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5 RESULTADOS E DISCUSSÕES: OS NÚCLEOS AMPLIADOS DE SAÚDE

5.2 CATEGORIA 2 – O PROCESSO DE TRABALHO DO NASF-AB E AS

5.2.1 As fragilidades do processo de trabalho do NASF-AB e a

A respeito do trabalho desenvolvido pelos profissionais do NASF-AB junto às equipes da Estratégia Saúde da Família, os próprios profissionais que integram os Núcleos apontaram algumas fragilidades – seja do ponto de vista da falta de planejamento e definição de cronogramas em parceria com as equipes apoiadas, seja pela falta de interesse de alguns profissionais na construção de uma proposta de trabalho coletiva.

Existe a necessidade de definir quando, onde e como esses profissionais se reúnem para organizar o seu trabalho. A complexidade do trabalho do Nasf – incluindo aqui a heterogeneidade na composição das equipes e a diversidade de atividades ofertadas – exige dos apoiadores um alto grau de organização das agendas de trabalho, uma vez que ações interdisciplinares requerem integração entre as atividades dos apoiadores e das EqSF (LIMEIRA et al., 2018, p. 336).

Seguem os relatos dos profissionais sobre as fragilidades do processo de trabalho do NASF no apoio à ESF.

A gente está sempre revisitando um pouco das nossas diretrizes. Por exemplo, o Nasf veio para quê? A que se propõe? Nós estamos conseguindo fazer aquilo para que o Nasf se propôs? A gente sempre fazendo essa pergunta, para que a gente não perca a direção do nosso trabalho. Considerando que a gente vive em um sistema, em um modelo de saúde de que isso não é feito sistematicamente para a estratégia de saúde da família. Primeiro é isso, porque, como nós somos apoiadores da estratégia, então termina que às vezes a gente vai naufragando também junto com a estratégia, considerando que a gente deveria também estar sempre com a estratégia perguntando, ‘para que veio a estratégia de saúde da família?’, ‘que modelo nós temos?’, ‘que modelo nós queremos? (E3)

O discurso do NASF reforça a importância da integração com a ESF, porém se essas equipes não estiverem abertas ao diálogo e à construção de uma proposta de trabalho para além do atendimento ambulatorial, vai limitar o campo de atuação dos Núcleos. “As EqSF possuem papel fundamental na aproximação do NASF com os usuários, na identificação e manejo dos problemas de saúde do território, assim como no compartilhamento de práticas entre as equipes.” (MEDINA; SOUSA, 2018, p. 155).

Mas às vezes a dificuldade está nos processos mesmo, de trabalho mesmo das unidades, sabe? Esses processos que às vezes barram e aí realmente dificulta o caminho do NASF, nesse sentido, do processo de trabalho, de atuar junto com a questão de trabalhar o fluxo, não é? Essas relações que são atravessadas por N coisas, não é? Pelas dificuldades mesmo pessoais, pelos desafetos, desinteresse mesmo, pessoas desmotivadas e que acabam não contribuindo para que as coisas deslanchem. Enquanto alguns tão juntos: ‘tá, a gente vai fazer, vamos pensar assim’, digamos, uma equipe está toda disponível, aberta para a discussão, vamos fazer, mas aí tem uma que... sabe? Fica dificultando o processo e isso acontece... e é bem difícil. (E10)

Os profissionais do NASF apontam as dificuldades em construir um trabalho integrado com a Estratégia Saúde da Família e afirmam que são limitações comuns aos integrantes das duas equipes. Para Medina e Souza (2018, p. 153), trata-se de “um processo de trabalho desarticulado entre as equipes Nasf e EqSF da APS. Soma-se a isso o fato de o Nasf enfrentar

desafios de diversas ordens, que limitam a realização das atividades tornando o processo de trabalho fragmentado”.

As equipes da Estratégia Saúde da Família também destacam como percebem o trabalho do NASF em seu território. Apesar de predominar nos discursos que se trata de um trabalho integrado, os profissionais falam de reuniões mensais com o Núcleo, ou apenas quando surgem demandas específicas, confirmando a fragilidade no processo de planejamento articulado entre essas equipes.

