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Se alguns países doadores consideram a cooperação para o desenvolvimento mais ou menos importante que outros, o mesmo ocorre dentre os países receptores de AOD. Não há homogeneidade na grande quantidade de países em desenvolvimento: além das diferenças socioculturais, há muita desigualdade em termos de desenvolvimento político e econômico. Parece-me contraproducente tentar entender um país africano que atravessou décadas de guerra civil e atualmente possui mais da metade de sua população contaminada pelo vírus HIV e da mesma forma que se tenta entender um BRIC71. Em contrapartida, elencar minuciosamente todas as dessemelhanças e peculiaridades existentes entre as centenas de países que recebem doações e empréstimos tampouco me parece proveitoso.

Assim, desejo apenas ilustrar aqui o quanto pode variar a recepção e o efeito de ajuda externa entre os países em desenvolvimento. Para isso selecionei três indicadores: (1) o PIB dos países, (2) o total de AOD recebida e (3) o percentual de AOD recebida com relação ao PIB do país receptor. Estes dados dizem respeito não apenas à economia local e ao impacto que a entrada AOD tem sobre a economia local, mas também apontam para outro elemento importante que é o nível de inserção que um país receptor ocupa no feixe de interesses do CAD. Independentemente das economias dos países em desenvolvimento e das funções que a AOD recebida possa ter nessas economias, um país pode receber muito ou pouco recurso oriundo da cooperação simplesmente por estar bem ou mal inserido nos interesses geopolíticos de um ou mais membros do CAD, ou mesmo pela sua inserção no foco de ação de uma ou mais OIGs.

De acordo com as variáveis mencionadas acima agrupei 138 países em 12 clusters (cf. gráfico 9). Para poder realizar os cálculos tive de obter os PIB desses países. Para isso recorri aos dados do Fundo Monetário Internacional (FMI) disponíveis on-line através da plataforma World Economic Outlook (WEO) (IMF, 2010). Aqui, o número de 138 países refere-se à máxima intersecção possível entre os dados fornecidos pelas bases do FMI e da OCDE. Os dados reais, desagregados por países, encontram-se disponíveis para consulta, listados no Anexo C.

Com efeito, ao comparar a ajuda recebida pelos países em desenvolvimento, verifica-se que há extrema desigualdade na relevância que a AOD representa para os 12 clusters obtidos. Para os países dos clusters 5, 7 e 8 ela é praticamente irrelevante em termos econômicos, pois representa menos que 1 por cento do PIB desses países. Por exemplo, o

cluster 5 é composto exclusivamente pela China. Mesmo esse país tendo recebido volumosos 9,6 bilhões de dólares em AOD no total durante os anos de 2002 a 2008, seu PIB monstruoso de 17,9 trilhões de dólares acumulados no mesmo período tornam esta doação ínfima. Efeito similar acontece em menor escala com os países Brasil, Índia e México (cluster 8). E países do cluster 7, os quais recebem em média valores parecidos com os do cluster 8, podem considerá-la com igual baixo interesse, mesmo possuindo um PIB bastante inferior.

De um modo um pouco diferente, a Nigéria é o único país do cluster 2 e acumulou 19,5 bilhões de dólares em AOD. Mesmo sendo alto esse valor, ele representa relativamente em torno de 2,3 por cento do PIB do país. Similarmente, outros 67 países (cluster 10) compartilham uma média percentual de AOD com relação ao PIB também baixa: 1,6 por cento. Entretanto, a diferença entre os clusters 2 e 10 reside no fato dos países do cluster 10 possuírem em contrapartida economias pequenas e receberem quantias baixas de AOD, enquanto a economia da Nigéria é um pouco mais robusta.

Diferenças notáveis com relação aos clusters acima podem ser encontradas dentre os países do clusters 6 e 9, cujas médias de AOD percentual em relação ao PIB são, respectivamente, 5 e 8 por cento. Espera-se que esses 35 países, que possuem uma parte importante de suas economias vinculada a remessas externas de AOD, tenham um grande interesse em manter boas relações com os países do CAD tendo em vista a manutenção deste fluxo de recursos.

