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As Organizações Globo e os meios de comunicação no Brasil contemporâneo

No presente capítulo, faremos algumas considerações sobre O Globo e os principais órgãos da imprensa no Brasil. Mostraremos a maneira como a mídia procura se apresentar ao conjunto da sociedade e, em contraposição, iremos expor nosso entendimento a respeito dos meios de comunicação, em conformidade com nossos pressupostos teóricos. Também faremos observações sobre o universo das redações dos jornais brasileiros e a condição dos profissionais de jornalismo.

Trataremos dos principais grupos de mídia do país, da monopolização do setor no Brasil e no mundo e das recentes associações com o capital estrangeiro feitas pelas Organizações Globo e pelos demais meios de comunicação nacionais. Também traçaremos um panorama dos inúmeros ramos econômicos nos quais as empresas da família Marinho atuam, bem como seus vínculos com diferentes frações do capital e com importantes nomes da sociedade política. Finalmente, apontaremos como os interesses empresariais do conglomerado Globo dependiam da adoção do programa neoliberal.

Na segunda parte deste capítulo, faremos um breve relato da história de O Globo e demais veículos de comunicação dos Marinho, destacando o período da ditadura militar. Também trataremos da atuação do conglomerado Globo no período da redemocratização, ressaltando sua enorme influência política.

1.1: A imprensa segundo ela mesma e a imprensa como “partido”

A análise da imprensa em um determinado contexto histórico deve considerar a maneira como o próprio veículo se auto-representa. Sua atuação política será eficaz quanto mais disseminada e aceita for essa auto-imagem. Nesse sentido, no estudo da ação de O Globo a partir do final dos anos 80, é preciso analisar como era a representação de si que o jornal procurou difundir.

De maneira geral, os órgãos de imprensa, não somente O Globo, se apresentam como meios que informam às pessoas sobre o que está acontecendo no Brasil e no mundo. Estariam, portanto, prestando um serviço à população, sendo dotados de

35 responsabilidade social. A mídia seria um espelho neutro, sobre o qual “a realidade” inscreve os seus traços.51

A imprensa se apresenta como “independente”: estaria acima dos interesses sociais, observando-os de modo neutro e objetivo. Trataria do meio político e dos conflitos sociais sem se confundir ou se envolver com os mesmos. Sem estar vinculada a qualquer grupo social, a mídia teria um único compromisso: o de explicar a realidade para o leitor.

Essa definição de mídia está presente em O Globo desde sua fundação. É o caso de um cartaz que foi espalhado na cidade do Rio de Janeiro em 1925 anunciando a inauguração do periódico: “Brevemente, O Globo. Jornal da noite dirigido por Irineu Marinho. Ampla informação, absoluta independência e rigorosa imparcialidade”. Décadas mais tarde, em uma publicação de 2004, João Roberto Marinho, vice- presidente das Organizações Globo, definiria o jornal de maneira semelhante: seu papel seria o de divulgar notícias; a função dos 4.500 jornalistas (de todos os veículos das Organizações Globo) seria “contar o que acontece no país”. Em 2006, Ali Kamel, diretor-executivo da Central Globo de jornalismo, assim se apresentou: “não sou movido por paixões políticas e meu compromisso é apenas com minha profissão: relatar os fatos, com correção e imparcialidade, não importando se beneficiam ou prejudicam esta ou aquela corrente política.”. Essa imagem alicerçada na “independência”, “imparcialidade” e “objetividade” é recorrente entre os porta-vozes das Organizações Globo e demais órgãos de imprensa; centenas de outros exemplos poderiam ser dados.52

Nos anos 90, a legitimação do jornal continuou a se basear em sua função de explicar o mundo para os leitores, acrescentando que se tratava a partir de então de um contexto ainda mais complexo, “globalizado”, de rápidas transformações, mas que, paralelamente, as pessoas tinham menos tempo para analisar tantos fluxos de informações. Daí a importância do jornal, que permitiria ao leitor compreender e se situar no mundo em que vive: “as coisas começaram a mudar cada vez mais depressa a

51

ARBEX JR, José. Showrnalismo, a notícia como espetáculo. São Paulo: Casa Amarela, 2001. p.105.

52

Apud FERREIRA, Cristiane. A história do Jornal O Globo. Monografia de final de curso em Comunicação Social. Universidade Federal Fluminense, Faculdade de Comunicação Social, 2001.p.66; Jornal Nacional: a notícia faz a história. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2004.p.12. LIMA, Venício de. (org) A mídia nas eleições de 2006. SP: Perseu Abramo, 2007.p.273.

