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Capítulo 3 – Análise e discussão dos dados recolhidos

3.1. Indícios do desenvolvimento de competências de comunicação e de

3.1.2. As línguas e as culturas

Como vimos no enquadramento teórico que esteve na base deste projeto, as possibilidades de comunicação que se abrem entre falantes da mesma família linguística levaram a que Escudé e Janin (2010: 42) afirmassem que não há línguas verdadeiramente estrangeiras, opacas, cabendo a nós estabelecer pontes e, assim, torná-las transparentes. Foi possível identificar sinais de que os alunos conseguiram reconhecer algumas similitudes e aproximações entre as línguas presentes na sessão e na plataforma Galanet.

O quadro abaixo apresenta as categorias que nos permitiram identificar a consciência de semelhanças linguísticas entre línguas aparentadas por parte dos alunos e os respetivos dados analisados.

Quadro 12: As línguas e as culturas - categorias, subcategorias e dados recolhidos

Encontrámos alguns indícios do recurso à comparação para estabelecer semelhanças linguísticas e, assim, compreender mensagens numa intervenção de um participante do nosso grupo, durante o chat realizado no dia 6 de março (Anexo 12):

(…)

[21:42:41][FernandaFer] E consegues aompanhar as diferentes línguas? (…)

[21:43:13][D.L] Mais ou menos, tenho alguma dificuldade mas as vezes com o sentido das outras ate e fácil

(…)

Continuando na senda de Escudé e Janin (2010: 42), há dois aspetos aos quais devemos atender para ultrapassar essa opacidade das línguas ditas “estrangeiras”: o contexto do ato comunicativo e a forma. Como exemplos, relativamente ao contexto, é

referido o apoio em elementos paratextuais, a presença de palavras transparentes, estrangeirismos, nomes próprios, termos geográficos… Quanto à forma, e entrando no caminho da IC, temos a transferência, a busca de aspetos linguísticos comuns, regularidades, mas também de fenómenos, de especificidades que despertam a curiosidade do aprendente. Quando essas regularidades e diferenças ocorrem dentro da mesma família de línguas, torna-se mais fácil para o aprendente estabelecer essas pontes:

(…)

[18:30:17][CarlaN] Riesci a capire la nostra conversazione in italiano? (…)

[18:30:58][D.L] Consigo entender mais ou menos (…)

[18:31:28][CarlaN] Brava D.! hai notato come l'italiano e il portoghese nello scritto sono vicini? (…)

[18:32:24][D.L] Sim, sao muito parecidos... ambos derivam do latin, nao é? (…)

(Excerto do chat, realizado no dia 17 de fevereiro, Anexo 12)

Este diálogo permite-nos ver que este participante tem consciência de que o facto de a língua portuguesa e de a língua italiana pertencerem à mesma família permite estabelecer correspondências, o que facilita a compreensão. Tal facto vinha a ser trabalhado durante as aulas, nas sessões II, III e IV, já descritas no capítulo anterior. Também o perfil da equipa (Anexo 2) e os perfis individuais (Anexo 3) foram realizados em português e espanhol, o que permitiu que os alunos contrastassem as duas línguas e observassem semelhanças e diferenças.

Igualmente, quisemos realizar algum trabalho mais prático para aproximar o nosso grupo das várias línguas românicas disponíveis na plataforma e promover alguma reflexão metalinguística. Assim, propusemos uma pequena ficha de trabalho, à qual chamámos “Primeros pasos en la intercomprensión” (Anexo 5), realizada na sessão V. Esta ficha era composta por cinco questões. A questão 1 consistiu em completar uma tabela com um conjunto de palavras e uma expressão nas diferentes línguas românicas disponíveis na plataforma, bastando, para tal, alterar o idioma do interface, tarefa em que os alunos não apresentaram dificuldades. Na questão 2, perguntámos se havia sufixos recorrentes e quais. O Quadro 13 apresenta uma síntese das respostas recolhidas das fichas realizadas pelos alunos (Anexo 5.1):

Capítulo 3 – Análise e discussão dos dados recolhidos

Quadro 13: Respostas dos alunos à questão 2 da ficha 1 “Primeros pasos en la intercomprensión” Da análise dos dados recolhidos, verificamos que os alunos detetaram alguns aspetos linguísticos comuns, nomeadamente os sufixos equivalentes –ge, -je, -gio, o sufixo de plural –s e sufixo do género masculino –o. Houve dois alunos que identificaram erradamente o artigo indefinido masculino singular un como um sufixo. Embora a nomenclatura não tenha sido a correta, é indiciário de que são capazes de identificar regularidades nas línguas românicas.

Seguidamente, os alunos foram questionados sobre as estratégias que podem ser utilizadas para diferenciar as palavras, questão 3 (Anexo 6). As estratégias apontadas foram as seguintes:

Deste modo, temos três alunos que buscam semelhanças entre as línguas (um aluno especifica semelhanças com a língua materna), três alunos que se apoiam no contexto e dois no sentido da frase. Há um aluno que refere as regularidades, dando o exemplo de s e –se para o plural. Assim, há indícios de que os alunos preferem apoiar-se nas regularidades das formas lexicais e verbais, seguido do contexto e, finalmente, nas regularidades sintáticas.

