil, no ensino fundamental de 1ª a 4ª, de 5ª a 8ª séries e também no ensino médio, visto que Letras é nossa área de formação inicial. No princípio, lecionamos em unidades de ensino pertencentes à extinta EDUCAR, à FUMEC (Fundação Municipal para a Educação Comunitária), à Secretaria de Educação do Estado de São Paulo na cidade de Campinas e à Secretaria de Ciência e Tecnologia, a qual estava vinculada à Escola Técnica Estadual “Conselheiro Antonio Prado” (ETECAP) e os sete últimos anos do exercício do magistério foram dedicados à Rede Municipal de Ensino de Campinas. No final deste período, tivemos a oportunidade de substituirmos, durante três anos, a direção de uma escola municipal específica para o ensino de jovens e adultos.

Desse modo, como tínhamos recentemente concluído a graduação na Faculdade de Educação da UNICAMP e realizado um trabalho de Iniciação Científica sobre a influência da língua materna na aprendizagem de noções matemáticas de crianças pré-escolares, nos despertou o interesse de examinar se e como a interação na e pela linguagem natural proporcionaria benefício semelhante na aprendizagem de matemática de pessoas jovens e adultas em situação de suplência de 5ª a 8ª séries.

Com o intuito de verificar o encaminhamento de nosso estudo para o contexto dessa escola, conversamos com uma das professoras de matemática desta unidade sobre a possibilidade de realizarmos a pesquisa nos módulos do

período vespertino, nos quais ela lecionava na época, por se configurarem turmas menores e de maior possibilidade de análise. Ela aceitou o convite e concordou que as aulas fossem inicialmente gravadas em áudio, mas requisitou que o pequeno gravador ficasse em um estojo, a fim de que, segundo ela, os alunos se soltassem no começo; já mais tarde, na ocasião de efetuarmos os registros em vídeo, já estavam todos de tal forma envolvidos que ela mesma explicou aos alunos o objetivo das gravações e se dispôs a trazer a sua filmadora com tripé para realizarmos a seqüência das imagens.

O nosso estudo é, então, resultado de uma pesquisa qualitativa, que foi viabilizada mediante a análise de interações em aulas práticas e teóricas de matemática neste Centro Municipal de Educação de Jovens e Adultos, denominado Modular8, situado na zona urbana, periferia de Campinas.

Foi neste contexto que desenvolvemos nossa coleta de dados durante dois semestres, no decorrer de vinte aulas, sendo que cinco foram gravadas em áudio e quinze em vídeo; além das gravações, tivemos o auxílio dos registros do diário de campo, de conversas informais, das anotações da professora sobre o seu conhecimento de cada aluno do nível I e de uma produção de texto da educadora sujeito da pesquisa a respeito da sua formação e sua experiência profissional.

Acordamos que a professora assistiria a todas as fitas e participaria da realização das transcrições bem como receberia um retorno escrito da pesquisa

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Nesta escola, as disciplinas são regulamentadas com a mesma carga horária de todos os cursos oficiais de Educação para Jovens e Adultos (EJA), sendo totalmente presencial, porém, a diferença é que os alunos, em forma de módulos, cursam cinco aulas seguidas diárias com o mesmo professor e igual componente

realizada com seus alunos. Ela também solicitou que fosse informada sobre a data da defesa da dissertação, manifestando interesse em assistir.

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