36 cada ano, a cada mês, a cada semana, a cada dia, com tamanha velocidade que é impossível se manter atualizado. Ainda bem que existe O Globo”.53

A representação de si que o jornal procura disseminar também se baseia na noção de “contra-poder” ou “quarto-poder”. A mídia vigiaria “os poderes”, fiscalizaria o Executivo, o Legislativo e o Judiciário, tornaria públicas as “irregularidades”. Tratar- se-ia de um agente que, embora desvinculado dos conflitos sociais, teria grande acesso a informações e as divulgaria “doa a quem doer”, em nome de seu compromisso com o leitor e com a “nação”. As denúncias de corrupção terminam por reforçar a idéia de que a imprensa está fora do processo político e dos interesses partidários. E vinculada a esta função da mídia, está presente a figura do jornalista: profissional que heroicamente buscaria a notícia, desvendando escândalos, surpreendendo os “poderosos” e os governantes, levando informações úteis à população.54

De acordo com essa imagem de “contra-poder”, a própria existência da “imprensa livre e independente” seria uma demonstração se há ou não democracia e “liberdade de expressão” no país. A mídia garantiria a pluralidade de opiniões, permitiria o debate público com presença de diversos pontos de vista, não somente o do governo ou de um determinado partido.55

Ainda que neutra e imparcial, a imprensa não se furtaria de emitir suas próprias opiniões em certos momentos. Porém, informação e opinião estariam separadas, cada uma ocupando um espaço diferente em O Globo. Segundo João Roberto Marinho, o jornal não abdica de dar suas impressões sobre os fatos, “mas estas tinham seu lugar adequado nos editoriais do Globo”.56

Nesse sentido, apenas nos editoriais, O Globo possuiria opiniões, as demais partes do jornal seriam apenas informativas. Por décadas, o jornal costumava ter

53

apud COUTINHO, Eduardo Granja (org). Mídia e poder: ideologia, discurso e subjetividade. Rio de Janeiro: Mauad X, 2008.p.202.

54

SILVA, Carla L. Veja.op.cit.p.28 e 38, NEVEU, Érik. Sociologia do jornalismo. São Paulo: Edições Loyola, 2006.p.29.

55 Interessante observar que a imagem que os órgãos da imprensa procuram fazer de si mesmos muitas

vezes é assumida por estudiosos de mídia. A socióloga Alzira Alves de Abreu, da FGV e da UFRJ, assim define o jornalismo dos anos 90: “apartidário, despolitizado e pluralista. Ontem, os jornalistas eram engajados... Hoje são os profissionais, os técnicos que vivem a crise de engajamento [a partir da crise do socialismo real]”. A mídia estaria mais voltada para as necessidades básicas da população, tratando de temas como condições dos hospitais e violências praticadas por policiais. “Ao se aproximar da vida quotidiana dos cidadãos, de suas dificuldades, e tentar ajudá-los, a imprensa estaria consolidando o tecido democrático”. Denunciando escândalos políticos, os jornais agiriam como “contrapoder”. ABREU, Alzira Alves, LATTMAN-WELTMAN, Fernando e KORNIS, Mônica. Mídia e política no Brasil, jornalismo e ficção. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 2003.p.71, ABREU, Alzira Alves. A modernização da imprensa (1970-2000). Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2002.p.46.

37 editoriais na capa do jornal, além daqueles presentes na parte interna, geralmente páginas 4 e 5 (mais tarde 6 e 7), onde também se encontram os colunistas. A partir de meados dos anos 90, os editoriais de capa tornaram-se menos freqüentes. Por outro lado, próximo de algumas reportagens “neutras”, foi colocado um pequeno retângulo à parte com o título “opinião”, onde há um pequeno texto, geralmente de apenas um parágrafo, onde estaria a posição oficial de O Globo sobre um determinado assunto.57

Quando apresenta sua opinião, o jornal procura identificá-la, segundo seus próprios termos, com o ponto de vista da maioria da “sociedade” ou “sociedade civil”. Nesse sentido, a imprensa seria representante da “opinião pública”. Se, de um lado, a “opinião pública” é apresentada como a posição da maior parte das pessoas, de outro, costuma ser também identificada com a dos leitores de jornais (especialmente as classes médias), que não são a maioria dos brasileiros. O conceito ganha então um caráter abertamente elitista, que é assumido pelos porta-vozes da imprensa. Daí, por exemplo, a colunista Teresa Cruvinel, de O Globo, observar, em agosto de 2006, que um eventual segundo mandato de Lula seria “marcado por uma contradição aguda: teria fortíssimo apoio popular, forte rejeição da opinião pública”.58

