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As doenças cardiovasculares e seus fatores de risco entre brasileiros

1. INTRODUÇÃO

2.2. As doenças cardiovasculares e seus fatores de risco entre brasileiros

nossa população, nossas informações sobre a prevalência, e especialmente sobre a incidência destas doenças ainda são insuficientes e os levantamentos sobre seus dados estatísticos são frequentemente pontuais, esporádicos e regionais. Um dos importantes levantamentos de amplitude nacional sobre diabetes deu-se em inicio da década de 90 com o exame de 21 847 indivíduos em nove grandes cidades brasileiras, detectando-se uma prevalência variável com a idade de 2,7% a 17,4% com média geral de 7,8% (MALERBI e FRANCO,1992). Também no Rio de Janeiro (OLIVEIRA et al. 1996) e em Ribeirão Preto (TORQUATO et al. 2003) foram feitos levantamentos em bases populacionais que mostraram prevalências semelhantes, de 7% a 12% respectivamente.

Quanto à hipertensão arterial, nossos estudos de prevalência são mais numerosos (LESSA,1999) e alguns, realizados em consistentes bases epidemiológicas com força para transferência populacional, mostram uma variação de 11% a 25% de sua prevalência nos adultos (REGO et al. 1990; De LÓLIO et al.1993; DUNCAN et al. 1993; PICCINI e VICTORIA,1994; FUCHS et al. 1994; FUCHS 2006).

O tabagismo já foi avaliado por diversos estudos em âmbito regional, com valores entre 30 a 40% (CHOR et al. 1995). As concentrações de lípides séricos foram medidas em diversas populações brasileiras em estudos de delineamento transversal, e poucos analisaram suas relações com as dietas (CHOR et al. 1995). Até meados da década de 90, alguns destes estudos resultaram em prevalência de 15% para pessoas com colesterol sérico superior a 220mg/dL (MARTINS et al. 1989), e outros avaliaram as concentrações médias das populações adultas metropolitanas (DUNCAN et al, 1988), com resultado de 202,4 ± 43mg/dL. Um estudo em base exclusivamente

laboratorial, realizado em área metropolitana, mostrou resultados de hipercolesterolemia de 24%, elevação do LDL colesterol de 26,1% e valores baixos de HDL-C em 15,9% (LESSA et al. 1997).

O país ainda não dispõe de um sistema continuado de monitoramento nacional especifico para os fatores de risco cardiovasculares (LESSA,2004). No ano de 2001 o Ministério da Saúde promoveu, através de esforço concentrado entre gestores e representantes de sociedades científicas de áreas relacionadas, o Plano de Reorganização da Atenção à Hipertensão Arterial e ao Diabetes mellitus no Brasil. Apesar das controvérsias, e considerando sua magnitude ao representar a primeira iniciativa mundial de rastreamento coletivo de doenças crônicas, a campanha promovida de detecção do diabetes foi analisada como de êxito (NUCCI et al.,2004;TOSCANO, 2004), e com custos aceitáveis para diagnosticar 16% de diabéticos em uma população de 22,1 milhões de adultos maiores que 16 anos (GEORG et al. 2005).

Recentemente o Ministério da Saúde reorientou sua Política Nacional de Promoção da Saúde para, na esfera do SUS, “organizar, planejar, realizar, analisar e avaliar o trabalho em saúde” (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2005) através de dois importantes objetivos: 1. Estimular e contribuir na elaboração de políticas, estratégias e ações integradas e intersetoriais que ampliem o acesso aos modos de viver mais favoráveis à saúde e à qualidade de vida e fortaleçam as ações de prevenção e controle de doenças e agravos não transmissíveis (DANT) e transmissíveis. 2.Definir mecanismos e instrumentos para o monitoramento, acompanhamento e avaliação das estratégias de promoção da saúde e a vigilância da DANT no Brasil.

Nossos esforços quanto às avaliações de prevalência dos fatores de risco, considerando nossas condições sociais, geográficas e demográficas, ajudam- nos ao menos calcular uma carga de doença em nossa população. De forma lenta, as ações preventivas de controle de alguns fatores de risco são

implementadas, mas ainda em formas de duvidosas consistências ou eficácias (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2007)1.

