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As diretrizes curriculares estaduais para o ensino de História na

CAPÍTULO 3 AS POLÍTICAS PÚBLICAS E O CONHECIMENTO

3.3 MATERIAIS NA DÉCADA DE 2000

3.3.1 As diretrizes curriculares estaduais para o ensino de História na

O documento, disponibilizado virtualmente no Portal da SEED-PR, tem 94

páginas.34 Nas páginas iniciais estão identificados o Governador do Estado, Roberto

Requião; a Secretaria de Educação, Yvelise Freitas de Souza Arco-Verde, e a Chefe do Departamento de Educação Básica, Mary Lane Hutner. Destaca também a Coordenadora das diretrizes curriculares estaduais, Maria Eneida Fantin.

Quanto à equipe técnica pedagógica responsável pela elaboração das diretrizes na disciplina de História, estão citados Edilson Aparecido Chaves, Fábio Luciano Iachteche, Juraci Santos, Mara Rúbia Lemos Debacco Hamann, Marcelo Fronza e Nádia Maria Guariza.

Na página de créditos há também referência a leitores críticos, tanto na disciplina específica – Marlene Rosa Cainelli (Universidade Estadual de Londrina) e Nádia Gaiofatto Gonçalves (Universidade Federal do Paraná), como da área pedagógica – Iria Brzezinski (Universidade Católica de Goiás), Lia Rosenberg

34 Disponível em:

(Consultora independente), Marcia Angela da Silva Aguiar (Universidade Federal de Pernambuco), Sofia Lerche Vieira (Universidade Estadual do Ceará) e Walter Esteves Garcia (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico).

A Carta da Secretaria de Educação (p.7) destaca o significado da publicação das diretrizes, após um período longo de construção “por meio de uma metodologia que primou pela discussão coletiva ocorrida, efetivamente, durante os últimos cinco anos e envolveu todos os professores da rede”.

Outro ponto relevante é a motivação que originou o processo de discussão e produção das diretrizes, conforme expresso na mesma Carta:

Um olhar para dentro das escolas permitiu identificar a ausência de reflexão sistematizada sobre a prática educativa que ali ocorria, e o foco da formação continuada, então oferecida, fugia da especificidade do trabalho educativo e situava-se em programas motivacionais e de sensibilização, em sua grande maioria.

Tais políticas educacionais, estabelecidas no final da década de 1990, alteraram a função da escola ao negligenciar a formação específica do professor e esvaziar as disciplinas de seus conteúdos de ensino, de modo que o acesso à cultura formal ficou mais limitado, principalmente para as camadas socialmente marginalizadas.

Contrapondo-nos a esta concepção, salientamos que, para a maioria da população brasileira, a escola constitui a alternativa concreta de acesso ao saber, entendido como conhecimento socializado e sistematizado na instituição escolar (GOVERNO DO PARANÁ, 2008).

Portanto, é explicitamente na contraposição às políticas do governo anterior que as diretrizes são elaboradas na década de 1990, de acordo com o discurso oficial. Mas a força da proposta, neste caso, também está na discussão realizada com os professores durante alguns anos, como se explicita na Carta do Departamento de Educação Básica:

Ao longo dos anos de 2007 e 2008 a equipe pedagógica do Departamento de Educação Básica (DEB) percorreu os 32 Núcleos Regionais de Educação realizando o evento chamado DEB Itinerante, que ofereceu, para todos os professores da Rede Estadual de Ensino, dezesseis horas de formação continuada. Em grupos, organizados por disciplina, esses professores puderam, mais uma vez, discutir tanto os fundamentos teóricos das DCE quanto os aspectos metodológicos de sua implementação em sala de aula (GOVERNO DO PARANÁ, 2008).

Finalmente, do ponto de vista oficial, destaca-se o papel da formação continuada voltada ao ensino e à valorização do conhecimento escolar, conforme as palavras da Secretária:

Com essas Diretrizes e uma formação continuada focada nos aspectos fundamentais do trabalho educativo, pretendemos recuperar a função da

escola pública paranaense, que é ensinar, dar acesso ao conhecimento, para que todos, especialmente os alunos das classes menos favorecidas, possam ter um projeto de futuro que vislumbre trabalho, cidadania e uma vida digna (GOVERNO DO PARANÁ, 2008).

Por esses elementos destacados do documento, pode-se dizer que a ideia de escola, nessas diretrizes, de certa forma retoma a perspectiva da pedagogia histórico-crítica que marcou as diretrizes estaduais da década de 1990.

