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As questões de gênero e etnia na política de qualificação profissional

CAPÍTULO 2 MERCADO DE TRABALHO E POLÍTICA DE QUALIFICAÇÃO

2.4 OS PLANOS DE QUALIFICAÇÃO PROFISSIONAL

2.4.1 As questões de gênero e etnia na política de qualificação profissional

As questões de gênero e etnia têm sido tratadas de forma transversal no Plano Nacional de Qualificação, e fazem parte dos objetivos de redução das desigualdades e promoção da cidadania. Moraes e Gassen (2004) afirmam que a partir de 2003 as ações relativas a gênero e etnia têm ganhado especial atenção com a criação da Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial e a Secretaria Especial de Políticas para a Mulher, possibilitando, assim, o tratamento dessas questões em diversas esferas das políticas sociais.

Dessa forma, as autoras afirmam que a transversalidade desses temas é um fator importante de ser trabalhado na política de qualificação profissional, visto que no mercado de trabalho as questões de discriminação são bastante evidentes, sendo que mulheres e negros, especialmente mulheres negras encontram-se em situação de vulnerabilidade. Nesse sentido, conforme Moraes e Gassen (2004), o atendimento de grupos prioritários no âmbito do PNQ é uma estratégia de universalização do acesso dos trabalhadores:

A garantia de acesso universal à política de qualificação, como direito social, vem associada à priorização do atendimento aos segmentos considerados mais vulneráveis econômica e socialmente — aqueles com maior dificuldade de inserção no mercado de trabalho, que têm sido alvos de processos de exclusão e discriminação social (MORAES; GASSEN, 2004, p.24).

Os dados da escolaridade e renda no Brasil demonstram as diferenças no aumento na escolaridade média de homens e mulheres, sendo que os dados do ano de 1981 sobre os anos de estudo24 são de 4,0 anos para os homens e de 3,7 anos para as mulheres. Em 1990 os dados são de 4,9 e 4,7, respectivamente e em 2001

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a vantagem se inverte, sendo que para os homens a média de anos de estudo é de 5,9 e para as mulheres é de 6,0 — alcançando os valores de 6,8 e 7,0, respectivamente, no ano de 2007 (IPEADATA, 2010). Os dados sobre etnia demonstram uma maior diferenciação entre a média dos anos de estudo entre brancos e negros25, sendo que para o ano de 1991 as médias representavam, respectivamente, 5,9 e 3,6 anos de estudo. Para o ano de 2000, os dados apontam uma média de 6,8 anos de estudo para brancos e 4,7 anos para os negros (IPEADATA, 2010).

O percentual de analfabetismo para o Brasil26, em relações a homens e mulheres é bastante próximo se comparado aos percentuais para brancos e negros. Para os primeiros, no ano de 1991 os valores são 18,24% para homens e 19,08% para mulheres e em 2001 os valores são de 12,44% e 12,30% respectivamente. Sobre as diferenças relacionadas à etnia, para o ano de 1991 o percentual de analfabetismo foi de 12,3% para brancos e 29,2% para negros. Apesar de apresentar uma tendência de aproximação entre si, a diferença entre os percentuais ainda permanece alta no ano de 2000, sendo de 8,3% para brancos e 18,7% para negros (IPEADATA, 2010).

Por esses dados, pode-se entender que, sobre as questões étnicas, existe uma grande vulnerabilidade dos negros em relação aos aspectos educacionais. As mulheres, no entanto, têm vantagens nesse aspecto, mostrando níveis educacionais superiores aos dos homens. Sobre as questões salariais, porém, mulheres e negros apresentam desvantagens no mercado de trabalho. Moraes e Gassen (2004, p. 26) afirmam que ―no Brasil, as mulheres recebem em média metade do salário dos homens e as mulheres negras, a metade do salário do que ganham as mulheres brancas‖. Os dados coletados na base Ipeadata (2010) demonstram a diferença da renda per capita27 entre brancos e negros no ano de 1991 (R$317,17 para brancos e R$129,28 para negros) e no ano 2000 (R$406,54 para brancos e R$162,75 para negros). Existem, portanto, aspectos que se entrelaçam nas discriminações de

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Média dos anos de estudo, pessoas com 25 anos ou mais. 26

―Percentual de pessoas de 15 e mais anos de idade que não sabem ler nem escrever um bilhete simples‖ (IPEADATA, 2010).

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―Razão entre o somatório da renda per capita de todos os indivíduos e o número total desses indivíduos. A renda per capita de cada indivíduo é definida como a razão entre a soma da renda de todos os membros da família e o número de membros da mesma. Valores expressos em reais de 1º de agosto de 2000‖ (IPEADATA, 2010).

gênero e etnia, tornando-se fatores cumulativos. Moraes e Gassen (2004) afirmam, nesse sentido, que

Existem fatores comuns entre a discriminação de gênero e a de raça/etnia: maior subemprego entre mulheres e negros, marcadamente entre as mulheres negras; ocupação nos postos mais baixos da escala salarial; remuneração desigual em ocupações de igual categoria; discriminação na admissão, promoção e qualificação. Por isso, torna-se estratégico abordar gênero e etnia juntos, porque a pobreza está fortemente concentrada na população negra, sendo as mulheres particularmente atingidas (GRPE/OIT). (MORAES; GASSEN, 2004, p. 26)

Moraes (2006) entende que as questões de gênero e etnia são próximas a política de qualificação no sentido que, entendida em sentido amplo, a estrutura curricular do PNQ prevê nos cursos carga horária definida para os aspectos relacionados à construção da cidadania, valorização dos diferentes saberes e reconhecimento da diversidade. A autora entende que, a partir da ―perspectiva da interseccionalidade‖ é possível ―dar ênfase a contextos e experiências específicas, diversas, diferentes‖, bem como, dar visibilidade às desigualdades e discriminações, que tem um sentido amplo, mas que se expressam no mercado de trabalho.

Apesar da concepção ampla em que se fundamenta o PNQ, que, conforme Moraes (2006) entende a qualificação profissional como direito, como construção social e como política pública, com a potencialidade de trabalhar com as questões de discriminação de gênero e etnia, a autora entende que existem alguns impasses na política para a efetivação de seus objetivos. As ―limitações orçamentário- financeiras‖ são um ponto levantado pela autora, que identifica defasagem nos recursos do FAT destinados as ações de qualificação profissional, sendo que o atendimento da população é restrito pelos poucos recursos e pela imprevisibilidade de sua alocação. Entre outros aspectos, a autora ainda inclui como limitações a ―pouca integração da qualificação com as demais políticas públicas de emprego‖ e o fato de que ―instituições de cursos profissionais ainda persistem em oferecer cursos dentro de uma visão tradicional de ocupações baseadas no sexo‖ (MORAES, 2006).