Entretanto, quanto à procura de fatores causais, é consternador o número de estudos realizados no país com metodologias de comparação, sejam em coortes ou estudos de caso-controle. Num desenho de caso-controle, com limitações do método que comprometem a extensão de seus resultados para toda a população brasileira, o estudo FRICAS (DA SILVA et al.,1998) mostrou significância para o colesterol, tabagismo, hipertensão, diabetes, e história familiar de DAC. MORAES et al. 2003, realizaram uma investigação longitudinal, em bases populacionais no sul do Brasil, em que fatores de risco foram considerados para qualquer evento cardiovascular incidente. Como se tornou o primeiro estudo brasileiro com este desenho de coorte, foi possível revelar os fatores de risco independentes, a saber o sexo masculino, a hipertensão arterial sistólica, a obesidade, e o consumo de álcool e cigarro. Em 2003, também foi apresentado o importante estudo de avaliação de fatores de risco para IAM no Brasil, num desenho de caso-controle, realizado em 104 hospitais de 51 cidades brasileiras. Denominado AFIRMAR (PIEGAS et al. 2003), este estudo trabalhou os fatores convencionais, efetuando a lipemia fracionada, e também estimando a renda familiar e avaliando a situação educacional. Os resultados do estudo AFIRMAR sustentam nossa base de informações para a atual investigação.

Estes autores, em 2005, (AVEZUM et al.,2005) sob a mesma metodologia, apresentaram resultados de um estudo multicêntrico, em base hospitalar, circunscrito à região metropolitana de São Paulo, em que emergiram como fatores associados ao IAM o tabagismo,a razão cintura-quadril,antecendentes de diabetes mellitus e hipertensão arterial, história familiar de doença arterial coronariana e valores séricos de LDL-C e HDL-C. Recentemente, o grupo de pesquisadores latinoamericanos do estudo INTERHEART publicou os

1 Recentemente, em 2007, foi lançado o projeto ELSA – Estudo Longitudinal de Saúde do Adulto - um consórcio nacional multidisciplinar, como um estudo de desenho longitudinal em base nacional, para avaliação dos fatores de risco cardiovascular.Disponível em <http://www.elsa.org.br/ >

resultados referentes exclusivamente a esta nossa população (LANAS et al.,2007), também revelando as forças de associação, em razão de chances, do tabagismo, obesidade abdominal, distúrbio dos lípides, e hipertensão arterial.

Em Minas Gerais, estado da federação habitado por 8.662.751 de pessoas com idade acima de 30 anos (IBGE,2007; DATASUS 2007), que no ano de 2004 teve 30.859 mortes por doenças cardiovasculares, das quais 7582 por infarto agudo do miocárdio ou doenças isquêmicas do coração (DATASUS, 2007), surpreende-se apenas um estudo em base populacional com o desenho de coorte, o PROJETO BAMBUI (FIRMO et al.,2004). Nele, avalia-se a hipertensão arterial em idosos, mas sem estabelecer os eventos cardiovasculares como variáveis dependentes. Recentemente, CÔSSO avaliou fatores de risco em diabéticos com demanda seletiva para cineangiocoronariografia (CÔSSO, 2005) buscando compreender o controle terapêutico daqueles fatores.

Em resumo: 1. apesar de não se conhecer uma etiologia para a aterosclerose, temos evidências de que a presença de fatores de risco contribue para sua gênese; 2. há pelo menos 4 fatores considerados convencionais, que respondem por, no mínimo, 50% dos casos; 3.os estudos epidemiológicos aumentam progressivamente o número de fatores de risco mas ainda não sabemos com segurança sua importância relativa; 4. apesar da população brasileira estar sob grande risco para estas doenças, nossos conhecimentos são ainda precários e pouco consistentes, e 5. a população de Minas Gerais não dispõe de estudos que avaliem a presença destes fatores.

