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As discussões acerca da Teoria Métrica Autossegmental (MA)

O Institute for Perception Research (IPO), em Eindhoven, trouxe inúmeras contribuições para os estudos de entoação desde 1965. Ladd (2008) afirma que, a princípio, os estudiosos buscavam encontrar um modelo de entoação da língua holandesa para que fosse usado na síntese discursiva. Posteriormente, a abordagem IPO desenvolveu uma teoria ampla para a estrutura entoacional não apenas do holandês, mas de outras línguas. Esses estudos iniciais serviram de base para análises do inglês, do alemão, do russo, do francês e do indonésio. A abordagem veio caindo em desuso devido aos objetivos do instituto, que foram redirecionados. Não se pode deixar de mencionar, entretanto, as grandes conquistas alcançadas pelos pesquisadores, que abriram portas com seus trabalhos iniciais sobre o nível fonológico abstrato e o detalhamento da realização fonética dos elementos fonológicos.

A teoria mais discutida atualmente é a teoria MA. Ladd (2008) aponta que o surgimento dos debates acerca do tema se deu por meio das teses de doutorado de Liberman (1975), Bruce (1977) e, principalmente, Pierrehumbert (1980). Aplicada em diversas línguas europeias, a teoria MA serviu de base para inúmeros sistemas de síntese de entoação por regra. Sob essa visão, foi primordial o desenvolvimento de uma fonologia de laboratório, em que desde cedo se adotou o objetivo de explicar detalhada e instrumentalmente as medidas de f0 na descrição fonológica. Assim, seguramente, é possível usar instrumentos fonéticos como fonte de dados para a teoria fonológica. Foram desenvolvidos softwares como o Praat e até mesmo séries de sistemas como o ToBI (BECKMAN et al, 1994), que promovem a transcrição de sistemas de entoação de várias línguas com bases amplas para discussões sobre a estrutura prosódica e a relação entre entoação e informações provenientes de suas estruturas.

Para Ladd (2008), a teoria MA tem o objetivo de promover a caracterização dos contornos adequadamente nos termos da curva melódica e da caracterização dos elementos que a compõem. Ao contrário da abordagem IPO, que possuía bases na percepção do discurso, a teoria métrica autossegmental tem foco além dos problemas fonológicos, pois

abrange a problemática da estrutura suprassegmental que motiva previamente o trabalho autossegmental, como nas línguas tonais africanas deste estudo.

Embora grandes discussões tenham acontecido fortemente na década de 1970, a teoria MA ganhou força após as propostas de Abercrombie (1991), que trouxe à tona discussões acerca da terminologia stress e pitch accent4, e Ladd (1996). Para Ladd (1996), o objetivo fonológico da teoria MA é abrir caminhos para a caracterização de contornos de maneira adequada, ainda que se trabalhe com elementos distintos categoricamente. O objetivo fonético da teoria MA é, então, oferecer aos estudos na área um mapeamento dos elementos fonológicos para alcançar parâmetros acústicos contínuos.

Consoante à descrição de Ladd (1996), são quatro os princípios da teoria MA: (1) a sequencialidade da estrutura tonal; (2) a diferenciação entre pitch accent e stress; (3) a análise dos pitch accents quanto à altura dos sons, sendo os níveis básicos H (high) e L (low); e (4) a comparação entre características mais particulares, relacionadas à altura, a padrões mais gerais.

Chama-se aqui a atenção para o segundo princípio: a distinção entre pitch accent e stress. Quanto ao pitch accent, Ladd (1996) aponta que, mesmo que nem todas as línguas apresentem ocorrências desse fenômeno, ele indica a proeminência, enquanto o stress aponta para o acento lexical.

A dicotomia entre stress e pitch accent também levanta outras questões. Entretanto, a noção de acento usada neste trabalho se refere à unidade entoacional mais perceptível, como adotado por Bolinger (1972) e Hyman (2014) na literatura métrica.

Hulst (2014), por exemplo, indica que o stress está ligado à dinamicidade e o pitch accent, à melodia. As definições são complementares no uso de seus expoentes fonéticos. O autor explica que, mesmo até os dias atuais, o acento não é uma propriedade bem definida nos estudos linguísticos. Em sua análise, o acento tem características fonéticas e fonológicas. Os expoentes fonéticos incluem a duração, as vogais não reduzidas e o pitch, que juntos compõem a tonicidade. Como expoentes fonológicos, o autor indica a duração, o contraste entre vogais e a altura.

Hyman (2014) questiona se todas as línguas possuem marcas de posições mais proeminentes nas palavras e indica que um número considerável e, provavelmente, a maioria evidencia o fenômeno do acento. Muitos estudiosos assinalam a falta de acento em certas línguas africanas tonais e até em línguas não tonais. Newman, por exemplo, (1947) indica que

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na língua bella coola, falada em território canadense, não há o fenômeno do acento e do pitch associado a sílabas ou palavras, assim, quando duas ou mais sílabas ocorrem em uma palavra ou sentença, a distinção é feita apenas pela força articulatória.

Por outro lado, muitas línguas não evidenciam ambiguidade na questão do acento e é importante ressaltar que as teorias para esses estudos são independentes e até mesmo pessoais: algumas pessoas notam o acento e outras, não. Assim, Hyman (2014) afirma que é extremamente difícil demonstrar acentos e ainda mais falar sobre universais para eles.

Para uma definição mais precisa de acento, adotar-se-á neste trabalho as propriedades concedidas por Hyman (2014) para o fenômeno. Assim, considera-se que:

 A localização do acento não pode ser reduzida à primeira ou segunda sílaba das palavras (que frequentemente representam as fronteiras);

 Sílabas tônicas evidenciam efeitos de proeminência devido à posição: consoantes, vogais e contrastes de tons são mais comuns em sílabas tônicas; os segmentos ganham mais força em sílabas tônicas;

 Sílabas átonas evidenciam efeitos de posição não proeminentes: consoantes, vogais e contrastes de tons são menos comuns em sílabas átonas e segmentos são enfraquecidos também nessas sílabas;

 O acento evidencia efeitos cíclicos;

 O acento evidencia efeitos rítmicos lexicalmente ou pós-lexicalmente, como ocorre com o inglês;

 O acento no nível lexical interage com o nível frasal;

 O acento lexical fornece elementos para a atribuição de tons entoacionais;

 Outros argumentos de que cada sílaba é um constituinte métrico podem ser mencionados.