A auto-imagem de O Globo segue os preceitos do jornalismo dos EUA. A influência norte-americana sobre a imprensa brasileira ganhou mais força a partir da segunda metade dos anos 50, no contexto de maior internacionalização da economia brasileira e da maior presença das multinacionais, se consolidando nos anos 70, durante a ditadura militar.59

Até então, o jornalismo brasileiro tinha mais semelhanças com o “modelo francês”, onde a identificação com tendências políticas e partidos é mais explicita.

57

Em meados dos anos 90, em algumas edições, a parte editorial de O Globo passou a ter o ponto de vista do jornal intitulado “Nossa Opinião” e um convidado externo que teria opinião diferente, “Outra Opinião”. Segundo Pedro Bial, “difícil encontrar melhor exemplo do aperfeiçoamento da democracia refletido num jornal”. BIAL, Pedro. Roberto Marinho. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2004.p.267.

58

Apud LIMA, Venício de. (org) A mídia nas eleições.op.cit.p.131 Otávio Frias Filho, da Folha de São Paulo, em depoimento de 2001, assumiu o mesmo caráter elitista de “opinião pública”. Afirmou que os jornais no Brasil são lidos por cerca de 10% da população. Tratar-se-ia de uma “audiência de qualidade, quer dizer, são formadores de opinião... E é um público basicamente de classe média (...) urbana, com bom nível de escolaridade”. Apud FONSECA, Francisco César Pinto.. Mídia e democracia: falsas congruências IN Revista de Sociologia e Política. nº22: 13-24 jun.2004 p.19. Para uma discussão sobre o conceito de sociedade civil e como várias análises costumam contrapor “sociedade civil” ao Estado, ver FONTES, Virgínia Maria. Reflexões im-pertinentes: História e capitalismo contemporâneo. Rio de Janeiro: Bom Texto, 2005.

59

SILVA, Carlos Eduardo Lins da. O adiantado da hora: influência americana sobre o jornalismo brasileiro. São Paulo: Summus, 1991.

38 Segundo Kucinski, os jornais dos anos 60 eram abertamente instrumentos de lutas políticas, sendo assumidamente ideologizados. Os casos mais notórios eram a Tribuna

da Imprensa, de Carlos Lacerda, vinculado a alguns setores da União Democrática

Nacional (UDN), e A Última Hora, de Samuel Wainer, mais próximo do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB). Jorge de Miranda Jordão, que ocupou vários cargos de chefia entre 1958 e 1967 na Ultima Hora, lembra que os integrantes do jornal eram “getulistas”, “samuelistas” e “antilacerdistas”: “era como se trabalhássemos hoje num jornal do PT”.60

A partir dos anos 50, o “modelo norte-americano” de jornalismo – que preconiza a “objetividade”, caráter mais informativo e a separação de fatos e comentários – foi tornando-se gradativamente preponderante na grande imprensa. Segundo Carlos Eduardo Lins e Silva, da Folha de São Paulo, “em todos os setores, da técnica ao estilo, da ética ao gerenciamento da redação, dos conceitos filosóficos à pedagogia, a ideologia jornalística americana se tornou hegemônica”.61

Portanto, principalmente a partir dos anos 60 e 70, dificilmente um jornal de grande circulação seria fundado tal como a Folha da Manhã e a Folha da Noite dos anos 30 que, ao mudarem de proprietário, declararam abertamente assumir a “causa da lavoura”, que deveria “ser considerada a causa de São Paulo e do Brasil”.62

Os jornais brasileiros de hoje, dentre os quais O Globo, não se vinculam declaradamente a partidos políticos ou a grupos sociais.

Partimos do pressuposto que a auto-imagem de O Globo e demais jornais é enganosa e encobre seu verdadeiro papel na sociedade capitalista. A idéia de “neutralidade” e “objetividade” procura dissimular os interesses de classe presentes na mídia. Como ressalta Arbex Junior, “mesmo a frase mais simples sobre evento mais „objetivo‟ – algo como „choveu ontem‟ – terá de ser diagramada na página do jornal. A

60

NEVEU, Érik. Sociologia ...op.cit.29, KUCINSKI, Bernardo. Síndrome da antena parabólica: ética no jornalismo brasileiro. São Paulo: Perseu Abramo, 1999.p.160, apud MARTINS, Ana Luiza e LUCA, Tânia Regina de.(orgs). História da imprensa no Brasil. São Paulo: Contexto, 2008.p.195.