Quanto à estrutura dos documentos, reproduz-se a seguir trecho da carta do departamento aos leitores:

Assim, os textos que compõem este caderno se apresentam na seguinte ordem e estrutura: o primeiro, sobre a Educação Básica, inicia com uma breve discussão sobre as formas históricas de organização curricular, seguida da concepção de currículo proposta nestas diretrizes para a Rede Pública Estadual, justificada e fundamentada pelos conceitos de conhecimento, conteúdos escolares, interdisciplinaridade, contextualização e avaliação.

O segundo texto refere-se à sua disciplina de formação/atuação. Inicia-se com um breve histórico sobre a constituição dessa disciplina como campo do conhecimento e contextualiza os interesses políticos, econômicos e sociais que interferiram na seleção dos saberes e das práticas de ensino trabalhados na escola básica. Em seguida, apresenta os fundamentos teórico-metodológicos e os conteúdos estruturantes que devem organizar o trabalho docente.

Anexo a esse documento, há uma relação de conteúdos considerados básicos para as séries do Ensino Fundamental e para o Ensino Médio. Tais conteúdos foram sistematizados a partir das discussões realizadas nos encontros descentralizados (DEB-Itinerante) e deverão ser ponto de partida para a organização das Propostas Pedagógicas Curriculares das escolas da Rede Estadual de Ensino (GOVERNO DO PARANÁ, 2008).

As Diretrizes Curriculares para o Ensino de História nos Anos Finais do Ensino Fundamental e no Ensino Médio (DCE) propõem o ensino por meio de temas. Justifica-se que os temas históricos possibilitam uma maior flexibilidade no ensino de História, considerando as críticas relativas à impossibilidade de ensinar “toda a história da humanidade”, pois a investigação didática da História é resultado de recortes ligados às problemáticas do presente (GOVERNO DO PARANÁ, 2008, p.41).

O documento qualifica os objetivos do ensino da disciplina, ressaltando especialmente a compreensão do processo de produção do conhecimento histórico e o desenvolvimento da ação, entre alunos e professores, de pensar historicamente. Este é um elemento novo em relação às diretrizes anteriores. Considera a opção e o encaminhamento metodológico da História Temática fundamentais para o alcance desses objetivos. Para que esses possam ocorrer, sugere que o professor faça uma

seleção de conteúdos significativos e opte, a partir desses conteúdos, por recortes que delimitem espacial e temporalmente o objeto de estudos.

Desde a década de 1990, os debates sobre a renovação curricular em história vêm apontando as possibilidades de um novo olhar sobre a história. Segundo os autores das Diretrizes, apesar de ter havido avanços com o Currículo Básico, algumas dificuldades persistiram, como explicitado a seguir:

Apesar do avanço das propostas naquele contexto histórico, os documentos apresentaram limitações, principalmente devido à definição de uma listagem de conteúdos que se contrapunha, em vários aspectos, à proposta apresentada nos pressupostos teóricos e metodológicos.

Para o Primeiro Grau, o conteúdo foi dividido em dois blocos distintos: História do Brasil e História Geral. A História do Paraná e a da América Latina apareciam como estudos de caso, descolados dos grandes blocos de conteúdos. Eram apresentadas com pouca relevância nos contextos estudados. Essa forma de organização curricular demonstrava a dificuldade da proposta em romper a visão eurocêntrica da História. Exemplo disso foi o uso de termos como comunidades primitivas para designar os grupos indígenas, o que desconsiderava a abordagem antropológica da diversidade cultural e do processo histórico dessas comunidades.

No encaminhamento metodológico, o Currículo Básico indicou o trabalho didático com outras linguagens da História, sem tecer orientações para sua realização; indicou a importância do trabalho com os conteúdos significativos, mas não os esclareceu adequadamente nem os relacionou de modo efetivo aos conteúdos propostos. Por fim, tendeu a uma supervalorização dos conteúdos em detrimento dos temas e subtemas que tinham como orientações as formações sociais do processo histórico (GOVERNO DO PARANÁ, 2008, p.42).

Outra limitação, segundo os autores, diz respeito à compreensão sobre o sentido e a finalidade do ensino de História que os PCN enfatizaram:

Nos PCN, a disciplina de História foi apresentada de forma pragmática, com a função de resolver problemas imediatos e próximos ao aluno. Ressaltou-se a relação que o conhecimento deve ter com a vivência do educando, sobretudo no contexto do trabalho e do exercício da cidadania. Essa perspectiva abriu espaço para uma visão presentista da História, porque não se ocupava em contextualizar os períodos históricos estudados. Além disso, muitos conceitos referenciais da disciplina foram preteridos em nome da aquisição de competências (GOVERNO DO PARANÁ, 2008, p.43).