Em seu turno, os onze países que formam o conjunto dos clusters 1, 3, 4, 11 e 12 são aqueles que dependem do ou tem suas economias extremamente influenciadas pelo recebimento de AOD. Em um extremo desse grupo de clusters temos o caso isolado do atualmente arrasado Iraque, que figura como o maior receptor (56 bilhões de dólares) e possui um valor acumulado percentualmente equivalente a 25,5 por cento de sua economia. Em outro extremo há países como a Libéria, as Ilhas Salomão e o Timor Leste, que mesmo recebendo relativamente pouco em AOD apresentam valores percentuais altíssimos, respectivamente 39,6, 31,9 e 51,9 por cento do PIB total acumulado no período analisado.

É viável então concluir que não há como descrever um efeito geral da cooperação internacional sobre os países em desenvolvimento os tomando como uma categoria genérica, mas sim tentar entendê-los nas suas especificidades, caso a caso, ou dentre padrões.

Gráfico 9 – Análise de cluster: agrupamento de países receptores de AOD selecionados segundo PIB dos países, total de AOD recebida e percentual de AOD recebida com relação ao PIB – 2002-2008.

(continua)

Cluster 1: Iraque Cluster 2: Nigéria Cluster 3: Afeganistão

Cluster 4: Burundi, Rep. Dem. do Congo, Kiribati, Moçambique, São Tomé e

Príncipe e Serra Leoa

Cluster 5: China Cluster 6: Bolívia, Camarões, Etiópia, Gana, Jordânia, Quênia,

Senegal, Sérvia, Sudão, Tanzânia, Uganda, Vietnã e

Zâmbia

Cluster 7Argélia, Argentina, Bangladesh, Chile, Colômbia,

Egito, Indonésia, Irã, Cazaquistão, Malásia, Marrocos, Paquistão, Peru,

Filipinas, Arábia Saudita, África do Sul, Tailândia, Turquia, Ucrânia e Venezuela

Cluster 8: Brasil, Índia e México Cluster 9: Butão, Burquina Faso, Camboja, Cabo Verde, Rep. Centro-Africana, Jibuti, Eritreia, Guiné Bissau, Haiti, Laos, Madagascar, Malauí, Mali, Mauritânia, Mongólia,

Nicarágua, Níger, Ruanda, Samoa, Tonga, Vanuatu e

(continuação)

Cluster 10: Albânia, Angola, Antigua & Barbuda, Armênia,

Azerbaijão, Barém, Barbados, Bielorrússia, Belize, Benim, Bósnia e Herzegovina, Botsuana, Chade, Comores, Congo, Costa Rica, Costa do Marfim, Croácia, Dominica, Republica Dominicana, Equador, El Salvador, Guiné Equatorial, Fiji, Gabão, Gâmbia, Geórgia, Granada, Guatemala, Guiné, Guiana, Honduras, Jamaica, Quirguistão, Líbano, Lesoto, Líbia, Macedônia, Maldivas, Malta, Ilhas Maurício, Moldova, Montenegro, Mianmar, Namíbia, Nepal, Omã, Panamá, Papua Nova Guiné, Paraguai, Seicheles, Eslovênia, Sri Lanka, São Cristóvão & Neves, Santa Lucia, São Vicente & Granadinas, Suriname,

Suazilândia, Síria, Tajiquistão, Togo, Trindade e Tobago, Tunísia, Turquemenistão, Uruguai, Uzbequistão e Iêmen.

Cluster 11: Libéria e Ilhas Salomão Cluster 12: Timor-Leste

Legenda

PIB Produto Interno Bruto

AOD Ajuda Oficial para o Desenvolvimento recebida AOD/PIB Valor percentual de AOD recebida com relação ao PIB Notas:

Casos analisados: 138

Valores padronizados entre zero (0) e um (1).

Valores relativos às posições nos eixos: centro = 0; extremidades = 1. Para valores reais, cf. Anexo C.