61 A influência do jornalismo norte-americano se fortaleceu através de viagens de profissionais brasileiros

para os EUA. Associações, como o Word Press Institute, ofereceram bolsas de ensino, financiando viagens para os Estados Unidos. O próprio Lins e Silva, entusiasta do padrão americano, estudou nos EUA. Ao mesmo tempo, as noções de “neutralidade do jornalismo” avançaram em instituições de ensino no Brasil, em um contexto em que se passou a exigir diploma dos jornalistas (1968) e seu registro no Ministério do Trabalho. SILVA, Carlos Eduardo Lins da. O adiantado... op.cit.p.71, 83 e 134, KUCINSKI, Bernardo. Síndrome.op.cit.191.

62

Apud TASCHNER, Maria da Conceição. Folhas ao vento: análise de um congloberado jornalístico no Brasil. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992.p.52

39 escolha do local da página onde será dada a notícia depende de uma interpretação, de uma hierarquizão de outras notícias em relação a esta...”63

Um jornal como O Globo tem grande importância na determinação do que é “de interesse público”, em decidir o que é notícia, na eleição do que é “relevante”. A mídia tem grande peso na definição dos “temas nacionais”, na pauta do que deve ser discutido e em que termos deve ser discutido. Pode escolher ou descartar temáticas, teatralizar os fatos, pode contribuir para gerar tanto conformismo como para mobilizar indivíduos ou grupos sociais. A mídia pode tratar de alguns temas de modo breve e de outros incessantemente. O que passa ao largo da mídia tende a ser considerado como de menor importância. 64

Percebe-se, portanto, que não se trata de um ente que apenas “observa” imparcialmente os fatos. Os jornais tem grande importância na “batalha de idéias”, fundamental na luta de classes contemporânea. As relações entre as idéias e os conflitos sociais foi destacada por Karl Marx e Friedrich Engels. Os autores registram que, em uma ordem social onde ocorre exploração, a classe dominante deve dar “universalidade” aos seus pensamentos, “representar o seu interesse como sendo interesse de todos os membros da sociedade”.65

Dentro dessas premissas, Antônio Gramsci refletiu sobre as mudanças ocorridas no mundo capitalista não testemunhadas por Marx, como a extensão do sufrágio, o surgimento de sindicatos e partidos de massa. Para as classes dominantes, a adesão e o convencimento das classes exploradas tornavam-se ainda mais cruciais e requeriam ação permanente.

Gramsci, trabalhando a partir de uma visão ampliada do Estado, enfatizou as lutas travadas no interior da “sociedade civil” – onde as classes sociais se organizam – e a disputa por “hegemonia”. Esta última não “brota” mecanicamente da preponderância econômica de um determinado grupo social, daí a necessidade deste de formular e difundir seus valores, doutrinas, crenças, convicções e representações, obtendo consenso, fazendo com que as demais classes e frações de classe compartilhem de sua visão de mundo. Uma vez no aparelho de Estado (“sociedade política”), o grupo continua difundindo suas formas de ver e pensar o mundo, procurando obter direção

63 ARBEX JR, José. Showrnalismo.op.cit.p.161

64 KUCINSKI, Bernardo. Jornalismo na era virtual. São Paulo: Perseu Abramo, 2005.p.40,

BAGDIKIAN, Ben. O monopólio da mídia. São Paulo: Scritta, 1993.p.37.

40 intelectual e moral, processo no qual a repressão e a coerção também desempenham papel importante.66

Nesta batalha por hegemonia (“guerra de posições), destacam-se os “partidos”, que são sempre expressão de um grupo social. O partido expressa e ao mesmo tempo constrói uma vontade coletiva organizada, pois contribui para que a classe ou fração de classe tenha um caráter mais homogêneo. Gramsci não entende o partido apenas como aquelas instituições cujos membros concorrem periodicamente às eleições. Clubes, associações, sindicatos, assim como jornais e revistas, são também “partidos” das classes e frações de classe. “Os partidos podem-se apresentar sob os nomes mais diversos, mesmo sob o nome de antipartido e de „negação dos partidos‟...” Nos momentos decisivos, os vários partidos da classe, que se apresentam como “independentes”, agem em conjunto: “a unificação das tropas de muitos partidos sob a bandeira de um partido único, que representa e encarna as necessidades de toda a classe, é um fenômeno orgânico e normal”.67