Diante dessas inquietações, as diretrizes propõem que o currículo de ensino de História seja com referência em “Conteúdos Estruturantes, entendidos como conhecimentos que aproximam e organizam os campos da História e seus objetos”. Esses conteúdos – relações de trabalho, relações de poder e relações culturais – “podem ser identificados no processo histórico da constituição da disciplina e no referencial teórico que sustenta a investigação histórica em uma nova racionalidade não-linear e temática.” (GOVERNO DO PARANÁ, 2008, p.45)

Quanto à concepção de História, os autores chamam a atenção para o fato de que:

Na concepção de História, que será explicitada nestas Diretrizes, as verdades prontas e definitivas não têm lugar, porque o trabalho pedagógico na disciplina deve dialogar com várias vertentes tanto quanto recusar o ensino de História marcado pelo dogmatismo e pela ortodoxia.

Do mesmo modo, são rechaçadas as produções historiográficas que afirmam não existir objetividade possível em História, e consideram todas as afirmativas igualmente válidas. Destaca-se que os consensos mínimos construídos no debate entre as vertentes teóricas não expressam meras opiniões, mas implicam fundamentos do conhecimento histórico que se tornam referenciais nestas Diretrizes (GOVERNO DO PARANÁ, 2008, p.45).

Reconhecendo que o conhecimento histórico “possui formas diferentes de explicar seu objeto de investigação, a partir das experiências dos sujeitos e do contexto em que vivem”, os autores destacam que as correntes historiográficas apresentadas nas Diretrizes Curriculares “dialogam entre si e trazem grandes contribuições para a formação de um pensamento histórico pautado em uma nova racionalidade histórica: a Nova História, Nova História Cultural e a Nova Esquerda Inglesa” (GOVERNO DO PARANÁ, 2008, p.48).

Os autores apresentam aos professores elementos de cada uma delas, indicando as contribuições que podem dar ao ensino na escola básica. Trata-se de um esforço importante para relacionar os elementos constitutivos da Ciência Histórica com as necessidades de organização do ensino. Deve-se destacar que essas contribuições, no entanto, são apresentadas “a partir da matriz disciplinar da História proposta por Rüsen” (GOVERNO DO PARANÁ, 2008, p.60).

Isso significa, especialmente, segundo os autores das diretrizes, a expectativa de que “por meio dessas orientações, a prática do professor contribua para a formação da consciência histórica nos alunos a partir de uma racionalidade histórica não-linear e multitemporal”. Com essa perspectiva, a aprendizagem histórica é valorizada, e para que ela se efetive sugere-se que sejam exploradas “metodologias ligadas à epistemologia da História” (GOVERNO DO PARANÁ, 2008, p.60).

Analisando este material, nota-se a predominância da história temática por eixos. Schmidt (2005) também reconhece a predominância de eixos temáticos e considera que estes devem ser levantados a partir da realidade social presente e relacionada à realidade social dos alunos.

Podem ser entendidos não só como a definição de questões articuladoras da análise do real, como também o entendimento de que essas questões

reportam-se a vários assuntos que guardam unidade entre si a partir de uma identidade que lhes é própria (SCHMIDT, 2005, p.206).

Bittencourt (1998) destaca que a inclusão da História Temática na maneira de abordar os temas de estudo gerou polêmicas e reavaliações no ensino de História, especialmente porque fracassou na França em detrimento da resistência dos conteúdos tradicionais da história linear e cronológica.

As Diretrizes Curriculares do Paraná indicam o encaminhamento de um processo: problematização para seleção de conteúdos (que são as ações e relações humanas), delimitação de um recorte conceitual e espaço-temporal para esses conteúdos e, finalmente, seleção de conteúdos específicos que atendam a problemática em questão.

O que define esta demarcação espaço-temporal é a historiografia específica escolhida e os documentos históricos disponíveis. Além dessas três dimensões, faz-se necessário instituir um sentido à seleção temática feita, dado pela problematização. Nesse sentido, é importante justificar por que escolheu determinada temática que contempla alguns conteúdos específicos em detrimento de outros, quais sujeitos históricos se pretende analisar. Ao fazer isto, estaremos estabelecendo um sentido para o tema, a problematização e o recorte espaço/temporal estabelecido (GOVERNO DO PARANÁ, 2008, p.47).

Com relação à apresentação dos conteúdos, destaca-se que eles foram incluídos em um Anexo, da forma como se pode observar a seguir.