3. DIABETES MELLITUS COMO FATOR DE RISCO PARA

INFARTO AGUDO DO MIOCARDIO

3.1. Evidências de sua força

Entre os fatores de risco convencionais para aterosclerose e infarto agudo do miocárdio, o diabetes mellitus se apresenta de maneira especial pois ao lado de evidências pouco refutáveis quanto à sua relação com as lesões anatômicas e as desestabilizações agudas, expõe dúvidas e problemas que se mesclam com a essência dos eventos aos quais lhe são propostos explicar. Além disto, considerados em conjunto com as dislipidemias e a hipertensão arterial, os outros dois fatores de risco convencionais, parece ser possível haver uma base única, um terreno similar aos três fatores como, por exemplo, a hiperinsulinemia (FERRANNINI et al., 1991) ou um outro fator a ser nomeado, que as modernas técnicas de análise confirmatória pretendem apontar (PLADEVALL et al., 2006).

Como já visto (Ver Fatores de Risco), estudos de autopsias têm mostrado reiteradamente que a aterosclerose em pacientes diabéticos é mais extensa, considerados o número de artérias coronarianas comprometidas, e mais grave e acelerada, considerados os graus de obstrução intra-arteriais (McGILL, 1968; STAMLER, 1978; PYORALA et al.,1987; GORAYA et al., 2002). Estas lesões são independentes da prevalência de DAC nas populações pesquisadas e não poupam as mulheres (ROBERTSON e STRONG,1968). Aproximadamente 75% das mortes por doença cardiovascular atribuídas ao diabetes estão diretamente relacionadas às doenças coronarianas, e tanto os pacientes portadores de diabetes do tipo 2, como diabéticos do tipo 1, insulino dependentes, compõem esta estatística (BROWNLEE et al., 2003). O estudo de FRAMINGHAM mostrou uma elevação de duas a três vezes do risco de desenvolver um evento clínico de aterosclerose entre os diabéticos do tipo 2 comparados aos não diabéticos (KANNEL e McGEE, 1979) enquanto outros estudos mostram ser a mortalidade por doença coronariana em diabéticos do tipo 1 quatro vezes maior que os não diabéticos, aos 55 anos de idade (KROLEWSKI et al.,1987(a)),elevando-se rapidamente a partir dos 30 anos de idade (KROLEWSKI et al.,1987(b)).

O importante estudo de STAMLER (Ver Fatores de Risco, acima), com sua coorte de 347978 homens entre 35 e 57 anos acompanhada por 12 anos, revelou que os indivíduos que usavam medicamentos para diabetes tinham três vezes mais risco de morrer por DCV do que os não diabéticos (STAMLER et al.,1993), e este risco se mantinha mesmo quando se ajustava para os outros fatores de risco, promovendo assim o diabetes como um fator de risco independente. Na Finlândia, HAFFNER e seus colaboradores, num original e primordial estudo em base populacional, concluiu que pacientes portadores de diabetes mellitus do tipo 2, sem infarto prévio do miocárdio apresentavam o mesmo risco de desenvolver IAM que pacientes não diabéticos com IAM prévio (HAFFNER et al.1998), promovendo o conceito de equivalente vascular para o diabetes. A mortalidade nos diabéticos, quando acometidos de IAM, era significativamente maior, e as mulheres diabéticas perdiam sua generosa vantagem cardioprotetora que a premenopausa lhes concede, tornando-as iguais aos homens quanto à incidência de IAM.

Este conceito foi aceito e incorporado posteriormente nas diretrizes do Terceiro Relatório do Programa Nacional de Educação para o Colesterol, nos EEUU (NCEP III, 2001), e considerou os pacientes diabéticos como portadores de equivalente cardiovascular, no grupo de maior risco, juntamente com pacientes já portadores de episódio prévio de IAM. As diretrizes brasileiras sobre dislipidemias e prevenção da aterosclerose, propostas por equipes de especialistas (SANTOS,2001; SPOSITO et al., 2007) também consideram os pacientes diabéticos como portadores de aterosclerose.

O estudo finlandês não foi confirmado, posteriormente, na Escócia (EVANS et al.,2002), mas o conceito foi mantido naquelas diretrizes.

3.2. Diabetes mellitus: fator de risco independente ou forte associação