Quanto às línguas que consideram mais fáceis e mais difíceis de compreender, questão 4 e questão 5, respetivamente, notámos alguma homogeneidade nas opções e respetivas explicações dos alunos. Nos quadros seguintes (Quadro 15 e Quadro 16), apresentamos as respostas dadas:

Quadro 15: Respostas dos alunos à questão 4 da ficha 1 “Primeros pasos en la intercomprensión”

Capítulo 3 – Análise e discussão dos dados recolhidos

Relativamente às línguas mais fáceis de compreender, questão 4, sete alunos nomeiam o espanhol, seguido da língua italiana, com três referências, e do catalão, referido por dois alunos. Quanto às razões apontadas para a facilidade de compreensão dessas línguas, seis alunos referem as semelhanças com a língua materna. Há dois alunos que referem o facto de o espanhol ser de fácil compreensão por ser uma língua que estudam. Um aluno inclui o inglês e o italiano neste grupo. Contudo, parece-nos que a referência à língua italiana como língua de estudo resultou de alguma distração durante a realização do exercício. Um aluno refere ser fácil compreender o catalão por ser um pouco parecido com o espanhol e o português enquanto outro menciona que o italiano é muito parecido com o espanhol. No respeitante às línguas mais difíceis de compreender, questão 5, destacamos que seis alunos apontam o romeno, cinco o francês, dois o italiano e um o catalão. Quanto às causas das dificuldades, dois alunos referem o facto de serem línguas que se afastam da sua língua materna, dois referem dificuldades de compreensão do vocabulário, um a escrita e um afirma não saber francês. Se, por um lado, estes dados confirmam o pouco contacto com outras línguas para além das estudadas no seu percurso escolar, por outro poderão indiciar que alguns alunos não têm consciência do parentesco existente entre as mesmas, nomeadamente entre a língua francesa, romena e portuguesa, e das suas possibilidades de correspondência e transferência recíprocas. Um aluno declara que o italiano tem muitos falsos amigos, o que exigiria uma abordagem mais aprofundada junto do inquirido para conhecer a base da sua afirmação.

Lembramos que estes resultados foram obtidos com base nas observações feitas pelos alunos nas várias línguas românicas disponíveis no interface da plataforma. Na verdade, durante a sessão em que este grupo participou, não houve participantes na língua romena. Também o catalão e o francês tiveram pouca expressividade. Assim, no inquérito final, quisemos saber a sua opinião sobre o seu grau de compreensão das línguas após o termo da sessão (parte I, questão 4; Anexo 10). Os resultados obtidos são os que se seguem, numa escala de 1 a 538:

Quadro 17: Níveis de atitudes face ao grau de compreensão das línguas

38

Lembramos a escala: 1 muito fácil // 2 fácil // 3 sem opinião // 4 difícil // 5 muito difícil.

0 0 0 Catalão 0 3 4 1 0 1 2 3 4 5 Francês 0 0 4 2 2 Espanhol 4 3 1 0 0 Italiano 0 2 3 3 0

A leitura dos dados analisados permite-nos verificar que quatro alunos consideram o espanhol de muito fácil compreensão, não tendo sido assinalada qualquer outra língua nesta opção. Tal dever-se-á ao facto de ser a língua de estudo, pelo que apresentará menores dificuldades. Três inquiridos acham o espanhol e o catalão fáceis e dois a língua italiana. Como vimos na análise da questão 4 da ficha de trabalho “Primeros pasos en la intercomprensión”, são as línguas com as quais os inquiridos conseguem estabelecer mais comparações com a sua língua materna. A opção “sem opinião” foi assinalada por quatro alunos relativamente ao catalão e ao francês, três ao italiano e um à língua espanhola. O elevado número de respostas nesta escala relativamente à língua catalã e francesa poderá estar relacionado com a pouca expressividade destas línguas ao longo da sessão. Quanto às línguas consideradas difíceis, temos três alunos que assinalaram o italiano, dois o francês e um aluno o catalão. A língua francesa foi a única referenciada como “muito difícil” por dois alunos. Nestes dois últimos pontos da escala notamos uma ligeira flutuação relativamente às respostas apresentadas na ficha de trabalho, com mais um aluno a considerar o italiano difícil e menos um a referir o francês. Esta pequena oscilação poderá indiciar que o contacto com estas línguas, ainda que pouco significativo, ao longo da sessão poderá ter influenciado a sua perceção sobre a dificuldade das mesmas.

Na base da família de línguas está a unidade e a variabilidade (Escudé, & Janin, 2010), pelo que devemos destacar as semelhanças evidentes e as diferenças sistemáticas para que os aprendentes sejam capazes de ultrapassar as fronteiras e observar formas de estabelecer pontes entre as línguas. De facto, os dados analisados permitiram-nos notar indícios de que os alunos conseguem “descompartimentar” os seus repertórios linguísticos e estabelecer pontes entre línguas de aprendizagem escolar e outras aparentemente desconhecidas, recorrendo ora à língua materna ora à sua língua de aprendizagem, o espanhol.

Capítulo 3 – Análise e discussão dos dados recolhidos