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2.4 Dimensões da Cultura Nacional

2.4.4 A Influência da Cultura na GRH

2.4.4.1 As Práticas de Gestão nas Empresas Portuguesas

Hofstede (1980; 1984; 1991; 2011) estudou a influência que três dimensões teriam no âmbito da gestão de pessoas. A próxima figura mostra, precisamente, aquilo que se espera da cultura portuguesa ao nível do estilo de liderança, a motivação e a estrutura organizacional.

Devido a valores elevados de distância hierárquica e valores baixos de individualismo encontra-se, em Portugal, um estilo de liderança “diretivo/autocrático”. Este tipo de liderança é caracterizado pelo controlo individual, por parte do líder, sobre todas as decisões, sendo as consultas da opinião dos membros do grupo pouco frequentes e inconsequentes.

Ora, de acordo com Lopes (2010) algumas destas características que Hofstede aponta ajudam a explicar a falta de produtividade das empresas nacionais. Lopes (2010) entende mesmo que o estilo diretivo/autocrático que resulta da elevada distância hierárquica é o grande anátema que impede a competitividade das organizações portuguesas o que não deixa de ser, de acordo com o autor, paradoxal, já que não aproveitamos a nossa capacidade para trabalhar em equipa, como é sustentado pelos elevados valores da dimensão coletivismo.

Fonte: Hofstede (1991).

Para Cunha e Rego (2005) existe um fraco pendor da liderança participativa na cultura portuguesa. Estas conclusões são retiradas dos estudos de Gill (1996) e do European Social Survey, em 2002, que mostram que Portugal é um país que apresenta níveis muito baixos de participação dos trabalhadores. De acordo com os dados publicados pela Fundação Europeia

com a recente vinda da Troika, a participação, por via dos sindicatos tem vindo a ser cada vez menor (Eurofound, 2016).

Com uma sociedade marcada por um elevado índice de controlo da incerteza e feminina, é esperado que as pessoas se motivem essencialmente pela satisfação das necessidades de segurança (baixa rotatividade na empresa, confiança na gestão, responsabilidade social da empresa, estruturas estáticas e pouco evolutivas).

Esta conjugação de valores culturais privilegia a pirâmide hierárquica como o tipo de estrutura eleita para as organizações. Este tipo de estrutura favorece a aplicação de normas e regulamentos próprios de sociedades com elevado índice de controlo da incerteza e atende à aceitação da diferença de papéis e hierarquias, características de sociedades com elevada distância hierárquica.

Alguns autores corroboram esta descrição da cultura portuguesa, apontando alguns detalhes relevantes. Como referido por Cunha (2005), dados do projeto GLOBE (Jesuíno, 2002) sugerem que os gestores da Europa latina percecionam uma grande distância hierárquica, preferindo, no entanto, níveis muito mais baixos do mesmo.

Apesar da cultura portuguesa ter uma elevada aversão à incerteza, não se sentindo confortável com situações ambíguas e originando que as organizações desenvolvam uma abundância de normas e regulamentos, “os dados de Jesuíno (2002) sugerem que os gestores portugueses lidam melhor com a incerteza do que seria de esperar a partir dos resultados de Hofstede” (Cunha, 2005: 191).

Em relação ao coletivismo, os dados do projeto GLOBE sugerem que a cultura portuguesa é mais coletivista no que diz respeito à família (o grau em que os indivíduos expressam orgulho, lealdade e interdependência nas suas famílias e companheiros próximos), do que diz respeito às instituições (o grau em que as práticas institucionais no nível social encorajam e premeiam a ação coletiva) (Cunha, 2005).

Lopes (2010) corrobora esta questão associada ao coletivismo, referindo que na cultura portuguesa existe uma dominância da feminilidade e um coletivismo elevado, mas como pontos fracos, emergem a baixa capacidade para a planificação e elaboração de processos amadurecidos, associada a um sentido grupal, mas que pouco se reflete em sentido verdadeiramente de equipa.

Usando o modelo de cultura organizacional de Quinn e seus colaboradores, Lopes (2010) analisa a liderança da cultura portuguesa depois de recolher informação através de um questionário aplicado a um grupo de empresários.

A figura 8 mostra os valores a que obedece a cultura portuguesa se não houver intervenção por parte da liderança. Denota-se, por um lado, um défice nos processos internos e nos objetivos e por outro, um exagero para sistemas abertos (inovação) e uma oscilação brusca nas relações humanas (do muito bom a péssimo muito rapidamente).

Fonte: Lopes (2010). Figura 8: Valores a que obedece a cultura portuguesa - modelo de cultura organizacional de R.E. Quinn.

Para melhor liderar a cultura portuguesa, Lopes (2010) afirma que será necessária uma micro-regulação da mesma (ver figura 9), conciliando os fatores positivos da cultura portuguesa e influenciando as dimensões menos positivas, de forma a posicionar o diagrama na zona de otimização. Identifica a necessidade de uma estabilização do quadrante relacionado com as relações humanas e investir mais nos processos, na planificação e na definição dos objetivos (quadrante dos Processos Internos e Objetivos Racionais). O autor espera que o investimento nos processos faça equilibrar a componente exagerada no quadrante dos sistemas abertos (criatividade e inovação).

Fonte: Lopes (2012) Figura 9: Micro-Regulação da liderança da cultura portuguesa.

Um estudo realizado em 2002 (Bennet & Brewster, 2002), pela Ad Capita Executive Search5 e pela Cranfield School of Management6, através de um inquérito a gestores (130

gestores estrangeiros e 34 gestores portugueses, cuja atividade profissional se desenvolve em Portugal), permitiu caracterizar a cultura de gestão existente em Portugal.

