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Capítulo 2 – A Cooperação entre a União Europeia e o Mercosul

1.3 As negociações na OMC

A OMC foi criada em 1995 como parte de uma nova ordenação mundial e visa regular o comércio entre os países através de negociações que são aprovadas pelos parlamentos nacionais. Esta instituição internacional vem no seguimento de outras surgidas após a segunda guerra mundial como o FMI e as Nações Unidas. Estas instituições são apologistas do reforço das normas internacionais e apreciam o papel dos Estados e das integrações regionais que lhes conferem força por acreditarem nos seus projectos (a UE é um deles).

Os efeitos das integrações regionais têm sido salutares pois conseguem perpetuar o espírito do GATT160, de 1947, que foi adoptado mais tarde pela Organização Mundial do Comércio (OMC) em abrir gradualmente os mercados ao comércio mundial incentivando um maior espírito de concorrência e aproveitando as vantagens do comércio ultra liberal. Neste espírito constrói-se uma ordem multilateral equilibrada em que nenhum dos actores tem o poder suficiente para se impor de forma arbitral e um único parceiro não é suficiente para dinamizar a economia, é necessário estabelecer vários acordos potenciando o comércio.

As relações entre a União Europeia e o Mercosul são possíveis neste quadro com o Acordo Inter-regional, de 1995, porque existem recursos e massa crítica suficientes em ambos os blocos o que evita correspondências de correlação baseadas no

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Se estes permanecerem fechados irão ser erigidos em torno dos EUA, China e Japão.

160 General Agreement on Tariffs and Trade

neocolonialismo. Existe um reforço de benefícios mútuos contribuindo para a integração mundial através do comércio. Segundo o artigo XXIV do GATT a integração regional deve se fundamentar nos efeitos do trade creation impondo-se aos de trade

diversion.

Tanto a União Europeia como o Mercosul enfrentam contrariedades que se espelham nas negociações da OMC. No caso do Mercosul as diferentes aspirações do mercado, quer se trate da Argentina ou do Brasil, leva a que haja incertezas quanto aos fins procurados para o porvir (uma união aduaneira, um mercado comum ou uma zona de livre comércio?) No lado da União Europeia a questão agrícola é uma mácula nas negociações da OMC porque faz-se questão de manter esta posição (pelas fortes pressões internas que enfrenta) o que já levou, por diversas vezes, ao esvaziamento das negociações como na Conferencia Ministerial de Seattle. Os negociadores procuram soluções temporárias mas que não são muito ambiciosas porque cada bloco quer ceder pouco na sua posição. Torna-se necessário superar este desafio e fazer um balanço dos prós e contras para que se encontre um meio-termo cujas perdas num determinado sector sejam compensadas por outros. As negociações entre a União Europeia e o Mercosul têm estado reféns de uma visão diminuta dos negociadores e cheia de palavras com boas intenções mas com poucos efeitos práticos. Têm que ser concluídas algumas cedências de, parte a parte, que caso fossem executadas naturalmente inspirariam a

OMC beneficiando outras regiões do mundo. Com o Comité Birregional de

Negociações a ter um relevante papel neste cenário é preciso pressionar os actores a

envolverem-se em estratagemas de ajuda e cooperação económica para que tais processos alavanquem outros que não avançam por estarem à espera de um modelo que supere a divisão tradicional do mundo em primeiro e segundo mundo.

Será que com os novos rounds das negociações na OMC as relações com a União Europeia vão melhorar ou serão colocadas em segundo plano? Para já, com o fracasso das negociações na OMC, têm se potenciado os acordos bi-regionais como polifonia a uma dinamização económica e neste sentido o Mercosul ganha uma importância complementar estando na mira da União Europeia e dos Estados Unidos.

A União Europeia tem sido um dos elementos que mais consegue dinamizar a OMC e as suas negociações ao atribuir uma importância superior, através do Comité 133, a áreas relativamente novas como o comércio e a concorrência, o comércio e o investimento, o comércio e o meio ambiente e ao aflorar a dimensão social do comércio. Estas são áreas importantes mas que não são percebidas na sua

