• Nenhum resultado encontrado

Como foi abordado na seção anterior, as empresas multinacionais desempenharam e continuam desempenhando um papel decisivo nas trocas internacionais e no processo de industrialização dos países periféricos. Todavia, a teoria tradicional de comércio internacional, tanto na concepção da teoria clássica ricardiana, quanto neoclássica (modelo HOS), não dá espaço às empresas multinacionais e ao comércio intra-empresas, pois ali são as nações e somente elas que mantêm relações de troca (RAINELLI, 1998). Segundo Rainelli (1998), as trocas entre filiais das empresas multinacionais estabelecidas em diferentes países responderam por mais de um terço do comércio mundial de mercadorias ao longo da década de oitenta. Logo, uma das razões para se tentar buscar uma nova teoria, foi a incapacidade da abordagem neoclássica em explicar resultados empíricos.

Enquanto o modelo HOS coloca como essencial as diferenças na dotação de fatores das nações para explicar a troca internacional, dados empíricos mostram que o comércio exterior é mais intenso entre as nações desenvolvidas, cujas dotações de fatores têm poucas diferenças (ID., 1998). Segundo estudo do IEDI (2000), 34% das exportações mundiais são entre matrizes e filiais de empresas transnacionais; 33% entre diferentes firmas multinacionais; e apenas 33% entre outras empresas. Por conseguinte, em termos de volume de negócios, no mercado internacional, predomina o comércio intra-indústria, que não reflete as vantagens comparativas, e sim as economias de escala, como será visto adiante. Se as nações mercantis tiverem estoque de capital e trabalho muito similares, haverá pouco comércio interindústrias, e o comércio intra-indústrias será dominante (KRUGMAN; OBSTFELD, 2001).

Na teoria ricardiana de vantagens comparativas, as nações fazem comércio porque possuem diferentes tecnologias de produção. Por sua vez, de acordo com o modelo HOS, a mesma tecnologia está disponível para os países mercantis, e a razão para existir comércio entre eles é a diferença na dotação de fatores de cada um. Já na nova teoria de comércio internacional, as economias de escala, ou rendimentos crescentes, constituem a principal força propulsora das trocas entre a nações desenvolvidas (ID., 2001).

Quando uma função de produção Y = f(K, L), apresenta rendimentos crescentes de escala, ao se multiplicarem os insumos por uma constante λ, com λ > 1, obtém-se: f(λK, λL) > λ f(K, L) (RAINELLI, 1998).Logo, havendo economia de escala, uma expansão das vendas através de exportações pode representar uma redução de custo para uma firma ou para um conjunto de firmas de uma mesma indústria. Se dois países mercantis estiverem em estágios tecnológicos semelhantes e se cada país produz apenas alguns dos bens, cada bem pode ser produzido em escala maior do que se cada país tentasse produzir tudo. Os consumidores dos países envolvidos na troca disporão de uma maior variedade de bens (KRUGMAN; OBSTFELD, 2001), a um custo menor.

A chamada nova teoria do comércio internacional embute o principio das vantagens comparativas, com divisão internacional do trabalho e especialização da produção, sob a premissa de rendimentos crescentes. Estes tornam os mercados concorrentes imperfeitos. Os produtos deixam de ser homogêneos, as grandes firmas têm normalmente vantagens sobre as pequenas (ID., 2001). A diferenciação de produto, que é ponto-chave nesta abordagem, contribui para acentuar as imperfeições de mercado.

Alfred Marshall em 1879 na sua obra (FRQRPLFV RI ,QGXVWU\foi um dos primeiros autores a tratar dos rendimentos de escala crescentes. Ele introduziu a distinção fundamental entre as economias de escala internas e externas à firma:

Podemos dividir as economias derivadas de um aumento da escala de produção de qualquer espécie de bens em duas classes: primeira, as dependentes do desenvolvimento geral da indústria; e segunda, as dependentes dos recursos das empresas que a ela se dedicam individualmente, das suas organizações e eficiência de suas administrações. Podemos chamar as primeiras de HFRQRPLDV H[WHUQDV, e as últimas de economias internas.

(MARSHALL, 1982)

Segundo Marshall (1982) as economias externas podem freqüentemente ser obtidas pela concentração de muitas pequenas empresas similares em determinadas localidades.

Estes dois tipos de economia de escala são utilizados na teoria do comércio internacional e levam a resultados distintos. Segundo Rainelli (1998) as economias de escala internas levam inexoravelmente ao monopólio. Nestas o custo médio de produção é inversamente proporcional ao tamanho da firma. As grandes empresas têm consciência de que podem influenciar o mercado e cada uma delas se considera formadora de preços. Têm capacidade de diferenciar seu bem, o que lhe assegura um monopólio do seu produto particular dentro da indústria e uma certa proteção e isolamento da concorrência (KRUGMAN; OBSTFELD, 2001). As economias de escala internas ocorrem com maior freqüência nas trocas intra-indústrias.

Já as economias de escala externas, ou externalidades tecnológicas na concepção de Dosi (1998), constituem-se em um ativo coletivo de grupos de firmas dentro de países/regiões que tendem a ser internalizadas em firmas individuais. Seus efeitos econômicos não são detectados pelo mecanismo de preços. As externalidades tecnológicas podem beneficiar firmas pertencentes a uma mesma atividade, a atividades complementares, ou mesmo distintas, que compartilhem a mesma infraestrutura física ou de conhecimento.

Na visão de Krugman e Obstfeld (2001), as despesas em Pesquisa em Desenvolvimento (P&D) também desempenham um papel chave nas relações de troca. A vantagem competitiva não parece ser determinada nem pelas características nacionais, nem pelas vantagens estáticas de produção em grande escala, mas pelos conhecimentos produzidos pelas empresas através de P&D e da experiência (ID., 2001). Um dos questionamentos que se faz é como o comércio se constitui num veículo de propagação destes conhecimentos.