Os resultados do estudo não foram “simpáticos” para os gestores portugueses e foram amplamente reproduzidos na comunicação social da altura (O Jornal Público, em 06/05/2002, publica o título da notícia ”Gestores europeus «arrasam» colegas portugueses”). O estudo concluiu que o principal problema da gestão portuguesa são a falta de liderança estratégica clara a partir do topo, o que resulta em confusão, visão de curto prazo e uma falta de planeamento em toda a organização empresarial. O estudo prossegue afirmando que a gestão de topo não se foca nas necessidades dos acionistas e, mais importante, os clientes e o mercado competitivo

5 Ad Capita Executive Search é uma das principais empresas de “caça talentos” em Portugal, especializada no apoio a missões globais e a empresas internacionais e respetivas administrações a operar em Portugal. Ad Capita é membro da INAC, rede global de “caça-talentos”. Clive Viegas Bennet, o autor do estudo, é sócio da empresa e possui um MA pela University of Oxford e um MBA pela Cranfield School of Management.

6 Cranfield School of Management, no Reino Unido, é uma das principais escolas de gestão da Europa. Além dos seus cursos de MBA de renome, Cranfield é líder mundial no desenvolvimento de executivos e nos cursos de gestão de pequena duração, bem como no fornecimento de serviços de consultoria para empresas de topo, em todo o mundo. Chris Brewster, autor do estudo, é uma das principais autoridades em gestão internacional de recursos humanos, em particular na expatriação, e é autor de numerosos artigos académicos e de uma série de livros no campo da gestão de recursos humanos.

como um todo, não são colocados no centro da estratégia de gestão e da atividade. Na verdade, não existe uma verdadeira cultura de serviço ao cliente entre os gestores ou nos negócios e comércio em geral.

A burocracia sufocante fora das organizações é referida no estudo e é visto como um problema sério por parte de todos os gestores e torna a gestão um trabalho claramente mais difícil.

Ao nível do estilo de gestão, o estudo corrobora a análise de Hofstede (1984), referindo que internamente, existe uma tendência grande para líderes autocráticos, que não procuram delegar as decisões, o poder ou as responsabilidades e não estão confortáveis a trabalhar em equipas com trabalhadores que se reportem a eles. As reuniões demoram mais tempo que o necessário. A resistência ao trabalho cooperativo é exacerbada pela formalidade excessiva no local de trabalho e pelo estéril apego ao prestígio hierárquico, através do uso generalizado de títulos académicos na vida quotidiana.

Organizacionalmente, os resultados não são muito melhores. O estudo conclui que os gestores portugueses não gostam de trabalhar de uma forma planeada e não usam o tempo de forma eficiente. Os gestores portugueses, de uma forma crónica, não são pontuais e o seu modo de lidar com prazos é deixar tudo para a última hora. Existe uma forte tendência para o que o estudo apelida de “presenteísmo”, ou seja, trabalhar longas horas apenas para mostrar.

São tecidas ainda considerações sobre os gestores portugueses fora de Portugal afirmando que estes são bons a falar línguas estrangeiras, no entanto, apesar de originários de uma cultura muito acolhedora para os estrangeiros, os gestores não são especialmente bons em compreender ou adaptarem-se a diferentes culturas empresariais.

O estudo finaliza afirmando que a cultura de gestão em Portugal não proporciona as melhores condições para a adoção de atitudes modernas de gestão como o trabalho em equipa, autonomia e abertura. A menos que os gestores percebam que apenas equipas de trabalho, com cada membro a aceitar as suas próprias responsabilidades, são o suporte de objetivos comuns e vantagem competitiva, eles nunca vão ser competitivos no mercado global.

Lopes (2010) cita um relatório de 2004 da OCDE sobre os empresários e gestores portugueses, onde se tecem considerações acerca da cultura de gestão em que estes se movem e afirma que têm falta de talento e de ambição, não gostam de crescer, o seu jogo estratégico preferido é o de procurar formas de fuga ao fisco, a gestão que praticam é antiquada, não aposta

de marcas portuguesas no estrangeiro denota falta de jeito para o marketing e de visão para obter economias de escala.

Fazendo um retrato resumido, Lopes (2010) afirma que a cultura portuguesa é fortemente adaptativa, tendo como pontos fortes a apetência para o improviso e a criatividade individual, realçando que gerir a cultura portuguesa não se revela uma tarefa fácil.

Estes problemas transparecem para o mercado laboral português. O relatório da OCDE Job Quality database (2016) para medir e avaliar a qualidade do trabalho considera três dimensões (qualidade dos ganhos, segurança do mercado de trabalho e qualidade do ambiente de trabalho) objetivas e mensuráveis que são importantes não só para o bem-estar do trabalhador, como também politicamente relevantes. Quando medido e avaliado nestas três dimensões, conclui-se que Portugal está no lote de países relativamente mal em duas ou todas as dimensões da qualidade do emprego. Por exemplo, dos 34 países estudados, Portugal é o quarto país com maior insegurança no mercado laboral (OCDE, 2016), sendo o 8º pior na qualidade do ambiente de trabalho quando comparado com os países da OCDE.

Não se esperam, no entanto, melhorias nestas três dimensões, pois segundo a OCDE (2016) os efeitos da crise foram mistos em alguns países. Em Portugal, a qualidade dos ganhos estagnou e a segurança do mercado de trabalho caiu consideravelmente devido ao aumento do desemprego que ainda está longe ser reabsorvido, enquanto a qualidade do ambiente de trabalho melhorou para as pessoas ainda empregadas.