superabundância pelos países em desenvolvimento como áreas prioritárias porque continuam a salientar a Política Agrícola Comum como um entrave à livre circulação do comércio. A União Europeia tenta, a todo o custo, defender esta questão e coloca a culpa do impasse das negociações nos países em desenvolvimento. Estamos perante um embaraço em que ambos os lados se acusam mutuamente e quanto a medidas concretas e passos para uma maior abertura comercial deixam muito a desejar. Mais recentemente o Mercosul propôs novas concessões à União Europeia no sector automóvel em troca da eliminação correspondente de tarifas em alguns produtos agrícolas. Estas propostas foram processadas para destravar as negociações que tinham ficado quase congeladas há seis anos. A União Europeia acenou, por sua parte, com uma maior flexibilidade agrícola por meio de uma bolsa comum de concessões que reduziria o número de cotas de 14 para 3 do Mercosul. A UE irá realizar uma reunião no final de Abril, em Bruxelas, para discutir as cedências que podem ser feitas para fechar um acordo de livre comércio na reunião de presidentes da UE e do Mercosul (marcada para Maio, em Madrid). Este será um passo histórico. Ambos os blocos estão dispostos a uma negociação audaz sendo que o Mercosul melhorou a sua oferta no sector de automóveis e de peças reduzindo de 18 para 15 anos o prazo de eliminação de tarifas161. Alguns produtos sensíveis têm um prazo de eliminação de tarifas maior mas a maior parte dos bens industriais têm as suas tarifas de importação abolidas em 10 anos. As negociações visam fechar um acordo rapidamente para que se possa começar a usufruir as vantagens de um mercado bi-regional que até agora tem sido muito favoráveis ao Mercosul.

As negociações na OMC podem ficar activadas se um acordo for fechado entre a União Europeia e o Mercosul e todos ganhariam com este desbloqueamento dos mercados: empresas, pessoas e capitais (dos dois processos de integração regionais). Se é certo que existem determinados produtos em que todos ganham com a abertura dos mercados os ganhos não se reflectem imediatamente para os países em desenvolvimento e por isso estes tendem a fechar-se obstruindo o livre comércio (em relação a possíveis acordos). A importância de uma economia solidária que dinamize e seja um factor de crescimento dos países em desenvolvimento é da máxima importância.

A União Europeia é, no seio da OMC, uma das tácticas políticas de cooperação mais úteis para a independência económica e política dos Estados Unidos por parte do Mercosul. Todos sabemos que os Estados Unidos exploram ao máximo o comércio

161 Este acordo é muito mais vantajoso se compararmos com a anterior proposta que propunha uma margem de preferência de apenas 25% a 50% em relação a outros parceiros.

liberal por estabelecerem zonas de livre comércio mas, apenas, isso não provoca o reforço das instituições que permitiria uma cooperação política. A soberania dos Estados Unidos, em termos económicos, é facilmente reflectida nesses blocos que ficam submetidos á sua predominância e visão de mercado. Não existe por, assim dizer, um meio-termo que seja de ajuda para os países do continente americano a superarem as dificuldades crónicas que têm quanto ao fortalecimento das suas democracias e a negociação de uma economia responsável. A União Europeia é uma alternativa para a consolidação do projecto do Mercosul a um nível mais penetrante porque permite resistir aos intentos e sedução do mercado americano contendo a influência deste país em termos económicos e políticos (por ganhar relevância económica e capital critico de ideias quanto ao futuro da região).

As negociações na OMC embora se encontrem em crise, por falta de saídas para os impasses criados, ainda assim são de importantíssima ajuda para o comércio. Já se conseguiu, pela sua regulamentação do comércio internacional, através das comissões e comités uma jurisprudência na área. A União Europeia e o Mercosul podem aproveitar a senda de luz que já foi trilhada, até aqui, pela OMC para relançar esforços através do reforço das suas relações o que possibilita desencadear determinadas negociações pendentes. Com o congelamento ou as dificuldades de entendimento na OMC os países e os agrupamentos regionais voltaram-se para entendimentos mútuos com vista a uma vasta rede de relações que garantam escoamento e mercados para os seus produtos. Agora joga-se em vários níveis: na OMC e a nível bi-regional. Pede-se aos agrupamentos regionais habilidade e sapiência económica e política para garantir rendimentos e ganhos de escala que permitam trunfos nos diversos tabuleiros de jogos em que se maneja o comércio mundial. Este é um tópico importatante para a difusão da integração europeia no mundo pois caso as negociações com o Mercosul falhem a resolução do impasse na OMC ainda assim seria uma via de escape.

1.4 O PAPEL DA UE PARA A CONSTRUÇÃO DE UM NOVO