Toda quinta-feira à tarde a gente se reúne, aí se tiver alguma coisa para a gente passar para o NASF para pedir ajuda do NASF, a colaboração para resolver algum problema, aí a gente chama para eles participarem. Porque eles têm dois dias aqui: a terça para fazer o atendimento com um grupo de crianças e quarta que é um grupo a tarde que é de pessoas que fazem uso de psicotrópicos. (E13)

É bem atuante o Nasf com a gente porque são duas unidades que elas estão integradas, elas fazem um atendimento integrado, até atendimento simples: psicólogo, serviço social, nutricionista. Então elas estão muito integradas. (E15)

Nessa perspectiva, Figueiredo et al. (2017, p. 703) reconhecem:

As políticas públicas preveem que as equipes de profissionais do Nasf e das ESFs organizem seus processos de trabalho priorizando o atendimento compartilhado e interdisciplinar, valorizando a troca de saberes e a capacitação, mantendo sempre foco na integralidade, na humanização e na promoção de saúde, no território sob a responsabilidade delas.

Ainda sobre a opinião das equipes da ESF apoiadas pelo NASF, apesar de os profissionais do NASF relatarem que atualmente não percebem tantos equívocos por parte do entendimento da ESF no referente à natureza do trabalho nos Núcleos, foi possível identificar na fala de alguns integrantes da Estratégia Saúde da Família a concepção de que devem prevalecer os atendimentos no modelo ambulatorial.

Não, só o que eu acho é que eles deveriam atuar mais em alguns atendimentos, porque a população é muito carente, a unidade hoje em dia não tem ginecologia, não tem pediatria, não tem assistente social como tinha psicóloga na unidade, não existe mais isso e como eles tem especialidades, mas aí o apoio fica muito superficial, era para ter um apoio mais intensivo, eu acho. (E12)

Diante desse aspecto, é inevitável que o olhar de instituições externas, como, por exemplo, o Ministério Público, que através das Promotorias avalia o trabalho dessas equipes, perceba essa fragmentação do processo de trabalho e, muitas vezes, interprete como desinteresse dos profissionais em ofertar um serviço de qualidade à população, utilizando como

No referente à questão dos parâmetros para avaliar a produtividade do NASF, o município de Natal publicou uma normativa, em 20178, que estabeleceu o quantitativo mínimo de atendimentos por hora, dia e semana para cada categoria profissional da Atenção Básica, incluindo o NASF e a ESF.

Seguem os discursos dos entrevistados sobre esses parâmetros de avaliação da produção das equipes.

Quer saber o calo do Nasf? Produção! Por quê? O que que acontece com fazer do Nasf? O médico ele tem marcado 12 atendimentos, a enfermeira tem seis preventivos, então ela tem esse parâmetro. A gente vai para um caso cabeludo como esse, assistente social levou a manhã inteira, articulando para cima e para baixo, articulando o transporte, articulando uma consulta, ligando para o filho que era quem iria levar, e tudo isso, no final se transforma em um atendimento.(E1)

Nós temos os parâmetros de atendimento para cada profissional. Eu vinha pensando, ‘não vou nunca atender isso’, porque tenho que fazer 16 visitas domiciliares, 32 atendimentos no mês. Se eu... eu acho que é isso, vou até olhar, porque de até... estou com medo de não estar... foi tanta discussão disso. (E11)

Os trechos revelam uma insatisfação dos profissionais do NASF em relação aos parâmetros utilizados para avaliar a produtividade deles, pois não são observadas as particularidades da rotina dessas equipes, ficando clara a tendência ao fortalecimento dos atendimentos ambulatoriais em detrimento das atividades coletivas e de educação em saúde.

E eu não parei. Agora se você for ver o mesmo dia do Médico tem 24 atendimentos. Porque é diferente eu trabalho e o SUS não mostra. É uma coisa que é bacana que as pessoas saibam E-SUS não mostra o que o Nasf faz. (E1)

Dessa forma, as equipes do NASF frequentemente são consideradas com baixa produtividade e, por isso, surgem as críticas sobre a ampliação de um serviço com pouco resultado. Porém, as entrevistas enunciam que a produção do NASF é avaliada com critérios similares aos da Saúde da Família com foco no quantitativo de atendimentos, o que não é razoável diante do perfil das demandas direcionadas a algumas categorias integrantes do NASF – muitas vezes um único caso requer o esforço de um dia de trabalho na tentativa de resolver ou dar andamento com articulações dentro da própria rede de saúde ou de outra política pública

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