Assim, para Gramsci, os jornais e revistas, incluindo “„a imprensa de informação‟, supostamente „apolítica‟”, são também partidos de determinados grupos sociais, comprometidos com a difusão e consolidação de visões de mundo. Como partido, a imprensa tem função “diretiva e organizativa”, além de “educativa” e “intelectual”. Jornais e revistas procuram “modificar a opinião média da sociedade, criticando, sugerindo, ironizando, corrigindo, renovando e, em última instância, introduzindo „novos lugares comuns‟”. A imprensa difunde “determinados tipos de cultura” e, ao fazê-lo, funciona como “escola de adultos”.68

Nessa perspectiva, O Globo é entendido como um veículo de difusão de visões de mundo e ideologias burguesas – não considerando ideologia como falsidade ou mentira deliberada, mas como um condicionamento da percepção da realidade, um certo horizonte intelectual. E o horizonte de O Globo são os valores da empresa privada

66 GRAMSCI, Antônio. Maquiavel, a política e o Estado Moderno. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira,

1989. Ver também: COUTINHO, Carlos Nelson. Gramsci: um estudo sobre seu pensamento político. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1999, MENDONÇA, Sônia Regina. “Estado e sociedade” IN MATTOS, Marcelo Badaró (org). História, pensar e fazer. Laboratório Dimensões da história, 1998 e MORAES, Dênis de. Comunicação, hegemonia e contra-hegemonia: a contribuição teórica de Gramsci. Revista Debates, Porto Alegre, n.1, jan-jun.2010.

67 GRAMSCI, Antônio. Maquiavel...Op.cit.p.20 e 55. Conforme Gramsci, os “intelectuais” e os partidos

tem funções similares.

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Idem.p.23. GRAMSCI, Antônio. Cardernos do cárcere. Os intelectuais. O princípio educativo. Jornalismo. VI.2. Caderno24 (1934). Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2000.p.24, 32, 209 e 229. Antes de Gramsci, Lênin já destacava a importância do jornal, que funcionaria como um organizador e propagador de idéias, educando politicamente.

41 capitalista, que são apresentados como universais. O mundo estabelecido é eternizado e seus problemas ou conflitos, atenuados ou mesmo negados. Afinal, como ressalta Leandro Konder, a ideologia dominante está justamente no que não é visto, nas limitações dos horizontes de pensamento.69

Mas a eficácia do jornal estará justamente em ocultar seus compromissos com o capital e com a ideologia dominante, mostrando-se como porta-voz do público, imparcial, íntegro, guardião da moralidade e dos valores coletivos. Daí O Globo se valer da noção de “opinião pública”, ora entendida como se fossem a posição da “maioria” da população, ora como se fossem as dos leitores. Porém, a existência de uma “opinião pública” dependeria de oposições de idéias e debates prévios para que, a partir de então, cada um formulasse seu ponto de vista. E não é isso o que ocorre no jornal, que, como veremos nos capítulos seguintes, procurou transformar os valores neoliberais em dogmas.

Nesta tese, O Globo é considerado um “partido” de diferentes frações das classes dominantes, em especial daquelas vinculadas ao capital financeiro e às multinacionais. Tais grupos, como vimos na Introdução, se interessavam pela implementação do neoliberalismo e tiveram o jornal como importante aliado. O partido O Globo procurou tornar hegemônicos os valores neoliberais (como a crença na “eficiência do mercado”), de modo a unificar as diferentes frações dos grupos sociais dominantes – ou, ao menos, atenuar suas divergências internas – além de obter também adesão das classes subalternas.

O Globo agiu pedagogicamente, buscando popularizar o discurso neoliberal,

apresentando-o como interessante para toda a “nação” (que, no âmbito discursivo, deixa de ser um espaço contraditório e conflitivo).70

Ao mesmo tempo em que procurava generalizar os interesses de algumas frações das classes dominantes, O Globo fez forte oposição às organizações de cunho popular, que reivindicavam políticas de caráter redistributivista, como o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST), a Central Única dos Trabalhadores (CUT) e o Partido

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MÈSZAROS, Istvan. O poder da ideologia. São Paulo: ensaio, 1996, KONDER, Leandro. A questão da ideologia. São Paulo: Companhia das Letras, 2002.p.223

70 Como ressalta Virgínia Fontes, existem diferentes modalidades de mídia, desde aquelas que criam certa

“racionalidade”, sob a forma de reflexão técnica para um público específico, caso de periódicos

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