• Nenhum resultado encontrado

3 DIÁLOGOS COM OUTRAS PESQUISAS

3.3 AS HISTÓRIAS EM QUADRINHOS NA SALA DE AULA

Quanto ao uso dos quadrinhos na sala de aula, selecionamos a pesquisa de Piffer (2006), que aborda um estudo de caso do tipo etnográfico, cujo objetivo foi investigar eventos mediados pela linguagem escrita, a partir de dois gêneros textuais – histórias em quadrinhos e textos de opinião –, em uma turma de crianças entre seis e sete anos de idade, de um centro de educação infantil do Sistema Municipal de Ensino de Vitória/ES. Os pressupostos teóricos da perspectiva bakhtiniana de linguagem são

tomados por base na pesquisa, na busca de dialogar com a realidade observada. Analisando práticas escolares, a autora conclui que a adoção do texto como eixo do trabalho educativo na educação infantil implica o reconhecimento da sala de aula como um espaço dialógico em que habitam sujeitos sócio-históricos e como lugar de interação verbal em que são confrontados diferentes saberes, em que a repetição e a criação são dimensões interdependentes e constitutivas do trabalho de produção. Essa pesquisa se aproxima da nossa por trabalhar com quadrinhos na sala de aula, tomando como base uma perspectiva bakhtiniana de linguagem, concebida de forma dialógica, e por conceber a sala de aula como lugar de interação verbal, considerando também os saberes do aluno como fundamentais para que ocorra a apropriação do conhecimento.

Além da pesquisa de Piffer (2006), selecionamos o artigo de Santos e Vergueiro (2012), cujo objetivo é incentivar e orientar o uso apropriado das Histórias em Quadrinhos nas práticas educativas, discutindo os caminhos possíveis para sua implementação. Assim como os autores, reconhecemos os inúmeros recursos de que elas dispõem para uso no ensino, a importância de conhecer bem sua linguagem para um trabalho eficaz e a importância do aumento de pesquisas na área para legitimar seu uso na formação de leitores críticos.

Nesse sentido, o artigo de Silva (2013) apresenta o projeto de pesquisa “Leitura de trações de humor”, cujo objeto de pesquisa são gêneros textuais que unem elementos verbais e visuais para veicular o humor, mais especificamente charges, cartuns e tiras cômicas, e o objetivo do projeto é ampliar a competência leitora de universitários, os quais apresentavam constantes dificuldades relacionadas aos gêneros em questão. A autora levanta a hipótese de que as dificuldades surgem pelo fato de esses gêneros serem muito usados apenas para o ensino da gramática, e não para o ensino da leitura. Compartilhamos ideias semelhantes no que se refere ao uso inadequado de quadrinhos na sala de aula, desconsiderando seus inúmeros recursos linguísticos, o que acaba fortalecendo o preconceito com a Nona Arte e, também, no que se refere à necessidade de conhecer e explorar a linguagem dos quadrinhos, os quais podem ser usados como pretexto, mas é preciso ampliar esse uso, trabalhando também aspectos relativos ao seu conteúdo – implícitos e explícitos –, aos seus recursos de linguagem, à criatividade e à complexidade neles existente.

Outro artigo selecionado foi o de Batista (2013), que apresenta teorias que invalidam os discursos preconceituosos existentes sobre as HQs e mostra que elas devem ser consideradas um gênero como outro qualquer. Concordamos com parte da argumentação do autor, no que se refere aos benefícios de seu uso em atividades de leitura, uma vez que nosso objetivo é trabalhar a formação do leitor crítico por meio de quadrinhos, e acreditamos também que o aprofundamento em sua linguagem mostra que eles se constituem em um rico material para o desenvolvimento de capacidades de leitura, como também evidenciam que o leitor, para compreender alguns deles, precisa refletir sobre o que está implícito e acionar seus conhecimentos de mundo, o que, certamente, não é fácil. Entretanto discordamos do conceito de letramento utilizado pelo autor, uma vez que o conceito de alfabetização implica não só codificação e decodificação como também a prática social, argumento já apresentado por nós diante de outras pesquisas que também defendem o letramento.

As pesquisas com as quais dialogamos nos permitiram compreender que a aprendizagem de leitura é um dos grandes desafios da escola e que é preciso mudar as práticas que são de cunho utilitarista e aceitam uma única interpretação dos textos. Para contribuir com a consciência crítica dos alunos, a leitura precisa ser considerada como prática social, realizada por meio da interação; e o leitor, como um sujeito ativo, que se posiciona diante do que lê, de acordo com suas vivências.

A sala de aula é um lugar de encontro de diferentes vozes, as quais mantêm relações de controle, negociação, compreensão, concordância, discordância, discussão. Neste espaço, a aprendizagem é uma atividade social de construção em conjunto, resultante das trocas dialógicas, uma vez que, na perspectiva bakhtiniana, o significado não é inerente à linguagem, mas elaborado socialmente. No que tange ao ensino de língua materna, Bakhtin assegura que ela não é aprendida por meio de dicionários e gramáticas; ela é adquirida durante nossas interações verbais, por meio de enunciados (FIORIN, 2006, p. 37).

Além disso, as pesquisas também contribuíram para legitimar o potencial das HQs para trabalhar a formação de leitores críticos, desmistificando a ideia de que elas são apenas para diversão e mostrando que muitas podem enriquecer as aulas e levar à reflexão e à tomada de posição, deixando claro que é preciso selecionar bem os

quadrinhos com os quais se pretende trabalhar, pois nem todos atendem a esse propósito.

Após o diálogo com outras pesquisas que, de alguma forma, se relacionam a nossa, apresentaremos o referencial teórico que embasa nossa pesquisa, com relação à formação leitor crítico e com relação às Histórias em Quadrinhos e seu uso no ensino.